sábado, 29 de maio de 2010

Guiné 63/74 - P6489: As Nossas Queridas Enfermeiras Pára-quedistas (15): A minha homenagem à enfermeira pára-quedista Ivone Reis que ficou em Contabane a cuidar dos feridos graves (Carlos Nery)

Mensagem do ex-Cap Mil  Carlos Nery, Comandante da CCAÇ 2382, Buba,  1968/70, a propósito do seu comentário no Poste P5971:

A minha homenagem à enfermeira pára-quedista Ivone Reis que ficou em Contabane a cuidar dos feridos graves e pelas fotos que tirou antes de o helicóptero descer

É talvez difícil de explicar o importante que era para nós, combatentes, a chegada de uma mulher ao local de combate onde sofrêramos baixas e estávamos ainda sob o efeito dessa traumatizante experiência. Senti-o intensamente em Contabane (*), na tabanca destruída por um dos ataques mais violentos da Guerra da Guiné.

A enfermeira pára-quedista Ivone quando se me dirigiu, tenho de o confessar, era a Pausa, o Lenitivo, a Mãe distante, a Noiva, a Mulher... Que sei eu? A sua decisão em ficar connosco, contrariando o estabelecido, enquanto os helicópteros levavam a Aldeia Formosa os feridos ligeiros, prestando os primeiros cuidados aos feridos graves que, em seguida, seriam levados para Bissau, foi de uma importância enorme para afastar a nossa angústia, para pôr uma pausa no nosso desespero!

Trocámos umas palavras, disse-lhe que aquela tinha sido a "minha noite mais longa"... Ouvi-lhe palavras apaziguadoras, que ainda guardo no meu íntimo.

Passadas semanas, já em Buba, recebo uma cartinha sua referindo essa "noite longa" acompanhada por duas fotos da tabanca destruída, tiradas por ela do helicóptero. Não serão muito bem tiradas mas são o objecto mais precioso das minhas recordações da Guiné.

Meu Deus, não sei se retribuí como devia essa carinhosa atenção!

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Olhando para as duas fotos oferecidas pela Enfermeira Ivone, tenho dificuldade em perceber de que ângulo foram feitas. É perfeitamente visível, nas duas, a Mesquita. Era a única construção feita com alguma solidez em Contabane. Dentro dela se refugiaram, durante o ataque, muitos cívis e alguns militares


Nesta foto, vêem-se algumas casas poupadas ao incêndio. Para cá da Mesquita está um abrigo em princípio de construção. O solo foi cavado e, junto, estão já colocados alguns troncos de palmeira. Creio que este ponto de vista é o do lado oposto ao da instalação inimiga e, portanto, menos atingido. Julgo que o lado Norte/Nordeste da tabanca. O caminho bem marcado que se vê à direita, junto da cabeça do piloto, será o que vai em direcção ao Saltinho. Mais abaixo, do lado esquerdo da foto, para cá do abrigo em início de construção, vê-se perfeitamente uma das fiadas de arame farpado; havia duas. Esta creio que foi a lançada pela minha companhia. A outra, lançada pela 5ª. Companhia de Comandos, parece estar logo atrás, embora não tão fácil de ver, por estar mais escurecida


Esta segunda foto foi tirada de mais perto e de um ângulo um pouco diferente. É perfeitamente visível o que restou de diversas casas consumidas pelo fogo. Dispersos pela tabanca vêem-se militares e cívis examinando as consequências do ataque.

Nas duas fotos parece perpassar um ambiente de perplexidade e de angústia. Aquela Contabane plena de vida e de simpatia tinha sido ferida de morte. Porém, a Companhia de "periquitos" tinha batido o pé a Nino e aos seus morteiros e canhões sem recuo. Haveria tempo para outros recontros com o Comandante lendário.
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Nota de L.G.:

(*) Vd. poste de 27 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6479: Histórias de Carlos Nery, ex-Cap Mil da CCAÇ 2382 (2): Noite longa em Contabane

Vd. comentário de Carlos Nery no poste de 11 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P5971: As Nossas Queridas Enfermeiras Pára-quedistas (12): Ivone Reis, a primeira Enfermeira Pára-quedista que conheci (Rosa Serra)

Vd. último poste da série de 29 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6487: As Nossas Queridas Enfermeiras Pára-quedistas (14): As primeiras mulheres portuguesas equiparadas a militares (2): Maria Arminda (Rosa Serra)

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