sábado, 28 de setembro de 2013

Guiné 63/74 - P12096: História da CCAÇ 2679 (64): Comportamentos e decisões determinantes (José Manuel Matos Dinis)

1. Mensagem do nosso camarada José Manuel Matos Dinis (ex-Fur Mil da CCAÇ 2679, Bajocunda, 1970/71), com data de 26 de Setembro de 2013:

Viva Carlos!
Trago uma nova estória para o contexto da CCaç 2679, mas que, no meu entender, também se refere a comportamentos ou decisões determinantes da coesão e eficácia dos grupos de combate.
A instrução era bastante frágil, e a ordem que devia identificar cada força, era tão mais acessível, quanto a facilidade de relacionamento entre todos - a camaradagem, a intuição e tarimba que o dia-a-dia aprimoravam.
Aqui vai!

Envio-te um grande abraço de amizade, extensivo ao tabancal.
JD


HISTÓRIA DA CCAÇ 2679

64 - COMPORTAMENTOS E DECISÕES DETERMINANTES

Após o pequeno-almoço reuniu-se o Foxtrot em frente ao edifício da messe, onde eu os esperava. Para aquele dia tínhamos uma patrulha de combate, com uma deslocação para nordeste, saindo na direcção de Copá, direccionando em seguida para a linha de fronteira, que acompanharíamos na direcção leste/oeste, até um marco situado na divisória das ZA de Bajocunda e Pirada. Depois, aproximar-nos-íamos para perto da fonte, onde passaríamos a noite.

O pessoal juntava-se com as chalaças costumeiras, em conversas de amigos, ou envoltos em pensamentos privados, mas, no geral, todos se apresentavam bem dispostos e preparados.

Confirmei que estavam todos, e também o radiotelegrafista e o enfermeiro, dois especialistas indispensáveis em cada deslocação no mato, que nos transmitiam a confiança e segurança suplementares às nossas próprias capacidades para lidar com as diferentes situações susceptíveis de acontecerem.


Arrancámos, com a despreocupação própria de uma viagem rotineira, e a confiança resultante do hábito de não encontrarmos inimigos que nos surpreendessem, nem causassem danos. Até à porta de saída o pessoal deslocava-se com alegria, brincando e respondendo a brincadeiras, uns com os outros, ou com camaradas que ficavam no aquartelamento, ou com membros da população, principalmente as bajudas, a quem se faziam promessas de amor eterno após o regresso da acção.

Ao atravessarmos a pista já se formava a fila de pirilau, e adiante, num segmento da picada com mais visibilidade, eu arredava da progressão, para chamar a atenção aos que tinham tendência para se agrupar em conversas. Costumava deixar para o fim dois ou três dos melhores elementos que garantiriam a boa ordem, enquanto os prevaricadores aceleravam o passo, e tomavam lugar a seguir a mim, no inicio da progressão. Fazia esta manobra com frequência, pois sabia da tendência para acontecerem ajuntamentos na retaguarda.

O passeio corria bem. Algures, junto da fronteira, abancámos para a merenda. Depois de reatarmos o caminho remanescente, fui informado de que um elemento estava doente. A progressão estava comprometida. Com ele já se encontrava o enfermeiro, que diagnosticava paludismo. Acrescentou que ia ministrar um injecção, mas que o estado de saúde se agravaria, e a melhor decisão seria deslocarmo-nos a Bajocunda para o deixarmos sob os cuidados da enfermaria. E foi o que decidi. De inicio amparado, depois deitado numa improvisada maca, a partir de dois ramos de árvore e de um pano de tenda, chegámos ainda cedo. Falei com o capitão e preparava-me para sair e montar a emboscada, quando surgiu o sargento David, equipado de camuflado, arma e munições, que me perguntou se poderia acompanhar-nos. Respondi que não via razão para sair connosco, mas, se era voluntariamente que se apresentava, eu punha a questão do comando. Que não, apenas desejava ter uma experiência, e não pretendia comandar, que ficava ao meu cuidado.

Voltámos a sair, mas já não concluímos o traçado original para a patrulha. Dei uma volta até à aproximação do crepúsculo, e montei a emboscada nas proximidades da fonte, como era previsto. Tal decisão tinha que ver com a referência da posição perante os obuses de Bajocunda e Pirada, na eventualidade de uma aparição do IN, e permitir-nos-ia, em coordenação com as defesas dos aquartelamentos, proceder a um envolvimento da força atacante. Chamei dois elementos de confiança e dei-lhes a incumbência de vigiarem o sargento, normalmente dado a exuberâncias, no sentido de que a nossa posição não fosse denunciada nas cercanias.

Não houve qualquer incidente nem perturbação, e o sargento não levantou qualquer problema, apesar da estranheza da iniciativa. Cada deslocação de uma força militar fora do arame, era susceptível de uma diversidade de incidências inesperadas, e nós deveríamos ter a capacidade para tomar as melhores decisões, sob pena de prejudicarmos condições singulares ou colectivas.
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Nota do editor

Último poste da série de 8 DE SETEMBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12017: História da CCAÇ 2679 (63): O jogo do Poker (José Manuel Matos Dinis)

2 comentários:

Tony Borie disse...

Olá José Dinis.
Este texto, é um documento importante, pois narra uma "saída para o mato", portanto iam arriscar as vossas vidas, naquele cenário onde havia um conflito.
Tu, descreves todos os movimentos, onde devia de haver alguma tensão, ou até talvez desespero, mas sempre lhe dás um ar de boa disposição com "chalaças costumeiras", indo em "fila de pirilau", enfim, nós os teus companheiros, que por lá andaram, ao ler este texto, parece que somos jovens, parece que foi ontem, parece que conhecíamos o pessoal do teu grupo!.
Um abraço, Tony Borie.

Luis Faria disse...

Amigo José Dinis

Por variados motivos andando um tanto arredado destas lides blogueiras,deparo-me agora com este teu texto.Gostei.

Aflora uma situação,que comigo tambem aconteceu por algumas vezes e que julgo foi comum a muita rapaziada que,não sendo de sua "arte"palmilhar pelo mato,não queriam voltar à Metropole sem ter essa esperiencia arriscada.

Abraço
luis faria