segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Guiné 63/74 - P9338: Memórias da CCAÇ 617 (2): Toby, o Cão da Tropa (João Sacôto)




1. Em mensagem do dia 7 de Janeiro de 2012 o nosso camarada João Sacôto (ex-Alf Mil da CCAÇ 617/BCAÇ 619, Catió, Ilha do Como e Cachil, 1964/66), enviou-nos esta história quase inacreditável do seu cão Toby que o acompanhou na sua comissão de serviço na Guiné




MEMÓRIAS DA CCAÇ 617 - 2

Bissau > Santa Luzia > Quartel General > João Sacôto e o seu cão Toby

Toby o Cão da Tropa

Neste poste vou recuar um pouco cronologicamente.

Assentei praça em Mafra, em Agosto de 1962 após dois anos de adiamento, por mim pedidos, em virtude de estar a estudar no então ISCEF (Instituto Superior de Ciências Económicas e Financeiras).
Tendo ficado bem qualificado no curso de oficiais milicianos (COM), fui colocado no RI 1 - Amadora e só fui mobilizado dois anos depois, em 1964 para a Guiné, já casado com vinte e cinco anos e uma filha que fez 2 anos exactamente no dia 8 de Janeiro data do embarque para a Guiné no Quanza.

Naquele 8 de Janeiro de 1964, embarcou comigo um elemento extra numerário, o meu cão Toby de raça boxer.

Na nossa estadia em Catió, sempre que saíamos do quartel para realizar alguma operação, fosse de dia ou de noite o Toby fazia questão de seguir com a tropa. Se alguma vez tentei que ele ficasse no aquartelamento, tive que o prender para que não nos acompanhasse.
A sua atitude no mato foi sempre de quem percebia o que se estava a passar, tanto em situações de emboscada, como em situações de patrulhamento, sempre atento e espectante.

Num dia de regresso ao quartel, caímos numa emboscada na estrada Cufar-Catió. Ficámos algum tempo sob fogo intenso e depois de conseguirmos pôr em debandada o inimigo, continuámos a nossa progressão para o quartel.
Estoirados de cansaço, porcos de sujidade e suor, desejosos de um bom banho refrescante e sedentos de uma bazuca bem gelada, só mais tarde, demos por falta do Toby, que, nesta altura já era conhecido pelo inimigo, como o cão da tropa (curioso, é o facto de, segundo julgo, toby, em balanta querer dizer chuva).
Ninguém se lembrava de o ter visto após a emboscada e foi grande a consternação durante os dois dias seguintes.

Durante uma patrulha na mesma estrada, o pessoal avistou ao longe, na berma do caminho um vulto que parecendo-lhes uma gasela ou uma cabra do mato se dispôs a dar-lhe um tiro, já antevendo algumas refeições de rancho melhorado. Porém ao aproximarem-se um pouco mais para garantirem um tiro certeiro, aperceberam-se no último momento que, afinal o objecto da sua caça era exactamente o Toby que se encontrava quase morto.
Transportado para a enfermaria, foi observado pelo médico da Companhia, o Ten. Mil. Cordeiro, que constatou ter o Toby sofrido o tiro de uma arma cuja bala lhe perfurou a barriga, tendo entrado e saído, deixando, portanto dois orifícios no abdómen.
A sua fraqueza nessa altura era extrema e durante muitos dias, sem força para se mover nem para comer, foi por mim alimentado a colheradas de papas de farinha dissolvida em água, até que lentamente foi recuperando até voltar a estar operacional.

Finda a comissão, não sei como mas a comunicação social, fez questão de fazer uma referencia ao Toby o cão da tropa.

No Cachil - Ilha do Como

Catió > Oficiais da CCAÇ 617 com o Toby

Chegada a Lisboa - Dever cumprido
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Nota de CV:

Vd. primeiro poste da série de 28 de Dezembro de 2011 > Guiné 63/74 - P9281: Memórias da CCAÇ 617 (1): A batalha de Bissau de Janeiro de 1964 (João Sacôto)

6 comentários:

Torcato Mendonca disse...

Amanhã, 10 de Fevereiro fazem três anos que morreu o meu Cão Pluto. Teve que ser abatido pelo Veterinário.
O sofrimento, devido á doença que tinha e se agravava, assim o determinou. Está a ver-me pela foto e tenho-o, junto ao Pit Bull Sebastião que ainda vive, num dos telemóveis.Este nasceu a 9 de Agosto de 2003. Já preocupa.
Foi pena "esquecerem-se" do Toby, não merecia estar a sofrer assim dois dias. Eles dão tudo pelos donos e só pedem uma caricia...
Ab T.

Antº Rosinha disse...

Tenho que meter a colher e peço desculpa ao "com" ou "catchurro", de João Sacôto, que teve uma vida original, mas queria aqui contar uma das impressões que chamavam a atenção de um tuga que desembarcasse em Bissau a seguir à independência.

Os cães abandonados de Bissau.

Era impressionante a quantidade de cães que na célebre "fome" que o novo regime criou, morriam debaixo dos volvos e peugeaut e de sarna e fome.

Com o abandono do interior pelas populações para Bissau, vieram aqueles cães que os guineenses gostavam de ter nas suas tabancas para guarda caça e companhia.

Bonita raça de cães, quase se poderia dizer que era uma raça apurada, pois mudavam apenas no tom da côr.

E, como os guineenses teem ou tinham um hábito de superstição que nunca entendi completamente, que consistia em atirarem para cima do animal morto pedras e paus, ficava um enorme obstáculo no meio da estrada, complicadíssimo para o trânsito, às vezes dias.

Essa imagem dos cães de Bissau, foi era muito degradante, embora em África houvesse pior.

Luis Cabral não teve a sensibilidade necessária, embora tivesse muita vontade de fazer melhor.

O Toby de João Sacôto fez-me recordar algo que me marcou em Bissau.

Cumprimentos

José Botelho Colaço disse...

Grande Toby.
Na minha companhia também um camarada levou um cachorro.
Tenho dele uma foto, ele entrelaçado nas minhas pernas ainda preso pela trela num passeio na [Bolola Bissau] para ele se adaptar à nova forma de vida.
Viveu poucos dias adoeceu e morreu.
Alguém me disse que os cães não aguentavam o clima da Guiné para o qual não estavam preparados nas suas defesas, o calor, a serem infectados pelas picadas dos mosquitos.
Não seria bem assim porque o Toby a tudo resisti ferido em combate, perdido, recuperado e regressado.
Ac. C.

Anónimo disse...

João

Com a minha companhia embarcaram 3 cães, dois pastores alemães e um rafeiro da Estrela.
Nos meses de Aldeia Formosa, os pastores procriaram e na ida para Medjo foi já uma boa matilha.
Não sei que tinha Medjo, para além da presença permanente da hipótese de combate.
Sei é que os cães morreram todos muito rapidamente, sendo o Serra da Estrela o último a morrer.
Abraço
José Brás

J. Gabriel Sacôto M. Fernandes (Ex ALF. MIL. Guiné 64/66) disse...

Não o mencionei no meu post sobre o Toby, o cão da tropa, porém, o meu fiel e dedicado cão, morreu pouco depois da passagem à disponibilidade, vitima de doença, na altura, diagnosticada pelo veterinário, com sendo infecção de sangue, provocada pelas inúmeras picadas dos mosquitos. Ainda na Guiné, todas as tentativas para lhe construir um abrigo com rede mosquiteiro, resultaram infrutíferas, pois o Toby, sempre irrequieto não mantinha o abrigo direito. O seu sofrimento nos últimos tempos de vida levou a que, com grande desgosto meu, tivesse que o mandar abater. Foi muito triste.

PASSAGEM disse...

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