domingo, 14 de dezembro de 2014

Guiné 63/74 - P14027: Manuscrito(s) (Luís Graça) (41): Maresias, Lisboa, Tejo, memórias, amnésias... Parte II: O Terreiro do Paço e a(s) cenografia(s) do poder


Lisboa >  Praça do Comércio > 8 de dezembro de 2014 >  "Exposição fotográfica 150 anos DN" (nas ruas de Lisboa,  de 4 de dezembro de 2014 a 31 de janeiro de 2015; foto do arquivo  do Diário Notícias; apoio da Câmara Municipal de Lisboa e patrocínio da Vodafone e da Essilor) >  Legenda: 

"No Terreiro do Paço, com a bandeira nazi desfraldada,  a banda do couraçado Deutchland tocou  para os lisboetas,  no domingo, 30 de janeiro de 1938.  No Tejo a esquadra alemã tinha ainda dois submarinos U-Boot".


Lisboa >  Praça do Comércio > 8 de dezembro de 2014 > "Exposição fotográfica 150 anos DN" (nas ruas de Lisboa, de 4 de dezembro de 2014 a 31 de janeiro de 2015; foto do arquivo  do Diário Notícias; apoio da Câmara Municipal de Lisboa e patrocínio da Vodafone e da Essilor) >  Legenda: 

 "Quatro dias depois da banda do couraçado alemão, a do couraçado britânico Nelson deu um concerto também no Terreiro do Paço. Em fevereiro de 1938 a esquadra inglesa tinha entrado no Tejo com vários cruzadores, contratorpedeiros e submarinos".




Lisboa >  Praça do Comércio > 8 de dezembro de 2014 > Exposição fotográfica 150 anos DN" (nas ruas de Lisboa de 4 de dezembro de 2014 a 31de janeiro de 2015)  > foto do arquivo  do Diário Notícias > apoio da Câmara Municipal de Lisboa e patrocínio da Vodafone e da Essilor > Legenda: 

"Desembarque no Cais das Colunas, coche real, colgaduras pendentes das varandas pombalinas, e o povo vitoriando uma jovem rainha Isabel II. Era inverno, 18 de fevereiro de 1957, mas o sol lisboeta brilhou".



Lisboa > Museu de Lisboa > Torreão Poente da Praça do Comércio > Exposição "Maresias: "Maresias: Lisboa e o Tejo, 1850-2014" (de 14 julho a 19 dezembro de 2014) (*) > Núcleo Terreiro  do Paço > "Visita do Presidente do Brasil, Juscelino Kubitschek de Oliveira, no  âmbito das cerimónias do V Centenário da Morte do Infante Dom Henrique, 6 a 10 de agosto de 1960" >  Foto de Amadeu Ferrari. Arquivo Municipal de Lisnoa.

[Foto: Luís Graça (2014). Imagem reproduzida com a devida vénia, e para fins meramente informativos]



1. Do portal do Museu da Cidade, sinopse da exposição "Maresias: Lisboa e o Tejo, 1850-2014", com a devida vénia:

A partir de meados do século XIX, a margem do Tejo vive uma fase de mudança que altera, em pouco mais de meio século, o seu perfil tradicional. Determinado pelas novidades tecnológicas, esse processo subverte as relações comerciais, o tráfego de gentes e mercadorias, e impõe a adaptação da frente ribeirinha da cidade. O caminho-de-ferro chega em 1856 [, com a inauguração do troço Lisboa-Carregado,] , e rápido se espraia pela margem, ao mesmo tempo que vias batidas substituem as praias fluviais, caso do Aterro da Boavista, ligando Santos ao Cais do Sodré, construído entre 1858/1867.

O despacho mais intenso de gentes e mercadorias torna obsoleto o transbordo, obrigando à construção de estruturas portuárias – cais, docas, filas de armazéns, gruas e guindastes. Esta azáfama recente cruza-se ainda com o trânsito de frescos pelo rio, sustentáculo do dia a dia da cidade, trazidos por embarcações tradicionais. Uma variada tipologia de modelos náuticos carrega um colorido barulhento, acentuando a dicotomia entre a tecnologia moderna, essencialmente metálica e movida a vapor, e o sabor antigo das madeiras, dos mastros e das velas.

Esta dinâmica imparável das alterações portuárias cria uma barreira entre a cidade e o rio. Lisboa vira costas ao Tejo, crescendo para o interior. No entanto, a partir de meados do século XX, inicia-se um processo lento de reaproximação, sendo dado o primeiro sinal através da Exposição do Mundo Português, em 1940. A Exposição Mundial de 1998 veio tornar irreversível essa reinvenção da margem, cujo avanço se vai aos poucos consolidando com novos projetos.

Através desta exposição, o Museu da Cidade propõe uma viagem atenta entre Xabregas e Santos, para se apreender o essencial do frenesim da mudança de vivências e paradigmas desde 1850 até à atualidade. Uma síntese sucinta realizada através da reunião de variado material que permita acompanhar essa evolução de forma apelativa e sensorial, ajudando a entender como se foi articulando a frente de rio às imposições e aos anseios de cada tempo.

José Sarmento de Matos [, comissário científico]





Lisboa, vista em perspectiva. Gravura em cobre, meados do Séc. XVI (Pormenor) (in G. Braun - Civitates Orbis Terrarum.., vol. V, 1593) (Fonte: Museu da Cidade).

Em meados do séc. XVI, a cidade de Lisboa não sofrera grandes alterações desde o reinado de D. Manuel que muda o paço, em 1511, do Castelo de São Jorge para a frente ribeirinha. Destaque, neste desenho, para o centro, com a representação do Terreiro do Paço e, mais a norte, a Praça do Rossio, com os edifícios do Paço dos Estaus, ao fundo, e do Hospital Real de Todos os Santos, do lado direito. O hospital ocupava grande parte do que é hoje a Praça da Figueira, e pode ser considerado o primeiro hospital mundial da era da globalização, inaugurada pelos portugueses, com a descoberta do caminho marítimo para a Índia. (LG)




Lisboa > Praça do Comércio > 30 de Maio de 2010 > Esquina do Terreiro do Paço com a Rua do Arsenal > Aqui morreram, assassinados, em 1 de Fevereiro de 1908, o Rei D. Carlos e o seu herdeiro... Em 5 de Outubro de 1910, era proclamada a República, a escassas dezenas de metros, da varanda dos Paços do Concelho, na Praça do Município. (LG)


Foto: © Luís Graça (2010). Todos os direitos reservados.





Lisboa > 6 de outubro de 2013 > Praça do Comércio, estátua equestre de D. José, com  o  Cais das Colunas e o  estuário do Rio Tejo, ao fundo... Vista panorâmica a partir do topo do Arco da Rua Augusta.(LG)


Fotos: © Luís Graça (2010). Todos os direitos reservados.

2. Um dos seis núcleos da exposição, "Maresias: Lisboa e o Tejo, 1850-2014", é o Terreiro do Paço, como o povo lisboeta continua a chamar à Praça do Comércio, o "hall" de entrada por excelência na capital quando o principal meio de transporte ainda era por mar e rio. Desde a Rainha Isabel II  (em 1957) ao Gungunhana, o imperador de Gaza, Moçambique  (1896), passando por Kubitschek (1960). Também foi aqui que em 1939 desembarcou o gen Oscar Carmona no regresso da sua visita oficial ao ultramar português.

Com 36 mil metros quadrados (o equivalente a 7 campos de futebol), é uma das maiores e mais belas praças da Europa. Foi local de residência dos reis e de suas cortes, desde 1511 até ao terramoto de 1755. E no plano pombalino de reconstrução da baixa lisboeta (1758), desempenhou um papel central com uma nova cenografia do poder. 

A estátua equestre de D. José I, inaugurada vinte anos depois do terramoto, merece agor ser vista de cima para baixo, a partir do topo  do arco  da Rua Augusta (cujo acabamento, curiosamente, se arrastou por dezenas e dezenas de anos de 1815 até 1873).

O Praça do Comércio e os edifícios pombalinos que a emolduram, assistiram à ascensão e queda de cinco regimes políticos (monarquia absolutista, monarquia constitucional, I Repúlica, Estado Novo, 25 de abril...). Com espaço onde cabem 180/200 mil pessoas de pé, foi palco de inúmeros acontecimentos políticos e socias, do regicído em 1908 a sua ocupação, em 25 de abril de 1974, por uma coluna de carros de combate, vinda de Santarém e  comandada pelo cap cav Salgueiro Maia (1944-1992),  que pôs cerco aos ministérios no Terreiro do Paço e forçou depois, à tarde, a rendição de Marcelo Caetano no Quartel do Carmo.

Nas suas raras aparições em público, Salazar gostavam de assomar à janela de um dos edificios ministeriais da ala sul do Terreiro do Paço (, ali+as, foi a+í que teve o gabinete enquanto ministro das finanças), tendo em baixo a sua multidão de apoiantes. Era também o espaço, físico e simbólico, preferido pelo Estado Novo para as cerimónias do 10 de junho e da condecoração dos heróis da guerra do ultramar, em muitos casos a título póstumo...(Curiosamente, são algumas "brancas" da exposição documentak e fotográfica "Maresias"...

Trabalhei aqui, na baixa lisboeta (na Rua da Conceição nº 100 e depois no Terreiro do Paço...), na 2ª metade da década dfe 1970 e primeira metade da décad de 1980, no Ministério das Finanças. Há tempos foi ao baú repescar escritos desse tempo. Aqui fica um deles, para os eventuais leitores deste(s) manuscrito(s)...  E, mais uma vez deixo o convite para visitarem as "Maresias"... Até 19 deste mês... No Torreão Poente do Terreiro do Paço... LG


3. Português, bip, bip 


Português,
sem título nobiliárquico,
suprimido, reprimido,
duplamente comprimido,
muito pouco enfático,
retornado e agora prec[arizado],
periférico e dependente,
pobrete mas alegrete,
vagueando pelas ruas,
da capital,
soletrando as letras das tabuletas,
e indo pondo os pontos nos ii,
de regresso a casa,
de mãos nuas,
sem os três ddd dos dedos da mão,
sem o ouro e os rubis 
do senhor dom joão,
o quinto.

Nem sequer o delírio palúdico do fernão mendes pinto,
que abril já é novembro,
sem os cravos,
sem os escravos,
com o FMI à perna.

Advinha fácil, e até terna,
para um marinheiro sem bote nem mar,
encalhado na rua da conceição nº 100,
ali ao terreiro do paço.
E porquê terreiro do paço e não do povo ?
Praça do comércio, diz a tabuleta,
que o poder afinal não caiu na rua,
não é minha nem é tua,
é de quem a apanhar…

Gostem, ou não, os novos senhorios,
do travo a sal que trazes das bolanhas,
do fétido cheiro da ressaca,
da podridão da madeira dos navios,
do azedo azebre dos canhões,
do bolor dos xicorações,
do gosto a sangue das batalhas,
da patine dos brasões de goa
e do negrume da fortaleza de são josé da amura, em bissau,
que a grande aventura dos teus avoengos,
te deixou na boca.


Tuga, chamavam-te os negros da guiné.
como quem chama filho da mãe,
hoje demandas outras paragens,
vais por terra porque já não tens porto,
nem cais de partida,
nem naus nem caravelas,
vais para o raio que te parta,
vais para a puta que te pariu,
grita o arruaceiro de um manifestante 
que ganhou há o dias o direito,
como qualquer doente,
de se queixar que lhe doi o dente


Seis milhas marítimas são um lago
para as tuas crianças brincarem
e já não há rei nem roque
para poderes clamar aqui d’el-rei,
para não perderes o norte,
para apelares à humana justiça
ou tão só para poderes morrer,
sem tença nem avença,
com cama, comida e roupa lavada,
mais o direito à extrema-unção
no real esprital de todos os santos.

Estás só, estás órfão,
mesmo que a europa, dizem, esteja contigo,
está contigo mas é o caraças,
a europa é um mapas que traças
a régua e esquadra.
Estás apático,
perdeste o gosto pelas histórias,
mesmo as trágico-marítimas do teu fado,
salpicado de sangue, suor e lágrimas.
Ah!, e os teus ditos de escárnio & maldizer ?
Onde estão,
oos teus quatro humores ?



Português, enfim,
de teu nome,
filho de gente cuja origem se perde
na noite dos tempos
ou nas manhãs de nevoeiro,
com judeus sefarditas, bérberes e pretos
e outros amores,
pelo meio,
a dar cabo da árvore genealógica,
a estripar a estirpe,
a sangrar a pureza do sangue.

Português bip bip
de bipolar
de bifurcação
de bis
de bisar
de bisca 
de lerpar
de bilhete

bissexto
bambadinca
bazuca
bip bip de banco
debalde,
de bic
banco intercontinental português
plural pluricontinental plurracial
que a rua é da conceição
nº100
e tem por debaixo as termas romanas, 
enquanto tu em cima trabalhas 
para a confiscação fiscal.
Lisboa, diz o porteiro do Texas bar,
é porto seguro,
quando lhe mostras o crachá da autoridade tributária.

Mas onde é que acaba, afinal,
a confusão imaginária 
do teu passado muito pouco imperial
e começa a prometida limpidez do futuro?

Lisboa, baixa pombalina, fevereiro 1977 

1 comentário:

Antº Rosinha disse...

Amigo Luís Graça, como pouca vezes se lêem coisas tão interessantes como este post sobre um dos lugares mais históricos e emblemáticos do Portugal do Minho a Timor, gostava de te transmitir mais uma curiosidade sobre o Torreão Poente.

Esse torreão oscila.

Esse torreão tem uma marca topográfica em bronze (?) de observação temporária na sua esquina do lado do terreiro.

E por mais que uma vez vi um geógrafo a fazer leituras ali, e tive que matar a curiosidade.

Como após as minhas andanças ultramarinas vim terminar a minha actividade na metrópole, foi naquele terreiro o meu último trabalho no ano que o Papa fez alí uma grande cerimónia.

Ouvi e depreendi o seguinte: Não sei se sabes que o Metropolitano Chiado-Santa Apolónia passa sob a Marinha e contorna o Torreão pelo Tejo, a uma certa profundidade, evidentemente.

Mas não tão profundo que o próprio túnel do Metro não acuse as marés, e o Torreão também acusa os efeitos da construção do Túnel e a actividade das marés.

Mas claro que os professores é que têm os livros e a política é que "arrisca".

Aquele túnel foi cá uma "derrapagem" e um risco!!!

Sempre que vou à baixa, passo por esse Terreiro, que tão bem retratas.

Cumprimentos