sexta-feira, 15 de abril de 2011

Guiné 63/74 - P8109: O Alenquer retoma o contacto (5): O ataque de 23 de Março de 1964 a Sangonhá (Armando Fonseca)

1. Mensagem de Armando Fonseca (ex-Soldado Condutor do Pel Rec Fox 42, Guileje e Aldeia Formosa, 1962/64), com data de 9 de Abril de 2011:

Caro camarigo Vinhal,
Aqui estou mais uma vez a contar mais um capitulo da minha vivida história, para ser publicada para conhecimento de toda a tabanca, se acaso a julgar digna disso. deixo à vossa consideração.


O Alenquer retoma o contacto (5)

O ataque de 23 de Março de 1964 a Sangonhá

Depois de, em Ganturé, existirem as condições mínimas de sobrevivência para a instalação das tropas que aí permaneciam, o Pel Fox 42 juntamente com tropas recém chegadas à Guiné e com um Pelotão de Milícias rumou até Sangonhá a 21 de Março de 1964, a fim de aí ser instalado um novo aquartelamento.

Como de costume segue-se a capinagem, a vedação de arame farpado em volta da tabanca, que seria agora um quartel, a colocação de cavaletes para instalação dos candeeiros a petróleo (petromaxes), a que alguns “valentes” iam dar pressão de ar durante a noite, sempre que necessário.

Também era norma que quando chegávamos a um novo local não se consumia água da que ali existia sem ser certificado de que ela estava em boas condições de utilização, assim, recorria-se sempre ao aquartelamento mais próximo para nos abastecermos desse precioso líquido.

Então no dia 23 pela tarde lá vamos nós a Guilege encher os reservatórios de água regressando já ao lusco-fusco, aquela hora em que já não se vê muito bem mas também ainda não é preciso acender faróis.

Assim o IN que decerto nos vigiava não deu pela chegada dos carros da Cavalaria e entenderam ser muito fácil um ataque às tropas recem instaladas para mais que a maior parte tinha as pernas muito brancas o que indiciava pouca experiência naquelas andanças e que se tornaria uma tomada do local com a maior das simplicidades.

E, então pelo meio da noite de 23 para 24, qual não é o espanto do sentinela que se encontrava do lado da estrada que liga a Guiné-Bissau à Guiné-Conacri quando vê aparecer um grupo de guerrilheiros pela estrada acima, descontraidamente a aproximar-se da entrada trazendo uma metralhadora e outros armamentos parecendo que passeavam. Essa sentinela chegou a estar confundido sem saber se devia atacar ou esperar julgando que eles se vinham entregar às nossas forças.

Entretanto quando eles se encontravam a cerca de vinte metros do arame, a sentinela que se encontrava dentro do granadeiro reagiu e fez uma rajada que despoletou um ataque feroz, à volta da aquartelamento. Havia mais duas metralhadoras iguais à que aquele grupo transportava, cuja foto envio, e várias outras armas mais ligeiras, aquelas "costureirinhas" que quase todos conhecemos.

As nossas tropas reagiram e o tal grupo procurou uma elevação no terreno e instalaram-se para fazer fogo sobre nós, mas como os nossos carros tinham um grande poder de fogo, depressa o anulamos, isto com a ajuda do comandante da milícia, visto que a certa altura devido à proximidade do IN não se sabia muito bem de quem eram os tiros se das nossas tropas se do IN. Depois de anulado esse grupo cuja maioria ficou lá assim como o respectivo armamento, que se encontra no museu militar, todo o ataque foi sendo anulado e o IN retirou em debandada.

Ao raiar da aurora fomos então fazer o reconhecimento, e do grupo que fora avistado estavam seis mortos, a metralhadora, pistolas-metralhadoras e pistolas e um rolo de corda. Depois de examinados os outros locais de onde vieram os piores ataques restavam montes de invólucros e os vestígios das metralhadoras terem sido arrastadas no final do ataque, pelo que se deduziu que o cordão encontrado seria exactamente para atar ao suporte da metralhadora para que um dos intervenientes recuasse para local seguro e puxasse a metralhadora no final do ataque, caso este corresse mal como foi o caso, só que neste caso não houve tempo para a execução dessa operação.

Passada esta primeira confusão, permanecemos em Sangonhá até 23 de Junho, continuando a manter as devidas precauções e a segurança das tropas aí instaladas, até que eles atingissem a maturidade para se defenderem a si próprios.

Depois de Sangonhá seguiu-se Cacoca que ficará para o próximo episódio.
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 28 de Fevereiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7877: O Alenquer retoma o contacto (4): Depois de Guileje, seguiu-se Ganturé (Armando Fonseca)

1 comentário:

Anónimo disse...

Meu caro camarigo e Sr. Armando Fonseca.
Trato-o por Sr. porque a diferença de idade deve ser de 10 anos, e se bem que não se seja a norma deste blog, o respeitinho é muito bonito.
Eu estava em Gadamael dez anos depois e fui algumas vezes a Sangonhá em reconhecimento.Muitas vezes fiz fogo de artilharia para a elevação que refere na sua história,é um pequeno planalto com elevação média de 20 m, o que para aquela região equivale a uma montanha.Os guerrilheiros fizeram desse lugar muitas vezes bases de fogos para flagelar Gadamael.Sempre que as flagelações vinham de Sangonhá as primeiras três "ameixas"iam para aí, com resultados devastadores, que por pudor não vou pormenorizar.Claro que deixaram de fazer fogo daí e minaram aquela zona, que eu "desminava" com granadas de obus 14. Nem era preciso ir verificar, bastava ouvir os rebentamentos secundários.Como sabe os antigos quarteis de Sangonhá e Cacoca foram desactivados em 68 com a ida do General Spinola para a Guiné.
Um grande alfa bravo

C.Martins (ex-artilheiro em gadamael)