sexta-feira, 29 de maio de 2009

Guiné 63/74 - P4436: O poder aéreo no CTIG: uma pesquisa de Matthew M. Hurley, Ten Cor, USAF: tradução de Miguel Pessoa (4): Alguns comentários

1. Mensagem de Miguel Pessoa (*), para Luís Graça, com data de 29 de Maio de 2009:

Assunto: Comentários ao texto do Matt Hurley

Luís

Da experiência que já tenho dos timings da publicação dos Postes no blogue, não me parece que o texto do Matt Hurley venha provocar grandes comentários por parte dos bloguistas. Mas lembro que durante a preparação da tradução solicitaste pareceres a diversos tabanqueiros. Pelo menos tenho conhecimento destes que incluí mais abaixo. Devidamente adaptados, talvez queiras introduzi-los como comentários ao Poste ou incluí-los na série "Comentários que merecem ser Postes" (desculpa lá se não é esse o termo, mas estou a escrever de cor...). Isto é uma simples sugestão.

Abraço
Miguel


2. Assim, seguindo a sujestão do nosso camarada Miguel Pessoa e a indicação do Editor do Blogue...

Comentários ao texto do Matt Hurley:
De João Seabra

Luís
Cá recebi o sumário do trabalho do Matt Hurley. Não tenho grande coisa a acrescentar em relação ao que te escrevi ontem. Tal como o autor, também não vejo que lições se possam tirar de experiências passadas que tenham alguma utilidade para uma doutrina da contra-insurreição actual.

Acho mesmo que as cidades constituem hoje o derradeiro maquis. Já não há, praticamente, terrenos difíceis onde as técnicas modernas não sejam mais do que suficientes para pôr fora de combate potenciais insurgentes. Os helicópteros actuais, os dispositivos de observação nocturna, a observação espacial, o empastelamento electrónico das transmissões adversas, a extraordinária precisão das armas e munições actuais, etc., tornam irrisórios os tradicionais santuários geográficos (montanhas, pântanos, florestas, etc.).

Restam as cidades, onde os guerrilheiros se podem movimentar com facilidade desde que, evidentemente, as forças armadas modernas se abstenham de as arrasar (como os Russos fizeram em Grozny).

Isto vale especialmente para o Iraque, onde 90% da população é urbanizada.

Sobre a tradução do Miguel, diria que escolheste a pessoa indicada. Prefiro (mera opinião) o termo situação para traduzir status, em vez de estado da arte sobre o tema, expressão que, parece-me, talvez mal, poderia induzir em confusão entre o estado da literatura sobre a arte e o estado da arte propriamente dita.

Só há uma expressão que me parece relativamente obscura (mais por culpa do autor do que do tradutor): a que se refere à não linearidade na guerra. (uma vez que) as operações efectuadas a uma escala relativamente pequena e os seus efeitos imediatos tinham desproporcionado profundamente o impacto….

A linearidade de uma função exprime efectivamente uma relação de proporcionalidade (directa). A não linearidade sugere uma desproporção. Entre o quê? meios e resultados? meios e efeitos? meios e impacto? efeitos impacto? O que é o impacto?

Enfim, o problema pode não ser do autor (e muito menos do tradutor), mas deste específico leitor, que é particularmente obtuso.

Acho o texto interessante e gostaria de o ver publicado no blogue. Quanto mais não seja porque enuncia explícitamente uma tese que merece estudo, e com a qual, possivelmente, haverá quem esteja em desacordo.

Mas eu sou dos que pensam que a controvérsia (racional) é mais profícua do que o chamado consenso.

Abraço
João Seabra


De Manuel Augusto Reis

Caríssimo Luís
Aqui vai, tarde e a más horas, a minha modesta opinião sobre o trabalho de doutoramento de Mr. Mattew H. Hurley.

Sobre o estudo de caso considero-o muito bem conduzido e o resultado das investigações vêm de encontro ao que nós, no terreno, vivíamos e sentíamos. Sem a eficácia de actuação da Força Aérea, na Guiné, ficávamos deveras fragilizados.
Mr Matew H. Harley fala na nossa superdepência das NT, no terreno, da eficaz actuação da FAP. Não só no aspecto operacional, mas também no aspecto logístico (alimentação, correio, evacuação de feridos ou doentes, etc...). Esta era, de facto, a realidade.

A sua ligação ao 25 de Abril é feliz, pois com a crescente evolução tecnológica (mísseis terra-ar) e a intensificação da sua utilização por parte do PAIGC, a actuação da FAP ficava bastante limitada (o que foi notório a partir de Maio de 73) e o recolher a Bissau tornava-se inevitável. Havia que fazer algo. Um desaste de grandes dimensões transformar-se-ia num vexame para nós aos olhos do mundo.
Isto apressou o 25 de Abril (estava previsto para Julho, dizia-se nos bastidores revolucionários).

Um abraço amigo
Manuel Reis


De Hélder V. Sousa

Caro Luís Graça
Quase conseguindo cumprir o prometido, aqui vão alguns, poucos, comentários ao trabalho do Matthew Hurley.

Como disse antes, não devo ter reparado ou entendido que o enviado anteriormente seria para comentar e disso me penitencio.

Ontem, como te disse, fui a Vila Franca de Xira para participar na divulgação pública do "Manifesto da Memória" das gentes da Secção Cultural da União Desportiva Vilafranquense, que foi muito interessante. Disso poderei falar mais tarde, se achares que possa ter algum interesse. Entre a malta do meu tempo (geracional e de actividades), encontrei uma amiga minha, chamada Ana Diogo (aliás, a médica Ana Diogo), que me disse que através dum texto que lhe enviei, publicado no nosso Blogue, ela te reconheceu e disse que tinha sido tua aluna numa formação qualquer e que até se conheciam e se davam bem.

Então, agora em relação ao artigo, começo por dizer que não tenho muita coisa a dizer.

No ponto 5. Esboço dos Capítulos, está indicado o conteúdo que ele pretende desenvolver. Parece-me que a sequência indicada é a óbvia, aquela que resultará duma abordagem com a distanciação necessária para obter o que pretende, estudar em simultâneo a acção da FAP e a acção do PAIGC para contrariar ou tentar contrariar a acção da FAP, e vice-versa.

Parece-me que ele irá pelo caminho que tentará mostrar que entre esses dois parâmetros de observação há muito de inter-relação, muito de causa-efeito. Assim, numa primeira fase a FAP, mesmo com meios limitados (relativamente poucos aparelhos e pouco modernos) será senhora incontestada dos céus da Guiné e isso será de uma importância não só inquestionada como irá obrigar o PAIGC a desenvolver actividades de defesa aérea. Com o desenrolar os tempos foi possível ao PAIGC introduzir equipamentos mais modernos e eficazes, obrigando a FAP a reajustar a sua estratégia, o seu modo de operação.

Sabe-se, sentiu-se e o autor faz eco disso, socorrendo-se inclusivamente do nosso Blogue (e também dos relatos datados do livro do A. Graça de Abreu), que a sombra protectora da FAP foi sempre um factor de grande importância para as operações no terreno, fossem elas de apoio às acções propriamente ditas, em acções de evacuações, de cobertura, até de simples meio de ligação com a rectaguarda, de que a distribuição de correio não era a menos importante. A perturbação do modus operandus da FAP, motivada pela adaptação da estratégia a aplicar para contrariar a tal entrada en cena dos "Strella", coincidindo com um cada vez maior efeito diluidor que progressivamente ia desgastando as NT foi também certamente uma contribuição decisiva para ajudar a criar o ambiente que culminou no 25 de Abril.

Do estudo sistemático comparado das acções de uns e outros o Autor tentará extrair as suas conclusões no sentido de retirar daí as lições que considerará relevantes para os actuais desafiosde insurreições com que se defrontam hoje os Estados Unido e os seus aliados, já que é sua firme convicção que esse estudo contém em si o que de mais paradigmático se poderá obter nesse sentido.

Como conclusão acho que é muito interessante que alguém, com a importância que tem o Autor, considere a nossa guerra, em particular a da Guiné, como uma fonte de ensinamentos e que muito poderão ajudar nos actuais desafios. Bem, talvez não seja de espantar assim tanto, afinal não é isso que temos andado a provar este tempo todo? Que a Guiné foi especial? Que essencialmente se deve a isso (não só mas também) o êxito do nosso Blogue?

Depois é reconfortante (e dá uma merecida pontinha de orgulho) saber que o Autor se socorreu do conteúdo do Blogue para defender alguns pontos de vista e que para além de textos e depoimentos lá contidos também o utilizou como veículo de contacto com elementos relevantes, como o caso do Miguel Pessoa. E que também se socorreu do livro do António Abreu.

Quanto aos pormenores de datas e outras questões técnicas, que eventualmente possam conter falhas, erros ou imprecisões (que não se quer que existam, até para não serem factores comprometedores) não me posso pronunciar por desconhecimento de causa.

Bem Luís, não sei bem se era este tipo de comentário que tinhas em mente, mas foi o que consegui fazer.

Um abraço
Hélder S.


De Alberto Branquinho

COMENTÁRIOS

1 - Pág. 9 do texto em inglês - linha 12:
«...I suspect it involves a complex interplay bettween national policy, military will, tactical considerations, weapons technology, superpower rivalry and insurgent motivation

Digo eu: - It's all right, sir !

Já ouvi falar de tudo isso em qualquer parte... mas poderia explanar (se é que está ciente disso) um pouco mais sobre o que é que entende por national policy?

Era só a política de São Bento e arredores ou algo mais? E sobre o estado da Nação?

É preciso ter em atenção a TENTAÇÃO (norte-) americana average de querer simplificar tudo o que não é States. E, além disso, de ver o mundo à sua imagem e semelhança.

E segue:

By unreaveling some of that complexity, I intend to demonstrate the link between the employment of a shoulder-fired air missile and the collapse of an empire!! (o sublinhado e a exclamação são meus).

Ao menos poderia ter dito que o SIMPLES shouder-fired air missile poderá ter sido um possível CATALIZADOR e não a CAUSA que produziu esse EFEITO. But Portugal is so small, gentlemen... don't you agree?

2 - Gostava muito saber o que pensa de todo este escrito do Matt Hurley o nosso camarada António Graça de Abreu, que entende que os Strela não afectaram a supremacia aérea Portuguesa, pois que comia em Cufar os repolhos (transportados pela FAP) que tinham chegado nesse mesmo dia a Bissau por via aérea.

3 - Mais haveria a dizer, mas o que vai em 1. acima é a parte fundamental.

Alberto Branquinho
__________

Notas de CV:

(*) Miguel Pessoa, ex-Ten Pilav, BA 12, Bissalanca, Guiné (1972/74), actualmente Cor Pilav Reformado

Vd. último poste da série de 27 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4430: O poder aéreo no CTIG: uma pesquisa de Matthew M. Hurley, Ten Cor, USAF: Trad. de Miguel Pessoa (3): Parte III (Bibliografia)

2 comentários:

joão coelho disse...

Sem pretensões, meto a colherada para fazer notar que (salvaguardadas a época e o terreno)no Afeganistão os "Stinger" fornecidos pelos EUA aos "muhajadin" foram decisivos na derrota da União Soviética. Conheço ex-militares russos e ucranianos que hoje trabalham em Portugal que me falam do terror que sentiam quando se deslocavam no território afegão por via aérea, por via dos tais "rebuçados".
A título de curiosidade, os americanos forneceram o material gratuitamente aos "muhajadin" e, quando acabou o conflito, gastaram fortunas para reaver os "stinger".
E mesmo pagando milhões de dólares só conseguiram recuperar uma pequena parte do equipamento..

João Coelho

an disse...

Oh, Branquinho, és capaz de me explicar porque é que os Noratlas, depois de Maio de 1973 e até Abril de 1974 voavam de Bissau para Cufar quase todos os dias, carregados de frescos, frangos, couves, carne, descarregavam para os Allouette 3 e logo tínhamos helicópeteros que partiam de Cufar para o Chugé, Cafal , Cadique, Cacine, Cobumba, Caboxanque, Bedanda para descarregar os frescos. Eu participei em tudo isso. E onde é que eu digo que os Strela não afectaram a operacionalidade das NT? Claro que afectaram. Porquê tanta mentirinha?

Abraço,

António Graça de Abreu