terça-feira, 29 de abril de 2008

Guiné 63/74 - P2800: Em bom português nos entendemos (1): Guidaje e não Guidage (Luís Graça / Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa)

Guiné-Bissau > Região de Cacheu > Guidaje > Novembro de 2008 > O regresso do Albano Costa, acompanhado do seu filho Hugo Costa e de outros camaradas, a Guidaje, o antigo aquartelamento da CCAÇ 4150 (1973/74), junto à fronteira do Senegal.

Tal como Guileje e outros aquartelamentos no sul, Guidaje, no norte, é um ponto no mapa da Guiné-Bissau que faz parte da nossa história comum, e que dificilmente cairá no esquecimento, de ambos os povos. Em Novembro de 2000, o Albano Costa foi lá encontrar o último soldado (guineense) da martirizada CCAÇ 19. Guidaje nunca será esquecida, mas os falantes da língua portuguesa têm dúvidas sobre a sua grafia correcta: Guidaje ou Guidage ? Entretanto, os jilas (e não gilas) continuam, como dantes, a atravessar a fronteira e a falar melhor o francês do que o português...

Segundo o Observatório da Língua Portuguesa, em 7 de Julho de 2007, o cálculo de Falantes de Português como Língua Materna nos países da CPLP era de 204.654.678, num universo de menos de 236 milhões de habitantes. A Guiné-Bissau com um total de 1.565.000 habitantes era o país da CPLP, com a menor percentagem de Falantes de Português como Língua Materna: 5% (em números absolutos, 78.250), atrás de Timor Leste (6%) e de Moçambique (6,5%), longe de São Tomé e Príncipe (20%), Cabo Verde (40%), Angola (40%), Portugal (96%) e Brasil (99,7%).

Foto: © Albano Costa (2008). Direitos reservados.


1. Pergunta a (e resposta de) o Ciberdúvidas da Língua Portiuguesa:

A grafia de Guidage/Guidaje (Guiné-Bissau)

[Pergunta]

A toponomia da Guiné-Bissau é fonte de grande confusão para os falantes da língua portuguesa. Já aqui em tempos levantámos a questão da grafia de Guileje/Guilege/Guiledje... Ainda recentemente participei num Simpósio Internacional de Guiledje (e não Guileje), em Bissau (1 a 7 de Março de 2008).

Há dias passou na televisão (SIC) e foi publicado num semanário (Visão) uma reportagem sobre Guidage, e a exumação e a identicação de restos mortais de militares portugueses, que lá morreram e ficaram sepultados, em Maio de 1973...

Eu costumo seguir a fixação dos topónimos feita, na antiga Guiné portuguesa, pelos nossos magníficos cartógrafos militares. Mas também eles erra(va)m. Consagraram duas grafias para esta obscura povoação no Norte, na zona fronteiriça, junto ao Senegal, povoação onde havia um aquartelamento português no tempo da guerra colonial/guerra do ultramar.

Guileje e Guidaje são hoje dois topónimos que fazem parte da história de ambos os países, a Guiné-Bissau e Portugal... Seria bom que nos entendêssemos sobre a sua grafia correcta...
Ver as cartas sobre Guidage/Guidaje, disponíveis em linha, a partir do meu blogue:

Luís Graça & Camaradas da Guiné
Carta da Província da Guiné, 1961
Carta de Guidaje, 1953

Parabéns pelo vosso magnífico trabalho em prol da língua portuguesa e dos falantes da língua portuguesa (tão pouco falada, infelizmente, na Guiné-Bissau).

Luís Graça,
Professor do ensino superior universitário,
Lisboa, Portugal

[Resposta]

Na transcrição de nomes africanos de origem banta, que pertencem ao grupo Benue-Congo do ramo Níger-Congo da família níger-cordofânia (1) , a tendência é usar o grafema j antes das letras e e i para representar uma série de sons vozeados (sonoros), realizados como fricativa pré-palatal [j] ( o j de janela), africada pré-palatal [dj](como em italiano, Giovanni) ou qualquer outro som que soe semelhante ao ouvido português. Assim, em nomes de lugar de países onde se falam tais línguas, dever-se-ia usar o j para representar tais sons: Malanje e Uíje (em Angola; cf. Rebelo Gonçalves, Vocabulário da Língua Portuguesa, 1966).

No caso da Guiné-Bissau, não temos línguas bantas, mas línguas da mesma família e do mesmo ramo, mas de grupos diferentes: o mandinga e o soninqué são membros do grupo mande, e as restantes, do grupo atlântico (2). Também neste caso me parece de aconselhar o j para transcrever os sons que, nestas línguas da Guiné-Bissau, soarem como fricativa, africada ou som semelhante. Recomendo, portanto, que se escreva Guidaje e Guileje, pelo menos, em português europeu.

Dito isto, sabemos que a norma brasileira aceita o dígrafo dj em variação com j (ver Dicionário Houaiss); por exemplo: djila/jila («mascate que circula entre a Guiné-Bissau (África) e os países vizinhos»). Surge aqui uma alternativa à disposição dos países africanos em que o português é língua oficial: sabendo que estamos numa fase de mudança, é possível que a adopção do novo Acordo Ortográfico dê azo a que em África se redefinam os critérios a aplicar na grafia e na forma portuguesas de topónimos com origem em línguas pré-coloniais.

Em nome do Ciberdúvidas, agradeço as suas palavras finais.

(1) Ver Ernesto d´Andrade, Línguas Africanas: Breve Introdução à Fonologia e à Morfologia, Lisboa, A. Santos, págs. 19-45.


(2) Idem, pág. 64.


Carlos Rocha. 24/04/2008

Textos Relacionados

Guileje (e não "Guiledje")

2. Outros sítios na Net a pôr na lista dos favoritos:

CPLP - Comunidade dos Países de Língua Portuguesa

Idiomático - Revista Digital de Didáctica de Português > A Língua Portuguesa na Guiné-Bissau

Dicionário Caboverdiano Português On-Line

Instituto Camões Portugal

Língua Portuguesa - Gramática, Ortografia, Literatura

Museu da Língua Portuguesa

Observatório da Língua Portuguesa

Por Detrás das Letras

Portal da Língua Portuguesa

Priberam Informática - Língua Portuguesa On-Line

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