terça-feira, 6 de julho de 2010

Guiné 63/74 - P6678: Controvérsias (91): Mário Cláudio e o debate, Açordas! (José Brás)

1. Mensagem do nosso camarada José Brás (ex-Fur Mil, CCAÇ 1622, Aldeia Formosa e Mejo, 1966/68), com data de 5 de Julho de 2010:

Carlos, meu amigo
Podes editar ou não, sendo que é grande para comentário

Um abraço
José Brás


Mário Cláudio e o debate:

Açordas!


Isto é que vai aqui uma açorda!

E começando assim, repetindo uma comezinha fala de "malucos do riso" e de um personagem popularizado (ou popularunchizado?) por actor de mais recursos do que, alcandorados em balofa erudição, alguns pensavam, começando assim, corro o risco de também popularuncho, ou de gato escondido com rabo de fora.

Mas lembrei-me do dito e pareceu-me bom como bengala, disso pedindo desculpa a eruditos e não eruditos, pelo abuso.

E para que preciso eu de bengala, afinal?

E antes ainda, e antes ainda pergunto a mim próprio porque diabo hei-de eu, em vez de me deixar quieto no meu canto, estar a meter colher em tal açorda, deitando mesmo a mão à bengala, seguramente porque sinta que dela necessito na circunstância, nem que seja para encontrar espaço e tempo de entrada no testo de barro, no alho, muito, nos coentros e outras ervas.

De Mário Cláudio, nem sei bem porquê, posso dizer quase, que nunca li nada, se disser que nada é o muito pouco e atravessado, lido mais com os olhos do que com a alma (quando leio, leio mais com a alma, o que é muito perigoso).

E é muito mau que assim seja, para mim, claro, porque indiciador de ligeirezas minhas e incapacidades de entender grandezas.

Li agora o texto que deu tempero a este luxo de debate e, peço desculpa a quem fala de densidades, porque digo que tal não achei e, sim, um texto limpo e claro, pronto a ser consumido sem grandes exigências de entendimento, ficção sobre um real muito conhecido, tivesse sido ou não, esse real, já em si, muito ficção. Marcado, certamente, e contra isso não haverá nada a dizer senão contrastar com outras marcas.

Quer dizer. A ficção escorre aqui, a meu ver, apenas pela forma como se juntam as palavras e se criam as imagens, apenas pelo estilo narrativo, naturalmente a milhas dos códigos do relatório a que nos habituámos muito.

Quase posso garantir que conheci o personagem em Tavira, mítico, cara de menino perdido, parecendo sempre longe dali, duro com seus instruendos, não mais que outros que por lá campeavam, amigos da pinga, violentos, sonhando heroísmos em África, confessadamente, alguns, admiradores de Hitler, fazendo pagar à maralha o preço de tão azarenta data de nascimento.

E reencontrei-o também na Guiné, onde, que me conste, não teve oportunidade de fazer das suas, se é que as fez realmente quilómetros mais abaixo no mapa de África. Aliás, nem ele, nem outros supostos heróis que nos haviam feito a vida negra no Algarve, alegadamente para nos endurecer e preparar na perspectiva do que nos esperaria.

Do que diz Mário Cláudio, e de como o diz, acabou por parecer que não falava da andorinha mas da Primavera.

E o clamor se elevou! Como é hábito, salutar, acho eu.

Com ou sem razão? Com ou sem razões (que não é a mesma coisa)?

Pessoalmente, desculpem-me a palavra honrada, tendo em conta o que somos como grupo (e somos, naturalmente, um pouco do que fomos), apesar da heterogenidade que compõe o ramalhete, só poderia dar bernarda.

Alguns dos comentários, em minha opinião, indo mais longe do que provavelmente Mário Cláudio quis ir, acrescentaram a pimenta.

De facto, pese embora a ocorrência de casos extremos e desvairados, do que sei, do exército português não se poderá dizer que se excedeu em desumanidades para além daquelas inevitáveis em guerras. Aceito que, provavelmente, ocupado com a realidade isolada de Medjo e do Corredor, sei muito menos do que um jurista em Bissau. E a melhor prova disso foi e é a possibilidade do abraço, acabada a guerra; são as declarações dos do outro lado sobre a bravura combatente e a moderação do gesto da tropa portuguesa, quando no acto de aprisionar.

Creio ser insuspeito, dizendo o que digo aqui, ou, pelo menos, não mais suspeito que todos os que abrem a boca para falar disto. Eu perguntaria se conhecem outra guerra deste tipo, com outros intervenientes, que na ressaca das independências, tenha sido possível juntar os dois lados sem ódios nem raivas, como aconteceu connosco e ainda acontece hoje, alguns achando que exageradamente, até.

Excessiva foi a postura do regime que se fechou à apropriada leitura da história e alongou o conflito, criando impossibilidades aos que lutavam dos dois lados. E nisso nos diferenciamos claramente de outras experiências, porque também os intelectuais portugueses não esperaram tempos para se pronunciarem contra a guerra, contra a guerra tendo estado sempre e o disseram abertamente, talvez que com isso se lhes enublando a visão sobre os que lutavam e aguentavam bravamente na crença de dar tempo a políticos para resolverem politicando, talvez olhando uma árvore e achando que era bosque.

Uma coisa não se pode negar. Este texto desatou uma boa e elevada discussão, quer do ponto de vista da afirmação de posições, quer do ponto de vista, mesmo, da construção da comunicação, e eu me espanto que se considere isso negativo.

Quanto ao fazer-se ou não ficção na Tabanca, quem é contra que invoque o artigo que nos estatutos o definem, claramente mostrando entender diferenças entre ficção e realidade.

E pronto, tenho dito!
Abraços
José Brás
__________

Notas de CV:

(*) Vd. poste de 20 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6436: Bibliografia de uma guerra (56): Vindimas no Capim, de José Brás - Maneira mais cómoda para obter esta obra

Vd. último poste da série de 5 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6677: Controvérsias (90): Guerra colonial: os Garcez que (nunca) existiram (Belarmino Sardinha)

2 comentários:

Zé Teixeira disse...

Zé Brás.
pelo que li, suponho que estiveste em Medjo.
Ora o Pepito, propõe que a Tabanca Pequena arranque com um projecto para a contrução de um poço nesta Tabanca, com o objectivo de se conseguir água potável para servir a população e fomentar a agricultura de leguminosas.
Assim sendo pedia-te para me dares alguma informação sobre esta Tabanca, onde iam buscar água e se tiverers fotos agradecia que mas facultasses, para melhor dinamizar o projecto.

abraço fraterno
Zé teixeira

Anónimo disse...

José Brás

É sempre perigoso "fulanizar", mas se a personagem ficcionada se baseou na pessoa que eu julgo que tu queres mencionar (sem a identificares) e que eu também conheci na Guiné, aí e então tinha um comportamento discreto e cordato.
Conversando há já muitos anos sobre os acontecimentos de Angola nos tempos da UPA, alguém me referiu que muita coisa lhe foi atribuida sem que (pessoalmente) tivesse estado envolvido.
Por outro lado, foi-me dito, também, que, mais que comandar tropas a caminho do e no norte de Angola, terá sido "arrastado" pela multidão de civis que se deslocaram das terras mais a sul.
Finalmente, havia necessidade de heróis...
Alberto Branquinho