quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Guiné 63/74 - P4786: Fauna & Flora (26): Make Love, Not War, ou as cobras que morreram na guerra a fazer amor (Rui Silva)

1. Mensagem de Rui Silva, ex-Fur Mil da CCAÇ 816, Bissorã, Olossato, Mansoa, 1965/67, com data de 4 de Agosto de 2009:

Caros Luís, Vinhal, Briote e M. Ribeiro:

Recebam um grande abraço mais votos de muita saúde, extensivos a todos os ex-combatentes da Guiné, ainda mais para aqueles que, de algum modo, ainda sofrem de sequelas daquela maldita guerra.

Segue uma pequena história para o capítulo Cobras (na Guiné), que julgo existir no Blogue (*).

Nas minhas memórias “Páginas Negras com Salpicos cor-de-rosa” também há uma pequena referência às cobras (apenas a foto seguinte e respectiva legenda) que deparamos na Guiné.


Numa das patrulhas de rotina feitas ao redor do quartel de Olossato, demos com 2 grandes cobras juntas (julgamos que em pleno acto sexual). Foram abatidas e o seu grande peso obrigou a que fossem arrastadas e puxadas até ao aquartelamento através de improvisadas tiras de ligaduras (gaze) da bolsa do enfermeiro


A história no texto seguinte é contada “à posteriori” com muito pouca margem de erro.

Fazia parte da nossa operacionalidade na zona de Olossato fazermos regularmente patrulhas a uma determinada distância e na periferia do aquartelamento.
Estas patrulhas visavam se o inimigo andaria por ali perto a fazer das dele: abrigos, ciladas, etc.

Certa vez numa patrulha que coube ser feita pelo meu Grupo de Combate e alguns indígenas, ouvem-se os da frente:

- Cuidado estão aqui 2 cobras! - Era o costume. Descansado ninguém andava, principalmente fora do arame farpado e então de vez em quando soava um alerta, normalmente vindo da frente da coluna. Desta vez tratavam-se de duas gigantescas cobras (giboias?) que se atravessaram no caminho da 816.

Logo de seguida ao grito de alerta, uma rajada de G3. Era assim, em tudo que mexia lá ia fogo, e logo de seguida outro arrepio não se fez esperar:

- Cuidado uma fugiu! - Para quem estava metido em capim alto, logo pensou (pensei eu): queres ver que ela vai escolher-me a mim?

Coração acelera e sangue não corre, até que passados alguns (longos) minutos alguém diz:

- Está aqui, Cuidado! - Há última sílaba outra rajada. E pronto a segunda cobra também foi abatida.

Uf! É cada sobressalto.

Então duas cobras encostadinhas uma à outra, a copularem naturalmente, e aparece um grupo de tugas a intrometer-se no acto e mais do que isso a liquidá-las de pronto?

Duplo crime: Não deixar amar e matar.

Bom, para as transportar só de arraste e então da bolsa do enfermeiro saíram tiras de gaze para puxá-las. Sei que havia a necessidade de revezamento no transporte de tão pesados que eram aqueles animais.

Houve mais casos com cobras e até lagartos de grande porte (Iguanas ?).

E quem não se lembra dos sardões (às dezenas) de peito azul a fazerem flexões no emaranhado dos troncos das palmeiras cortados e empilhados no chão.

Muitas das vezes quem nos safava eram os próprios indígenas: quando os víamos brincar com cobras logo víamos que dali não vinha azar, mas quando os víamos fugir e a ficarem brancos, por simpatia toca a correr também.

Então o que se passa, já depois de termos corrido atrás deles sem saber bem porquê. Foge Furriel cobra mata num minuto.

A reacção deles às cobras comandava o nosso procedimento imediato e em conformidade. Aparafusava eu: como ali, a santa ignorância se transformava em douto conhecimento de causa?

A cobra que eles mais temiam era uma comprida (1,5-2 metros) e delgada, aí uns 2-3 centímetros (mamba-negra?).

Uma vez vimos uma pendurada no ramo de uma árvore. Fizemo-la cair a tiro e depois um preto, com cuidado extremo e sem deixar ninguém aproximar-se, chegou perto dela e com a catana cortou-lhe a cabeça e de imediato enterrou-a. Não precisamos de perguntar nada…
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Notas de CV:

(*) Vd. postes com datas de:

9 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4484: Fauna & flora (20): Histórias de grandes serpentes: da jibóia de 7 metros (Paulo Raposo) ao irã-cego (Clara Amante)

9 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4491: Fauna & flora (21): Surucucus (Lachesis muta muta) que cantavam nas praias dos Bijagós (Joaquim Mexia Alves)

11 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4512: Fauna & flora (23): “Por pouco não nos caçamos a nós próprios… em Cufar” (Santos Oliveira)

Vd. último poste da série de 17 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4543: Fauna & Flora (25): Cobras & Bichas (Manuel Maia)

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