quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Guiné 63/74 - P5209: Ser solidário (41): Obrigado, Catarina Furtado, Sra. Embaixadora da Boa Vontade, no Gabu (Torcato Mendonça)

1. Mensagem, com data de 1 de Novembro, do nosso histórico Torcato Mendonça, que vive no Fundão, mas já construiu e habitou bunkers (em Mansambo, sector L1, Bambadinca, Zona Leste, Guiné, 1968/69, no tempo em que foi Alf Mil Art, CART 2339, e em que andava na guerra colonial):

Meus Caríssimos Editores, camaradas e amigos:

Não sei ao certo se viram o documentário que eu acabei de ver, Dar a Vida sem Morrer. (*)

É o segundo que vejo. O primeiro foi há bastante tempo. Este agora visa fundamentalmente dar à mulher Guineense melhores condições de vida, visando reduzir a mortalidade materna e neonatal.

A esperança média de vida é de 47 anos, vive-se com um Euro e Meio por dia e acredita-se, olham as câmaras com os olhos de antigamente, olham-nos fundo, tão fundo e nós arrepiamo-nos por dentro, bem lá no fundo e vemos o hoje, recordando o ontem de há décadas.

Pergunto a mim se este Povo, esta Gente não vive hoje pior. Mas acredita, canta, sorri e do pouco faz a esperança. Com tão pouco, tão pouco e uma Mulher, Catarina Furtado, continua a dar esperança, a contactar directamente no terreno com Técnicos e com o Povo. Eu espero que olvide caciques e certas organizações e beneméritos.

E o Homem Grande falava e as suas palavras eram traduzidas para a língua oficial, o português, e mais uma menina nascia, uma Catarina, e a mãe olhava com o olhar de sempre, o agradecimento nesse olhar e a cesariana feita porque o Hospital de Gabu tem um gerador. Raio, um gerador...e a a mulher dá uma vida sem morrer.

Eu só agradeço à Catarina Furtado (**) e a todos os que partilharam neste projecto, portugueses, guineense e sei lá quem mais.

Sinto aquele Povo de uma maneira muito minha e nem palavras encontro. A escrita que fique para outros mais dotados, mais frios e menos emotivos.

Eu fico agora quieto, vou ficar um pouco só e, á minha maneira, vou estar com eles na penumbra de minha varanda.

Fico por aqui, espero que tenham visto o que eu vi... A Guiné mexe connosco, não mexe?

A cada trinta segundos uma morte com malária? Eu percebi bem? Oxalá - queira Alá, o Deus da maioria daquele Povo - tenha percebido mal!

Não vos aborreço mais, não vou reler e espero que tenham visto o documentário.

Um abração do Torcato


2. Mensagem de hoje, novamente do Torcato:

Assunto - P5204 (sem critica - só dar "razão" à não publicação do e-mail. E daí...) (**)

Era noite de lua cheia. Diz-me o relógio. Vantagens de viver no interior. Mas:

Meu Caro Carlos Vinhal (e Editores mesmo não sabendo da conversa por nós tida) : como vês, eu tinha razão. A idade traz, como tudo na vida, a vantagem e a desvantagem ou o bem e mal...

Sempre apareceu um texto sobre o tema, uma reflexão, um chamar de atenção e, qual cereja em cima do bolo, Beethoven e Sonata Moonlight.

Eu, se estivesse na varanda a varrer fantasmas, como (te ou vos) escrevi, preferia a 5ª Sinfonia. Mais chama, melhor no aplacar da raiva então sentida. Raiva? Não! Ia na 9ª, isso, a nona.

Pensava então nas mulheres, nos meninos, na doença, na carência, no esforço da Catarina Furtado e tanta gente de bem a aplacar a ignomínia...e pensava também nos "Senhores e dos seus Amores" a virem a Lisboa pôr o botox, tratar do calo ou de outro mal e, porque não, a Paris, La Belle, ou logo ali a Dakar.

Ah, eu vi através destes documentários e não esqueço. Questiono-me: Independência para tanta dependência e traição - palavra talvez forte demais - antes negação... aos ideais dos que lutaram pela Liberdade e muitos por ela deram a vida.

Pois é, camarada e amigo no singular ou com sss no plural, pois é...

Por uma Guiné melhor, por um Mundo mais justo e fraterno.

Um abração para ti e para todos do Torcato (acabei por fazer cc)

3. Comentário de L.G.:

Por ti, pelos guineenses, nossos irmãos e amigos, sobretudo por essas Extraordinárias e Heróicas Mulheres Guineenses, por todos nós, amigos e camaradas da Guiné,pela Catarina Furtado e tantos outros homens e mulheres de boa vontade, o teu mail deveria ter sido automatica, instantaneamente publicado... Just in time... Mas a gente ainda não tem essa capacidade, técnica e humana... Os mails ficam na fila de espera, na linha de edição, à espera de um editor de serviço...

José, não é tarde. E eu fico sensibilizado por, dentro da nossa Tabanca Grande, haver pessoas como tu e o António Matos, e tantos outros, capazes de ter tempo e sensibilidade para escutar os outros, que sofrem, que estão doentes, que precisam de ajuda, lá nessa terra vermelha que também é um pouco nossa, pelas memórias e afectos, e para ser solidários, quanto mais não seja através da escrita, do testemunho, da indignação...

Num mundo, numa sociedade (na Europa, em Portugal, na Guiné-Bissau) onde impera o individualisno, o cinismo, a infiderença, o eu-eu-eu-e-o-resto-que-se-foda, eu só posso, José, enviar-te daqui um quebra-costelas valente, daqueles que são mesmo para consertar os ossos e mexer com as nossas emoções e os nossos neurónios... Também estive a ver o programa com o meu filho, João, médico, que vai à Guiné em Dezembro, quinze dias, dedicando uma semana à assistência médica da população de Iemberém. Temos a obrigação de passar o melhor dos nossos valores (e ainda temos alguns!) aos nossos filhos e netos... Um Alfa Bravo. Luís

_________

Notas de L.G.:

(*) Vd. poste de 29 de Outubro de 2009 > Guiné 63/74 – P5181: Ser solidário (40): Dar a vida sem morrer, Domingo, 1 de Novembro, na RTP1, às 21h30 (Torcato Mendonça)

(**) Embaixadora da Boa Vontade do Fundo das Nações Unidas para a População (UNFPA)
Vd. UNPF > 24 June 2009 > Goodwill Ambassador Catarina Furtado Finds Progress on Maternal Health during her Visit to Guinea-Bissau

Vd. também Africanidade > 2/6/2009 > Catarina Furtado, embaixadora da Boa Vontade, visita a Guiné-Bissau

(***) Vd. poste de 3 de Novembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5204: Controvérsias (34): Os guineenses têm uma esperança de vida de 47 anos! (António Matos)

2 comentários:

Anónimo disse...

Caro Luis
Eu é que disse ser desnecessário publicar o meu e-mail. Foi escrito com a emoção á flor da pele. Mais tarde enviei outro ou outros e falei pelo móvel com o Vinhal (uma hora e tal até esgotar bateria). Quanto á publicação seria desnecessária, outro escreveria. O e-mail de hoje era a continuação da conversa inacabada...o Vinhal se ler ri-se.
O A.Matos escreveu e bem,-(um obrigado a ele)- não faço qualquer critica só uma constatação:Vinhal eu tinha a razão dada pela idade.
Abraço fraterno a todos do Torcato

António Tavares disse...

Caro Torcato,

Li a tua prosa que tão bem retrata o que vimos na RTP1.
O bébé de 710 gramas...
A mãe menina de 13 Anos...
O abandono dos filhos pelo pai...
E tantas outras misérias humanas num País onde passamos uns anos das nossas vidas.
Os Guinéus não mereciam tanta crueldade!.