terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Guiné 63/74 - P5677: Núcleo Museológico Memória de Guiledje (6): Júlia Neto em Bissau, com a família do Dauda Viegas (Pepito)























Guiné-Bissau > Bissau >  18 de Janeiro de 2010 > As primeiras da Júlia Neto, com destaque para a sua emocionada e emocionante visita à família do Dauda Viegas, já falecido, e que era uma criança que o José Neto tratava com um verdadeiro amor de pai.. O Dauda foi o filho  (adoptivo) que ele nunca teve... A Júlia e o José Neto tiveram 3 filhas... Todas elas, de resto, reconhecem o amor que o pai tinha por Guileje... Recorde-se que o nosso Zé Neto pertenceu à CART 1613 (Guileje, 1967/68). Amanhã a Guiné-Bissau vai fazer-lhe uma pequena homenagem, com a inauguração da capela (reconstruída) de Guileje... A Júlia, membro recente da nossa Tabanca Grande, vai representar-nos também nesta singela homenagem ao Zé e a os militares portugueses que viveram, lutarem e morreram (alguns) em Guileje.

Fotos: © Pepito / AD - Acção para o Dsenvolvimento (2009). Direitos reservados.

1. Mensagem enviada onem pelo nosso amigo Pepito, dando-nos notícia do 1º dia de estadia, em Bissau,  da nossa amiga Júlia Neto, viúva do Cap Art Ref José Neto (1929-2007), convivada pela AD - Acção para o Desenvolvimento para a cerimómia de inauguração do Núcleo Museológico Memória de Guiledje

Amigo Luís


Chegou esta madrugada a Bissau, Júlia Neto, esposa do nosso capitão José Neto.

É para nós uma grande alegria acolhê-la nesta terra que pertenceu ao coração do marido.

É uma pessoa extraordinária. Simples e muito humana. Parece que já conhecia a Guiné-Bissau há muitos anos, e é bem capaz disso, pelos relatos e escritos do Capitão Neto.

Esteve esta manhã num encontro muito emotivo com a Djenabu Fati, mulher do famoso Dauda Viegas, criança que ele adoptou em Guiledje e a quem ele sempre considerou como um filho. Morreu recentemente e deixou três filhas, a Paula de 12 anos, a Segunda de 10 e a Fátima de 8, "netinhas" da Júlia Neto.

Trouxe-lhes recordações formidáveis, desde roupa, calçado, material escolar e brinquedos.

Confesso que me emociono com facilidade, pelo que tive que "fugir" para não assistir aos momentos comoventes de ternura recíproca.

A Paula já vai tratar do Bilhete de Identidade para ir passar férias no Algarve com a família Neto (assim as autoridades portuguesas não criem os entraves habituais de visto... e que nada contribuem para a amizade natural e espontânea entre portugueses e guineenses).

Depois visitou algumas instalações da AD, como o centro de Animação Infantil, o Estídio de Gravação BISSOM e a Escola de Artes e Ofícios.

Acabou por almoçar em família, na escola de Hotelaria da AD, com o pessoal da nossa ONG.

Amanhã às 8h00 partimos para Guiledje e na 4ª Feira será o grande dia da inauguração do Museu e da Capela.

Abraço

pepito
 
_____________
 
Notas de L.G.:

(*) Vd. poste anterior desta série: 18 de Janeiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5671: Núcleo Museológico Memória de Guiledje (5): Recordando o brilhante improviso de Luís Moita, na sessão de encerramento do Simpósio Internacional de Guileje, em 7 de Março de 2008 

(**) Vd. poste de 21 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDLXVII: Memórias de Guileje (1967/68) (Zé Neto) (3): Dauda, o Viegas



Dauda, o Viegas


Como já escrevi, eram todos de etnia fula, de raça negra, com excepção de um menino mestiço.


Este menino, na altura com onze, doze meses de idade, era filho da Sona, uma jovem de Cacine, comprada pelo alfaiate de Guileje para ser a sua terceira esposa.


Tinha o nome de Dauda, mas era tratado por todos nós por Viegas, apelido do pai, capitão que comandara a companhia de Cacine. Ainda hoje, quando revejo as dezenas de fotografias que fiz do garoto, acho que poderíamos anteceder Silva a Viegas…


Foi pela minha mão que o miúdo deu os primeiros passos. E foi por ele que, suponho, arrisquei a vida quando, num ataque bem apontado, as morteiradas atingiram a zona da cozinha, lenheiro e depósito de géneros.


Ao correr para o abrigo ouvi o choro duma criança. O Viegas tinha jantado connosco, como de costume, e tive a quase certeza de que era ele. Retrocedi e apanhei-o junto ao coberto que servia de messe de sargentos. Arrastei-o até à entrada do abrigo e, uns instantes depois, uma granada explodiu no monte de lenha a menos de quatro metros de distância, projectando cavacas em todas as direcções.


Dos meus troféus faz parte a empenagem que sobrou dessa granada, que nunca limpei, e que a minha mulher resmunga que só serve para sujar o móvel onde está. Não é que suje, mas também nunca me apeteceu contar-lhe a história desse bocado de ferro com alhetas e terra empastada. (...)

1 comentário:

Unknown disse...

É com muita emoção que leio o relato do Pepito (perdoe-me a familiaridade) e vejo as fotos da minha mãe nessa estadia memorável na Guiné. Com emoção e uma pontinha de inveja, devo confessar.
Estas experiências, e estes relatos acerca do meu pai, saber dele detalhes que não conhecíamos, conhecê-lo através dos olhos dos outros, são de repente muito perturbadores. Perturbadores, mas agradáveis. Contribuem para o contínuo processo de actualização do "retrato" que a nossa memória selectivamente faz daqueles que nos deixaram.
Espero que esta viagem seja a primeira, e que outras se lhe sigam; que possamos lá ir, a mãe e nós as irmâs, com os filhos. Que encontremos forma de contribuir e cooperar com a AD ou outras entidades, seguindo o exemplo do meu pai e do seu amor por essa terra.
Muito obrigada pelo que nos proporcionaram. Até breve,
Maria Eugénia Neto
(segunda filha do Zé Neto)