segunda-feira, 2 de abril de 2007

Guiné 63/74 - P1640: A africanização da guerra (A. Marques Lopes)

Guiné > Região de Tombali > Bedanda > CCAÇ 6 > 1971 > A famosa e feliz foto do ex-Alf Mil Médico Amaral Bernardo: a saída do obus 14, de noite. "Foi tirada com a máquina rente ao chão. Bedanda tinha três. Uma arma demolidora. Um supositório de 50 quilos lançado a 14 km de distância... Era um pavor quando disparavam os três ao mesmo tempo... Era costume pregar sustos aos periquitos... Eu também tive honras de obus, quando lá cheguei... Guileje não tinha nenhum bus, mas sim três peças de artilharia 11.4. A peça era esteticamente mais elegante do que o obus" - disse-me ele, esta tarde, no seu gabinete no Hospital Geral de Santo António, que é a sua segunda casa , e onde é o director director do ensino pré-graduado da licenciatura de medicina ICBAS - Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar/HGSA Ciclo Clínico (ou seja, responsável por cerca de 550 alunos, um batalhão)...

m Bedanda, durante 13 meses, sob o comando do capitão de cavalaria Ayala Botto. Um grande comandante,um verdadeiro oficial de cavalaria... que nos derretia com mimos: ovos liofilizados e outras delícias, que vinham de Lisboa, de uma fábrica da família... Estive primeiro em Cacine, que era deslumbrante... Percorri todo o sul, acabando em Bolama, depois de passar por Bedanda, Gadamael, Guileje, Tite...A CÇAÇ 6 tinha fulas e um pelotão de balantas... Em Bedanda, os tipos do PAIGC apareciam nas minhas consultas, nas calmas, disfarçados com a população... Bedanda, no tempo das chuvas, era inacessível por terra, transformava-se numa ilha. Ficava entre dois rios, o Cumbijã, a oeste e o seu afluente, o Ungauriul, a leste e a norte... Era abastecia pelos fuzileiros e pela força aérea... Em 2005 falei com o Nino sobre os ataques a Bedanda, quando ele era o comandante da região sul... Havia malta na tabanca que lhe fazia sinais de luz (com uma lanterna) para orientação do tiro... À terceira, eles acertavam todas... Os melhores abrigos, à prova do 120, eram os de Guileje... Mas o Spínola proibiu a construção de mais bunkers, queria que o pessoal fosse todo para as valas... Foram tempos muitos duros, tive uma actividade como médico... e eu próprio cheguei a desejar secretamente ser ferido para poder ser evacuado dali"...

Foto: © Amaral Bernardo (2007). Direitos reservados.



1. Amigos e camaradas: Estou no Porto e não tenho acesso aos ficheiros que alimentam o blogue(e-mails, imagens, textos...). Tenho, no entanto, diversos posts pendentes. Entre eles, material que o A. Marques Lopes tem vindo a compilar sobre as NT, as nossas baixas, etc., no TO da Guiné. Parte deste material já circulou pela tertúlia, mas ainda não foi divulgada através do blogue.

Mesmo sem a competente explicação do autor, acho útil para já divulgar a lista de unidades formadas na Guiné, com pessoal africano, ao longo dos anos. Algumas são mesmo anteriores ao começo oficial da guerra, como foi o caso das 1ª, 3ª e 4ª CCAÇ. Todas tinham quadros de origem metropolitana, com excepção das companhias de comandos, fundadas em 1969 (a 1ª CCmds Afr) e 1971 (as 2ª e 3ª CCmds Afr).

Vários dos membros da nossa tertúlia pertenceram a este tipo de unidades (como é o caso do próprio A. Marques Lopes, que esteve na CCAÇ 3). Acabo agora mesmo de sair do Hospital de Santo António onde fui expressamente conhecer, em pessoa, o nosso camarada Amaral Bernardo que me contou estórias emocionadas e emocionantes do sul da Guiné, da época de 1970/72, quando ele lá esteve como Alferes Miliciano Médico: de Bedanda (onde passou 13 meses, com o pessoal da CCAÇ 6, comandada na altura por um grande oficial de cavalaria, o Carlod Ayala Botto), de Gadamael, de Guileje, de Tite, de Bolama... Tenho que falar desde encontro noutra ocasião, com mais tempo e vagar... O Amaral Bernardo, que viveu em Angola dos 6 aos 18 anos, é um apaixonado da Guiné. E, mais do que isso, como cooperante (em vários projectos ligados à saúde e à formação médica), um grande amigo da Guiné, a par do Paulo Santiago.

O nome de Spínola está associado à criação da chamada nova força africana. É desse tempo, por exemplo, a criação da CCAÇ 12, a que eu pertenci, eu e vários outros camaradas (o Reis, o Levezinho, o Fernandes, o Sousa, o Martins, o Abel Rodrigues, o Gabriel Gonçaves, o António Duarte...) cuja presença neste blogue muito me honra e nos enriquece a todos. (LG)


Unidade / Formação / Extinção / Composição
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Unidade > 1ª CCAÇ
Formação > 01.01.61 (anterior a)
Extinção > 01.04.67 (passou a chamar-se CCAÇ 3)
Composição > Quadros metropolitanos e praças do
recrutamento local
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3ª CCAÇ / 01.08.61 / 01.04.67 (passou a chamar-se
CCAÇ 5) / Quadros metropolitanos e praças do
recrutamento local

__________________________________________________

4ª CCAÇ / 01.01.61 (anterior a) / 01.04.67 (passou
a chamar-se CCAÇ 6) / Quadros metropolitanos e
praças do recrutamento local

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CCAÇ 3 / 01.04.67 (por alteração da designação da
1ª CCAÇ) / 31.08.74 / Quadros metropolitanos e
praças do recrutamento local (1)
___________________________________________________

CCAÇ 5 / 01.04.67 (por alteração da designação da
3.ª CCAÇ) / 20.08.74 / Quadros metropolitanos e
praças do recrutamento local (2)
___________________________________________________

CCAÇ 6 / 01.04.67 (por alteração da designação da
4.ª CCAÇ) / 20.08.74 / Quadros metropolitanos e
praças do recrutamento local (3)

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CCAÇ 11 / 20.06.72 (por alteração da designação
da CART11) / 23.08.74 / Quadros metropolitanos e
pessoal natural da Guiné, de etnia fula (a CART 11
foi formada a 18.01.70 por alteração da designação
da CART 2479, composta por quadros metropolitanos
e pessoal da Guiné de etnia fula) (4)
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CCAÇ 12 / 08.06.70 (por alteração da designação da
CCAÇ 2590) / 18.08.74 / Quadros metropolitanos e
pessoal natural da Guiné, de etnia fula (5)

__________________________________________________

CCAÇ 13 / 18.01.70 (por alteração da designação da
CCAÇ 2591) / 20.08.74 / Quadros metropolitanos e
pessoal natural da Guiné, de etnia balanta (6)
___________________________________________________

CCAÇ 14 / 18.01.70 (por alteração da designação da
CCAÇ 2592) / 02.09.74 / Quadros metropolitanos e
pessoal natural da Guiné, das etnias mandinga e
manjaca e um pelotão de etnia felupe
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CCAÇ 15 / 29.01.70 / Finais de Jul 74

Quadros metropolitanos e pessoal natural da Guiné,
de etnia balanta, sendo inicialmente designada por
CCAÇ Balanta, e CCAÇ15 a partir de 28 Fev 70
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CCAÇ 16 / 04.02.70 / 31.08.74

Quadros metropolitanos e pessoal natural da Guiné,
de etnia manjaca
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CCAÇ 17 / Princípios de Maio de 1970 / Princípios de
Ago 74 / Quadros metropolitanos e pessoal natural
da Guiné, de etnia balanta, predominantemente já
integrante das milícias
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CCAÇ 18 / 01.12.70 / 8.08.74
Quadros metropolitanos e pessoal natural da Guiné,
predominantemente de etnia fula e na sua maioria
já integrante das milícias
______________________________________________________

CCAÇ 19 / 01.12.71 / Princípios de Ago 74
Quadros metropolitanos e pessoal natural da Guiné,
predominantemente de etnia mandinga e na sua maioria
já integrante das milícias
_______________________________________________________

CCAÇ 20 / 05.06.73 / Princípios de Ago 74 /
Quadros metropolitanos e pessoal natural da Guiné,
de várias etnias

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CCAÇ 21 / 05.06.73 / 18.08.74

Quadros metropolitanos e pessoal natural da Guiné,
de etnia fula, predominantemente já integrante das
milícias

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Comandos africanos


Unidades / Formação / Extinção / Composição
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1.ª CCmds Afr / 09.07.69 / 07.09.74

Exclusivamente pessoal natural da Guiné
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2.ª CCmds Afr / 15.04.71 / 02.09.74

Exclusivamente pessoal natural da Guiné
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3.ª CCmds Afr / 14.04.72 / 07.09.74

Exclusivamente pessoal natural da Guiné

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Notas de L.G.:

(1) O A. Marques Lopes foi Alf Mil da CCAÇ 3 (Barro, 1968). Tem diversas estórias desse tempo publicadas no nosso blogue.

(2) À CCÇ 5 - Gatos Pretos - pertenceram os nossos camaradas e membros da nossa tertúlia José Martins e João Carvalho (Canjadude, 1968/70 e 1973/74, respectivamente). O Martins era furriel mil de transmissões e o Carvalho furriel miliciano enfermeiro. Vd. por exemplo os posts de:

4 de Março de 2006 > Guiné 63/74 - DCV: A última noite em Canjadude (CCAÇ 5) (João Carvalho)

4 de Março de 2006 > Guiné 63/74 - DCIV: Os últimos dias de Canjadude (fotos de João Carvalho)

23 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDLXXIV: O nosso fotógrafo em Canjadude (CCAÇ 5, 1973/74)

(3) À CCAÇ 6 (Bedanda) pertenceram, em diferentes épocas, os noaaoa camaradas Hugo Moura Ferreira (1966/68), Carlos Ayala Botto (1970/72), Amaral Bernardo (1970/72) e Mário Bravo (1971/72), estes dois últimos médicos (Porto). Vd. posts de:

22 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCXCV: CCAÇ 16121 (Cufar); CCAÇ 6 (Bedanda) (1966/68) (Hugo Moura Ferreira)

23 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1457: Tertúlia: Apresenta-se o Alf Mil Médico Mário Bravo, CCAÇ 6, Bedanda (1971/72)

2 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1489: Tertúlia: Formalizo o meu pedido de entrada (Amaral Bernardo, ex-Alf Mil Médico, Catió, BCAÇ 2930)


(4) A CCAÇ 11 (recruta, instrução de especialidade e IAO) foi formada em Contuboel. Sobre esta unidadem formada a partir da CART 11/CART 2479, há já diversos posts:

23 de Junho de 2006 > Guiné 63/74 - P899: Diga se me ouve, escuto! (Renato Monteiro)

23 de Junho de 2006 > Guiné 63/74 - P898: Saudades do meu amigo Renato Monteiro (CART 2479/CART 11, Contuboel, Maio/Junho de 1969)

28 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P1001: Estórias de Contuboel (i): recepção dos instruendos (Renato Monteiro, CART 2479 / CART 11, 1969)

30 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P1005: Estórias de Contuboel (ii): segundo pelotão (Renato Monteiro, CART 2479 / CART 11, 1969)

1 de Agosto de 2006 > Guiné 63/74 - P1015: CART 2479, CART 11 e CCAÇ 11 (Zona Leste, Gabu, subsector de Paunca)

2 de Agosto de 2006 > Guiné 63/74 - P1017: Estórias de Contuboel (iii): Paraíso, roncos e anjinhos (Renato Monteiro, CART 2479 / CART 11, 1969)

4 de Agosto de 2006 > Guiné 63/74 - P1026: Estórias de Contuboel (iv): Idades sem lembrança (Renato Monteiro, CART 2479 / CART 11, 1969)

4 de Agosto de 2006 > Guiné 63/74 - P1027: Estórias de Contuboel (V): Bajudas ou a imitação do paraíso celestial (Renato Monteiro, CART 2479 / CART 11, 1969)

19 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1612: Relembrando, com saudade, os nossos soldados fulas da CART 11 (Renato Monteiro / João Moleiro)

25 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1625: José Casimiro Carvalho, dos Piratas de Guileje (CCAV 8350) aos Lacraus de Paunca (CCAÇ 11)

(5) Foi também formada em Contuboel, a nordeste de Bafatá. A recruta do pessoal africana doi dada pela CART 2479. A especialidade foi já dada pela CCAÇ 2590 (quadros metropolitanos). Esteve como unidade de intervenção na Zona Leste, no Sector L1, em Bambadinca (até 1973) e depois no Xime, até ao fim da guerra.

Há numerosos posts, no nosso blogue,com referência a esta unidade, que esteve ao serviço do comando de três batalhões: BCAÇ 2851 (1968/70), BARET 2917 (1970/72) e BART 3873 (1972/74).

(6) Vd. página do Carlos Fortunato > Guiné - Os Leões Negros [CCAÇ 13].

O Carlos foi revisitar, ainda recentemente )Novembro de 2006), os seus balantas da CCXAÇ 13: vd. post de 17 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1533: De regresso a Bissorã: Uma viagem fantástica (Carlos Fortunato)

1 comentário:

Anónimo disse...

Chamo-me Luis Jales.Pertenci à CCAÇ 20 que esteve em Gadamael de 73 a 74.Sou um apaixonado pela Guiné e por tudo o que aqui se escreve.Neste momento estou a editar um livro que se chama "Bom dia Gadamael".Darei notícias em breve.Um abraço