segunda-feira, 18 de abril de 2011

Guiné 63/74 - P8125: Blogpoesia (145): Falando de poesia, de José Régio e do nosso Blogue (Felismina Costa)

1. No P8084 - "Vila do Conde é um poema"*, o nosso recém entrado para a Tabanca, Manuel Sousa, mais um excelente poeta do nosso Blogue, mandou-nos um poema seu dedicado à sua terra adoptiva.

Felismina Costa, amante de poesia, ela própria já nos presenteou com lindos textos de sua autoria, fez um comentário no poste onde falou de José Régio, um poeta nascido e falecido em Vila do Conde, que durante a sua vida de docente deu aulas em Portalegre. Transcreveu Felismina Costa um poema deste poeta, dedicando-o ao Manuel e a mim, Carlos Vinhal, Editor de serviço. Assim rezava:


A Corda Tensa

Deixem-me! Deixem-me ser tantos quantos sou.
Cada um de vós agarrou uma das minhas faces – a que mais lhe agradava ou era mais sua; e começou a negar as outras do prisma.
Ou eu sou o prisma de não sei quantas faces... não sei.
Bem me basta ser tantos, que já nem posso, às vezes, com tantos que sou!
Mas deixar de ser tantos também o não posso. Também não posso fechar todas as mais janelas, ficar-me a olhar só por uma.
Sei que o não posso, porque já o tentei. “Será um descanso” – pensava. Mas vinha o vento, vinha a lua, vinha a chuva, vinha o sol ... até a poesia vinha. Tudo batia nas janelas fechadas, e entrava pelas frinchas. Descanso? Não tinha nenhum.
Abri todas as janelas! Entre o que quiser.
E agora sois vós a querer, na mesma, fechar todas menos uma, cada um a que mais lhe agrada ou tem por mais sua.
Como poderei eu satisfazer a cada um de per si e a todos?
Prefiro satisfazer a todos e a mim próprio sem agradar a nenhum.


2. Manuel Sousa riposta:

Ofereço à D. Felismina Costa, a comentadora que me antecede, uma estrofe de um poema de José Régio sobre a sua terra Natal, Vila do Conde.
Os meus cumprimentos.
Manuel Sousa (autor do poema "Vila do Conde é um Poema"

Vila do Conde, espraiada
Entre pinhais, rio e mar...
- Lembra-me Vila do Conde,
Já me ponho a suspirar.

José Régio em "O Fado"


3. Felismina Costa não desarma:

Dizer os nossos poetas, é um orgulho muito justamente sentido, e já agora deixe-me acrescentar mais uma estrofe a essa que me oferece:

(...Vento norte, ai vento norte,
Ventinho da beira mar,
Vento de Vila do Conde,
Que é minha terra Natal,
Nenhum remédio me vale
Se me não vens cá buscar,
Vento norte, ai vento norte,
Que em sonhos sinto assoprar...


Que bom é reviver os sentimentos de quem, de forma escrita no-los deu a conhecer!
Cordialmente
Felismina Costa


4. Então apareci eu para estragar o ambiente, mandando esta mensagem à nossa amiga Felismina Costa:

Cara amiga Felismina
Estou a seguir felicíssimo ao esgrimir de poemas entre a amiga e o Manuel Sousa. Bem bonito.
Permita-me agora uma brincadeira.
O vento norte é muito bonito na poesia, mas senti-lo aqui na beira-mar, principalmente em Caminha, Esposende, Póvoa de Varzim e Leça da Palmeira, não é pêra-doce, acredite.

Um abraço
Carlos


5. Finalmente transcrevo esta mensagem de Felismina Costa, afinal a razão principal de voltar a este assunto:

Amigo Carlos Vinhal
Fico muito contente por gostar do despique. Adoro poesia e José Régio é um dos meus poetas preferidos, só há pouco tempo soube que o Carlos era de Vila do Conde, senão já lhe tinha falado de Régio, do professor da Bela Portalegre, que ele também cantou.
Permita-me Carlos:

Toada de Portalegre

Em Portalegre, cidade
Do Alto Alentejo, cercada
De serras, ventos, penhascos, oliveiras e sobreiros,
Morei numa casa velha,
Velha, grande, tosca e bela,
À qual quis como se fora
Feita para eu morar nela...

Cheia de maus e bons cheiros
Das casas que têm história,
Cheia de ténue, mas viva, obsidiante memória
De antigas gentes e traças,
Cheia de sol nas vidraças
E de escuro nos recantos,
Cheia de medo e sossego,
De silêncios e de espantos,
-Quis-lhe bem, como se fora
Tão feita ao gosto de outrora
Como ao do meu aconchego...

Obrigada Régio!

Obrigada Carlos Vinhal, meu amigo desconhecido, mas não tanto, que não dê para trocar umas palavras amigas.

Obrigada meu Amigo por este ano que passou fugindo.
Nem calcula quantas horas passo aqui frente ao computador, é um vício! mas acredita que ligo o computador e vou direitinha ao nosso Blogue?
Podem orgulhar-se do vosso trabalho!
Já disse que vocês são uns homens da história e toda a gente sabe o mesmo, pelo menos os nossos.
É bom partilhar este vosso trabalho!
Sei que somos poucas as mulheres que por aqui andamos, mas, não tenho medo de pessoas que considero amigos, sinto-me muito bem e enquanto assim for, penso continuar.
Sinto que é um espaço que também me pertence, não me pergunte porquê, mas sinto tal como já tem sido dito, que é também um lugar de afectos, e o tema principal, sempre me foi muito caro.

Desculpe toda esta minha divagação, mas sou assim mesmo, aberta, frontal e amiga.

Um abraço fraterno
Felismina Costa
____________

Notas de CV:

(*) Vd. poste de 11 de Abril de 2011 > Guiné 63/74 - P8084: Blogpoesia (143): Vila do Conde é um poema (Manuel Sousa)

Vd. último poste da série de 14 de Abril de 2011 > Guiné 63/74 - P8102: Blogpoesia (144): Se eu pudesse escolher uma data... (Juvenal Amado)

3 comentários:

Torcato Mendonca disse...

Carlos Amigo

Aqui tens uma pessoa que não foi á Guiné, felizmente não esteve dentro da guerra mas, por direito próprio, pela força da amizade, do querer e saber da vida é, efectivamente como a Felismina diz, neste lugar de afectos, neste lugar onde a poesia adoça certos temas aqui trazidos, uma voz já indissociável do Blogue - Luís Graça e Camaradas da Guiné -.
É a força de uma Terra de luta, uma terra que podemos dela muito falar.
Alonguei-me.Para Vós e para Todos um abraço fraterno. T

Hélder Valério disse...

Caros camarigos

Poderá haver quem reclame que o Blogue já tem 'poesia a mais', que o que faz falta é relatar as operações, as emboscadas, os tiros...

Pois, poderá.
Mas se se fizer um pequeno esforço de memória podemos lembrar que haviam 'intervalos' entre as operações, as emboscadas, os tiros, as flagelações e que esses tempos eram passados de muitos modos: descansando, dormindo, lendo, jogando à bola, à batota, escrevendo...

A poesia aqui funciona como esses 'intervalos' e muita dela até assume a forma de relato dessas situações de um modo muito acutilante.

Não há que temer a poesia.

Abraços
Hélder S.

Anónimo disse...

ESta página do nosso blogue é, para mim, das mais belas que ele escreveu.
Um abraço a todos
Joaquim Luís Mendes Gomes