quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Guiné 63/74 - P7403: Recortes de Imprensa (36): Gandembel/Balana, com o Hugo Guerra (Pel Caç Nat 55) e o João Barge (CCAÇ 2317)























Excerto de reportagem do jornalista César da Silva, "Um repórter na guerra da Guiné (Conclusão): Em Gandembel, o adeus à guerra. Diário Popular, 17 de Março de 1969, p. 11 (Página digitalizada por Hugo Guerra. Imagens editadas por L.G.)



Guiné > Região de Tombali > Aldeia Formosa > 1969 (?) > O João Barge, "descansando de Gandembel", com o Hugo Guerra (comandante do Pel Caç Nat 55)...




Guiné > Região de Tombali > Aldeia Formosa > 1969 (?) > O João Barge (Alf Mil, CCAÇ 2317, 1968/70), ao centro, "descansando de Gandembel", com o Hugo Guerra (à sua direita) e o Fur Mil Palmeirim, "do meu pelotão", ou seja, do Pelç Caç Nat 55... Estiveram juntos em Gandembel / Balana...

Fotos: © Hugo Guerra (2010) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados



1. Comentário do Hugo Guerra ao poste P7398 (*)

Quando o João Barge chegou a Gandembel [, em Outubro de 1968,], o Pelotão que ele ia comandar estava em Ponte Balana comigo e foi para aí que ele se deslocou.

Passámos juntos mais de dois meses e com ele que "fechei a porta " em Ponte Balana [, em Janeiro de 1969]. Era um amigo bom , calmo e pachorrento, com uma cultura muito acima da média. Sabia falar árabe e com isso se entretinha a falar com alguns dos nativos do meu Pel Caç Nat 55.

O abrigo, no qual ele parece estar a entrar, foi feito pelos seuss homens em Ponte Balana em Outubro ou Novembro de 1968 e era aí que dormia com os Furriéis do seu pelotão.

Quando precisei dele como minha testemunha num Processo por doença, de imediato respondeu afirmativamente e lá veio a Lisboa, onde nos encontrámos há 5 anos. 

Estivemos juntos pela última vez em Monte Real, este ano [, por ocasião do V Encontro Nacional da Tabanca Grande,] e cconversámos emocionados, embora nada deixasse transparecer do seu estado de saúde.

Perdi um grande amigo e camarada de armas. Paz à sua alma, onde quer que esteja. Os meus sentidos pêsames à família.


P.S.- Fui eu e não o Hugo Moura quem avisou o Vinhal logo no dia do falecimento. 

________________

Notas de L.G.:


(*)  Vd. poste de 7 de Dezembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7398: In Memoriam (65): Faleceu o nosso camarada João Barge, ex-Alf Mil da CCAÇ 2317 (Tertúlia / Editores)

(**) Último poste da série > 26 de Novembro de 2010 >  Guiné 63/74 - P7343: Recortes de imprensa (35): Manecas dos Santos, o último dos cabos de guerra do PAIGC, que comandou os Strela e o cerco a Guidaje, estará na 2ª feira, 29, no lançamento do livro de Moura Calheiros (Diário de Notícias)

7 comentários:

Luís Graça disse...

Recorde-se que quando esta reportagem foi publicada no "Diário Popular" (17/3/1969), já o aquartelamento de Gandembel e o destacamento de Balana tinham sido retirados pelas NT há um mês e meio (ou seja, em finais de Janeiro de 1969)...

Uma reportagem como esta não seria possível uns meses antes... Os jornalistas aproveitaram a relativa abertura da censura, na sequência da "primavera marcelista"... Recorde-se que Marcelo sucedeu a Salazar em 27 de Setembro de 1968... Por sua vez, o "Diário Popular" modernizou-se, entre 1963 e 1971,sob a liderança de Pinto Balsemão que incentivava os seus jornalistas (onde pontificavam grandes nomes como Abel Pereira, Baptista Bastos, Jacinto Baptista, José Freitas, Manuel Magro, Mário Ventura, Urbano Carrasco...) a escrever como se não existisse censura... Balsemão irá depois vender o "Diário Popular", em 1971, para poder fundar o "Expresso", em 1973...

Luís Graça disse...

Dou agora conta que este recorte de jornal já havido transcrito pelo Zé Teixeira (*)...

Diz ele,em nota de rodapé, que o bispo titular de Madarsuma e vigário castrense (portanto, o bispo das Forças Armadas Portuguesas) era o então Dom António Reis... (Rodrigues e não Ribeiro, esse,o Dom António Ribeiro sucedeu ao Cardeal Cerejeira)... O Dom Antóno Reis Rodrigues nasceu em 1918 e morreu em 2009. Em 1966 foi nomeado bispo auxiliar da Arquidiocese de Lisboa e bispo titular de Madarsuma, sendo ordenado bispo em 1967.

Vd. poste de 4 de Novembro de 2008
Guiné 63/74 - P3404: Recortes de imprensa (9): Em Gandembel - O adeus à Guerra (José Teixeira/César da Silva)

http://blogueforanadaevaotres.blogspot.com/2008/11/guin-6374-p3404-recortes-de-imprensa-9.html

Luís Graça disse...

Texto introdutório do Zé Teixeira, em 4 de Novembro de 2008:

"Através do Almeida, o camarada da CCaç 2317, que nos tem deliciado com a canção de Gandembel, na Tabanca de Matosinhos, chegou-me à mão uma reportagem do Diário Popular com data de 17 de Março de 1969 sobre Gandembel, assinada pelo jornalista César da Silva.

"Gandembel é um local mítico da Guerra na Guiné, que alguns dos camaradas que em 1 de Março passado visitaram aquando do Simpósio sobre Guiledge.

"O Título Em Gandembel – O Adeus à guerra seduz qualquer ex-combatente que tenha andado pela Guiné nessa época, a ler o referido artigo que abaixo descrevo.

"O seu conteúdo espelha bastante bem o inferno de Gandembel. Estranho para mim, é o facto de a Censura política ou a Pide terem deixado passar este artigo, em pleno tempo de guerra, com uma descrição tão rigorosa do que era a guerra naquele local, que eu, estando em Mampatá Forreá e participando nas colunas de reabastecimento de algum modo testemunhei. Talvez porque Gandembel à data da vinda a lume do artigo, já estivesse desactivada.

"Pode ler-se por exemplo: Afinal isto dará uma ideia do que efectivamente é a guerra no Ultramar? Pois eu permito-me pensar, de acordo com o que pude observar directamente na Guiné, que o conflito naquela Província não será melhor nem pior que o do Vietname, desde os quadros dirigentes, aos operacionais, desde a mentalização dos soldados inimigos, ao material por ele utilizado, o que é exactamente o mesmo.

"Ao ler o artigo ficamos a saber que os fortes de Gandembel e Balana foram construídos com o objectivo de libertar, já nessa altura (princípios de 1968) a pressão sobre Guiledge, o que veio a acentuar-se após o abandono destas praças, em fins de 1968 e culminou com o seu abandono forçado em 1973.

2Interessante também a descrição exagerada, a meu ver, das acções dos Páras, bem como a hilariante história do leite para o comandante Nino, que foi efectivamente verdadeira. Tanto quanto sei, porque acompanhava de perto a movimentação dos Páras e o seu enfermeiro era um camarada amigo, colega de curso, que mais tarde foi gravemente ferido numa A/C a caminho de Fulacunda, onde morreram creio que sete camaradas, tais encontros com o IN aconteceram e muitos mais, pois todos os dias ouvíamos em Mampatá o matraquear da metralha. Foi de facto apanhado manga de material, bem como o leite para o Nino. A quantidade de IN mortos, tal como é descrito, é que me parece exagerada. Talvez o Idálio Reis ou o Hugo Guerra nos possam dar uma ajuda, repondo tanto quanto possível a verdade dos factos.Zé Teixeira".

Anónimo disse...

A minha Companhia C.CAC. 1622)estava em Medjo e foi-lhe com quase 18 meses de comissão, mortos e feridos. Bissau talho o trabalho de abertura da picada (resto de caminho) que ligava a estrada Guiledje-Bedanda, um pouco depois de Medjo, a Salancaur, picada encerrada havia muito tempo e visitada em patrulhas de um ou dois pelotões de vez em quando.
A Companhia estava exausta e sem condições de executar tal operação mas "como o Rei manda avançar mas não manda chover", lá se iniciou o trabalho, com dois mortos logo nesse dia e o Capitão que seguia entre eles, "lavado" no seu sangue.
A evacuação resolveu-se com muitas dificuldades dado o fogo nutrido do PAIGC.
No outro dia o Capitão jurou perante nós que não queria mais nenhum dos seus homens mortos e que assumiria a responsabilidade da recusa em continuar, para além das habituais patrulhas na zona.
Ao mesmo tempo pediu uma junta médica para os seu homens, teve-a, acho que no dia seguinte e numa semana a Companhia estava em Bolama com dieta especial para recuperar da completa debilidade em que se encontrava.
Fiquei eu com o Furriel Vago Mestre a entregar material à Companhia que ali chegou com poucos dias ainda de Guiné.
As flagelações a que já estávamos habituados passaram-nos ao lado mesmo com edifícios destruídos (o vago mestre quase não teve nada para entregar)porque a nossa cabeça estava já fora daquilo e morte era coisa que parecia já nem nos preocupar muito.
Saímos para Guiledje a caminho de Gadamael, no meio da operação Bola de Fogo e assistimos aos preparativos e ao início da marcha.
Eu estive praticamente cooptado para dar a mão ao Furriel de Transmissões da C.ART. 1613(?) porque o Alf. da especialidade que estava em Buba me conhecia e achava que eu daria jeito alí. O então Cap. Corvacho disse não e, em Guiledje, nos dias seguintes ouvíamos o fogachal medonho e imaginávamo-nos pele daqueles camaradas que o tinham de gramar sem nada para se protegerem para além de buracos cavado por cada um, e nas emboscadas montadas na estrada às colunas de reabastecimento.
Por vezes, o ruído do fogo era tão intenso que mais parecia uma onda que subia e baixava e subia de novo.
Tanto sacrifício, dor e morte, pensava eu, para quê, se o PAIGC logo abrirá novas picadas para continuar as suas incursões de abastecimento.
Penso que Spínola, quando chegou, chamou àquilo uma parvoíce, naturalmente não apenas à falta de futuro da nova praça mas também sensível ao sofrimento e às perdas.

José Brás
José Brás

Anónimo disse...

A minha Companhia C.CAC. 1622)estava em Medjo e foi-lhe com quase 18 meses de comissão, mortos e feridos. Bissau talho o trabalho de abertura da picada (resto de caminho) que ligava a estrada Guiledje-Bedanda, um pouco depois de Medjo, a Salancaur, picada encerrada havia muito tempo e visitada em patrulhas de um ou dois pelotões de vez em quando.
A Companhia estava exausta e sem condições de executar tal operação mas "como o Rei manda avançar mas não manda chover", lá se iniciou o trabalho, com dois mortos logo nesse dia e o Capitão que seguia entre eles, "lavado" no seu sangue.
A evacuação resolveu-se com muitas dificuldades dado o fogo nutrido do PAIGC.
No outro dia o Capitão jurou perante nós que não queria mais nenhum dos seus homens mortos e que assumiria a responsabilidade da recusa em continuar, para além das habituais patrulhas na zona.
Ao mesmo tempo pediu uma junta médica para os seu homens, teve-a, acho que no dia seguinte e numa semana a Companhia estava em Bolama com dieta especial para recuperar da completa debilidade em que se encontrava.
Fiquei eu com o Furriel Vago Mestre a entregar material à Companhia que ali chegou com poucos dias ainda de Guiné.
As flagelações a que já estávamos habituados passaram-nos ao lado mesmo com edifícios destruídos (o vago mestre quase não teve nada para entregar) porque a nossa cabeça estava já fora daquilo e morte era coisa que parecia já nem nos preocupar muito.
José Brás
(continua)

Anónimo disse...

(continuação)
Saímos para Guiledje a caminho de Gadamael, no meio da operação Bola de Fogo e assistimos aos preparativos e ao início da marcha.
Eu estive praticamente cooptado para dar a mão ao Furriel de Transmissões da C.ART. 1613(?) porque o Alf. da especialidade que estava em Buba me conhecia e achava que eu daria jeito alí. O então Cap. Corvacho disse não e, em Guiledje, nos dias seguintes ouvíamos o fogachal medonho e imaginávamo-nos pele daqueles camaradas que o tinham de gramar sem nada para se protegerem para além de buracos cavado por cada um, e nas emboscadas montadas na estrada às colunas de reabastecimento.
Por vezes, o ruído do fogo era tão intenso que mais parecia uma onda que subia e baixava e subia de novo.
Tanto sacrifício, dor e morte, pensava eu, para quê, se o PAIGC logo abrirá novas picadas para continuar as suas incursões de abastecimento.
Penso que Spínola, quando chegou, chamou àquilo uma parvoíce, naturalmente não apenas à falta de futuro da nova praça mas também sensível ao sofrimento e às perdas.

José Brás

Anónimo disse...

Pois é (foi) Zé Braz,

Nós (CART 1689), que caminharamos de Norte (Aldeia Formosa), mais a 2317, que viera de sul (Guileje) e ali nos juntaramos, sofremos essa primeira noite de fogachal continuo, instalados em quadrado, fazendo buracos no chão com pequenos sachos militares transportados à cintura (ou com as unhas). Foi tanto barulho e tracejantes, que no dizer do soldado que estava a meu lado "isto é pior que o São João no Porto, meu alferes".
Obrigado por referires isso que observaste e ouviste.
Alberto Branquinho