segunda-feira, 9 de julho de 2012

Guiné 63/74 - P10135: Estórias dos Fidalgos de Jol (Augusto S. Santos) (3): A cobra cuspideira

1. Terceira e última história enviada pelo nosso camarada Augusto Silva Santos (ex-Fur Mil da CCAÇ 3306/BCAÇ 3833, Pelundo, Có e Jolmete, 1971/73), em mensagem no dia 30 de Junho de 2012.


ESTÓRIAS DOS FIDALGOS DE JOL (3)

A COBRA CUSPIDEIRA

Embora o maioria do pessoal da minha Companhia fosse constituída por Soldados do norte do país, nomeadamente de Trás-os-Montes, portanto por pessoas habituadas a trabalhar no campo e a lidar com os mais variados animais, ou seja, sem qualquer medo de bichos, sempre havia um outro que, pelos mais diversos motivos, não podia ouvir falar em cobras.

Foi uma dessas situações que levou a que se inventasse que já se havia visto perto do quartel cobras cuspideiras, bicho terrível que poderia cegar uma pessoa, ao cuspir o seu veneno para os olhos. Era uma realidade, no entanto ainda hoje desconheço se existem ou não cobras cuspideiras na Guiné, não tendo isto na altura passado de uma mera invenção para assustar um dos Soldados, que tinha um terrível pavor que tal lhe viesse a acontecer.

Mal ouvia o rastejar de um rato ou de um lagarto em cima da chapa que cobria o abrigo, aí estava ele em alerta total. Lembro-me que a esses lagartos chamávamos de “paga dez”, por estarem sempre a fazer o que pareciam flexões. Para em definitivo (ou não) se tentar acabar com aquela fobia, alguém um dia se colocou no lado de fora numa das vigias do abrigo imitando o rastejar e o silvo de uma cobra, para atrair o coitado do Soldado, que estava na sua hora de descanso.
Para completar a situação, outro entrou no abrigo a gritar que lá fora estava uma enorme cobra. Tendo aquele espreitado pela vigia para ver se via algo, é-lhe despejado um valente bocheco de água nos olhos.

Escusado será dizer que o infeliz deitou a correr para o meio da parada, com alguns trambolhões pelo meio, pois tentava tapar os olhos com as mãos, gritando:
- Estou cego, estou cego, estou cego.

Destas coisas sim, tenho saudades.

Augusto Silva Santos

Jolmete, Agosto de 1972 > Estrada velha de Bula

Jolmete, Agosto de 1972 > Regresso da segurança à água

Jolmete, Outubro de 1972 > Convívio

Jolmete, Novembro de 1972 > Bolanha de Ponta de S. Vicente
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 6 de Julho de 2012 > Guiné 63/74 - P10127: Estórias dos Fidalgos de Jol (2) (Augusto S. Santos): A noite da hiena

8 comentários:

Torcato Mendonca disse...

Mau bicho caro camarada, mau bicho e, ainda por cima, traiçoeiro.
Se desse tempo era colocar o relógio no ângulo de visão...da bicha.

Ab T

Luis Faria disse...

Em bula,uma manha assisti a um africano atirar-se do cimo de uma palmeira para o chão,por causa de uma.Foi evacuado vivo mas todo "partido"!

Anónimo disse...

Recém chegado e em plena parada dos "adidos",em Brá, avisto esses ditos cujos lagartos que correm na minha direcção param a curta distância iniciando as ditas flexões.
Receoso, tento afastá-los...entretanto ouvia à distância..ahhhh..piu..piuu.

Um dia em gadamael..eis que uma companhia regressa prematuramente ao quartel..dois soldados amparavam um furriel que gritava e se contorcia com dores..tinha levado uma cuspidela num olho da dita cuja.
Esclareço que a saliva da dita, se não for feito tratamento adequado ao olho ou olhos,provoca uma úlcera muito grave que pode levar à cegueira.
As "surucucus" são pequenas e verdes e normalmente estão suspensas em ramos de árvores e por isso normalmente mordem na cabeça provocando num curto espaço de tempo paralisia muscular o que logicamente inclui os músculos respiratórios...imaginem o resto.

C.Martins

Luís Dias disse...

Caro C. Martins

As cobras que picavam quem subia às árvores(normalmente nas palmeiras), embora também viessem ao chão eram as que denominávamos de: cobra verde da palmeira e, senão estou em erro, são conhecidas por "Green Mamba". A que denominávamos de surucucu (ao que creio erradamente, porque a surucucu é própria da América do Sul)será a "Víbora do Gabão", uma cobra grossa e relativamente curta (não é tão alongada como as outras, porque termina um pouco abruptamente)e muito venenosa. Matámos uma no Dulombi (que estava a digerir um sapo).
As cobras cuspideiras são do tipo víboras (najas).
Com os melhores cumprimentos.
Luís Dias

Tino Neves disse...

Para começar, um grande abraço para ti Augusto.
Eu sou da opnião do camarada Luis Dias, pois as cobras das palmeiras são pequenas e verdes, e que os guineenses preferiam saltarem das palmeiras para o chão e partirem as pernas, que serem mordidos por elas, porque não se salvariam.
Uma vez passou-me uma a um metro dos meus pés, na estrada a caminho de Bissalanca.
No que respeita à cuspideira nunca vi nenhuma, mas o meu irmão, uma vez quando lhe perguntei o que lhe tinha acontecido às lentes dos óculos, que tinham vários salpicos e não se conseguiam tirar, ele me disse que tinha sido uma cobra cuspideira e que não fora os seus óculos tinha ficado cego.
Tino Neves

Manuel Carvalho disse...

Caro Augusto

Cobras mesmo as de cá é bicho que eu dispenso, então as da guiné são bem mais perigosas.
Quanto ás fotos gostei de rever sítios onde passei cerca de um ano da minha juventude.

Um grande abraço

Manuel Carvalho
Ccaç.2366 Jolmete

Anónimo disse...

Caros Camaradas,

Muito obrigado pelos vossos esclarecimentos.
Conforme já tive oportunidade de comentar ao Luís Graça, de facto desconhecia a existência de cobras cuspideiras na Guiné, pois felizmente nunca tive qualquer encontro com aquelas bichas, embora numa ocasião no mato, enquanto estava encostado a um baga-baga, uma cobra verde tenha passado bem perto de mim. Lembro-me perfeitamente de um milícia estar a olhar para mim com os olhos arregalados e quase sem fala, a apontar para a dita cuja. Passou de "fininho" sem problemas.
Um Forte Abraço

Anónimo disse...

As minhas desculpas por me ter esquecido de identificar.
Um Forte Abraço
Augusto Silva Santos