sábado, 26 de janeiro de 2013

Guiné 63/74 - P11009: Diário de Iemberém (Anabela Pires, voluntária, projeto do Ecoturismo, Cantanhez, jan-mar 2012) (3): De Varela a Guileje

1. Continuação da publicação do Diário de Iemberém, da nossa grã-tabanqueira Anabela Pires,  nascida em Moçambique, técnica superior de serviço social no Ministério da Agricultura, reformada, amiga dos nossos grã-tabanqueiros Jero e Alice Carneiro... Em 2012, esteve na Guiné-Bissau cerca de três meses (, de meados de janeiro a meados de abril). Devido ao golpe de Estado de 12 de abril , acabou por sair da Guiné.-Bissau, por razões de segurança. Passou um mês no Senegal. Regressou a Portugal. Vive neste momento na Índia, em Auroville. Em Iemberém, Parque Nacional do Cantanhez,  região de Tombali, esteve a trabalhar como voluntária no projeto do Ecoturismo, da AD - Acção para o Desenvolvimento.  Chegou em Iemberém no dia 17/1/2012. E ficou  hospedada nas instalações locais da AD, a ONGD que é dirigida pelo nosso amigo Pepito (*)


2. Diário de Iemberém, por Anabela Pires [, que escreve de acordo com a antiga ortografia] > Parte III


22 de janeiro de 2012 (continuação)

Estiveram cá a passar o fim-de-semana 9 jovens portugueses, 7 dos quais professores, mas na vinda tiveram um acidente e acabaram por vir só em 2 carros. Assim, não puderam dar boleia à Cadi. Bom, talvez também seja perigoso dar boleia pois em caso de acidente pode-se arranjar um grave problema. E problemas já eles tiveram na vinda com uma moto em contramão que se enfaixou de frente. Na mota vinha um homem e uma mulher grávida que ficaram feridos e tiverem que ir para Bissau.

Foi a primeira vez que estes jovens vieram a Iemberém, ficaram nos bungalows, comeram no restaurante da Satu e saíram para passear com o Zeca (guia turístico instrutor). Hoje às 5.30 da manhã saíram para irem ver chimpanzés e conseguiram ver três.

Uma das jovens era professora de matemática e colega da Cátia, amiga da Mariana, de Coimbra, do Aikido. Não a conheço mas mandei-lhe de presente uma cestinha feita aqui pelos Balantas (uma das etnias existente nesta zona da Guiné).

Regressando à chegada a Bissau…. No dia 14 de Janeiro, às 7 horas da manhã, depois de me ter deitado às 4 horas, fui com o Pepito, a Isabel e o Cláudio para Varela, no norte do país, na fronteira com o Senegal. O Cláudio é um italiano que trabalha num projecto de cooperação com a AD. É geógrafo e o seu trabalho tem uma grande incidência em Iemberém. Já vem à Guiné há 10 anos. Agora foi para Itália mas volta em Março com outros colegas italianos ligados ao projecto. Estarão alguns dias em Iemberém mas também irão trabalhar no norte, na zona de S. Domingos.

Logo à saída de Bissau, na estrada, o Pepito foi comprar aquilo a que aqui se chama “couscous”. São uns bolinhos feitos de arroz pilado, levemente açucarados, com a forma de um pequeno queque. Uma dúzia deles dentro dum saco de plástico preto de má qualidade e lá os fomos comendo pelo caminho. Achei-os bem saborosos e imaginei a maioria dos meus amigos portugueses a comerem aqueles bolinhos, feitos por uma mulher agachada na estrada! Aí a ASAE! Bem, ninguém ficou doente e eu aproveito para aumentar as minhas resistências a alguma suposta falta de higiene.

O Pepito e a Isabel têm uma casa de férias em Varela e estão a fazer uma nova com horta, mesmo no meio da floresta. Penso que Varela deve ter a melhor praia da Guiné, de areia branca e muito fina. Assim, fomos tomar banho de mar no Sábado à tarde e no Domingo de manhã. A água devia estar aí a 23º ou 24º, considerada fria aqui em África. Nesta zona, uma das etnias são os Flupes, a etnia do coração do Pepito, e que pescam de zagaia! Quem me dera ter tal habilidade! [, a Anabela levou canas de pesca para Iemberém!]

Neste primeiro dia fiz logo coisas que me tinham dito em Portugal para não fazer: lavei sempre os dentes com água da torneira (e assim continuo pois não me fez mal algum!) e atravessei um pequeno riacho descalça.

Na casa de Varela quem cozinha é uma jovem também chamada Satu, que cozinha igualmente muito bem e tem ar de ser bem inteligente. O seu irmão Moamed é o empregado de casa, que segundo o seu próprio pai deu uma pancada com a cabeça em pequeno e ficou afetado! Só se lhe pode pedir uma coisa de cada vez pois se pedirmos duas não faz nenhuma. Não tinha ouvido a voz ao Moamed e por isso não imaginei que falasse português. Comecei a falar com a Satu e espantei-me do seu bom português! E descobri que o Moamed também falava bem português. Então expliquei por que tinha vindo para a Guiné, disse que ficaria 6 meses e que depois voltaria ou não, caso me adaptasse e o Pepito gostasse do meu trabalho.

Moamed: “Vai voltar!”

Eu: “Não sei, não depende só de mim, também depende do Pepito gostar ou não do meu trabalho.”

Moamed: “Vai gostar!”

Eu: “Ah, não sei!”

Moamed: “Sim, vai gostar. Como a senhora fala na mesa, Pepito vai gostar!”

Fiquei de boca aberta com a sua observação e percebi que da conversa à mesa nada lhe tinha escapado! O Pepito e a Isabel explicaram-me depois que o Moamed é extraordinariamente curioso e que, se por acaso, eles estão ao computador, ele não sai dali. Quer ver tudo, sobretudo o que pode ser para ele algo de novo. Felizmente a tal pancada na cabeça não o afectou completamente!

Antes de chegarmos a Varela parámos em Ingóre, zona onde a AD também intervém. Fomos ver o infantário que está a ser construído pela população e para o qual a AD contribui com os materiais. Conheci o Eugénio, engenheiro agrónomo guineense formado no ISA [, Instituto Superior de Agronomia,] em Lisboa e a Ermelinda, também técnica da AD. Parámos em S. Domingos, em Suzana, onde o Pepito e a Isabel foram contactando outras pessoas ligadas ao trabalho da AD. Fizemos 170 km de Bissau a Varela, 120 dos quais em estrada alcatroada e os restantes em terra batida.

No Domingo, depois do almoço, fizemos a viagem de regresso. Nos primeiros quilómetros devemos ter parado uma dúzia de vezes. As crianças da zona conhecem o carro do Pepito e saem a correr em direcção à estrada – mesmo quando estão a guardar vacas – a gritar “Pepito, Pepito, Pepito!”. Ele pára o carro e eles pedem “caneta”! Então ele pergunta-lhes em que classe andam e de acordo com a que frequentam questiona-os sobre a tabuada. Quando acertam dá-lhes uma caneta, se não acertam manda-os estudar. Dá-lhes às vezes segunda hipótese, às vezes até uma terceira mas se não acertam nenhuma não têm direito à caneta. Ele já me tinha contado este jogo quando esteve em Portugal mas vê-lo ao vivo foi uma delícia! E assim, aqueles primeiros quilómetros demoraram uma eternidade. Quando chegámos a Bissau já tinham terminado as cerimónias fúnebres do Presidente da República [, Malam Bacai Sanhá, 1947-2012] e a cidade estava calma.

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Na segunda-feira, dia 16, de manhã, fui com a Isabel às compras a Bissau. Começamos por ir tomar um pequeno-almoço especial – pão de Deus, com manteiga e fiambre, sumo de papaia e depois uma bica. Muito bom, mas custou, para as duas, cerca de 8 €. Em Bissau encontra-se quase tudo à venda mas os produtos importados são caros.

Dia 17, 3ª feira, vim então para o Sul, às 6 da manhã. Devemos ter feito cerca de 150 km em estrada alcatroada e depois começou a estrada de terra batida. Parámos em Quebo onde o Pepito comeu um pão (cacete) com a margarina de cozinha aqui usada mas eu preferi comer pão seco.

Passámos em Farosadjuma, onde a Fatu, que será também minha formanda, tem três bungalows e energia solar. Parámos em Guileje, onde existiu um quartel português. Um dos antigos edifícios (foram todos destruídos após a retirada da tropa portuguesa e por sua ordem) foi reconstruído e serve de habitação e escritório aos técnicos locais da AD – O Domingos e a Maimona. O exterior da entrada do edifico está todo coberto de garrafas de cerveja enterradas pelo gargalo – um piso curioso feito pelos soldados portugueses e que evita a lama à porta de casa no tempo das chuvas. Depois visitei a antiga capela, também já reconstruída pela AD, com um pequeno altar, uma cruz, uma Nossa Senhora de Fátima, oferecida por antigos combatentes portugueses, e à entrada uma antiga pedra gravada pelos nossos soldados. De seguida fui ao memorial de Guileje, outro edificio reconstruído, onde estão memórias dos combatentes portugueses e do PAIGC. Uma homenagem a todos os que tiverem de fazer a guerra.

É um sítio de reconciliação e não pude deixar de me sentir emocionada. Onde se fez a guerra há 40 anos faz-se hoje a paz. Gostei especialmente da frase de Amílcar Cabral colocada à entrada “A cultura é um elemento essencial da história de um povo”. A AD vai agora começar a reconstrução de outro edifício do antigo quartel. A Fundação Mário Soares contribui financeiramente, e penso que não só, neste projecto. No Memorial existe uma detalhada maquete do antigo quartel. No exterior está um antigo Unimog português e uma arma anti-aérea que era do PAIGC.

Chegámos finalmente a Iemberém, onde era previsto almoçarmos.

(Continua)

[Fotos: © João Graça (2009). Todos os direitos reservados]

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Nota do editor:

Último poste da série > 23 de janeiro de 2013 > Guiné 63/74 - P10988: Diário de Iemberém (Anabela Pires, voluntária, projeto do Ecoturismo, Cantanhez, jan-mar 2012) (2): A adaptação

5 comentários:

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