sábado, 11 de abril de 2009

Guiné 63/74 - P4173: Humor de caserna (10): Como se caçavam Maçaricos em 1964 (Santos Oliveira)

1. Mensagem de Santos Oliveira (*), ex-2.º Srgt Mil Armas Pesadas, Pel Mort 912, Como, Cufar e Tite, 1964/66, com data de 8 de Dezembro de 2008:

Caros Luís e Companhia
Cá vai uma história inocente (dum ingénuo) do que aconteceu no dia da minha apresentação em Tite (20SET64).


COMO SE CAÇAVAM MAÇARICOS EM 1964

A Guerra do Ultramar veio criar a necessidade de, aos Militares para lá deslocados, um fardamento adequado ao clima, de caqui amarelo-torrado.
Os que haviam seguido pelos anos de 1961 ainda sofreram as agruras da regulamentar farda utilizada no Contingente Metropolitano, inadequada, de fazenda cerdosa, grossa, de cor cinzenta (quentíssima cá, como seria por lá???...).

Estes foram os verdadeiros criadores do termo e apelido que nos era atribuído, pela semelhança de cores com a do MAÇARICO, um tipo de ave, muito comum na Guiné.
Com a evolução e renovação do tal fardamento inadequado, todos ficaram amarelos, pelo que somente aos novatos e inexperientes no Ultramar eram apelidados com tal epíteto.

Feito este preâmbulo para se perceber que a minha chegada (a de qualquer Maçarico) era sempre aproveitada para fazer render umas quantas cervejas fresquinhas.

Acabado de me apresentar, tive, de seguida uma calorosa recepção de uma boa dezena de prestáveis rufias, camaradas Furriéis e Sargentos, Milicianos e do Quadro, que, solidariamente, me rodearam (e eu sentia-me como que confortado com tanta atenção); perguntavam coisas de cá, queixavam-se, do calor, do sol que era tanto forte, que até fritava sardinhas dentro dum capacete.

Céptico, ia mantendo aquela conversa e referia que jamais iria colocar o capacete, porque se o usasse perderia toda a mobilidade e destreza. Eles contrapunham outros argumentos sobre regulamentos, segurança, etc.etc.

Voltavam ao calor, ao sol que até fritava sardinhas…

- Queres apostar que se em cinco minutos as sardinhas não fritarem, pagamos cerveja a todo o teu Pelotão que está lá em baixo (no Enxudé). Se fritarem, pagas tu a cada um de nós, diziam.

Lembrava-me da educação da minha Mãe quando dizia:

- Meu filho, quando tiveres certeza de alguma coisa, teima e teima; mas nada de apostas. Aposta é jogo.

Mas a juventude dos meus 23 anos...

Aceitei.
De imediato e em chusma, conduziram-me ao do Parque das viaturas onde havia muitos bidões. Retiraram a protecção interior dum capacete que colocaram em cima de um deles, apareceu, sei lá de onde, uma lata de sardinhas (das que faziam parte da Ração de Combate), lançaram o conteúdo dentro do capacete e marcaram o tempo.

Não é que o azeite borbulhava como quando se frita?

Quantos, como eu, já teriam sido caçados? Seguramente os que por lá aportaram em Rendição Individual e foram imensos.

Claro que me custou largar aqueles escudos da Metrópole para pagar a minha ingenuidade.

E eu, MAÇARICO, me confesso: fui assim caçado pelos velhinhos dos BCaç 237/599.
Santos Oliveira
__________

Nota de CV:

(*) Vd. poste de 10 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4169: O trauma da notícia da mobilização (9): Afinal, sou necessário sem me sentir voluntário (Santos Oliveira)

Vd. último poste da série de 22 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4066: Humor de caserna (9): Quando os alentejanos de Jumbembem viram cair-lhes os tomates... a seus pés (Artur Conceição)

2 comentários:

Colaço disse...

Camarada Oliveira eu a pensar que tu tinhas o complexo de periquito e afinal ainda pertenceste aos maçaricos de caqui amarelo.
Quando apareceram as fardas verdes deixaram de ser maçariços foram cogonomizados de periquitos.
Aliás nem fazia sentido um maçarico verde.
Um abraço amigo Colaço.

Julio Vilar pereira Pinto disse...

Por falar em Maçaricos, em Angola mesmo com o camuflado, os novos eram m,açaricos.
Quando a minha CART 1769, foi rendida em Angola, os maçaricos traziam um 2º sargento Xico que tinha a mania que era esperto e ao conferir, com o nosso vagomestre, o depósito de géneros, apertava com o nosso vagomestre pois tinha medo de ser levado.
O vagomestre falou comigo e então na última noite que passamos em Angola,com mais dois cozinheiros, assaltamos o depósito e só trouxemos conosco até Luanda um pipo de 50 litros de vinho. Foi uma festa toda a viagem ninguem passou sede. Também eram para ai 600 Kms até Luanda.