segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Guiné 63/74 - P8943: Antologia (73): Tarrafo, crónica de guerra, de Armor Pires Mota, 1ª ed, 1965 (6): Ilha do Como, 17 e 23 de Fevereiro de 1964




Passando o rio Camuntudú sobre uma ponte de três palmeiras. Escolta diária

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Fonte: © Armor Pires Mota (1965-2011) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados.


1. Continuação da publicação de Tarrafo; crónica de guerra, de Armor Pires Mota, 1ª ed., Aveiro, 1965. Parte 2 (Ilha do Como, Jan / Mar 1964), pp. 68-74. (*)

Com a amável autorização do autor, começámos, a partir de 14 do corrente, a publicar as crónicas do Tarrafo, relativas à Op Tridente, na Ilha do Como (15 de Janeiro a 15 de Março de 1994), recorrendo para o efeito a um exemplar, fotocopiado, da primeira edição do livro (pp. 47 a 85), onde ainda são visíveis as marcas da censura
. (Recorde-se que o livro foi retirado do mercado, logo a seguir à sua entrada nas livrarias, em Outubro de 1965, muito embora o autor já talvez publicado estas mesmas crónicas no Jornal da Bairrada).

Publicamos hoje mais duas crónicas, relativas aos dias 17 e a 23 de Fevereiro de 1964. Estas duas situações passam-se já um mês depois do Alf Mil Cav Mota ter desembarcado na Ilha do Como, juntamente com o resto da sua subunidade, a CCAV 488, integrado na Agrupamento B.


De acordo com o planeamento da Op Tridente (destinada a desalojar o PAIGC da região do Como, onde ocupava desde 1963 três ilhas, Caiar, Como e Catungo), a ação das NT dividiu-se em 3 fases: (i) desembarque, a 15 de janeiro de 1964, com apoio da força aérea e da marinha; (ii) operações de patrulhamento das ilhas, de 17 a 24 de janeiro; e (iii) concentração de esforços na ilha do Como, onde de 24 de janeiro a 24 de março, se travaramos combates mais intensos...

As NT mobilizaram c. de 1100/1200 homens, para além de importantes meios aéreos e navais. O efetivo do PAIGC era estimado em 300 combatentes. Um elevado numero de combatentes nossos (193, ou seja, mais de 15%) foram evacuados por doença, devido às duas condições do terreno e à duração da operação (71 dias).  A superfície das 3 ilhas era da ordem dos 210 km2, dos quais 80% eram constituídos por tarrafo, sujeito à ação das marés (Na maré cheia, a região do Como ficava reduzida a 40 km2).

2. Paralelamente estamos a seguir a crónica de outro combatente do Como, o Mário Dias, hoje sargento comando reformado, membro da nossa Tabanca Grande, desde a I Série do blogue. Em relação a este período (2ª quinzena de Fevereiro de 1964), selecionámos o seguinte excerto (o resto pode ser lido na I Série do nosso blogue, aqui):


(...) A 17 de Fevereiro, o grupo de comandos recebeu a missão de bater a mata desde o Norte de Curcô até Cauane. Confirmando a nossa convicção de que os guerrilheiros do PAIGC estavam a ficar enfraquecidos, não houve oposição à nossa penetração na mata que, até há pouco tempo, tinha sido um santuário que não deixavam profanar. 


 Apenas a cerca de 1 km a Norte de S. Nicolau se ouviram dois disparos de espingarda - código por eles usado para avisar que andava por ali a tropa e se esconderem. Prosseguimos a nossa patrulha em direcção a Cauane onde, sensivelmente no local do nosso primeiro contacto com o IN nesta operação (quando morreram dois fuzileiros), fomos flagelados com alguns tiros de PPSH e Metralhadora, mais com o propósito de nos manter afastados do que nos enfrentar. Reagindo, abatemos um elemento IN. Alcançamos Cauane e daí a praia da Base Logística. (...)

Vd. também este excerto da III Parte das crónicas do Mário Dias:


(...) Dia 23 de Fevereiro novamente embarcados numa LDM com o Pelotão de de Paraquedistas e 8º Destacamento de Fuzileiros, rumo a Curcô onde pernoitámos.


No dia seguinte, com mais um grupo de combate da CCAV 488, iniciámos uma batida à mata. Por duas vezes tivemos contacto com um numeroso grupo de guerrilheiros que dispunham de um morteiro 82 e 1 metralhadora pesada 12,7mm. As NT causaram 7 mortos confirmados, sendo 3 caboverdeanos, armados com pistola-metralhadora, dois deles fardados de caqui. Nesta acção, o Pel Paraquedistas teve 1 morto, 1 ferido grave e 1 ferido ligeiro. Uma rajada de PPSH inutilizou a arma do comandante dos páras, que ficou ferido na cabeça.


Quando me recordo, à distância dos anos, do que aconteceu a seguir, dá-me vontade de rir da cena caricata que devemos ter feito.


Eu conto: tendo nós conseguido sempre levar a melhor nos contactos com o IN, eis que um enorme enxame de abelhas se abateu sobre nós. Toda a gente a sacudir-se, ferroadas de criar bicho, correria desenfreada. Quem diria… pequenos insectos conseguiram aquilo que o IN nunca foi capaz: pôr-nos em fuga. Com o pessoal todo picado, já havia muitos olhos tumefactos, nada poderíamos fazer a não ser o regresso a Curcô. Ganharam as abelhas.


Na orla da mata perto de Curcô, ainda descobrimos uma plataforma construída sobre palafitas, com cerca de 1,80m de altura, e que servia como posto de vigia sobre aquela localidade. Deixámo-la ficar armadilhada. Não sei se a armadilha chegou ou não a ser activada. Hoje, faço votos para que não.


(...) Que bem dormia eu quando, naquela madrugada do dia 27 de Fevereiro, “às 4 da matina” me acordaram:
- Porra… são lá horas de acordar um pacato cidadão embrenhado em sonhos tão deliciosos!...
- Vamos embora! - Mais uma vez a mata espera por nós. E fomos.


Sol já a brilhar, movimentos suspeitos no tarrafe. Avançámos cautelosamente para averiguar. Apenas algumas pegadas de 2 ou 3 pessoas que devem ter fugido com a nossa aproximação.


Nesse dia, juntamente com o Pel Paraq e 1 grupo de combate de elementos das CCAV 487 e 489 foi destruída a tabanca de Catabão Segundo onde fizemos um prisioneiro e apreendemos 2 binóculos, 1 cantil, 1 espingarda G3 com 4 carregadores, e 3 granadas de mão. Mais uma acção em que o IN não deu sinais de vida. (...).


___________________


Nota do editor:


(*) Último poste da séruie > 20 de Outubro de 2011 > Guiné 63/74 - P8931: Antologia (72): Tarrafo, crónica de guerra, de Armor Pires Mota, 1ª ed, 1965 (5): Ilha do Como, 8 e 12 de Fevereiro de 1964


4 comentários:

Luís Graça disse...

Alguém conheceu o Brandão da Ilha do Como ? Manuel Brandão, ao que parece... O Mário Dias tê-lo-á conhecido em Bissau:

(...) "A tabanca de Cauane, bem como as restantes, estava praticamente destruída assim como a casa do comerciante Brandão, ali bem próxima. Meses antes, já a aviação havia actuado na ilha bombardeando e destruindo todas as instalações que pudessem ser proveitosas ao IN.

"Recordo-me ainda de assistir no QG em Santa Luzia, onde ocasionalmente me encontrava, aos protestos do referido Brandão por lhe terem escavacado tudo quanto possuía no Como. Nada a fazer. Tivemos que ordenadamente retirar e regressar às nossas posições na tabanca de Cauane. Nesta acção, os fuzileiros sofreram 2 mortos e 3 feridos graves. Dos guerrilheiros não se sabe pois ninguém conseguiu lá chegar e verificar o que entre eles se passou." (...)

Tenho que ideia que havia relações de parentesco entre os Brandão da Guiné, com núcleos familiares em Catió, Como e Bambadinca... A sua origem deveria ser Arouca...

Já vimos em tempos a saga da nossa amiga Gilda Pinho Brandão (hoje Gilda Brás, pelo casamento), que veio aos 7 anos para Portugal, para uma família de acolhimento.

Integra a nossa Tabanca Grande desde Julho de 2007:

Vd. marcador "Gilda Brás"

http://blogueforanadaevaotres.blogspot.com/search/label/Gilda%20Br%C3%A1s

Vd. marcador "família Pinho Brandão"

http://blogueforanadaevaotres.blogspot.com/search/label/fam%C3%ADlia%20Pinho%20Brand%C3%A3o

Luís Graça disse...

O Armor Pires Mota dá-nos mais informações sobre o "tal Brandão" com casa em Cauane, destruída pela Força Aérea antes da Op Tridente...

"(...) o único branco que ali vivera em tempos [presume-se que até 1963, antes da ocupação da ilha pelo PAIGC], onde montara os seus negócios e fizera fortuna"... E acrescenta: "Ele casara com a filha da rainha dos Bijagós e vivia agora em Catió. O filho, que diziam ter morrido, andara com os terroristas, o Chiquinho" (Tarrafo, 1965, p. 52).

Luís Graça disse...

Vd. também o poste de 22 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1455: Crónica de um Palmeirim de Catió (Mendes Gomes, CCAÇ 728) (7): O Sr. Brandão, de Ganjolá, aliás, de Arouca, e a Sra. Sexta-Feira

http://blogueforanadaevaotres.blogspot.com/2007/01/guin-6374-p1455-crnica-de-um-palmeirim.html


(...) "Era o caso do Sr. Brandão, de Ganjola, a quinze km de Catió, um injustiçado lavrador das terras de Arouca. Ali vivia há dezenas de anos, por assassínio, cometido numa das romarias da Senhora da Mó. No meio dos folguedos e romarias, por vezes, acertavam-se contas atrasadas, duma qualquer hora de desavença, mesmo no fim da missa domingueira.

"O Sr. Brandão, agora, era um velhote, rodeado de filhos e netos que foi gerando, ao sabor das madrugadas de batuque e da liberdade de escolha, sem custos, entre as mais viçosas bajudas da tabanca" (...)

Será que estamos a falar da mesma personagem ?

Anónimo disse...

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