domingo, 23 de novembro de 2008

Guiné 63/74 - P3503: Controvérsias (11): O início da guerra (Tite, 23 de Janeiro de 1963) e a estreia da G3 alemã, em 1961 (Santos Oliveira)

1. Mensagem do Santos Oliveira, com data de 22 de Novembro

Luis e Mário [Dias]

Acabo de chegar e tomar conhecimento desta mensagem para conhecimento. Não me foi solicitada opinião, mas dou-a na mesma; posso vir a ser controverso, mas também não possuo documentos que possam atestar a veracidade do que digo. Foi o que apurei no tempo.


Luis

A tua questão e a do nosso Camarada Alberto Nascimento (*), na minha opinião pessoal, não tem muito a clarificar.


(i) Escaramuças antes do início oficial ou oficioso da Guerra, em 23 de Janeiro de 1973

Escaramuças, desde a fundação do PAIGC, aconteciam com mais frequência que as que são conhecidas e/ou registadas. Eram casos de Polícia. O PAIGC necessitava de alimento para a sua causa, pelo que os problemas com os Comerciantes, menos colaboracionistas, foram mais que muitos, mas passavam por ser questões de índole social. Quando não eram resolvidas pelos Chefes de Posto e dos seus Cipaios, era activada a segunda fase, ou seja, a intervenção da PIDE; esta, agia de acordo com o seu Estatuto de Toda Poderosa e “ordenava” a intervenção do Exército que agia e era utilizado como se de Polícia se tratasse. Não havia que justificar o que quer que fosse. Os Castros da época nem pestanejavam e mandavam avançar.

Dos primeiros ou últimos tiros dados antes de Tite, podemos confirmar que se disparam imensos. Podemos falar de Pidjiguiti. Foi aqui que começou? Foi em Farim? Em que ficamos? É que o tema era a “sublevação” social e não a reivindicação da Independência.

Dos poucos Documentos que consegui ler em Tite e das muitas vozes que consegui ouvir entre os mais antigos, conseguindo comparar com o que havia documentado, tirava as ilacções que agora vou reportando. Era um dos assuntos que me fascinava porque havia uma transmissão oral em contraposição com a quase total ausência de Documentação que o atestasse. Veja-se o exemplo gritante do início oficial da Guerra.

Em Tite, uns quantos documentos designavam por um desacato de elementos de fora da jurisdição e que obrigou as NT a reagirem a tiro. Referências aos mortos e feridos e mais nada. A descrição notável do Gabriel Moura, que o Camarada e Amigo Carlos Silva, herdeiro e depositário do Documento já trancrito em Poste (**), tanto quanto conheço, corresponde perfeitamente à realidade do tempo. Confirmei a descrição de factos ao Carlos Silva antes da sua publicação no Blogue. Dessa conversa guardo em memória de que até ele se sentia um tanto céptico. Deficiência Profissional de Advogado, que me perdoe a revelação deste meu sentimento. A sua reacção em nada me surpreendeu, porque é esse o sentimento que encontro nos Camaradas que percorreram os mesmos trajectos uns escassos dois anos depois.

Os mais antigos, os dos primeiros tempos, como o Mário Dias, o Colaço, o Alberto Nascimento, sabem que as informações que o Exército possuia, eram as da PIDE; a 5ª Divisão existia a trabalhar o que já estava trabalhado, decidido e muitas vezes já executado. A informação, a verdadeira, corria, sim, de boca a boca. As comunicações militares, CTMs, eram filtradas e manipuladas segundo conveniências incompreensíveis, das outras, só se estivessemos a uns escassos 2 Km. Esta a minha opinião do que vivi, acompanhei com raiva e com raiva o senti. Daí a importância que se tornou em o Ponto de Encontro, denominado 5ª Divisão, que foi o Café Bento, em Bissau. Alí parava tudo quanto vinha do Mato e a transmissão oral era o modo comum de Informação.

(ii) Agora as famosas e magníficas G3

Vou responder-te pelas perguntas que hás feito ao meu amigo Mário Dias (*).

(a) No meu Curso de Sargentos Milicianos de 63, existiam G3 (Alemãs) e FN suficientes e necessárias ao treino total de Manipulação (montagem, desmontagem) e de Tiro; no entanto, a Mauser era Arma atribuida para o Curso.

(b) A G3 foi conhecida nessa altura, foi na data, em parceria com a FN, o meu brilharete em Tiro Instintivo, mas que não consta dos meus registos individuais.

(c) Como é referido acima, as escaramuças existiam mas não tinham carácter de Guerrilha. As G3 que o nosso Camarada Alberto Nascimento recebeu, teriam sido as que nos foram facultadas pela NATO para utilização dentro do âmbito da Organização e de que Portugal fazia parte. Como se percebe pela descrição do Gabriel Moura (Pel Mort19/ Bcaç 237, 1961 a 1963), as G3 estavam encaixotadas e apenas havia meia dúzia delas em Serviço. A Mauser era a Arma do Batalhão. Deve ter sido um recurso ousado, embora apressado, o ter equipado aquela Unidade para a sua deslocação á região de Farim. Dúvidas não existem de que estas Armas já estavam no Bcaç 237 desde 1961, mas não em utilização oficial.

Esta Brochura do Gabriel Moura (**) bem merecia ser devidamente Editada e Publicada para conhecimento de todos os Camaradas, sobretudo dos que por lá chegaram depois de 65 (pensariam que estavam noutra Guerra ou que era Ficção).

(d) Perante o exposto, não parece ter sido ficção o início das hostilidades a 23 Jan 63, com o ataque ao Quartel de Tite. Data coincidente por ambas as partes.

Acrescento um Comentário aos Comentários do Mexia e do Colaço ao Guiné 63/74 - P3492: Controvérsias (9): Eu fui para Farim (...) (*):

(e) Joaquim Mexia refere, e muito bem, que a Arma G3 não fazia parte do Equipamento do seu irmão, numa zona de Guerra activa e em pleno desenvolvimento;

(f) O Colaço reporta, igualmente muito correcto, que a Licença de produção em Portugal da G3, só se adquiriu em 1962. Mas a verdade é que as Armas que estavam no território da Guiné, como disse, eram originais (alemãs) e que eram parte da nossa participação na NATO (OTAN), pelo que a sua utilização seria ilegal (como os F86-Sabre, os Lockeed P2V-5, etc.). A prudência aconselhava... A partir de 64 começaram a chegar as G3-FBP e então tudo ficou bem. Já era legal.

É quanto sei e posso dizer. Espero merecer a Vossa compreensão para se poder escrever, com verdade, a História desta Guerra na Guiné, pese, embora, que nos sobrem mais dúvidas que certezas.

A todos, o meu mais sincero abraço
Santos Oliveira

2. Comentário de L.G:

Camarada Santos Oliveira: obrigado pelas tuas preciosas informações. O facto de ter-te dado conhecimento do mail, a ti e outros camaradas mais velhinhos (de 1961 a 1963...), era na esperança de poder suscitar também a tua opinião. Em boa hora o fizeste. Há montes de coisas que não vêm (nem nunca virão) nos documentos oficiais ou oficiosos da tropa. Há coisas que só se podem conhecer, ou vir a conhecer, pelo método do boca a boca... Este método tem, de algum modo, funcionado no nosso bogue... LG

_________

Nota de L.G.:

(*) Santos Oliveira, ex-2.º Sarg Mil Armas Pesadas Inf do Pel Mort 912, Como, Cufar e Tite, 1964/66., membro da nossa Tabanca Grande desde 24 de Novembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2301: Tabanca Grande (41): Santos Oliveira, 2.º Sarg Mil de Armas Pesadas Inf.ª (Como, Cufar e Tite, 1964/66)


Vd. postes mais recentes:

15 de Outubro de 2008 Guiné 63/74 - P3318: Album fotográfico de Santos Oliveira (1): Tite

6 de Novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3416: Album fotográfico de Santos Oliveira (2): Tite, Tempestade tropical

10 de Novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3434: Album fotográfico de Santos Oliveira (3): Tite, dia de ronco

15 de Novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3458: Album fotográfico de Santos Oliveira (4): Tite

18 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3332: O meu baptismo de fogo (13): Tite, 1964 (Santos Oliveira)

15 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2352: Ilha do Como: os bravos de um Pelotão de Morteiros, o 912, que nunca existiu... (Santos Oliveira)

21 de Setembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3222: Convívios (84): Pessoal dos BCAÇ 237 e 599, Pel Mort 912, Pel Caç 955 e Pel AM Daimler 807 (Santos Oliveira)

4 de Julho de 2008 > Guiné 63/74 - P3021: Os nossos regressos (6): Regressei a olhar para trás...(Santos Oliveira)
Vd. psotes de:

22 de Novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3499: Controvérsias (10): Vi em 1961 chegarem, a Bissau, as primeiras tropas equipadas com a espingarda automática G3 (Mário Dias)

21 de Novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3492: Controvérsias (9): Eu fui para Farim, em Julho de 1961, com a G3, com o 1º Gr Comb da CCAÇ 84 (Alberto Nacimento)

(**) Vd. postes de:

11 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3294: O ataque a Tite, em 23 de Janeiro de 1963 (Parte I) (Carlos Silva / Gabriel Moura )

12 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3298: O ataque a Tite, em 23 de Janeiro de 1963 (Parte II) (Carlos Silva / Gabriel Moura)

13 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3308: O ataque a Tite, em 23 de Janeiro de 1963 (Parte III) (Carlos Silva / Gabriel Moura)

4 comentários:

Anónimo disse...

Nesta página http://herdeirodeaecio.blogspot.com/ explica-se como surgiu da nossa G3.
Abraço Henrique Matos

Anónimo disse...

Queria dizer a nossa G3.
Henrique Matos

Anónimo disse...

O que o camarada Santos Oliveira refere no paragrafo (f)é verdade.
No comentário anterior não o citei porque o caso é muito polémico e segundo me parece não há registos oficiais que o possam confirmar. O governo viu-se confrontado com uma situação que não soube prever e deitou mão a tudo legal e ilegal.
Exemplo na Operação Tridente Ilha do Como,o avião P2V-5 estava em Cabo Verde durante a noite vinha despejar as bombas na mata do Cassacá e regressava a Cabo verde.(uma ilegalidade legal).
Quanto as g3 existentes nas ex-colónias antes de 1962 deve ter sido uma negociata no escuro entre o governo português, o governo alemão e o fabricante alemão (HECKLER&KOCH).
Aguardo com muito interesse o comentário do camarada Mário Dias.
Um alfa bravo.
Colaço
Nota: Quanto as fbp de fraca qualidade e segurança,(opinião pessoal)acho que não entram neste pacote,são armas totalmente portuguesas criadas pelo major Gonçalves Cardoso e produzidas pela F.M.de B.P.

Anónimo disse...

O HERDEIRO DE AÉCIO está muito explícito e real, sobre o tema em questão.