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sábado, 31 de outubro de 2015

Guiné 63/74 - P15307: História da CART 3494 (12): A mobilização para a Guiné –CART3494 - O embarque em Lisboa [Base Militar de Figo Maduro] e o primeiro período de férias na Metrópole em outubro de 1972 [há quarenta e três anos] (Jorge Araújo)


1. O nosso Camarada Jorge Alves Araújo, ex-Fur Mil Op Esp/RANGER da CART 3494, (Xime-Mansambo, 1972/1974), enviou-nos mais uma mensagem desta sua série. 

Camaradas,

Com um pequeno atraso em relação ao lançamento do tema «O nosso querido mês de férias», por razões operacionais, e por efeito de nova visita ao baú de memórias, donde recuperei meia-dúzia de imagens com mais de quatro décadas, permitiu-me partilhar convosco, não uma mas duas efemérides, simbolicamente relevantes, e que marcaram aquele meu/nosso tempo da vida militar, ou seja, a mobilização e respectivo embarque, e o primeiro período de férias passadas na Metrópole, iniciadas em 24OUT1972, faz hoje quarenta e três anos. 

A MOBILIZAÇÃO PARA A GUINÉ – CART 3494 
- O EMBARQUE EM LISBOA [BASE MILITAR DE FIGO MADURO] 
E O PRIMEIRO PERÍODO DE FÉRIAS NA METRÓPOLE 
EM OUTUBRO DE 1972 [HÁ QUARENTA E TRÊS ANOS] 

1. - INTRODUÇÃO

Eis mais duas efemérides que me proponho partilhar convosco, resumidas nesta pequena narrativa histórica. A primeira surge na sequência da respectiva mobilização ultramarina publicada na Ordem de Serviço do então RAP2, Vila Nova de Gaia, em 03JAN1972, com destino ao CTIGuiné, para completar o contingente da CART 3494, do BART 3873 [1971-1974], sediado em Bambadinca [P15230]. A segunda decorre do primeiro período de férias passadas na Metrópole, entre 24 de Outubro e 27 de Novembro de 1972, faz agora quarenta e três anos.

Trata-se, naturalmente, de duas memórias de significado antagónico. A primeira tendo por pensamento, não a sabedoria que o contexto impunha nem tampouco a experiência feita por episódios anteriormente vivenciados naquele território africano banhado pelo Atlântico, lugar de misteriosas e desconhecidas matas “com olhos”, mas, tão só, uma elevada crença onde as expectativas deveriam orientar os nossos comportamentos, no sentido de gradativamente ficarmos mais habilitados a jogar aquele “jogo”, em nome da defesa da vida.

Este valor humano [o de viver] não era só uma questão pessoal, incluía também os meus pares ex-combatentes [e vice-versa], onde os desempenhos concertados em cada actividade [missão/acção], com alguma audácia à mistura, deveriam ser cumulativos ao permitir a aquisição de novos saberes e novos comportamentos, aprendendo com cada uma das diferentes experiências, visando obter os melhores resultados possíveis, nestes se incluindo justamente os conceitos de superação e de transcendência, sinónimos de sobrevivência.


Lamentavelmente, no final, este objectivo colectivo não foi conseguido na totalidade.

A segunda como possibilidade de retorno às origens, ainda que com duração efémera traduzida em trinta e cinco dias, que passaram depressa, e com recurso a bens económicos próprios, visando repor/recuperar os deficits físicos e psicológicos por efeito de sete meses de intensa e exigente actividade militar numa zona de grande complexidade [como bem sabem todos aqueles que por lá passaram, antes e depois de nós], como era o exemplo do Xime.

De entre os registos historiográficos desse primeiro período destacam-se: a 1.ª emboscada à Ponta Coli [22ABR1972], a morte de Mário Mendes na Ponta Varela [25MAI1972], o Naufrágio no Rio Geba [10AGO1972] e os diferentes ataques ao Aquartelamento e ao Enxalé, todos eles já aqui referenciados com razoável detalhe.

2. – O EMBARQUE LISBOA-BISSAU EM 23MAR1972

Cumpridos os procedimentos administrativos que antecederam o embarque para o CTIG, como seja a vacinação obrigatória efectuada no Hospital do Ultramar, sito na Junqueira, Freguesia de Alcântara [Lisboa], uma unidade de saúde que, a par do Instituto de Medicina Tropical [IMT], funcionavam na dependência do Ministério da Marinha e Ultramar e que se destinavam a dar assistência médica aos funcionários civis e militares em trânsito, de e para o Ultramar Português, incluindo os casos com doenças tropicais e infecciosas. 

Entretanto, por efeito da aprovação do Decreto-Lei n.º 47102, de 16JUL1966, o IMT daria lugar à nova Escola Nacional de Saúde Pública e de Medicina Tropical [ENSPMT], continuando esta a estar inserida no complexo do Hospital do Ultramar. Depois do 25 de Abril de 1974, mais propriamente em 05 de Outubro desse ano, o Hospital do Ultramar passou a designar-se por Hospital Egas Moniz no âmbito das comemorações do centenário do nascimento do médico, neurologista e investigador português, natural de Estarreja, António Caetano de Abreu Freire Egas Moniz [1874-1955], galardoado em 1949 com o Nobel de Fisiologia ou Medicina, prémio partilhado com o fisiologista suíço Walter Rudolf Hess [1881-1973], “pela descoberta da relevância da leucotomia (lobotomia) pré-frontal no tratamento de certas doenças mentais”. 


Capas dos boletins de vacinas

De referir que o Nobel da Fisiologia ou Medicina, um dos prémios internacionais de investigação científica instituídos pelo sueco Alfred Bernhard Nobel [1833-1896] desde 1901, é atribuído anualmente pelo Instituto Karolinska, situado em Solna, arredores de Estocolmo [Suécia]. Este Instituto sueco, que foi criado em 1811 como centro de treino para cirurgiões do exército, chamava-se inicialmente Medico-Chirurgiska Institutet, sendo no presente a única Universidade de Medicina existente na Suécia. Ele está associado ao Hospital Universitário Karolinska, e daí ser considerado como uma das maiores universidades médicas da Europa.

Concluído o processo de vacinação sem efeitos secundários e expirados os dias de férias atribuídos no processo de mobilização, eis que é chegado o dia «D» – o da despedida – e, concomitantemente, o da partida aprazada para 23 de Março de 1972, uma 5.ª feira.

Depois de um jantar [bem acompanhado] no Restaurante-Cervejaria Solmar, nas Portas de Santo Antão [passe a publicidade], e uma noite sem dormir, obviamente, desloquei-me pelas 08:00 horas ao Aeroporto [Base] Militar de Figo Maduro, ali bem perto da minha casa em Moscavide, onde um Boeing-707 dos Transportes Aéreos Militares [TAM] me/nos aguardava, preparado para voar com mais um contingente militar de cento e noventa milicianos, entre oficiais, sargentos e praças, rumo ao aeroporto de Bissalanca, em Bissau.

Destes, a maioria seguia em situação de rendição individual, com o objectivo de substituir outros camaradas/combatentes por motivos diferentes: fim da comissão, ferimentos em combate ou, ainda, casos de morte. Esta última situação era dramática e altamente emotiva para quem dela tinha conhecimento antecipado.


Foto 2. Figo Maduro (23MAR1972). Grupo de familiares presentes na despedida para o CTIG (imagem pouco nítida). 

Foto 3. Figo Maduro (23MAR1972). Grupo de Militares escalando os últimos degraus rumo ao interior do transporte aéreo que, minutos depois, os levaria até Bissau.

3. – AS PRIMEIRAS FÉRIAS NA METRÓPOLE - DE 24OUT A 27NOV72

Durante os primeiros meses no Xime, onde cheguei algumas semanas depois de aí ter ficado aquartelada a CART 3494 vinda de Bolama, onde realizou o seu IAO durante o mês de Janeiro de 1972, não fazia a menor ideia de qual seria o melhor período para agendar férias, particularmente por ter/termos de cumprir, no mínimo, dois anos de comissão.

Aos poucos foram-se afinando as ideias sobre esse tema, entre Sargentos e Oficiais da Companhia, ficando definitivamente acordado que o primeiro grupo a marcar férias só o poderia fazer após estarem concluídos os primeiros seis meses de comissão, de acordo com as normas então em vigor. 

A gestão do tempo foi-se fazendo com maior ou menor dificuldade, e em finais de Setembro decidi considerar com uma excelente hipótese balizar o primeiro período de férias de modo a fazê-lo coincidir com o meu aniversário [10NOV]. E assim foi. Da análise ao competente plano de férias global, eu, o Espadinha Carda [furriel do 3.º GComb] e o Mendes Pinto [furriel do Serv. Mat.], acordamos viajar em grupo, reservando o voo para a Metrópole para 24 de Outubro (3.ª feira) e o regresso a Bissau para 27 de Novembro de 1972 (2.ª feira).

Dois dias antes fizemos a viagem Xime-Bissau por via marítima, ficando hospedados [se a memória não me atraiçoa] no Hotel-Cervejaria Miramar, a tal cervejaria das ostras «***** estrelas», em que cada travessa custava vinte e cinco pesos. 


Foto 4. Bissau (23OUT1972). O Mendes Pinto, o Espadinha Carda e o Jorge Araújo, mentalizando-se para a sua primeira viagem de férias na Metrópole.


Foto 5. Bissau (23OUT1972). Na marginal, junto ao monumento ícone da epopeia dos Descobrimentos Portugueses do século XV, inaugurado em 1960 em comemoração do quinto centenário da morte do Infante D. Henrique [1394-1460]. 


Foto 6. Bissau (23OUT1972). No jardim da marginal, depois de ter liquidado o valor da viagem de avião entre Bissau/Lisboa/Bissau, e ter na minha posse os respectivos bilhetes.


Foto 7. Bissau (24OUT1972). Aeroporto de Bissalanca (Marechal Craveiro Lopes), aguardando o momento de embarque.


Foto 8. Bissau (24OUT1972). Aeroporto de Bissalanca (Marechal Craveiro Lopes), a caminho do Boeing-707 da TAP, rumo a Lisboa, com três “necessaire”, um de cada elemento do grupo, oferta da Agência de Viagens.

Chegado ao aeroporto de Lisboa era aguardado pelos familiares mais próximos, seguindo depois para a minha residência em Moscavide. Os primeiros dias foram de completa readaptação aos espaços, particularmente no que concerne ao trânsito intenso na capital, aos semáforos e às passadeiras, aos cheiros, aos ruídos; em suma, a quase tudo.

Os dias passaram a ser, gradualmente, mais tranquilos, com os familiares a não perderem a oportunidade de colocarem questões sobre a realidade por mim vivida até então na Guiné, transmitindo-me, nessas ocasiões, os seus medos, expectativas e ansiedades, mas também procurando saber mais como era a sua gente, o seu ambiente, o seu clima, a sua organização social, os seus consumos, o que era perfeitamente natural e normal naquele contexto e naquela época. 

Os amigos, alguns mais velhos, que tinham já vivido experiências semelhantes nos diferentes cenários ultramarinos, davam-me conselhos, sugestões e outras dicas visando ajudar-me a ultrapassar eventuais dificuldades.

Fora deste ambiente, e uma vez que o ex-Alf. Mil. Maurício Viegas, também ele natural e Lisboa, e que havia chegado ao Xime em Junho de 1972 em rendição individual para comandar o 20.º Pelotão de Artilharia, sugeriu-me que visitasse os seus pais, residentes na Freguesia da Ajuda, facultando-me a sua morada, o que respeitei. Daí ter agendado um encontro com eles levando-lhes as naturais saudades e palavras de conforto e ânimo para resistirem ao tempo que ainda faltava para a conclusão da sua Comissão de Serviço, pois contabilizava à data uns escassos quatro meses.

Na sequência do primeiro contacto presencial, aceitei a proposta de com eles almoçar, ficando também combinada uma sessão de slides [meus] visando uma aproximação à realidade por parte daqueles que, estando longe do seu filho, agora na condição de militar/combatente, gostavam de ver as suas paisagens, as suas gentes, as lavadeiras, as beijudas e outros ícones da cultura guineense, e que para mim era o contexto para onde teria de voltar alguns dias depois. 

Como um dos tios do ex-Alf. Maurício Viegas era pasteleiro [mestre de renome em doçaria], e o sobrinho comemorava mais um aniversário no dia 01DEC, pediu-me para ser portador de um bolo especial para esse dia de anos, confeccionado com uma substância que permitia aguentar os dias em falta até à chegada ao mato. No dia 26NOV1972, véspera da partida, lá fomos buscar o bolo ao Bairro da Boa-Hora, fazendo votos para que ele chegasse inteiro ao seu destinatário.

Embarquei no dia seguinte prometendo voltar, logo que possível, para um segundo período de férias.

Regressado a Bissau no dia 27NOV1972, 2.ª feira, desci à terra e tomei consciência de que as férias tinham acabado e que o principal objecto que teria em mãos, a partir de então, era outro, mais sério e problemático do que nunca.

Cheguei ao aquartelamento do Xime dois dias após a saída de Lisboa, ou seja em 29NOV1972, 4.ª feira, por volta das 17.00 horas. Mas, como tinha feito a totalidade da viagem ao sol [Geba], pois a embarcação civil navegava a céu aberto, logo sem sombras, essa noite foi passada num estado febril em crescendo. Antes, porém, tive a oportunidade de entregar ao ex-Alf. Maurício Viegas, o bolo de aniversário que me tinham pedido para lhe trazer. O dia seguinte foi passado na cama, aguardando que as drogas produzidas no Laboratório Militar, prescritas pelo meu camarada mezinho, ex-Fur. Mil. Enfº. Carvalhido da Ponte, fizessem o seu efeito.

O dia seguinte, 01DEC1972, 6.ª feira, voltou a ser um dia diferente, com muitas emoções/tensões, em função de nova emboscada [a 2.ª] à Ponta Coli. Sobre este acontecimento ver P9802. 


Foto 9. Xime (1998) – Estrada Bambadinca-Xime. O espaço à esquerda da imagem era designado por “Ponta Coli”, local onde ocorreram as duas emboscadas perpetradas pelo PAIGC ao efectivo da CART 3494 [4.º GComb], em 22ABR1972 e 01DEC1972, com baixas de ambos os lados.

[foto do camarada ex-Alf. Mil Acácio Correia, datada de 1998, e obtida durante uma visita realizada por um grupo de ex-combatentes da Companhia à Guiné-Bissau, com a devida vénia]. 

Concluída esta pequena narrativa histórica, despeço-me com amizade, prometendo voltar logo que possível com outras memórias da nossa passagem pelo CTIG. 

Fontes do ponto 2:
http://www.chlo.min-saude.pt/Hospital/Historia
https://pt.wikipedia.org/wiki/Instituto_Karolinska 

Com um forte abraço e votos de muita saúde.
Jorge Araújo.
Fur Mil Op Esp / Ranger, CART 3494

Mini-guião de colecção particular: © Carlos Coutinho (2011). Direitos reservados.
___________
Nota de M.R.:

Vd. último poste desta série em:


segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

Guiné 63/74 - P12734: O Destacamento da Ponte do Rio Udunduma - Contrastes do mesmo cenário [parte III] (Jorge Araújo)

1. Mensagem do nosso camarada Jorge Araújo (ex-Fur Mil Op Esp / Ranger, CART 3494, Xime e Mansambo, 1972/1974), com data de 9 de Fevereiro de 2014:

Caríssimos Camaradas Editores:
Luís Graça, Carlos Vinhal e Eduardo Magalhães. 
Os meus melhores cumprimentos.
O presente texto, ainda que continue a ter por panorâmica histórica o cenário do Destacamento da Ponte do Rio Udunduma, e o modus vivendi de quem por lá passou [1973], a sua introdução foge um pouco do que tem sido meu hábito em situações anteriores.
Este desvio, enquanto espaço de liberdade, foi influenciado por algumas reflexões surgidas recentemente neste espaço plural de partilha e, daí, deu este resultado.

Obrigado pela vossa compreensão!
Um abraço.
Jorge Araújo.
09Fev2014


O DESTACAMENTO DA PONTE DO RIO UDUNDUMA 
(XIME-BAMBADINCA)

- Contrastes do mesmo cenário [parte III] -

1. Introdução

De acordo com a intensão expressa nos textos anteriores [P12565 e P12586], volto hoje à vossa presença com o mesmo propósito de sempre: o de relatar, na primeira pessoa, os factos mais relevantes que marcaram a vida de um miliciano na sua passagem pelo CTIGuiné.

Assim, continuaremos a aprofundar o tema relacionado com o Destacamento da Ponte do Rio Udunduma, onde estivemos o segundo semestre do ano de 1973 [já fez quarenta anos!], decisão confortada com as palavras solidárias do camarada António Rosinha ao defender que “cada um deve ter a coragem de dizer aquilo que na realidade presenciou e aprendeu”.

Mas, antes do mais, é justo endereçar aos camaradas, grã-tabanqueiros desta Tabanca que não pára de crescer, os meus sinceros agradecimentos pelos diferentes contributos/comentários produzidos neste âmbito, adicionando-lhe mais valor reflexivo e histórico, por efeito de aí terem passado uma parcela do seu precioso tempo, ainda que em momentos diferentes, em obediência à missão militar que lhes foi confiada/imposta.

Estão nesse caso os camaradas: Carlos Marques Santos [CArt 2339], Luís Graça, António (Tony) Levezinho e Humberto Reis [CCaç 2590/CCaç 12], Jorge Cabral [PCN 63], Paulo Santiago [PCN 53], Beja Santos [PCN 52] e Joaquim Mexia Alves [CArt 3492 e PCN 52], com especial deferência para o Carlos Marques Santos, por ter sido o primeiro a assentar arraial naquele espaço, no longínquo dia 29Mai1969, com tendas de três panos da 2.ª Guerra Mundial, e daí considerar-se, simbólica e carinhosamente, como o DINOSSAURO… da Ponte.
Estou de acordo!

No alinhamento deste texto, entendi incluir e apreciar a pertinência da reflexão do nosso amigo e camarada Pereira da Costa [que foi, durante cinco meses, CMDT da CART 3494, tempo suficiente para ter estado envolvido, entre outros, no episódio estúpido do Rio Geba] ao colocar a problemática do conflito militar a partir de duas perguntas filosóficas; porquê e para quê?

Com efeito, estas são, pela intemporalidade da sua pertinência, duas das principais questões em que nos deveríamos deter ao longo das diferentes fases da nossa vida [unindo o presente ao passado e aprendendo com ele, encontrando novos rumos para a dignificação do Homem], sendo o como e o quando, outras tantas a considerar de igual modo, pois sabemos que tudo é efémero neste nosso cosmos: tem princípio, meio e fim.

Mas, de facto, não tenho uma resposta assertiva e convincente, por ausência de dados, quiçá mais importantes do que aqueles que possuo, na medida em que a nossa ignorância se evidencia e cresce com o saber, em resultado do número de questões ser sempre superior ao das respostas, e daí não haver explicações definitivas.

Retenho-me, por ora, num simples mas importante detalhe que influenciou o nosso comportamento naquele contexto. Quando, dando cumprimento ao programa de treino multidisciplinar de preparação para a guerra, me diziam: “Ranger-Araújo: tu-vais-ser-chefe!” [futuro], omitiam em que condições e com que recursos materiais e humanos tal ia acontecer, para logo a seguir afirmarem: “tu-és-carne-para-canhão!”, expressão [massificada] que viria a ser repetida manga de vezes ao longo da comissão, em particular quando o psicológico dava sinais de algum desânimo, deixando, assim, ao livre arbítrio a construção/reconstrução de um conceito ideológico temperado pela prática concreta do dia-a-dia.

Pelo exposto, e como ficou demonstrado ao longo do tempo, nunca me conseguiram explicar o porquê e para quê, uma vez que a explicação pressupõe antes uma compreensão, que é um processo incompleto e equivocado, e daí haver um deficit dessa compreensão em cadeia. Ou seja, primeiro será necessário compreender para, depois, tentar explicar, pelo que este é um processo que ainda não se encontra encerrado.

Num cosmos onde tudo muda: as pessoas, a sociedade e o mundo, e em que só a mudança é imutável; depois duma ordem, vem a desordem para dar lugar a uma nova ordem [sociologia da ordem e do progresso], por influência da tríade [tróica] TER-PODER-SABER – eis, então, a fórmula que nos comandou… e continua…!

Ainda assim avanço com um elemento mais desta fenomenologia, para prosseguir a reflexão.

Pode ler-se na brochura editada sobre a História do BART 3873 [de autor(es) desconhecido(s)] que “A sede do BArt 3873, decorridos já 5 meses, não teve qualquer ataque ou flagelação o que se percebe pelo cordão protector que a rodeia a dificultar, ou a impedir mesmo, a retirada da força atacante” [p.70].

Da interpretação deste parágrafo nasceu em nós uma outra dúvida: será que o efectivo reduzido a doze unidades, existente no Destacamento da Ponte do Rio Udunduma, no âmbito da missão de fazer segurança a duas Pontes, era também parte desse cordão?

Do ponto de vista do significado/significante, o conceito “Segurança” significa acto ou efeito de segurar; afastamento de todo o perigo; condição do que está seguro; garantia; confiança; tranquilidade de espírito por não haver perigo [Dicionário da Língua Portuguesa. Lisboa: Texto Editora. Abril/2004; p.1339].

Será que esta era a questão principal da nossa missão?

Importa salientar, todavia, que nenhum fenómeno sociocultural, no qual se inclui o socio-militar, é neutral, na justa medida em que não há nenhum sistema totalmente fechado em si, nem é plenamente autónomo. Isto significa que qualquer que seja o seu objecto [de estudo] este emerge de um processo construído pela filosofia da época, a partir do funcionamento sistémico entre todos os elementos que o constituem, como foi referido anteriormente.

Daí julgar que se devem aceitar estas pequenas histórias, com a sua independência e cronologia específica, mais que não seja para se identificarem os contrastes ocorridos nos mesmos cenários [diferenças/semelhanças], e ainda como legado particular de um tempo de vida, que foi o meu, em que, felizmente, saí vitorioso em todos os “contextos”, o mesmo não acontecendo com outros meus semelhantes que não tiveram, lamentavelmente, direito a “bilhete de volta” [expressão do camarada Tony Levezinho], aos quais presto, neste espaço, uma sentida homenagem.

Deste modo, o porquê e o para quê continuará a fazer todo o sentido se antes das decisões a tomar, eles contribuírem para esclarecer as consequências de cada uma delas, numa dupla dimensão: qualitativa e quantitativa. Como teriam feito todo o sentido se tivessem sido colocadas a Winston Churchill (1874-1965), enquanto primeiro-ministro britânico, após o discurso proferido no âmbito de uma Moção de Confiança ao seu governo, em 13Mai1940, a propósito da sua visão futurista no conflito militar emergente da 2.ª Guerra Mundial, quando afirmou: “não dou pré, nem quartéis, nem provisões. Dou fama, sede, marchas forçadas, batalhas e morte”, plagiando a ideia expressa anteriormente pelo general italiano Giuseppe Garibaldi (1807-1882).

Curiosamente, estávamos, então, na época da adolescência dos nossos pais e/ou nos primeiros anos de vida daqueles que foram os pioneiros da Guerra Ultramarina. Eis como os factos históricos continuam a ser cruéis para a humanidade.

Daquela expressão brutal, nasceu uma outra mais reduzida: “Sangue, suor e lágrimas”, e que, entre tantas apropriações, deu nome ao poema “Fado Sangue, suor e lágrimas” [P9122] do camarada Manuel V. Moreira, da CArt 1746, nosso antepassado nas lides da Ponta do Inglês e do Xime - 1967/69, e escrito, segundo creio, em 20Dez1968, no Xime.

Em suma, com o decorrer dos anos, o Poder [pois é ele que decide sobre estas e outras matérias] continua a ser cego, surdo [ou faz de conta!]… e é teimoso, até que o “cordão”… se parte e se desfaz.

Dito isto, avancemos para o ponto seguinte, apresentando mais algumas imagens referentes ao enquadramento geográfico onde nasceu o “Destacamento da Ponte…” e o modo de vida de um tempo organizado em interface com outros tempos, onde a natureza de cada tempo influenciava o outro que vinha a seguir.


2. O Contexto do Destacamento da Ponte do Rio Udunduma

Foto 27 – Estrada Xime-Bambadinca [Destacamento da Ponte do Rio Udunduma] – imagem aérea dos espaços circunvolventes às duas Pontes: a velha danificada em 28/29Mai1969, a cima, e a nova construída pela empresa TECNIL e inaugurada no início do ano de 1972, paralela, a baixo.

O rectângulo a vermelho corresponde à área onde foram construídas as primeiras instalações de apoio aos sucessivos contingentes militares para ali enviados, vulgo abrigos, concebidos a partir de buracos abertos no chão e alinhados entre si, virados para a mata/o mato.

É de referir, em nome da verdade, que o camarada Carlos Marques Santos e o efectivo do seu Gr Comb (o 3.º), da CArt 2339, sediada em Mansambo, e que liderou, foram os primeiros habitantes daquele território.

A imagem de fundo é de Humberto Reis [P12647], com a devida vénia.

Foto 28 – Estrada Xime-Bambadinca [Pontes do Rio Udunduma - 1973] – As duas pontes vistas de frente e o Rio Udunduma. Bambadinca fica para a esquerda e o Xime para a direita.

Foto 29 – Estrada Xime-Bambadinca [Destacamento da Ponte do Rio Udunduma - 1973] – Imagem longitudinal da estrada nova, à esquerda, e a velha, à direita. Ao fundo fica Bambadinca, a quatro quilómetros, e à esquerda a estrada termina no Cais do Xime, localizado a sete quilómetros, em cujo Aquartelamento, à data, esta instalada a CCAÇ 12.

Foto 30 – Estrada Xime-Bambadinca [Destacamento da Ponte do Rio Udunduma - 1973] – Imagem da estrutura da nova ponte.

Imagens [postal] dos contrastes no roteiro triangular: Bambadinca – Xime – Destacamento da Ponte do Rio Udunduma, entre 1972/1973. 

Bambadinca, sede de Batalhão, era o local identificado do “ar condicionado”, onde tudo estava muito limpinho e arranjadinho… O Xime foi o destino inicial da CART 3494, onde permanecemos treze meses: de finais de Janeiro/1972 a início de Março/1973 e onde vivemos muitas emoções… O Destacamento da Ponte foi um tempo e um espaço, e um modo de vida… pouco/nada digno, mas que acabou por ser superado com alguma criatividade.

Foto 31 – Estrada Xime-Bambadinca [Destacamento da Ponte do Rio Udunduma - 1973] – Imagem de um plano de água do Rio Udunduma, procurando-se identificar potenciais locais de “armadilhas” e outros de risco efectivo…

Foto 32 – Estrada Xime-Bambadinca [Destacamento da Ponte do Rio Udunduma - 1973] – População do Aldeamento A/D de Amedalai que ali se deslocava diariamente para lavar roupa e fazer a sua higiene pessoal. Ficava a 1 km [+/-], na direcção do Xime. Estávamos, com efeito, na Estação das Chuvas… o caudal do rio era, naturalmente, maior.

Foto 33 – Estrada Xime-Bambadinca [Destacamento da Ponte do Rio Udunduma - 1973] – O mesmo da legenda anterior, reforçada com a presença do camarada Joaquim Cerqueira, para compor o enquadramento.

O Cerqueira, como era conhecido, foi o militar da CArt 3494 que nas saídas para o mato, no Xime, era quase sempre o último a transpor o arame farpado e, naturalmente, o último a chegar ao Aquartelamento. Por isso, vastas foram as vezes que lhe dissemos para ter cuidado, pois um dia poderia ser apanhado à mão. Felizmente que não lhe aconteceu nada. Um abraço para ele.


3. O Tempo de novas Emoções versus Tensões

O dia 13 de Setembro de 1973, 5.ª feira, estava a ser semelhante à grande maioria dos já contabilizados, até então, no Destacamento da Ponte. Porém, deixou de o ser quando no exterior dos buracos, aos quais se chamavam “abrigos”, o pessoal se organizava para superar mais uma noite, depois de ter ingerido a terceira refeição da jornada: o jantar.

O sol já se tinha escondido no horizonte e a claridade do dia diminuía a cada minuto. O equipamento que nos auxiliava na visão de proximidade [petromax] estava a ser preparado. E eis senão quando a nossa atenção mudou de sentido por efeito de mais um “festival pirotécnico”, pleno de luz e som, que se apresentava à nossa frente. Rebentamentos e rajadas de kalashnikov, também conhecidas por “costureirinhas”, entravam pelos nossos ouvidos, provocando um natural aumento do ritmo cardíaco. Não vinham na nossa direcção [por enquanto!], mas não estavam muito longe. Quem estaria, naquele momento, a “embrulhar”? Era a pergunta mais banal naqueles momentos dramáticos.

Como o som dos rebentamentos tinham níveis diferentes, muito provavelmente estaríamos perante vários ataques em simultâneo na direcção do Xime. E nós…? O que fazer naquelas circunstâncias…? Iríamos, também, ser contemplados com uma visita relâmpago…? Estas e outras interrogações nos surgiram no pensamento… E agora o que devo fazer… na qualidade de líder [chefe] do Grupo… com apenas doze elementos.

Lidar com ele, entre emoções e tensões, aliás como acontece com todos os Humanos que estão em situações complexas, como foi o nosso caso no CTIG… e como serão certamente em todas as guerras, independentemente dos lugares.

Sei/sabemos hoje, no quadro teórico das neurociências, por exemplo, que o conceito emoção traz à mente uma taxonomia de seis emoções ditas primárias ou universais; alegria, tristeza, medo, cólera, surpresa ou aversão. O rótulo emoção também tem sido aplicado por impulsos e motivações e a estados de dor e prazer.

Como já tinha estado em situações francamente mais difíceis, como já dei conta nas narrativas sobre as duas emboscadas na “Ponta Coli” [P9698; P9802 e P12232] e a do “Naufrágio no Rio Geba”, em 10Ago1972 [P10246], ou ainda nas várias flagelações sofridas pelo colectivo da CART 3494, no Aquartelamento do Xime, durante os treze meses que aí permanecemos, procurei/procurámos, em função do quadro que estávamos a observar, manter o melhor autocontrolo possível.

Para saber algo mais concreto, recorremos ao único instrumento de comunicação aí existente – um rádio emissor/receptor AVP1 – mas sem sucesso. Ruídos e interferências… e mais ruídos… e mais interferências… até que desistimos. E os rebentamentos continuavam ali tão perto ajudando a iluminar a noite… que já o era.

Largos minutos depois surgiram, ao longe, as primeiras viaturas militares vindas do lado de Bambadinca, o que nos permitiu entender o contexto com mais tranquilidade. Mas, como elas não pararam na Ponte… que “cena” estaria a acontecer, na medida em que a duração do[s] ataque[s] levava já um tempo francamente excessivo em relação a situações anteriores?

Por exclusão de partes, chegámos a conclusão de que o ataque mais próximo de nós seria no Aldeamento em Auto-Defesa [A/D] de Amedalai, situado a escassos mil metros [+/-]. O outro, muito provavelmente, seria no Aquartelamento do Xime, onde estava agora a CCAÇ 12. E bateu certo!

Essa noite foi, como seria de esperar, passada ao relento e mais uma em “branco” num cenário de Lua Nova; escura como breu. Porque não abandonámos o nosso contexto, os relatos acima correspondem, tão só e apenas, ao que sentimos e vivemos naquela noite. Porém, para completar esta ocorrência histórica, recorremos ao que se encontra expresso na publicação sobre a História do BART 3873. Eis a sua transcrição na íntegra:

“Em 131835SET73 [a hora não corresponde aos meus registos; seria mais tarde!], o Xime e Amedalai são flagelados simultaneamente durante 15 e 45 minutos respectivamente, por numeroso grupo IN. Sobre o 1.º, o inimigo utilizou R.P.G, Morteiro 82 e Canhão s/Recuo. Sobre o 2.º, R.P.G. e armas automáticas. 1 GrComb da CCS/BART 3873 e 2 viaturas do Pel. Rec. Daimler 8681, acorreram em socorro da A/D de Amedalai, sofrendo uma emboscada na Estrada Xime/Bambadinca. NT e Pel Mil. 241 (Amedalai) sem consequências, bem como os civis. Houve apenas a registar o incêndio de 2 moranças daquela A/D.

O inimigo deu mostras de maior agressividade nas referidas flagelações, ao prolongar a sua acção contra a A/D por três quartos de hora, sabendo que o acesso das NT a Amedalai seria facilitado pela estrada asfaltada e proximidade de Bambadinca e Destacamento da Ponte do Rio Udunduma. As forças IN, provenientes do Poindon/Ponta do Inglês, vinham reforçadas pelo grupo de Artilharia do Quinara” [pp 119/120].

Termino esta terceira narrativa sobre o “Destacamento da Ponte…” dando conta de um facto omisso na História da Unidade relacionado com a imagem abaixo.

Foto 34 – Estrada Xime-Bambadinca [Aldeamento A/D de Amedalai a 1 km do Destacamento da Ponte do Rio Udunduma] – Estado em que ficou uma Daimler na sequência do ataque.

Porque pertenço à última geração de ex-combatentes que viveu, conviveu e sobreviveu no contexto do Destacamento da Ponte do Rio Udunduma, tenciono voltar a este tema, numa próxima oportunidade, dando continuidade ao seu aprofundamento histórico, divulgando outras peripécias enquadradas por novas imagens.

Estes meus relatos históricos poderão ser, de facto, os últimos, na medida em que, se a memória não me atraiçoa, o contingente da CART 3494 ali destacado, foi substituído, em Fevereiro/74, por um PCN, como, aliás, acontecera em situações anteriores.

Não é crível, por isso, saber-se o que, entretanto, aí aconteceu até ao 25 de Abril.

Obrigado pela atenção!
Um forte abraço para todos.
Jorge Araújo.
09.Fev/2014.
____________

Nota do editor

Vd. Postes anteriores da série de:

10 DE JANEIRO DE 2014 > Guiné 63/74 - P12565: O Destacamento da Ponte do Rio Udunduma - As acções especiais durante o segundo semestre de 1973 (parte I) (Jorge Araújo)
e
15 DE JANEIRO DE 2014 > Guiné 63/74 - P12586: O Destacamento da Ponte do Rio Udunduma - As acções especiais durante o segundo semestre de 1973 (parte II) (Jorge Araújo)

segunda-feira, 20 de abril de 2015

Guiné 63/734 - P14495: História da CART 3494 (6): RECORDANDO A 1.ª EMBOSCADA NA PONTA COLI EM 22ABR1972 E A MORTE DO FURRIEL BENTO - A única baixa em combate da CART 3494 (Jorge Araújo)


1. Mensagem do nosso camarada Jorge Araújo (ex-Fur Mil Op Esp / Ranger, CART 3494, Xime e Mansambo, 1972/1974), com data de 20 de Abril de 2015: 

Camaradas

Com a presente narrativa procuro recuperar duas das principais memórias do nosso percurso militar como ex-combatentes no CTIGuiné [1972-1974], ambas ocorridas no mês de Abril, mas com dois anos de intervalo, e que ficarão para sempre na historiografia do contingente da minha CART 3494/BART 3873.

A primeira, com quarenta e três anos [faz hoje!], relembra os episódios das emboscadas na Ponta Coli, com particular destaque para a 1.ª [22ABR1972]. A outra efeméride, já com quarenta e um anos, recorda a chegada à Metrópole [como se dizia à época], em 03ABR1974, a derradeira etapa após o dever cumprido.

Como o tempo passa veloz…

RECORDANDO A 1.ª EMBOSCADA NA PONTA COLI 
EM 22ABR1972 E A MORTE DO FURRIEL BENTO
- A única baixa em combate da CART 3494 -

1.- INTRODUÇÃO

Para o contingente dos ex-combatentes da COMPANHIA DE ARTILHARIA 3494 [CART 3494 - Xime-Enxalé-Mansambo / 1971-1974], do BART 3873,ABRIL passou a ser, desde 1972, um mês onde, por motivos opostos, se comemoram duas efemérides de grande significado colectivo; uma de dor, tristeza e revolta [1972] a outra de felicidade pelo regresso às origens depois do dever cumprido [1974].

A primeira, de muitas emoções e tensões, está relacionada com o «baptismo de fogo» da Companhia ocorrido na emboscada em22ABR1972 [sábado], experiência que classificamos de superação extrema [ou superior transcendência] vivida por vinte e dois elementos continentais do 4.º GComb, mais um Guia guineense, atacados [à má fila…] no contexto damissão/acção de segurança à Estrada Xime-Bambadinca, no sítio da Ponta Coli, onde se registou, lamentavelmente, a primeira e única baixa da Unidade contabilizada em combate durante a sua presença no CTIGuiné, a do nosso camarada Furriel Manuel Rocha Bento, natural da Ponte de Sor, a quem justamente prestamos a nossa sentida homenagem.

Foto 1 – Xime - Uma semana antes do trágico acontecimento em 22ABR1972. O camarada Manuel Bento acompanhado por dois homens do “rancho”; à sua dtª o João Machado e à sua esqª o João Torres [cozinheiros], com o Geba ao fundo.

Foto 2 – Xime - Alguns dias antes do 22ABR1972. O trio de furriéis responsáveis pelo 4.º GComb, que foram apanhados na emboscada na Ponta Coli, pousando antes de um «jogo da bola». Da esqª/dtª, o Manuel Bento, eu e o Sousa Pinto [1950-1912.04.01].

Sete meses depois, uma segunda emboscada voltou a ser perpetrada pelo PAIGC no mesmo local e à mesma hora, ou seja, em 01DEC1972 [6.ª feira], em que o alvo foi, naturalmente por coincidência, o mesmo 4.º GComb, mas desta vez não se verificaram baixas mortais nas NT, registando-se dois feridos que foram evacuados para o HM 241, em Bissau. 

Do lado IN, que era constituído pelo grupo de «Bazookas» de Coluna da Costa e pelo bigrupo de Mamadu Turé e Pana Djata [substitutos de Mário Mendes, morto em combate, em 25MAI1972 [5.ª feira], na Ponta Varela, e responsável pela 1.ª emboscada], os guerrilheiros deixaram, no terreno, dois cadáveres, que foram sepultados no cemitério de Bambadinca, em campas separadas, bem como uma pistola, uma espingarda automática e um RPG com duas granadas.

Mapa-itinerário (linha vermelha) utilizado entre o Aquartelamento do Xime e o sítio da Ponta Coli – Estrada Xime-Bambadinca.

2.-RECORDANDO A EMBOSCADA…

Hoje, ao recordar aquele episódio de há quarenta e três anos, continuo incrédulo como foi possível superar aquela batalha, perante tamanha inferioridade física e numérica das NT, com um morto, dezassete feridos, desmaiados e poucos em condições de estabelecer um equilíbrio com quem iniciou a contenda.

Actuando de surpresa a cinquenta/sessenta metros dos alvos [humanos] colocados em cima de duas viaturas, ainda que em movimento lento, estaríamos nos centros das miras das suas “costureirinhas” e “RPG’s”,é inacreditável como não conseguiram fazer um “ronco” maior neste (des)encontro? 

Em primeiro lugar, porque as NT eram piriquitas nestas andanças da guerra de guerrilha, pois tinham apenas oitenta dias de mato, equivalente a mês e meio de sobreposição com a CART 2715 e os restantes dias [ainda poucos] de autonomia plena. Em segundo, pela experiência dos líderes do PAIGC, acumulada nas emboscadas anteriormente montadas no mesmo local desde 10ABR1968, data da primeira acção, a que se adicionam todos os outros conhecimentos adquiridos ao longo de muitos anos de prática neste contexto.

No meu caso, esta deslocação à Ponta Coli era a oitava vez que a fazia, pois havia chegado ao Xime somente nos últimos dias do mês de Março, e onde encontrei muitas rotinas já instaladas, em particular o exemplo da segurança à Ponta Coli.

Foto 3 – Xime [Ponta Coli] – Local do combate travado com o IN pelo 4.º GComb, em 22ABR1972, onde o camarada Bento foi atingido mortalmente por efeito de uma granada de RPG na zona da cápsula articular/clavícula do ombro direito, uma vez que se encontrava na 1.ª viatura, no banco da frente, ao lado do respectivo camarada condutor.

Foto 4 – Xime [Ponta Coli] – Árvore sinalizada como posto de vigia e onde ficava instalado o CMDT da força em acção/missão de segurança diária. Foi a partir deste local que o IN deu início à emboscada no dia 22ABR1972. 

Foto 5 – Xime [Ponta Coli] – A mesma árvore da imagem anterior, agora no seu plano superior, donde se tinha uma observação de maior alcance.

Quanto ao menor sucesso do IN [e ainda bem…], acredito que uma possibilidade ficou a dever-se à gestão do tempo, que correu a nosso favor, pois [como referi na narrativa original, a 1.ª que publiquei no blogue] aos poucos, ao ritmo de um tempo que parecia não passar, os desmaiados começam a acordar, os feridos tomam consciência de que ainda têm força suficiente para reagirem, e com os cinco ilesos que continuavam activos e operacionais, através de um impulso colectivo vindo das entranhas e de um grito de contra-ataque, contribuímos para anular a terceira tentativa de sermos apanhados à mão por parte dos elementos do PAIGC, que muito porfiaram mas sem sucesso. 

Por outro lado, é da mais elementar justiça referir o desempenho do nosso camarada guineense MALAN [guia e também ele combatente - imagem ao lado (6)], que sempre me mereceu o maior respeito, admiração e apoio, pois era um homem solitário, tendo como única companhia o seu cachimbo artesanal, mas nosso amigo, e que muito nos ajudou nos diferentes itinerários que tivemos de percorrer, numa mata extremamente difícil, com muitas armadilhas, ratoeiras e outros obstáculos [já relatados neste espaço por outros camaradas que por lá passaram] e que hoje, certamente, ele já não faz parte do grupo dos vivos. 

Parece que ainda o estou a ver sangrando com alguma abundância da cabeça, onde existiam pelo menos duas perfurações, empunhando duas G3 [a sua e outra que encontrou abandonada no solo].Com uma em cada membro superior, apoiadas nas suas axilas e, em plena estrada, de pé, defendia-se contribuído, também, para o sucesso do grupo. Foi depois evacuado para Bissau, onde ficou internado algumas semanas, regressando ao Xime ainda a tempo de participar na segunda emboscada. 

Outra situação que também ajudou, certamente, na debandada dos guerrilheiros teve a ver com a circunstância dos municiadores de morteiro e de bazuca, após recuperarem a consciência, depois de terem ficado atordoados na sequência do salto das viaturas em andamento, fazerem uso das suas armas a uma cadência de tiro inconstante, mas mesmo assim relevante, uma vez que o desempenho de ambos estava/ficou dependente da localização das suas munições [granadas] que acabaram por ficar dispersas ao longo da estrada, numa frente de cento e vinte metros, mais ou menos, dando a ideia de que estávamos fortemente armados.

Foto 7 – Xime [Ponta Coli] – Linha recta da zona de segurança à Ponta Coli. A estrada Xime-Bambadinca fica do lado direito da imagem, paralela às árvores. Os elementos IN estavam emboscados ao longo do trilho, enquanto as NT se encontravam na estrada asfaltada, à direita.

Depois deste episódio negativo, que provocou dor, sofrimento e algum temor entre nós, nada mais ficou como dantes, a exemplo do que nos diz a metáfora popular «depois de casa roubada trancas à porta», tendo apresentado de imediato outras metodologias e procedimentos assimilados durante a instrução no CIOE, em Lamego, visando a salvaguarda da minha/nossa sobrevivência perante este contexto adverso e muito exigente.

A prová-lo estava, ainda, o facto do CMDT da Companhia se ter autoexcluído no dia seguinte à 1.ª emboscada, ao assinar a sua própria baixa ao Hospital Militar [Serviço de Psiquiatria],em Bissau, para não mais regressar ao Xime.

Devido a essa sua decisão de se autoexcluir é nomeado para novo CMDT da CART 3494 [o 2.º], o então ex-CapArt António José Pereira da Costa [hoje, Cor Art Ref], meu/nosso camarada e tertuliano deste blogue. A sua chegada ao Xime ocorreu dois meses após a 1.ª emboscada, ou seja, no dia 22JUN1972 [5.ª feira], dia do seu aniversário… que coincidências!

As duas histórias originais que foram escritas na primeira pessoa em 2012, quarenta anos depois de as ter vivido in loco, e que agora recordei em síntese, fazem parte do espólio de narrativas divulgadas neste blogue [P9698 e P9802], no separador “Ponta Coli”e que, por sinal, correspondem às minhas duas primeiras memórias com que iniciei a participação na «Tabanca Grande», o grande batalhão de ex-combatentes que no passado sábado, em Monte Real, se reuniram no seu X Encontro Nacional, e que na próxima 5.ª feira, 23ABR2015, comemorará o seu 11.º Aniversário.

PARABÉNS aos Editores e a todos os camaradas Tertulianos que dela fazem parte.

Entretanto, em resultado da experiência e das emoções contabilizadas nesse 1.º episódio no sítio da Ponta Coli, e como modo de as traduzir no papel, decidi baptizá-las como «Era uma vez uma estrada, palco de jogos de sobrevivência (Xime-Bambadinca) – o caso da Ponta Coli».

Quanto à segunda efeméride, reportada ao mês de Abril,esta está datada desde03ABR1974 [4.ª feira],quando o contingente regressou definitivamente à Metrópole, ao aeroporto de Figo Maduro, em Lisboa, a bordo de um boeing 707, dos Transportes Aéreos Militares [TAM]. Este acto [ou facto] ocorreu oitocentos e vinte e sete dias depois do embarque no Cais da Rocha, em Lisboa, encerrando-se assim o ciclo de vida ultramarino previsto nos deveres individuais para com a Nação inscritos, à data, na Lei do Serviço Militar Obrigatório [SMO].

Esta referência normativa é dirigida, justamente, aos mais jovens leitores deste blogue, uma vez que o SMO foi extinto em meados de 1999. A partir de 2004, passou a ser atribuída às Forças Armadas a capacidade de captar os seus próprios recursos humanos concorrendo directamente no mercado de trabalho com outras entidades empregadoras.

Termino, prometendo voltar logo que possível a este tema, resumindo num só texto o mapeamento cronológico e histórico relacionado com as emboscadas na Estada Xime-Bambadinca, com destaque para a Ponta Coli, e as suas consequências.

Com um fraterno abraço de amizade,
Jorge Araújo.
Fur Mil Op Esp / Ranger, CART 3494
___________
Nota de M.R.: 

Vd. Também o último poste desta série em: 


sábado, 21 de novembro de 2015

Guiné 63/74 - P15390: In Memoriam (240): Faleceu o Mário Rodrigues Silva ‘Nascimento’ [1950-2014], ex-soldado da CART 3494 (Xime-Mansambo, 1971/74)... Era um "sem-abrigo", esteve seis meses num lar da Figueira da Foz (Jorge Alves Araújo)



1. O nosso Camarada Jorge Alves Araújo, ex-Fur Mil Op Esp/RANGER da CART 3494, (Xime-Mansambo, 1972/1974), enviou-nos mais uma mensagem desta sua série no passado dia 12NOV. 


Camaradas,

No passado fim-de-semana estive na Figueira da Foz e, em comunhão de interesses com o camarada António Bonito, tomámos a iniciativa de tentar localizar o Mário Rodrigues Nascimento, nosso camarada da CART 3494,  ferido em combate em 01DEZ1972 na Ponta Coli.

O resultado do nosso trabalho de pesquisa é aquele que consta do texto que anexo: faleceu em 08JUN2014.

IN MEMORIAM

Mário Rodrigues Silva ‘Nascimento’ [1950-2014], ex-Soldado da CART 3494 (Xime-Mansambo, 1971/74),
ferido na ‘Ponta Coli’ em 01DEZ1972; […] “sem abrigo” até finais de 2013,faleceu no Lar de Santo António, Figueira da Foz, em 8JUN2014

1.- INTRODUÇÃO 

Camaradas, 

A notícia do falecimento do camarada Mário Rodrigues Silva ‘Nascimento’, ex-combatente da CART 3494 na Guiné [4.º GComb], mais cedo ou mais tarde haveria de chegar, na medida em que viver na rua, na condição indigna de “sem abrigo”, não augura nada de bom à saúde de ninguém, degradando as diferentes dimensões da natureza humana, quer seja física, psicológica e/ou social, agravada pelo histórico que lhe deu origem. 

De facto esta notícia peca, ainda, por tardia, já que a morte do Mário ‘Nascimento’ ocorreu há mais de dezassete meses na Figueira da Foz, onde nasceu em 05 de Abril de 1950. 

E como a ela chegámos? 

Na deslocação efectuada no passado fim-de-semana à Figueira da Foz, por compromissos familiares, encontrei-me com o camarada António Bonito [ex-furriel do 2.º GComb - Enxalé], residente em Santana, uma localidade anexada à Freguesia de Ferreira-a-Nova, pertencente ao Município Figueirense. 

De entre os vários assuntos abordados no nosso encontro, a situação do camarada Mário ‘Nascimento’ veio à nossa memória, uma vez que desde 12JAN2012 [P137-3494] nada mais soubemos da sua existência. 

No sábado, 07NOV2015, durante a caminhada que se seguiu após o meu almoço, encontrei um grupo de três indivíduos, aparentemente na mesma situação do ‘Nascimento’, perguntando-lhes se conheciam um ex-combatente na Guiné a viver na rua, na zona do Alto do Viso. A resposta foi positiva… Referiram que há já algum tempo, mais ou menos dois anos, que o deixaram de ver, e que ele era conhecido por “Sr. Mário”. Disseram-me que esta ausência de contacto poderia ter a ver com o seu internamento no Lar de Santo António, instituição da Misericórdia da Figueira da Foz. 

Antes de seguir em direcção ao Lar, muito próximo do ex-quartel da Escola Prática de Serviços e Transportes [EPST] – C.I.C.A.2 – encerrado em Junho de 2006, pondo fim a cerca de cem anos de presença militar na cidade, sito nas Abadias, tomei a iniciativa de fazer uma abordagem telefónica exploratória, indagando sobre a possibilidade de aí o encontrar.

Na sequência desse contacto de sábado, seguido de outro na segunda-feira, por dificuldades de me responderem às questões formuladas no primeiro, fui informado pelos serviços administrativos do Lar, de que o Mário Rodrigues ‘Nascimento’ havia entrado para a Instituição no dia 18OUT2013 e falecido em 08JUN2014, domingo. 

Estes dados foram igualmente confirmados pelo camarada António Bonito, em contacto pessoal ontem realizado na Figueira da Foz.

2.- HISTÓRICO SOBRE O MÁRIO ‘NASCIMENTO’ 

Porque não possuo qualquer foto que identifique o camarada Mário ‘Nascimento’, utilizarei outras imagens para enquadrar o texto. 

O Mário Rodrigues ‘Nascimento’, na qualidade de militar pertencente ao 4.º GComb da CART 3494, foi um dos dois feridos graves contabilizados durante o combate travado com o grupo especial de «Bazookas» de Coluna da Costa e o bigrupo de Mamadu Turé e Pana Djata, na segunda emboscada montada pelo PAIGC, na Ponta Coli, em 01DEC1972 [P9802+P12232] vai fazer quarenta e três anos. O outro ferido grave foi o Joaquim Moreira de Sousa [ex-soldado], de Amarante [P155-3494]. 

Os ferimentos graves em ambos os militares acima referenciados resultaram dos efeitos provocados pelo accionamento de duas minas de sopro comandadas à distância pelos guerrilheiros emboscados na orla da mata a quarenta metros do local da segurança ao tráfego da estrada Xime/Bambadinca, vulgo “Ponta Coli”.


Foto 2 – Ponta Coli (Dec1972) – Trilho utilizado para ligar os postos de vigia onde foram colocadas e accionadas as minas de sopro que atingiram, com gravidade, os dois militares do 4.º GComb, da CART 3494. 


Ambos foram evacuados no mesmo dia para o Hospital Militar 241, em Bissau, onde permaneceram algum tempo em tratamento. Seguiu-se, depois, a sua transferência para o Hospital Militar Principal, em Lisboa, também conhecido por Hospital Militar da Estrela. Desde esse momento deixámos de ter contacto com eles.


Foto 3 – Ponta Coli – Território onde ocorreram as duas emboscadas ao 4.º GComb, da CART 3494, e onde foram capturados dois guerrilheiros já cadáveres, em 01DEC1972.


Foto 4 – Ponta Coli – Posto de Comando durante a missão de segurança. 


Entretanto, em 11JAN2012, um elemento da Direcção da Associação dos Deficientes das Forças Armadas [ADFA], Delegação de Coimbra, ex-Furriel Soles Girão, contactou o camarada Espadinha Carda [ex-furriel do 3.º GComb, da CART 3494] pedindo esclarecimentos sobre o Mário Rodrigues Silva ‘Nascimento’, na justa medida em que ele vivia na rua e só sabia dizer que pertenceu à Companhia 3494, estivera no Xime, onde fora ferido e evacuado para Bissau. 

Nesse mesmo dia, o camarada da Ponte Sor, Espadinha Carda, entra em contacto com o camarada Sousa de Castro, editor do Blogue da CART 3494, que de imediato dá o alerta através do Poste 137-3494, de 12JAN2012

O movimento de solidariedade para com o camarada Mário ‘Nascimento’ nascera a partir daquele momento. Vários foram os testemunhos deixados no post, nomeadamente do camarada João Pereira da Costa, ex-furriel da CCS do BART 2857 (Piche, 1968/70) que se prontificou a contactar com o seu camarada de Batalhão, o ex-furriel Soles Girão, reforçando o pedido de apoio. 

Eu próprio contactei o camarada da ADFA procurando saber algo mais, na medida em que era necessário identificar o local mais ou menos próximo em que poderíamos encontrar o nosso camarada “sem-abrigo”. Foi-me dito que ele vagueia pelas ruas da Figueira da Foz e que a morada constante nos registos anteriores era a Rua do Viso, curiosamente a mesma rua onde os meus avós tinham uma moradia e que eu conhecia muito bem dos tempos em que lá passava as férias escolares de outrora. 

De seguida contactei os Serviços Sociais da Autarquia Figueirense, apresentando a problemática, prometendo-me a Assistente Social, com quem falei, interessar pelo assunto. 

Desde essa data nada mais soube acerca da evolução do processo do camarada Mário ‘Nascimento’, a não ser o que acima relato. 

A informação de que falecera em 08JUN2014, domingo, deixou-me triste e revoltado, sentimentos certamente comungados por todos os restantes camaradas ex-combatentes da CART 3494. 

Ficou sepultado no Cemitério Oriental da Figueira da Foz.


Foto 5 – Edifício do Lar de Santo António, da Misericórdia da Figueira da Foz, onde o camarada Mário Rodrigues Silva ‘Nascimento’ esteve abrigado durante os últimos oito meses da sua passagem terrena, e onde travou a última batalha da sua vida.

QUE DESCANSES EM PAZ.

Com um forte abraço e votos de muita saúde.

Jorge Araújo.
Fur Mil Op Esp / Ranger, CART 3494

Mini-guião de colecção particular: © Carlos Coutinho (2011). Direitos reservados.
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Nota de M.R.:

Vd. último poste desta série em:


quarta-feira, 15 de agosto de 2018

Guiné 61/74 - P18925: Furriéis que tombaram no CTIG (1963-1974), por acidente, combate e doença - Parte I: Por acidente (n=68) (Jorge Araújo)


A linha vermelha, ligando o Xime (aquartelamento) e a Ponta Coli (local da segurança), na estrada Xime-Bambadinca, era o itinerário diário utilizado pelas NT. Linha vermelha para Sul, zona de emoções fortes (antiga estrada Xime-Ponta do Inglês), onde se verificaram muitas baixas de ambos os lados (NT e PAIGC), ao longo da guerra.


Xime (Abril de 1972) – Elementos do 4.º Gr Comb, o grupo que sofreu duas emboscadas na Ponta Coli (estrada Xime-Bambadinca) – a primeira, em 22 de Abril de 1972; a segunda, em 1 de Dezembro de 1972 [vidé P9698 e P9802]. Até à 1.ª data, a CART 3494 foi comandada pelo cap. Vítor Manuel da Ponte Silva Marques (?-2004) [P15470]. Em 22 de Junho desse ano, o cap. António José Pereira da Costa [membro da n/ Tabanca] chegou ao Xime para render o cap. Silva Marques, ausente após a 1.ª emboscada.

Imagem acima: de cócoras, da esquerda para a direita – Manuel Bento (furriel; 1950-1972.04.22), Jorge Araújo (furriel) e Sousa Pinto (Furriel; 1950-2012.04.01), os três “quadros de comando” do 4.º Gr Comb.

Esta imagem foi obtida alguns dias antes da primeira emboscada, onde viria a falecer o camarada Manuel Bento, natural de Galveias, Ponte de Sôr, a única baixa em combate do contingente da CART 3494, nos mais de vinte e sete meses de comissão (1971-1974).


Subsector do Xime (08Fev1970), heli evacuação de feridos em Madina Colhido, durante a «Op Boga Destemida», envolvendo a CART 2520 (1969/70) e CCAÇ 12 (1969/71) – [P16762].

Em 26NOV1970, na «Op Abencerragem Candente», o mesmo cenário envolvendo a CART 2714, CART 2715 e CCAÇ 12, num total de 8 Gr Comb. Dos combates travados com a guerrilha, as NT tiveram 6 mortos e 9 feridos graves. Um dos mortos foi o camarada furriel Joaquim Araújo Cunha, natural de Outeiro, Barcelos, da CART 2715, unidade sediada no Xime, comandada pelo cap aet Vítor Manuel Amaro dos Santos (1944-2014).


Em 14NOV1968 (três anos e meio antes do episódio da CART 3494), em emboscada na Ponta Coli (estrada Xime-Bambadinca) morreu o furriel Fernando Maria Teixeira Dias, natural de São Simão, Amarante, da CART 1746, comandada pelo cap mil António Gabriel Rodrigues Vaz (1936-2015) [P11522].




Jorge Alves Araújo, ex-Furriel Mil. Op. Esp./RANGER, CART 3494 
(Xime-Mansambo, 1972/1974); coeditor do nosso blogue


OS 221 FURRIÉIS QUE TOMBARAM NO CTIG [1963-1974] (POR ACIDENTE, COMBATE E DOENÇA) - Parte I: Acidente (n=68)


1. INTRODUÇÃO

Na sequência da actualização da lista dos camaradas «Alferes» que tombaram no CTIG (1963-1974), publicada no P18860 (*), anexo agora a referente aos camaradas «Furriéis», apresentando-a ao Fórum organizada segundo a mesma metodologia anterior, ou seja, por quadros de categorias (acidente, combate e doença) e por ordem cronológica.

Porém, admitimos a hipótese desta lista estar incompleta, uma vez que existem alguns casos de ex-combatentes que tombaram nos diferentes TO que estão ainda por registar e/ou recensear, como são os exemplos de dois dos três camaradas da minha CART 3494, naufragados no rio Geba em 10AGO1972 [faz quarenta e seis anos], cujos corpos não apareceram e daí não fazerem parte dos documentos oficiais [P10246]. São eles: o Abraão Moreira Rosa (Sold; 1950-1972), da Póvoa de Varzim [registo do óbito em 23Nov1973], e o Manuel Salgado Antunes (Sold; 1950-1972), de Quimbres, São Silvestre, Coimbra [registo do óbito em 21Fev1973].

Entretanto, em homenagem a todos aqueles que não regressaram para junto dos seus familiares, aqui recordo os nomes de três furriéis, todos eles falecidos em combate no subsector do Xime, com intervalos de dois anos, região onde vivi, convivi e sobrevivi a muitas situações… francamente difíceis e de grandes emoções/tensões.

● Em 14NOV1968 – o furriel Fernando Maria Teixeira Dias, da CART 1746.

● Em 26NOV1970 – o furriel Joaquim Araújo Cunha, da CART 2715.

● Em 22ABR1972 – o furriel Manuel Rocha Bento, da CART 3494.

Para que não fiquem na "vala comum do esquecimento", como é timbre no nosso blogue, eis os quadros estatísticos dos 221 (duzentos e vinte e um) furriéis, nossos camaradas, que tombaram durante as suas Comissões de Serviço na Guerra no CTIG, por diferentes causas: combate (n=139), acidente (n=68)  ou doença (n=14).


2. QUADROS POR CATEGORIAS E ORDEM CRONOLÓGICA










Jorge Araújo

(Continua)
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Notas do editor: