quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

Guiné 63/74 - P3942: Sr. jornalista da Visão, nós todos fomos combatentes, não assassinos (4): Camaradas, sei o que vos vai na alma (Virgínio Briote)

1. Mensagem de Virgínio Briote, nosso co-editor, ex-Alf Mil Comando, CCAV 489/BCAV 490, Cuntima, e CCmds, Brá, 1965/67, com data de 25 de Fevereiro de 2009:

Caros Luís, Carlos e Camaradas,

[Negrito, do editor, C.V]


Compreendo bem o que vos vai na alma. Quem deu o corpo e a alma por aquele Portugal de então, a troco de cigarros e cerveja (e uísque, para os mais favorecidos), sente-se ofendido, no seu mais íntimo, por tão apressada crónica.

E, no entanto, a opinião do Luís Almeida Martins, embora muito à tona (duas páginas também não davam para muito mais e, ainda por cima, com marcianos no filme), não me parece totalmente incorrecta. Massacres e acidentes de viação, são, na referida crónica, os aspectos mais discutíveis.

Massacres, é a palavra que mais nos dói e é injusta, felizmente, para a grande maioria de nós. Mas houve-os, comprovadamente. Para referir apenas dois: o assassinato dos "majores" e acompanhantes, no chão Manjaco, na Guiné, e o "Wiriamu", em Moçambique, ocorreram. Luís Cabral, Aristides Pereira e Pedro Pires referiram-se a esse facto com uma frase simples: era guerra, tratava-se de guerra.

O alferes de "Wiriamu", acidentalmente cmdt da CCmds e responsável pela operação, confessou-o para as câmaras. Pediu perdão às vítimas. Senti-me envergonhado quando o ouvi descrever como tudo se processou. Um jovem de 20 e poucos, com a mesma idade dos seus camaradas, com um historial de baixas na companhia... compreendi-o, mas confesso-vos que não fiquei orgulhoso.

Foram casos que não fazem exemplo, dirão muitos e eu também, mas existiram vítimas. Embora raros, casos desses fazem parte da guerra. E a guerra é um charco, quanto mais nos metemos nele, mais sujos ficamos.

Que as baixas eram mais devidas a minas fortuitas e a acidentes de viação... Não posso falar por Moçambique nem por Angola. O tipo de guerra era similar, diferentes eram o IN, as características do território e as populações. Da Guiné, temos, entre nós, infelizmente, gente mais habilitada para falar de como o IN se comportava no terreno. Apenas acrescento: é verdadeiramente invulgar que, sujeitos a uma guerra a sério, com testemunhas que, ainda hoje estão vivas e que trazem no corpo as marcas da luta, os INs de então sintam uns pelos outros uma compreensão e amizade tão grande.

Acima de tudo, da crónica do Almeida Martins, o que ressalta, para mim, é que reflecte a visão dos que têm, acima de tudo, privilegiado a chamada opinião politicamente correcta, a de que aqueles povos estavam submetidos a uma ocupação, que, embora histórica, lhes parece ilegítima.
Massacres só houve de um lado, pelo que depreendo da crónica. Não é novidade, é uma opinião recorrente, temo-la ouvido estes anos todos. E têm todo o direito, como qualquer um de nós, de expressar o seu ponto de vista. Diferente, para mim, é que, no seu afã de defenderem ou justificarem esse ponto de vista, deixam passar para último plano o que de melhor Portugal tem tido ao longo da sua História, os seus Soldados. Foi com eles que este pequeno País se fez e se tem mantido, há quase mil anos.

Mas este Portugal, da pena do articulista de que estamos a falar, é o que estamos a viver. Não sei é se há muita gente que gosta dele. Eu não.

Um abraço do
Briote
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 26 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3941: Sr. jornalista da Visão, nós todos fomos combatentes, não assassinos (3): Mário Fitas, aliás, Mamadu (CCAÇ 763, Cufar, 1965/66)

2 comentários:

Julio Vilar pereira Pinto disse...

Eu foi combatente em Agola e não podemos esquecer os massacres de 61 no norte de Angola em que fora ortos à catanada, fazendeiros e familiares incluindo bebés e crianças e mesmo trabalhadores nativos das fazendas, foi uita gente indefesa que foi morta, o sr. jornalista nesse altura devia estar a coer um bom bife na Portugália em Lisboa porque em Luanda também havia uma Portugália a que chamavamos a 6ª Repartição do QG, pois lá passavam todos os militares.
Julio Pinto
ex- 2º sargento Milº em Angola que sauda todos os ex-combatentes e em especial os da Guiné.

Anónimo disse...

V.Briote, é verdade que em Angola já poucos combates havia no fim.
Mas esse jornalista e todos os que estes 34 anos tentam justificar, que é o comportamento daqueles que se negaram a compartilhar um acontecimento histórico, dos mais marcantes da história de Portugal, intencionalmente, generalizam e misturam as várias frentes quando isso dá geito e particularizam quando convem.

Nunca analizam os processos que os movimentos e seus aliados usaram, como o de concentrar a guerra na Guiné e norte de Moçambique para atingir Angola.

Mas esta luta de 34 anos dessas figuras "anticolonialistas" desde que nasceram, tem vindo a ser derrotada pelo próprio tempo e pelos acontecimentos, que estão constantemente a demonstrar que não fomos assassinos e que os ex-colonizados não demonstram a esses anticolonialistas a gratidão a que se julgam com direito.

Conhecem-se algumas figuras "anticolonialistas", tanto militares como civis, como tomaram partido na guerra de 27 anos que se seguiu em Angola. Essa sim guerra do mais desumano que se possa imaginar. E o entusiasmo com que se grudaram aos contentores que é de realçar.

Mas os acontecimentos e o tempo são as nossas testemunhas.

Antº Rosinha