sábado, 1 de março de 2014

Guiné 63/74 - P12785: Bom ou mau tempo na bolanha (46): Todos fomos cowboys (Tony Borié)

Quadragésimo sexto episódio da série Bom ou mau tempo na bolanha, do nosso camarada Tony Borié, ex-1.º Cabo Operador Cripto do Cmd Agru 16, Mansoa, 1964/66.



Foi por acaso, estávamos no aeroporto da cidade de Orlando, no estado da Florida, com destino a Phoenix, no estado do Arizona, que seria o nosso local de início de uma aventura pelo deserto do Arizona, pois queríamos ver ao vivo aqueles lugares que nos encantavam nas películas a “preto e branco”, de “índios e cowboys”, algumas vistas lá em Mansoa, principalmente ao sábado, quando o furriel Honório trazia na avioneta do correio mais uma bobine com um filme novo, que era projectado naquela noite em Mansoa, que eu considerava um verdadeiro “posto avançado”, pois era a partir do nosso aquartelamento que começava a “verdadeira guerra”, o verdadeiro “faroeste”, lá para as bandas de Mansabá, Bissorã, Olossato, Bafatá, todos aqueles aquartelamentos do interior, para onde a bobine do filme seguiria depois para entreter os nossos companheiros, que já fartos de tiros, iam ouvir e ver mais tiros.

Como disse, foi por acaso, pois não havia lugares naquele vôo, para a cidade de Phoenix. A empregada de balcão muito amável, com aquele sorriso que vende uma qualquer marca de “pasta de dentes” nos diz:
- Não há para Phoenix, mas há lugares para Tucson, que fica um pouco a sul, e o avião sai daqui a trinta minutos.

Aproveitámos e seguimos para Tucson, cidade de fronteira, que dizem que se fundou por volta do ano de 1775, com o nome de “Pueblo Viejo” (Povo Antigo) devido a seu antigo forte que então delineava as fronteiras e se localiza na parte sul do estado do Arizona, numa zona conhecida por Deserto de Sonora. Fica num vale com cerca de 1300 quilómetros quadrados e está rodeada por cinco cordilheiras montanhosas, que se aproximam dos 2700 metros de altitude.

Para nós, pois nesta idade o tempo até é um pouco difícil de passar, pouca diferença fazia, pois o nosso destino era o sul do estado do Arizona, de onde depois de alugar um veículo automóvel económico, seguiríamos a deambular pelas pradarias do centro e norte do Arizona, talvez até ao Parque Nacional do Grand Canyon ou outras paragens.

Já no pequeno aeroporto de Tucson, logo verificámos que havia muita publicidade ao lugar de Tombstone, sim o tal Tombstone dos filmes de cowboys e índios de Hollywood, protagonizados por aqueles actores, que quase todos nós, naquela época de jovens conhecíamos, o tal lugar das histórias de fronteira, onde os bandidos roubavam no México e fugiam para os USA, ou vice-versa, o célebre “O. K. Corral” e toda a espécie de aventuras em que o actor principal carregava duas grandes pistolas, era o mais rápido no gatilho, vencia sempre e depois de matar dois ou três “foras-da-lei”, que podiam ser “gringos” ou “amigos”, depois ficava naquela indecisão entre a rapariga e o cavalo, que normalmente passava a mão pela cabeça do cavalo, acariciando-o, então de seguida agarrava a rapariga pela cintura, que normalmente era loira, encostava-a ao seu corpo, pregando-lhe um grande beijo.

Ora nós, que quando jovens apreciávamos aquelas aventuras, tanto no cinema a preto e branco, como nos livros das histórias de banda desenhada que o Carlos nos emprestava. O Carlos era o filho do Santos dos Correios que tinha vindo dos lados de Leiria e até diziam que era “Bufo”, pois era ele que fazia a revisão do jornal que se publicava em Águeda, e usava uns lápis com cores azul ou vermelho, que o Carlos lhe roubava para fazermos desenhos a cores, depois de toda a classe ter “cantado” a tabuada.

Continuando, estando tão perto, não perdemos a oportunidade, abalámos na estrada número 10, depois numa estrada secundária, e ao fim de mais ou menos uma hora de viajem, deparámos com uma placa de sinalização que dizia: “Tombstone”.
Tombstone é uma histórica cidade do antigo oeste americano, situada no distrito de “Cochise”, cidade de fronteira, de cowboys, onde chegavam diligências com todo o tipo de aventureiros. Por volta de 1890, durante a prospecção de prata das diversas minas que havia em redor, chegou a ter 110 “saloons”, 14 salões de jogo, dezenas de bordéis com raparigas oriundas de diversas partes dos USA e até do oriente, que chegavam aos USA através do porto de São Francisco. Chegou a ter um dos famosos teatros de fronteira, que era o “Bird Cage Theatre”, que era frequentado tanto por cowboys como por mineiros.

Foi a esta cidade de fronteira, por volta do ano de 1880, que chegaram os famosos irmãos Earp, que era o Virgil, o Wyatt, o Morgan e o Warren, que logo entraram em conflito com alguns cowboys residentes em Tombstone, que deu lugar ao célebre “Gunfight at the O. K. Corral”, que foi um dos mais famosos duelos entre cowboys do oeste americano, que Hollywood memorizou em diversas películas que foram filmadas neste local. Tem diversas atracções, e locais para se apreciar como “Boothill Cemitério”, algumas minas de prata, o “O. K. Corral”, onde fazem um divertimento com muitos tiros e lutas, alguns sallons, como eram na época, diligências que dão a volta à área, e se explica a história desta cidade de fronteira.


Depois de termos sido por algum tempo, John Wayne, Gary Cooper ou Kirk Douglas, seguimos para norte, seguindo a rota que antes tínhamos traçado, através das padrarias do Arizona, onde o terreno é seco, sem vegetação, embora a terra seja vermelha, tal como lá, na nossa então província da Guiné.

Tony Borie, Fevereiro de 2014.
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Nota do editor

Último poste da série de 22 de Fevereiro de 2014 > Guiné 63/74 - P12760: Bom ou mau tempo na bolanha (45): Combatentes até ao fim (Tony Borié)

1 comentário:

Hélder Valério disse...

Olá Tony!

Continuas a dar-nos retratos da América.
Neste caso referes-te a locais que o pessoal "das nossas idades" viram no cinema ou ouviram falar.

Fui um tipo afortunado. Vivia numa terra, Vila Franca, que tinha cinema. Tive a sorte de uma senhora que era minha vizinha e arrumadora no cinema me adoptar como 'sobrinho' de modo que entre os meus doze e os dezasseis anos foram raros os filmes 'para maiores de 12' que falhei. Acho que vi todas as coboiadas.

Do que contas, 110 "saloons", 14 salões de jogo e dezenas de bordéis, revelam a importância da povoação e também das potencialidades de desordem que tais "instituições" podiam gerar.

Como de costume, consegues fazer sempre a ligação entre o que vês e as tuas memórias guineenses.

Abraço
Hélder S.