sábado, 15 de outubro de 2011

Guiné 63/74 - P8910: In Memoriam (94): António Dias das Neves (1947-2001), Sold At Cav, CCAV 2486 (Bula, 1969/70), "o meu herói" (Marisa Neves)

Folha da caderneta militar de António Dias das Neves

 
Sold At Cav António Dias das Neves


O Sold At Cav António Dias das Neves montado num obus 10,5...A CCAV 2486  (1969/70) passou por Teixeira Pinto, Bula, Pete e Bula.  Foi comandada pelo Cap Cav João Soares de Sá e Almeida e pelo Alf Mil Inf  José Manuel Duarte Fernandes.



O jovem futebolista António Dias das Neves, na sua terra natal, Ramada, Odivelas

 
Outra foto do jovem futebolista António Dias das Neves.


O António Dias das Neves na Alemanha... Em 1968, Portugal tinha celebrado um acordo com a a Alemanha, ao abrigo das facilidades pela utilização de Base de Beja, para tratamento e recuperação de deficientes, no Hospital de Hamburgo,  com a participação da Cruz Vermelha


O António Dias das Neves  em casa... O "meu herói", diz a filha Marisa Neves

Fotos (e legendas): © Marisa Neves (2011). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]  


1. Texto de Marisa Neves [, foto à esquerda, 2009], baseado em comentários ao poste P8887 (*)  e troca de emails com os editores:

(i) Sr. Luís Graça,  só lhe posso dizer que o meu pai era e será sempre o meu herói, ainda por cima por ter passado por isso tudo e ter ficado sem 2 pernas aos 21 anos. Mas graças a Deus que se adaptou o melhor possível, conseguiu-o,  e quem não soubesse também não sabia que ele não tinha as pernas. 


Gostei muito de ter encontrado este blogue e pessoas que estão dispostas a ajudar-me. Pois o meu pai sempre me contou muitas coisas sobre o ultramar, mas já passaram 10 anos da sua morte e na altura ainda só tinha 21 anos, não assimilei tudo. 

Agora em conjunto com uns amigos, vamos fazer uma exposição da nossa terra, Ramada, e nessa exposição haverá um cantinho especial para o filho da terra, o meu pai [Neves).  

(ii) O meu pai foi ferido a 18 Outubro de 1969,  está na caderneta militar e também ele me dizia isso. Sei, sim, que o meu pai foi condecorado com a cruz de guerra [de 4ª] e um louvor. O louvor está comigo, a cruz de guerra infelizmente o meu pai ''chateado'' com o que lhe aconteceu amandou-a da ponte 25 de abril a baixo.

O meu pai quando foi ferido foi enviado para o hospital militar na Alemanha, onde esteve em recuperação. Posso lhe dizer que a pessoa que sabe muito sobre o meu pai é o ex-alferes Fernandes, pois ele ficou muito amigo do meu pai e costumava dizer:
- Este homem salvou-me a vida, se não fosse ele tinha sido eu a pisar a mina.

Palavras ditas em pleno funeral do meu pai pelo ex-alferes Fernandes. Gostava imenso de poder ter o contacto do agora Tenente Corenel  (aposentado). Se me puderem pôr em contacto com ele, agradeço.  Pois ele ia ajudar muito naquilo que vou fazer ao meu pai,  o memorial [, aqui em Ramada].

Quando tiver tudo ok,  concerteza que vós informarei do dia e local da exposição. O meu super herói será sempre o meu pai, esteja ele onde estiver pois faz parte de mim, se não fosse ele eu hoje não era aquilo que sou, e com muito orgulho digo que sou filha do Neves.
Cumprimentos,

(iii) O meu pai nasceu a 15 Junho de 1947 na Ramada, hoje concelho de Odivelas. Morreu no dia 21 de Agosto de 2001, devido aos vários aneurismas que já tinha espalhados pelo corpo, tendo feito a operação ao aneurisma da artéria que vai do coração à aorta, mas passado uma semana da intervenção não resistiu e teve uma paragem cardíaca.

Serviço militar:  Isto é o que está escrito na Caderneta Militar


António Dias das Neves - Nº de matrícula 19081/585/68 em 1968 
Arma em serviço - Cavalaria
Alistado em 5/07/1967 
Incorporado em 30/07/68
Pronto da escola de recrutas em 17/11/1968 
Especialidade - atirador de cavalaria.

Depois tenho isto assim na caderneta que não sei o que é.

Colocação durante o serviço

UNIDADE - C.T.S.C        30/07/1968

UNIDADE - R.C.7            28/09/1968
UNIDADE - QG/R.M.L     1/07/1972  


Nº DE ORDEM - 3948
 

Ocorrências extraordinárias

Embarcou em 28/2/69 no navio ''UIGE'', com destino ao CTIG fazendo parte da CCav 2486. Desembarcou em Bissau em 1/03/69. 


Evacuado para o HMP em 6/11/71 por despacho de 30/12/70, de sua Excia o Secretário do Estado do Exército.  

Foi ferido em combate a 18/10/69 quando pisou a mina que lhe tirou o pé esquerdo  e depois estilhaçou-lhe a outra perna, tiveram que lhe cortar  as 2 pernas até ficar tudo em condições.

Guiné 100% desde 1/3/69 até 30/12/70.
 

Também tem assim [contagem do tempo de serviço]:

1968 - 155 dias
1969 - 365 dias
1970 - 364 dias

Há muitas coisas que estão escritas na caderneta mas infelizmente não consigo perceber.


Em relação aos hospitais,  infelizmente não sei datas concretas, acho que ele foi 1º para Bissau [HM 241] e depois veio para Portugal
 [HMP - Hospital Militar Principal, Lisboa, Estrela] . A seguir foi transferido para Alemanha  [Hospital Militar de Hamburgo]. Sei que esteve algum tempo na Alemanha em tratamentos e recuperação para adaptação das próteses.

A pessoa que pode-lhe dar todos os dados fidedignos é sem dúvida o ex-Alferes Fernandes, agora Tenente-Coronel aposentado. 
Além de ter estado sempre ao lado do meu pai, ficou bastante amigo dele depois disso. Era um homem que muitas vezes o meu pai ia ao encontro dele, onde ele estivesse destacado e almoçava lá com ele nas messes, lembro-me de ser pequenina e ir com o meu Pai.
 
Se conseguir falar com ele,  vai conseguir todas as respostas, aquelas que eu também precisava.

Então segue uma foto minha, foi difícil encontrar pois as minhas fotos são aquelas todas com a minha filhota, mas depois de muito procurar lá encontrei esta que estou sozinha e não fiquei mal...lol


Fico muito feliz pela homenagem que farão ao meu pai no vosso blogue.


Obrigado mais uma vez.
 
Cumprimentos

Marisa Neves



2. Comentário de L.G.:

Não podemos ficar indiferentes à tenacidade e à dedicação filial da Marisa, que viu o seu pai partir, ainda novo (aos 54 anos), tinha ela 21... Dez anos depois, quer-lhe fazer a devida homenagem, na sua terra natal. E para isso, quer saber mais coisas da sua história passada, como militar no TO da Guiné, onde foi gravemente ferido...

Da nossa troca de comentários e emails, nasceu este poste, que é também a nossa pequena mas merecida homenagem a um dos nossos camaradas que deu o melhor da sua vida, como soldado, tendo sido gravemente ferido, por mina A/P, em 18 de Outubro de 1969, no decurso da Op Ostra Amarga (ao 7º dia, na região de Badapal, a norte de Bula).

O António já não está entre nós, mas o gesto de amor da sua filha Marisa obriga-nos a recordá-lo, doravante, na nossa lista dos membros da Tabanca Grande que da terrível lei da morte se vão libertando...

Ele será mais um dos irãs bons que poisarão no nosso poilão, fazendo-nos  lembrar sempre que aquela guerra, onde fomos protagonistas, teve - para a nossa geração - um enorme preço em sangue, suor e lágrimas. Obrigado à Marisa pelas ternas recordações do seu pai, que foi juntando, peça a peça, desde o seu tempo de jovem futebolista a deficiente das forças armadas, amargurado e revoltado, ao ponto de lançar fora, à águas do rio Tejo,  a sua cruz de guerra...

Vou pedir ao nosso colaborador permanente José Martins, que mora em Odivelas, para estar atento à iniciativa desta jovem de Ramada, que deve ser apontada como um exemplo à geração dos nossos filhos. Queremos estar presentes na exposição de homenagem que vai ser organizada em Ramada.
__________________

Notas do editor

(*) Vd. poste de 11 de Outubro de 2011 > Guiné 63/74 - P8887: O Nosso Livro de Visitas (120): Sold At Cav António Dias das Neves, da CCAV 2486, ferido por mina A/P no dia 18/10/1969, no decurso da Op Ostra Amarga (Marisa Neves / Virgínio Briote)

15 comentários:

José Marcelino Martins disse...

Algumas notas para ajudar a descodificar as situações:

CTSC = Carreira de Tiro da Serra da Carregueira,

RC 7 = Regimento de Cavalaria nº 7, esteve na Calçada da Ajuda, em Lisboa - Desactivado.

OG = QG/RML = Quartel General da Região Militar de Lisboa

Vivo em Odivelas, aliàs bem perto da Ramada (Patameiras) com o 919 169 539 e josesmmartins@sapo.pt
Coloco-me à disposição para ajudar no que for possivel.

Um beijo, Marisa.

Unknown disse...

É com muito orgulho que leio esta pequena mas grande homenagem a um grande homem o meu Pai.... aquele que será sempre um grande heroi, nem que seja só meu..... Obrigado a todos....
PS- Só vós pedia mais um unico favor, vosses que têm os vossos contactos, vejam se me conseguem por em contacto com o ex-alferes Fernandes.

Cumprimentos,

Marisa Neves

Anónimo disse...

Marisa (nome da minha filha mais velha) :
Que bonito o teu gesto.
Sinto-me honrado, como ele se sentiria, pelas tuas palavras e dedicação, ao teu pai, que não conheci, mas que faz parte do meu coração pela sua condição de ex combatente da dita guerra colonial, eu "safei-me" de morrer uma emboscada, por troca,casual,de posição numa patrulha, outro,porventura,morreu no meu lugar, como o tal alf que esteve na despedida do teu "heroi",
Sê forte e luta para atingires o teu objectivo, que é honrar a memória do teu pai, na sua terra, nunca desistas de lutar neste mundo cão, sê uma "Padeira de Aljubarrota" dos nossos conturbados tempos.
Um beijo.

PS
Uma lágrima verteu, no meu rosto, um pouco cansado, deste,também, heroi (fomos todos).
Mereces o teu apelido.

José Carvalho
ex Fur Mil OP/ESP
Guiné 72/74

Unknown disse...

Boa Noite Sr. José Martins,

Por acaso conhecia o meu pai?

manuelmaia disse...

Cara Marisa,

Gesto bonito o seu,no sentido de perpetuar a imagem do seu pai.
Parabéns!
Vá em frente,que estou convencido que chegará ao tal alferes através desta grande casa que é o nosso blogue.
cumprimentos.
manuelmaia

Anónimo disse...

Marisa, a companhia do seu pai, a CCAV 2486, teve dois comandantes: Capitão de Cavalaria João Soares de Sá e Almeida e Alferes Miliciano de Infantaria José Manuel Duarte Fernandes. Tudo indica que este seja a pessoa que procura, hoje tenente-coronel aposentado. Vamos tentar saber por onde pára.

Saudações. Luís Graça

jose manuel disse...

Sabes Marisa, acho que o teu pai morreu feliz por ter tido uma filha como tu.
O caso de teu pai trouxe-me à memória a morte de Albuquerque, soldado do 3º. Grupo de combate da minha Companhia, que pisou uma mina, mas não sobreviveu e nunca teve a felicidade de ser pai. A ele ao teu pai a todos que tanto sofreram todas as hoimenagens são poucas. A tua dedicação tocou-me profundamente e me levou a lembrar um poema feito ao Albuquerque:

sangue derramado

puseste o pé em sítio errado
um som violento, o pó levantado
escondeu por algum tempo
o teu corpo violentado

sem pensar em outras minas
correram em teu socorro
o sangue fugia do teu corpo
e o "hélio" não chegava

tua cara ainda de criança
ficava cada vez mais pálida
tudo num silênçio angustiado

apesar dos teus vinte anos
a vida fugia-te em golfadas
porquê tanto sangue derramado?

José Marcelino Martins disse...

Não, Marisa. Não conto com o António, entre os meus conhecidos.
As nossas vidas não se cruzaram.
Porem, ontem soube que tinha mais "uma filha".
"As filhas e os filhos dos meus camaradas de armas, meus filhos são!"

Continuo à disposição, para o que estiver ao meu alcançe.

José Marcelino Martins disse...

Não, Marisa. Não conto com o António, entre os meus conhecidos.
As nossas vidas não se cruzaram.
Porem, ontem soube que tinha mais "uma filha".
"As filhas e os filhos dos meus camaradas de armas, meus filhos são!"

Continuo à disposição, para o que estiver ao meu alcançe.

Luís Graça disse...

Marisa, o José Martins veio lembrar-lhe uma das nossas "palavras de ordem", usadas no nosso blogue: "Os filhos dos nossos camaradas, nossos filhos são"....

Retórica ? Fazemos um esforço por ajudar, por sermos solidários, por dar visibilidade a casos como o da Marisa, a procurar informação, a apoiar inciativas... Somos uma "comunidade virtual" (mas também física, já que nos encontramos, convivemos com regularidade) de antigos combatentes da Guiné (mas também amigos, como é o caso dos filhos de alguns dos nossos camaradas, vivos ou falecidos)...

O José Martins é um coração de ouro. Tem a sorte de o ter como vizinho.

Unknown disse...

Mais uma vez obrigado a todos.
Sim o Tenente Coronel Jose Manuel Duarte Fernandes é a pessoa que gostava de encontrar,ainda estive algumas vezes com ele quando era muida e o meu pai se ia encontrar com ele.
O Capitão Sá também mts vezes o meu pai esteje com ele depois da guerra terminar, se não estou em erro o Capitão Sá era responsavél pela cadeia de Elvas.
Todos vosses foram herois, porque foram obrigados a partecipar numa guerra que os grandes fizeram por capricho, porque no meu ver não ganharam nada com isso, tendo mais tarde entregado tudo de mão beijada, coisa que deviam ter feito logo no inicio sem guerras, e teriam ganho com isso... por esses paises eram ricos em mts coisas, coisas essas que se os nossos dirigentes na altura fossem espertos, teriam lucrado (o nosso Portugal todo). Não teria havido tanta desgraça em grande escala como ouve e continua a reproduzir-se ainda em mts pessoas, vosses ex-combatentes e os familiares e amigos dos mesmo.... Um bem aja a vosses todos.
bjs

Marisa Neves

Manuel Reis disse...

Marisa,comoveste-me com a tua vontade férrea de prestares uma homenagem ao teu pai,ex-combatente como nós.

Não estou muito bem colocado para te poder ajudar na tua busca de camaradas que com ele privaram.

Vou torcer por ti e desejar-te boa sorte, para que consigas o que desejas.

Um beijo.

Manuel Reis

Anónimo disse...

Faltam-me as palavras para comentar este post. É natural. Somos humanos.Mas compreendemos bem o amor desta filha ao seu pai, o seu "herói" como ela bem sublinha com todo o direito. Casos destes foram mais que muitos. Mortos em combate naquelas três frentes de batalha foram cerca de 10.000. Depois foram estes, os estropiados, que engrossaram o número infindável de feridos. E os politicos da época, e todos os que se lhes seguiram até aos dias de hoje, nem sequer souberam arranjar forma de trazer de volta tantos corpos de tantos camaradas nossos que por lá ficaram. Era o minimo. Mas isto que acabo de dizer toda a gente sabe. O que interessa agora é valorizar a combatividade desta filha para homenagear o seu pai como ele merece.
Seja-me permitido comparar esta persistência com a de António Teixeira da Mota que ao fim de de 33 anos conseguiu que os restos mortais de seu pai JUSTINO TEIXEIRA DA MOTA tivessem sido translados de Angola para Portugal com a ajuda de muitos amigos, como ele bem espelha no seu Livro LUTA INCESSANTE. Convém dizer que quando o pai morreu em Angola, o António tinha um ano de idade pelo que, logo que começou a ter conhecimento da realidade nunca deixou de trabalhar para que os restos mortais de seu pai viessem repousar na sua terra natal, Travanca-Amarante.
Já que os poderes são aquilo que são, que pelo menos nós, também combatentes ainda vivos e os familiares de todas aqueles que se libertaram da Lei da Morte, não os esqueçamos.
Um abraço para todos
Carlos Pinheiro

Anónimo disse...

Só hoje pude ver e ler este Poste, estive ausente uns dias.

Embora não esteja a residir atualmente em Odivelas, era aí que vivia quando fui para o serviço militar 1971 a 1974, dos quais entre junho de 72 a Agosto de 74 passados na Guiné. Também não tenho presente a figura do Camarada António Neves, mas isso não impede que esteja disponível para ajudar no que for possível para lembrar a sua memória.

Meu contacto pessoal 960036124.

Por vezes ainda estou por Odivelas um ou dois dias todos os meses, Arroja.

Um abraço,
Belarmino Sardinha

Unknown disse...

Venho agradecer do fundo do meu coração a ''esta familia dos ex-combatentes'', pelas palavras e pelo apoio e por me terem ajudado.
Hoje tive uma grande alegria, quando no meu mail tenho uma mensagem do Sr. Virote com a informação que falou com o ex-alferes Fernandes e o nº telef dele para lhe ligar. Como já era tarde, mandei-lhe uma msg: ''Boa noite Sr. alferes Fernandes com todo o respeito lhe continou a chamar assim, porque o meu pai o neves sempre lhe chamou com muito carinho. Fiquei muito feliz por ter o seu nº. Quando for oportuno ligarei-lhe para falar consigo. Cumprimentos, Marisa Neves''.
Nem 1 minuto e o Sr. Alferes ligou-me, foi muito bom e agora vamos encontrarmos-nos para assim podermos recurdar saudosamente o nosso neves.
Mais uma vez e nunca serão demais, obrigado mesmo do fundo do meu coração pela vossa ajuda, hoje consegui ter um dia muito feliz.

Beijos a todos

Marisa Neves