quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Guiné 63/74 - P10764: (In)citações (47): Em louvor dos bravos marinheiros da LDM 302 e dos mártires do meu DFE 21 (João Meneses)

1. Já aqui foi apresentado, como leitor e visitante, o nosso camarada, 2º ten FZE RA, João Meneses, que pertenceu ao DFE 21, e que pretende ingressar na nossa Tabanca Grande  (*), estando nós a aguardar o emvio das duas fotos da praxe para a sua apresentação formal.

Antes disso, a 6 de novembro último, ele já tinha respondido a um mail do Carlos Vinhal, nestes termos:

Caro amigo Carlos

Amizade expontânea, unidos pela Guiné. Brevemente enviarei, via mail, o que me foi pedido. Blogue que veio (e continua a) trazer luz ( na sua grande maioria com casos reais, outros, como o pescador que apanhou um peixe de 8 metros !!!!) que ajuda a reviver, a fazer-nos falar, do que alguns NUNCA conseguiram falar, a desabafar e, porque não, a recordar amizades unidas pelo sangue.

Parabéns pela iniciativa e por manterem vivo este Blog

Com amizade
João Carvalho Meneses

2. Em 26 de novembro último, o João Meneses manda-nos a seguinte mensagem:

Caros amigos

Venho agora corrigir um erro ao identificar a suposta LFG a que se fez referência anteriormente (*).

A memória atraiçoa-nos pela acção do tempo, tornando difusa a exactidão, mas grava sempre no subconsciente, que se aclara por vezes em “flashes” .

Assim escrevi que não era uma LFG na Tabanca Nova da Armada e sim uma LFP. Na realidade tratava-se da LDM 302, (cuja história está descrita e muito bem,neste Blogue ) (**), então abatida ao servíço, de onde se retirou a Oerlinkon, da qual existem fotografias no livro do Luís Sanches Baena.

Essa mesma fotografia de “ronco” foi tirada com elementos do meu DFE21. Serve pois para completar ou complementar a história desta LDM
Alguma nomenclatura:

LFG - Lancha de Fiscalização Grande
LFP - Lancha de Fiscalização Pequena
LDG - Lancha de Desembarque Grande
LDM – Lancha de Desembarque Média
LDP – Lancha de Desmbarque Pequena

Isto leva-me para outro assunto: É um estado de Alma e Coração que transformou todo o meu futuro:

Alguns deles (Praças do DFE21), direi, quase todos, assassinados após o “exemplar” incompetente abandono e traição, pelos nossos “internos” libertadores, que não respeitaram as vidas humanas que ao seu serviço ofereciam a deles. 

Não está em causa a independência da Guiné. Está em causa sim, a forma como foi feita. Em nenhuma guerra da história se abandonaram elementos das respectivas forças armadas, que se sabia irem ser fuzilados,(não só por razões de crenças étnicas como por vinganças políticas). Não se poderá atribuir a “escolha” individual a sua permanência na Guiné. Não se lhes deu, sequer, a hipótese de, como Portugueses que eram, virem para a então “metrópole”. Eram soldados Portugueses inscritos nas suas fileiras e como tal obrigatoriamente  de nacionalidade Portuguesa. Não eram mercenários. 

Vergonha, Vergonha e Revolta  minhas, que não tive a hipótese e a possibilidade de interferir por eles nesse processo. (No entanto falei disto ao Nino, quando o transportei, muito mais tarde, de avião de Lisboa para Bissau). Pedi, na altura do meu internamento no INAB após ter sido ferido, para trazer para Portugal o enfermeiro Fuzileiro Pedro, que demonstrou vontade em vir, mas foi-me negado o pedido, por ser muito complicada uma transferência de um militar.

Esta revolta acompanha-me há quase 33 anos. Lembro-me de ver o Augusto Có a chorar, quando fui evacuado pelo Héli. Bem haja,  Augusto. Entrei em coma logo a seguir.

Não falo aqui de convicções políticas, que as tenho, mas sim de convicções morais, que as mantenho

O que consente é conivente com o executante. Daí que .... a conclusão é triste e chocante
Um abraço a todos,

2º Ten FZE João Meneses (***)

____________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 12 de novembro de 2012 >  Guiné 63/74 - P10659: O nosso livro de visitas (152): João Meneses, 2º ten FZE RA, DFE 21, gravemente ferido na península do Cubisseco, em 27/9/1972


(**) Vd. poste de 28 de junho de 2012 > Guiné 63/74 - P10084: Antologia (76): Vida e morte da gloriosa LDM 302, a cuja heróica guarnição pertenceu o marinheiro fogueiro Ludgero Henriques de Oliveira, natural da Lourinhã, condecorado com a Cruz de Guerra em 1968 (Manuel Lema Santos / Luís Graça)

(***) Último poste da série > 3 de dezembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10755: (In)citações (46): O cadete Lima, do último curso de oficiais milicianos que reuniu em Mafra, em 1964, a juventude do império... (Rui A. Ferreira)

5 comentários:

jpscandeias disse...

Penso que essa mágoa de abandonar, aos Deus dará, os camaradas de armas, é comum a todos que passaram e especialmnte os que estavam em Maio de 1974 nas companhias africanas.É da situação, que ainda hoje, mais me envergonho e entristece e não perdoo aos responsáveis, muitos deles ainda hoje se exibem e pavoneiam pelos media e apresentam como desculpa que a guerra estava perdida. Estava sim politicamente e desde o primeiro dia.

joao silva ex-furriel ccac 12

Anónimo disse...

Caro camarada J.Meneses

Não é para servir como desculpa do acto vergonhoso dos responsáveis das NT..mas quando referes que em "nenhuma guerra um exército abandonou os seus elementos que se sabia que iam ser fuzilados"..desculpa mas não é verdade.

Aconteceu o mesmo em todas as guerras do mesmo tipo,nomeadamente no Vietnam, Argélia e Afeganistão..só para citar as mais importantes..e até com maior ferocidade e malvadez, mas reafirmo que isso não serve de desculpa da nossa atitude e responsabilidade.

Um alfa bravo

C.Martins

Henrique Cerqueira disse...

Antes de mais partilho do sentimento do nosso camarada João Meneses.
Não sei se este assunto já aqui foi tratado,no entanto eu creio que haverá camaradas do blogue que poderão tentar explicar essa ação de desmobilização das tropas africanas regulares e não regulares.E se algumas vês lhes foi dado o tratamento como Tropas Portuguêsas tal como a todos nós.E se lhes foi dada a possibilidade de virem para a metrópole ou não.
Eu de qualquer dos modos acredito e tal como o C.Martins diz seria sempre inevitável o desfecho terrível que aconteceu.
Tambem não sei qual o critério do PAIGC que usou para os ASSASSINATOS que cometeu.pois que felizmente tenho algumas notícias de soldados da CCAÇ13 e que nada(?)lhes aconteceu.Inclusive um deles até é chefe de tabanca em Bissorã.("Graças a Deus Branquinho").
Um abraço solidário ao Camarada João Meneses.
Henrique Cerqueira

JD disse...

Camaradas,
Já aqui fizémos o choro desses camaradas abandonados à vingança.
E ainda andam por aqui alguns dos responsáveis: o MFA (mesmo os que teriam outra ideia sobre o movimento, mas que participaram numa aventura cheia de traições); e os políticos que logo determinaram a independência incondicional das colónias, com a entrega do poder aos movimentos emancipalistas). E as vítimas nas colónias foram muitas mais do que aqueles antigos camaradas.
Abraços fraternos
JD

Luís Graça disse...

O João Meneses acaba de me mandar as fotos da praxe para eu o poder apresentar formalmente ao resto da nossa comunidade virtual...

Já lhe expliqueu que somos quase 600, mas muitos de nós encontram-se regularmente em diversas "tabancas" (aqui em Lisboa, há a da "Linha"...) e anualmente (Monte Real)...

Também acho que a "blogoterapia" nos faz bem a todos... Também "fundei" uma companhia africana, fula, a CCAÇ 12, alguns dos meus camaradas guineenses (e amigos) foram fuzilados...Aliás, 80 dos 100 (da CCAÇ 12 inicial, de 1969/71) já desapareceram, que a esperança de vida deles era mais curta... O Candeias conheceu o seu doloroso fim... (E a propósito, bem gostaria que ele se juntasse a nós, Tabanca Grande!).

A Guiné foi (e é ainda) fonte de grande sofrimento para todos nós... Duplamente para ti, João, que foste gravemente ferido... Força, camarada,contamos uns com os outros... Um abração. Luis.

PS - Vives em Lisboa, ou na Grande Lisboa ? O Carlos Vinhal depois manda-te a lista de endereços de email da malta toda (que é só para uso interno da nossa Tabanca Grande, não sendo divulgada publicamente).

Logo vou-te apresentar como o grã-tabanqueiro nº 591.