segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Guiné 63/74 - P5792: Blogoterapia (145): Como te compreendo, amigo António Rosinha (José Brás)

1. Comentário do José Brás ao último poste do António Rosinha (*):
 Luís: O Rosinha já me havia enviado este texto antes, e eu havia também respondido com o texto que junto mais abaixo.
É um caso curioso, este, porque começou a nossa troca de correspondência no blogue, pareceu-me com uma certa animosidade negativa e com  o seu desenvolvimento, na base do respeito pelo humano e pelas diferenças, temos feito uma excelente aproximação.
Parece-me um homem muito sério que carrega legitimamente uma grande lástima pelo que aconteceu no desfazer do Império.
No texto que lhe enviei, juntei outro que nem sei se serve para o blogue, porque tem 12 páginas e sai do tema restrito da guerra colonial e da Guiné para tentar perceber melhor o Regime, a Colonização e a chamada Descolonização.
Se achares bem posso enviar-te uma cópia e tu verás se vale a pena.
Um abraço
José Brás


2. Texto do José Brás:

António, meu amigo:
Acredita que não é demagogia dizer-te "como te compreendo, amigo". E não to digo porque te queixes, porque isso ainda não vi que fizesses, mas porque apontando o dedo, denuncias uma situação trágica na sociedade portuguesa, aqui na metrópole, e lá, em Angola, Moçambique e Guiné.
E o não te queixares é já a denúncia de uma enorme dignidade, complementada, evidentemente pelo uso do direito à indignação e à incompreensão.

De modo curto, poderia dizer-te, utilizando o teu sub-título ENTÃO COMO FICAMOS? GUERRA OU ABANDONO?, que quanto a mim a questão não está aí mas é anterior e a sua não solução, anterior, precipitou tudo.

Evidentemente, dá para ver que nem de perto nem de longe aceito ou aceitei alguma vez, desde que me lembro de botar pensamento, a Salazar.

Contudo, face ao horror espalhado pela UPA no Norte de Angola, nada havia a fazer no imediato, senão enviar tropas que travassem o verdadeiro massacre que a UPA fazia e pretendia continuar a fazer porque não tinha como programa político senão o terror e o ódio racista servidos por superstições como sabemos.

Travado esse massacre, Salazar estava ainda muito a tempo para dar indícios de possibilidade de negociação.

É claro amigo, a questão era e é o petróleo, os diamantes e outros recursos espantosos que se encontram naquela terra, acxrescentando-se que também a luta pela hegemonia territorial global entre a URSS e os EEUU.

E acho que é isso mesmo que fez de Portugal um simples peão que suportou os prejuízos e que na hora de segurar e de dar a volta às coisas, não tinha a mínima força para o fazer.
E a verdade é que este povo que foi expulso daquela terra que amava, muita falta fez ao novo País, dizendo eu isto sem a mínima intenção neo-colonial, mas na parceria que poderia ter sido exemplar.

Acabo de escrever um trabalho de 12 páginas precisamente sobre esse assunto, um pouco motivado pela nossa anterior correspondência no blogue, e também na questão colocada pela amiga Filomena e a minha resposta já publicada, como sabes. (**)

Ainda nem sei se o irei enviar ao blogue, pelo seu tamanho e pela matéria abordada que extravasa largamente a nossa questão Guiné.

Em parte, tal trabalho, poderia ser uma resposta ao teu desafio. ´Não o é porque não há aqui necessidades de respostas nem de desafios, e porque as questões suscitadas pelo drama dos retornados são muito mais vastas e complexas.

Aqui, entre nós, há apenas lugar para a amizade e para a compreensão. Ainda assim, envio-to, solicitando que por enquanto fique entre nós, sobretudo porque utilizo dois quadros que retirei do trabalho de outro a quem terei de dar contas.

Um forte abraço

José Brás

3 comentários:

JD disse...

Zé Brás,
Sublinho duas passagens: Salazar teve oportunidade para arrepiar caminho através da negociação, quer antes, quer depois do inicio das hostilidades; os portugueses fizeram falta às novas nacionalidades.
Quanto ao primeiro aspecto, já referi num esboço biográfico sobre Salazar, aqui publicado, que o "ódio" internacional concitado, ficou a dever-se à sobranceria do governante relativamente às condições da Carta das Nações Unidas. Afinal, Portugal promoveu um inegável desenvolvimento sócio-económico, a par da integração de uma cada vez maior franja de prêtos que ascendiam à classe média - as condições da carta, e esse esforço não relevou por força do teimoso despique político. Quer dizer, o Estado Novo não acreditou que os colonizados estivessem reconhecidos pela nossa presença em África, antes nos regeitassem qualquer vinculo através de referendo.
Quanto ao segundo, antes de se dizer que os portugueses foram expulsos, se calhar, deveremos admitir que foram abandonados pelo novo governo e pelas FA. Na verdade, nem o MFA se revelou sensato a propósito,nem o Spínola, autor de uma proposta federativa, se impôs, no sentido de exigir das FA uma atitude firme em África, bem como o respeito preciso ao estabelecimento de negociações com os emancipalistas, principalmente chamando à pedra os dirigentes comunistas e socialistas adeptos da entrega incondicional.
Hoje, sabemos como essa displicência foi responsável pela debandada de brancos, pelo extremar de posições e pelas guerras civis, pelo claudicar de estruturas, e pelos imensos estragos causados naqueles territórios que ainda persistem. E também não estou com piquinhas neo-coloniais. É que ninguém estava preparado e, face ao desmobilizar português, os movimentos preocuparam-se em marcar terrenos.
Num clik, lá se foi a obra civilizadora dos portugueses, deixando aqueles povos à mercê dos abutres internacionais.
Abraços fraternos
JD

Anónimo disse...

Caro José Manuel
Tenho muita pena por não estar de acordo contigo nesta matéria, o que, de resto, não é nenhum drama, se o respeito pelo que pensa cada um, estiver acima da discussão do drama, esse sim, desgraçadamente importante.
E não é que eu discode de que o MFA e os políticos lavaram as mãos sobre o drama.
O que eu digo é que não tinham a mínima capacidade para influenciar, primeiro por culpa do regime que desprezou o caminhar da história e prolongou a guerra, segundo, porque o bolo era demasiado grande e apetitoso do ponto de vista dos recursos e do ponto de vista da hegemonia que se disputava entre russos e americanos.
Enviei hoje mesmo um texto mais longo sobre esta problemática e ainda não sei se saie se sair como sairá.
No resto, o lamento pelos prejuizos de milhares de portugueses e...a nossa amizade
José Brás

JD disse...

Zé Brás,
Referi-me a dois momentos históricos distintos:
O 1º., desde 1953, aquando da alteração à Lei Constitucional para admissão na ONU, até ao dealbar dos anos sessenta, quando se regista e situação de guerra; o 2º. em 1974.
Em nenhum período se assistiu a acções sérias para preservar elos de ligação pacífica entre Portugal e as colónias, desenvolvendo-as,antes, faz-se finca-pé da universalidade lusíada, por um lado; e por outro, adoptando a ideia antípoda de entregar as colónias tão rápido quanto possível, mas querendo influenciar os novos regimes políticos.
Eu sei que ambas as atitudes derivaram de, inicialmente, vivermos sob um regime autocrático, e em 25/4, não estávamos, a tropa não estava, os civis não estavam, preparados para construir e viver a democracia.
Um abraço amigo.
JD