quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Guiné 63/74 - P7093: (De) Caras (4): Eu também estive lá (Carlos Fernandes, ex-1º Cabo Pára-Quedista, CCP 122/BCP 12, 1971/74)



Guiné > Região de Tombali > Aldeia Formosa > CCP 122 / BCP 12 > 2 de Abril de 1972 > O 1º Cabo Pára-quedista Carlos Fernandes, apontador de MG 42, fotografado com um casal feito prisioneiro: em primeiro plano, a criança,  filha do casal, completamente nua, levada pela mão do Carlos; em segundo plano, a mulher, de peito desnudo e com um simples pano à cinta, entre dois páras, vendo-se ainda o ombro do homem, à direita... Um foto, de guerra,  que capta um momento de grande expressão dramática, e que tem um real valor documental.  Quem terá sido o fotógrafo ? Seguramente um camarada do Carlos, da CCP 122, que "também estava lá"...

Foto: © Carlos Fernandes (2010) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados.


1. Mensagem do ex-1º Cabo pára-quedista, Carlos Fernandes, CCP 122 / BCP (Bissalanca, BA 12, 1971/74), remetida em 30 de Setembro último:

Assunto: Eu estive lá também

Luis Graça:

Eu,  Fernandes,  ex-Pára da 122, estive lá na Guiné entre Novembro de 71 a Agosto de 74 e estive no grupo do Marcelino da Mata entre Janeiro de 74 até eu vir embora,  muito depois do 25 de Abril.

A minha arma na Guiné foi a MG 42 sempre, desde o início da comissão até ao 25 de Abril, onde fui condecorado com a Cruz de Guerra 4ª classe pelo Marcelino. Só a recebi em 2006 em Chelas. Também recebi a Medalha das Campanhas da Guiné.

Mas antes estive em Moçambique,  em Nacala,  no BCP32, entre Março de 1970 a Janeiro de 71. Participei em várias operações,  a melhor foi a Nó Górdio, em que a minha Companhia,  a 1ª , apanhou para cima de 27 mil kilos de armamento junto ao Rio Rovuma.

Tomámos a Base Moçambique perto de Nangulolo, onde nessa altura morreu o tal Capitão das Chaimites e o pessoal que ia dentro dela, pois o Capitão, burro, colocou a Chaimite a abrir caminho, como arrebenta- minas. Eu ia nessa coluna.

Junto duas fotos do antigo,  com a MG ao ombro,  em Aldeia Formosa,  e outra tirada o ano passado.  Estou reformado. O meu posto foi 1º Cabo Pára-quedista. Vivo aqui na Ilha da Madeira por opção.

Meu contato é canico2009@hotmail.com

Irei dando noticias. Tenho fotos de alguns tempos e bons.

Um abraço amigo a todo o pessoal deste blog dos amigos da Guiné

Carlos Fernandes
TM 937743321

2. Comentário de L.G.:

Obrigado, Carlos, pelas tuas notícias e pelo abraço que mandas a todo o pessoal do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Tomei boa nota do teu interesse em continuar a dar-nos notícias tuas e mandar-nos fotos do teu álbum. Não foste, porém, explícito na manifestação do teu eventual interesse em fazer parte da nossa Tabanca Grande e subscrever as nossas regras de sã convívio e de boa ética. Presumo que sim, e nessa medida serás bem vindo, na tua qualidade de antigo combatente no TO da Guiné.

Sei que eras conhecido como o Fernandes da MG 42, e que terás pertencido ao 4º Gr Comb da CCP 122. Espero que encontres malta da tua subunidade, desse tempo.

Se bem leste e compreendeste as nossas regras, sabes que não fazemos juízos de valor sobre nenhum camarada, em termos de comportamento operacional. A missão fundamental do nosso blogue é criar condições, de liberdade intelectual e de conforto psicológico,  parar partilharmos uns com os outros, e com os demais  leitores que nos seguem de muitas partes do mundo (de Portugal, Guiné-Bissau, Cabo Verde, Brasil, Estados Unidos, etc.), as histórias das nossas vidas no TO da Guiné, entre 1963 e 1974.

Não preciso, pois, de lembrar-te que não gostamos de chamar "burro" a ninguém, mesmo quando camaradas nossos tenham feito eventualmente asneiras fatais, no teatro de guerra, como terá sido o caso do tal capitão das Chaimites em Moçambique que tu não identificas (e ainda bem).

Sobre a foto com os prisioneiros, que publicamos acima, devo dizer-te que é forte e, para alguns dos nossos leitores, até poderá ser chocante, podendo ferir eventuais susceptibilidades e sensibilidades. Mas não vale a pena ignorar, escamotear ou branquear a realidade da guerra que nos tocou em sorte. Não quero que essa foto se vire contra ninguém: nem contra ti nem contra nós, os antigos combatentes portugueses, os pára-quedistas. Nem contra nós nem contra o PAIGC,  o inimigo de ontem... Também a minha CCAÇ 12 fez prisioneiros, mulheres, crianças e idosos, em estado andrajoso, miserável, as crianças nuas e subnutridas... Essa foto teve o condão de mexer comigo e com algumas das memórias mais dolorosas da guerra...

Se quiseres e puderes, conta-nos pormenores dessa operação realizada na região de Aldeia Formosa, em Abril de 1972, as circunstâncias em que foi apanhada a criança e os seus pais, o destino que foi dado aos prisioneiros, etc... Muitos dos nossos camaradas e amigos gostariam, muito provavelmente, de conhecer mais pormenores desses acontecimentos de que foste actor e testemunha. E, já agora, lembras-te de quem foi o autor da foto ?

Enfim, feita a tua apresentação sumária como ex-1º Cabo Pára, falta-te contar pelo menos uma história da tua/nossa guerra, como mandam as nossas regras. Sobre o teu BCP 12, já temos no nosso blogue mais de 60 referências. E sobre a tua CCP 122 há já uma dezena de postes com referências. Um Alfa Bravo (abraço) para ti em meu nome e dos demais co-editores do blogue. Luís Graça

_______________

Nota de L.G.:

Último poste desta série > 30 de Setembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7058: (De) Caras (3): A emboscada em Malandim e a descontrolada reacção do 1º Cabo Costa, na noite de 3 de Agosto de 1969:Branco assassino, mataste uma mulher (Beja Santos)

7 comentários:

Unknown disse...

Comentário a um comentário de Luís Graça.
Mas em primeiro, cumprimentar o amigo Carlos Fernandes por ter vindo ao blogue e naturalmente prosseguir por cá e de peito descoberto como pareceu transparecer !!!
De seguida; apraz-me as palavras escritas de Luís Graça, no 5º parágrafo do seu comentário.
Na realidade teremos que pesar sempre o que fazemos, dizemos e neste caso publicamos.
Mas se este Blogue pretende para além da sua vertente cultural, epicentro de amizades, ponto de escape de sentimentos, de tertúlia, etç, tambem me parece pretender ser, digamos, um bloco de notas de acontecimentos, que fazem ou poderão vir a fazer parte da história da guerra colonial.
Se assim é, devemos falar e mostrar (mostrar)os factos, com clareza, com a maior precisão possivel,como qualquer contribuição neste campo exige.
Claro, tendo em consideração outras sensibilidades, não será ético optar por meias-verdades ou omitir parte dos variados aspectos.

Unknown disse...

Continuação -- comentário a um comentário de Luís Graça.

Na realidade para as pessoas intelectualmente e moralmente honestas, havendo sómente a variante de um maior ou menor conhecimento da história recente de Portugal, não se trata de estar contra o PAIGC (vd Luís Graça)ou contra nós na altura da guerra colonial, trata-se de ser verdadeiro dentro das nossas limitações e conhecimentos.
Não se trata de jogos florais, trata-se de uma guerra que ceifou muitas vidas nas colónias (dum lado e do outro)e em Portugal afectou muitas vidas dos que lutavam contra a sua existência.
Obrigado Luís e desculpa por me ter permitido comentar, um comentário editorial do Post do amigo Carlos Fernandes.

Carlos Filipe
ex CCS BCAÇ3872 Galomaro

Anónimo disse...

Caro Carlos Fernandes,

Eu também participei na Nó Górdio, era Fur. Milº de uma companhia do cerco sul. O capitão a que te referes, era o comandante do Esquadrão de Cavalaria 1, também actuando no cerco sul da referida operação.
Joaquim Silvério
ex Fur Milº

Luís Graça disse...

Extracto da página "Tropas Pára-Quedistas Portuguesas"

NIP/NIM: 348/68

Nome e apelido: Carlos Fernandes
Curso de Pára-quedismo: 49º
Nº de capacete: 22
Instrutor da patrulha: 1º Sargento Badálo
COMENTÁRIO: Bem eu quando entrei no curso em Janeiro de 1969 nunca imaginei de poder chegar ao fim do mesmo pois que a meio do curso estive para desistir só que me tinha calhado pela frente o 1º Badálo e não me deixou sequer levar a efeito as minhas intenções. Ao fim de 25 saltos da torre a qual o Capitão Ferreira Pinto que me fez o favor de me obrigar a saltar até os cordões se partirem e de baixo de chuva pois que eu era um nabo aos olhos dele mas quando eu dei o 1º salto e não cai como muitos a qual o largador foi o César António e dentro da patrulha eu fui o melhor aos olhos dele na zona de Bemposta pois que o Arrepiado estava cheio de água devido ás fortes chuvadas e acabei por sair dos Páras no ano de 1974 em Agosto já dentro do Exercito com 25 saltos de avião e depois fiz mais 25 como civil em que nestes 25, 11 foram de queda-livre a qual fiz o gosto ao dedo.
Bem hajam camaradas ou colegas tanto ex-páras como no activo.
Fernandes


http://www.paraquedistas.com.pt/26282/26309.html?*session*id*key*=*session*id*val*

Manuel Peredo disse...

O Fernandes deve ter muitas histórias para contar,queira ele contá-las.Conheço-o um pouco pois ele era do meu pelotão.Será que todos estarão dispostos a ouvi-lo?

Anónimo disse...

... ao Carlos Fernandes, que "burrou" a sua apresentação neste espaço, ao qualificar como "burrice" a decisão de um camarada-de-armas (à qual se sucedeu a morte dele mesmo e de outros militares); ao Joaquim Silvério, que também participou na "Nó Gordio"; e a outros colaboradores e visitantes deste blogue, lembro que o oficial de cavalaria citado, era filho do fundador da Liga dos Combatentes.
Para que conste.

Cpts,
João dos Santos

Manuel Peredo disse...

Está provado que o que o Fernandes possa dizer não agradará a muitos.As verdades por vezes magoam.