quarta-feira, 3 de abril de 2013

Guiné 63/74 - P11338: 9º aniversário do nosso blogue: Os melhores postes da I Série (2004/06) (6): O meu diário (José Teixeira, ex-1º cabo aux enf, CCAÇ 2381, Buba e Empada, 1968/70) (Partes XI / XII): Das peripécias da licença de férias à morte do Cantiflas, por eletrocução (junho-julho de 1969)



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Fotos (e legendas): © José Teixeira (2006). Todos os direitos reservados [Edição: L.G.]





O Zé Teixeira em Farosadjuma, Cantenhez, Região de Tombali, em 2011


1. Continuação da publicação de O Meu Diário, de José Teixeira (1º cabo enfermeiro Teixeira, da CCAÇ 2381, Buba, Quebo, Mampatá, Empada, 1968/70) (*)

Recorde-se do percurso do Zé, em terras da Guiné:

(...) "Fui enfermeiro de campanha na CCAÇ 2381. Fui para a Guiné em fins de Abril de 1968 e regressei em Maio de 1970. Estacionei cerca de 3 meses em Ingoré, no Norte, onde a companhia fez o seu treino operacional. Seguimos depois para Buba [, na região de Quínara, no sul] e fixámo-nos em Quebo (Aldeia Formosa), [no final de Julho de 1968]. Aí a CCAÇ 2381 teve como missão fazer escoltas de segurança às colunas logísticas de abastecimento entre Aldeia Formosa/Buba e Aldeia Formosa/Gandembel, ao mesmo tempo que garantia a autodefesa de Aldeia Formosa, Mampatá e Chamarra. Regressámos a Buba, em Janeiro de 1969, para servirmos de guarda às equipas de Engenharia que construíram a estrada Buba / Aldeia Formosa. Face ao desgaste físico e emocional fomos enviados, a partir de 1969, para Empada onde vivemos os últimos meses de Comissão".(...)




 Guiné > Região de Quínara > Empada > CCAÇ 2381 >  1969  >  O Zé Teixeira tinha (e continua a ter) um trato fácil e afável com a população local. Aqui vemo-lo "muçulmano por um dia" ou "por empréstimo", vestido à maneira tradicional da população islamizada...








Guiné > Empada > CCAÇ 2381 > 1969 > O 1º cabo aux enf  Teixeira, para além da sua intensa actividade operacional, estava sempre disponível para os outros e arranjava maneira de se divertir e divertir os seus camaradas. Aqui, nas duas fotos de cima,  caricaturando o festival da Eurovisão.

Fotos: © José Teixeira (2006). Todos os direitos reservados


Bissau, 19 de Junho de 1969

Regressei a Bissau depois de um mês de férias na Metrópole onde pude participar no casamento do meu irmão Joaquim.

A minha licença de férias foi cheia de aventura. O comandante não assinou o passaporte, pelo que não podia ir, apesar de ter a viagem comprada. Mandei um rádio para Bissau a anular a viagem e entretanto o comandante foi para uma operação.

Como tinha a papelada toda pronta apresentei-a ao capitão mais antigo que ficara a exercer o comando, e que era um bolas, estava ali de castigo. Este assinou e logo enviei novo rádio a Bissau a reservar a viagem, só que a avioneta do correio não veio no dia habitual e o risco de perder o avião e o dinheiro da viagem era grande.

Entretanto aparecem dois bombardeiros no ar e o lugar do atirador vago. Ao pressentir que iam aterrar, fardei-me, peguei na mala e dirigi-me à pista com intenções de pedir ao comandante da esquadrilha para me levar, só que vejo sair do outro bombardeiro nada menos que o meu comandante que regressava da operação. Olhou para mim, muito espantado, e regressámos ao quartel na mesma viatura, isto porque o meu passaporte perdera de imediato o valor, e anulei novamente a viagem. No entanto pedi ao alferes Barbosa para o guardar.

Nessa noite veio a Buba uma lancha trazer uma peça necessária para uma máquina, um caterpillar, que estava parado por ter pisado uma mina e era utilizado na construção da estrada para Aldeia Formosa. Alguém me veio avisar e eu rompi a barreira, fui ter com o Barbosa que estava a jogar cartas com o comandante, fiz-lhe sinal para vir cá fora, pedi-lhe o passaporte falso e, à revelia do comandante, fui para a Praia. Um colega pegou em mim e atirou-me para dentro da lancha e lá fui eu rumo a Bissau.

No dia seguinte de manhã cheguei a Bissau, corri à Agência, consegui ainda reservar a viagem e esperei 24 horas pela partida para Lisboa via Ilha do Sal.

  Empada, 5 de Julho de 1969

Empada parece ser o que os meus colegas diziam. A partir de l de Julho é a minha nova morada. A população é um misto de todas as raças onde predomina a Manjaca e a Bijagó. É trabalhadora e parece fiel. Recebe a tropa com muita simpatia e, pelo seu proceder, confirma mais ainda que a população da Guiné quer viver em paz no amanho das suas terras.

A região é bastante rica, tem muitas bolanhas e os africanos aproveitam para semear milho, mancarra, malagueta e batata doce. Também se dedicam à plantação de arroz na bolanha da Punderosa.

Porque o IN vem, destrói e mata, sinto que existe um ódio tremendo e uma insegurança na população, que no entanto se arrisca a trabalhar nas bolanhas para seu ganha pão.

Esta população, de raças diferentes da de Buba e Aldeia Formosa (Mandingas e Fulas), é muito mais trabalhadeira.

Não gosto da posição estratégica do Quartel, mas como já fizemos um grande desbaste na vegetação, eles não tem condições para se aproximarem muito. Há que estar atento e continuar a confiar. As instalações são boas, superiores às de qualquer quartel na Metróple. A alimentação, porque as refeições são bem feitas, pode-se dizer-se que são do melhor. Se assim continuar, teremos um fim de comissão em beleza.

A situação moral é caótica. O sexo avança em toda a linha. Quase todas as jovens lavadeiras se prostituem por dinheiro.

Buba, 10 de Julho de 1969

Em Buba novamente desde o dia sete, por um mês, segundo diz quem tem os livros, no entanto eu duvido um pouco. Recordo-me do ano passado, quando vim para este Sector, por um mês e ainda cá ando...

Presentemente Buba está calmo, já não mete, até certo ponto, o medo que metia nos tempos em que se andava a rasgar a nova estrada para Quebo (Aldeia Formosa). Mas é de temer , pois mesmo sem o terrror de há meses atrás, o trabalho ainda é muito, as saídas para o mato são constantes e o tempo não ajuda.

Tem chovido muito. Ainda ontem, fui impossibilitado de passar a noite emboscado pela chuva que caíu torrencialmente durante todo o dia. Saí de manhã cedo em patrulha de reconhecimento e ao fim da tarde estávamos ensopados de tal maneira que um colega caíu sem forças e cheio de frio e angustiado por o Comandante não autorizar o regresso a quartéis. Viemos traz-lo e fomos autorizados a ficar.

Não sei o tempo que vou estar por Buba. Parece que querem arranjar a velha estrada de Nhala e tenho medo de lá cair. As recordações que touxe de lá e de Samba-Sábali não foram as melhores e estrada está toda alagada pelas chuvas da época.

A estrada nova Buba/Aldeia Formosa (Quebo) está feita e pretende substituir a velha estrada de Nhala com as suas bolanhas lamacentas, mas ninguém se atreve a passar na dita, pois na primeira e única coluna que se fez, houve três terríveis emboscadas que provocaram três mortos e nove feridos.

Empada está a tornar-se uma zona perigosa. Desde que saí de lá já sofreram dois ataques cujos resultados desconheço. É certo que está lá pouca tropa. Talvez seja essa a razão que faz o turra. ir até lá chatear mas... qual será melhor ? Buba, um pouco calma, com muitas saídas, fraca comida, más instalações, ou Empada que tem melhores condições, com o terrorismo a aparecer ?!

Buba, 12 de Julho de 1969

Há qualquer coisa que me falta. Sinto isso mais forte em mim desde que vim de férias. Pego num livro, porque de momento sinto vontade de ler para em seguida o fechar e pensar em qualquer coisa. Procurei na leitura qualquer coisa que precisava e não encontrei.

Sinto-me vazio. Por vezes sonho acordado, imagino a felicidade. Quero mais, quero ir mais além. Creio ser esta a razão do meu vazio. A sede de ir mais longe abrasa-me.

Comecei a sentir medo. Tenho medo de tudo, da vida e da morte, da guerra e do ódio, tenho medo. Tenho medo de mim mesmo, da minha fraqueza. Sinto-me um pouco fraco espiritualmente, mesmo com tudo o que as férias me deram. As forças do lado oposto também são mais fortes.

Será o meu querer forte o suficiente para vencer ? Tenho medo...

... Depois de deixar a pena correr, sinto o mesmo vazio que me persegue, que me atormenta. Que quero eu afinal ? Ir mais além, dar mais, continuar firme na minha construção como HOMEM...

Empada voltou a ser atacada hoje, enquanto por Buba não se nota o mais pequeno sinal do IN, aliás parece-me que as acções do bandido diminuiram em toda a Guiné.

Buba, 18 de Julho de 1969

Para morrer basta estar vivo, não interessa o local ou meio. De paz ou de guerra. A morte aparece em qualquer sítio e a qualquer hora. O Cantinflas estava na guerra.. Caíu debaixo de fogo várias vezes, sofreu os efeitos de uma guerra traiçoeira, sem o mais pequeno ferimento, mas a morte espreitava-o impiedosamente e há dias, através de um choque eléctrico, veio ter com ele.

Mulher e uma filha, os pais e familiares, os amigos, todos o esperavam. Que choque sentirá aquela esposa ao receber a notícia que o marido morreu electrocutado ?! Aquela criança... os pais que o adoravam!...

Veio para os Maiorais [, CCAÇ 2381,] em substituição do Alzira que se encontra na Metróple com uma perna artificial depois de pisar uma mina na estrada de Buba. Duas figuras típicas e muito queridas. O Alzira (cujo verdadeiro nome não sei) , um infeliz sem pais, que nos deliciava com os seus fados. O Cantinflas,  pela sua boa disposição permanente que deixava transparecer através de comiquices e lhe valeram o nome.

Empada voltou a ser atacada. Hoje emboscaram no Rio Grande duas Lanchas de Desembarque e o Barco Patrulha que transportavam uma companhia para Gadamael. Creio que não houve problemas.

Buba, 22 de Julho de 1969


Domingo (20) saí para o mato pela tarde a patrulhar a estrada nova e emboscar o IN em seguida. De certeza que fomos seguidos pelo IN que nos deixou montar a emboscada e abriu fogo de seguida. A nossa reacção foi rápida e os indivíduos calaram-se. Uma granada caíu bem perto de mim mas não feriu, aliás, nenhum dos meus camaradas foi ferido pelo IN. Apenas o homem do morteiro 60 se feriu na mão com o morteiro.

Retirámos silenciosamente sem mais novidades e chegámos a Buba pelas 20 horas onde toda a gente esperava ordens para avançar em nosso auxílio. Este pequeno ataque não foi pera doce para mim. Quando notei que o camarada do morteiro estava ferido - tinha a mão rasgada por não ter utilizado o prato e o morteiro ao disparar enterrou-se na terra escorregando-lhe pela mão - , passei mensagem que não havia feridos graves e dispus-me a tratá-lo para evitar a hemorragia.

O comandante, na sua pressa de se afastar da zona de perigo, mandou retirar e quando nos apercebemos estávamos a 300/400 metros dos companheiros de luta com o IN, na retaguarda que também não se tinha apercebido da situação. Iniciamos uma fuga a alta velocidade. Valeu-os o colega do lança-rockets [, bazuca,]  que se apercebeu e fez passar algumas granadas por cima de nós obrigando o IN a manter-se em defesa.

 (Continua)
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Nota do editor:

(*) Vd. último poste da série > 24 de março de 2013 >Guiné 63/74 - P11304: 9º aniversário do nosso blogue: Os melhores postes da I Série (2004/06) (5): O meu diário (José Teixeira, ex-1º cabo aux enf, CCAÇ 2381, Buba e Empada, 1968/70) (Partes IX / X): Buba, fevereiro / maio 1969

3 comentários:

Luís Graça disse...

Zé: Escreveste no teu diário: “Empada, 5/7/1969: (…) A situação moral é caótica. O sexo avança em toda a linha. Quase todas as jovens lavadeiras se prostituem por dinheiro.”

Era a tua perceção, na época. Seguramente que te baseaste na “evidência empírica”, em factos conhecidos, da tua experiência… Mas mesmo assim há sempre o risco da “generalização abusiva”… Fazemos isso todos os dias a partir das nossa experiência pessoal… É o que eu chamo “sociologia espontânea”, podendo no entanto levar-nos a tirar conclusões erradas…

De um modo geral, pode dizer-se que há um pouco de cientista social em cada um de nós. De certa forma, todos nós fazemos sociologia espontânea, psicologia espontânea, epidemiologia espontânea, investigação espontânea. Por exemplo:

Quem é que, não sendo médico, não fez já automedicação para lidar com um problema de saúde ? Quem é que não tem uma teoria qualquer para explicar os trágicos acontecimentos do 11 de Setembro de 2001? Quem é que não aplica, na educação dos seus filhos, certas teorias explicativas do comportamento infantil? Quem é que não gosta de especular sobre a eficácia do comportamento do líder nos grupos e nas organizações? Quem é que não se sente capaz de comentar, numa roda de amigos, os resultados de uma eleição para a Assembleia Nacional ou a vitória de um candidato populista, à revelia das máquinas partidárias ou o peso do partido da abstenção ? Quem é que não tem uma teoria espontânea para ‘explicar’ as alterações climáticas ?

Enfim, os exemplos seriam infindáveis… Tu também tens o mesmo direito de afirmar, a partir do conhecimento da situação local, em Empada, em 1969: “O sexo avança em toda a linha. Quase todas as jovens lavadeiras se prostituem por dinheiro.” E comentar: “A situação moral é caótica”…

Mas o que eu gostava de saber era o seguinte. (i) Manterias, ainda hoje, esta afirmação, com o conhecimento que tens da Guiné de ontem e de hoje ?; (ii) A situação era igual noutras povoações por onde passaste, como Buba, Mampatá ou Aldeia Formosa ?; (iii) Havia diferenças entre as lavadeiras cristãs, animistas ou islamnizadas (fulas, mandingas, beafadas) ?

Num território em guerra, num terra como Empada, onde havia algumas centenas de militares, deslocados, homens, jovens, brancos e negros, era natural que se criasse um “mercado do sexo”. Acontece em todas as guerras… Mas dizer que “quase todas as lavadeiras” faziam “favores sexuais” pode ser abusivo… ou exagerado. Ou provavelmente, não.

Tiras essa conclusão a partir de um número necessariamente limitado de casos… Não tinhas, nem nós tínhamos, nem ontem nem hoje, estatísticas sobre este problema (ou outros, afins, respeitantes à relação da tropa com a população).

De qualquer modo, temos aqui um problema interessante para discutir no blogue, com bom senso, ponderação e cautela. Só podemos invocar a nossa experiência, limitada. Se queres o meu depoimento, digo-te que tive em Bambadinca uma lavadeira mandinga, e nunca lhe pedi “favores sexuais” nem ela mos ofereceu. Pagava-lhe o que era justo pelo seu trabalho de lavadeira. E não mais do que isso. Quanto ao resto, ia às “meninas de Bafatá” de tempos a tempos… Por outro lado, a maior parte de nós não tinha “quartos privativos", com exceção talvez dos nossos comandantes… E era mais fácil “partir catota” na tabanca do que no quartel…

Zé: eu sei que eras (e és) um católico (,presumivelmente praticante), tinhas e tens a tua ética e fé cristãs, e que nessa época chocava-te a “miséria moral” a que se tinha chegado em Empada…

Como sabes, sempre apreciei a tua autenticidade e franqueza, valores que não são de hoje. Recebe este comentário com (bom) humor... Um xicoração fraterno. Luis Graça

Arménio Estorninho disse...

Caro Irmão Maioral Zé Teixeira, da leitura feita concordo quase no seu todo no descrito e relevando o acidente do Sold. Cond. Auto Albino Carneiro de Oliveira "O Cantiflas", não ridicularizando no seu todo "em Empada, em 1969, o sexo avança em toda a linha."

Quanto ao "O Cantiflas" que depois de um duche e ainda molhado, fora apanhado desprevenido ao tocar nas pontas descarnadas de um cabo eléctrico e que tinha sido retirado de um candeeiro.

Tal acidente deveu-se porque a lâmpada de um candeeiro não acendia, para verificar o motivo fora chamado o eletricista e tendo concluído que não era avaria do candeeiro mas do cabo de ligação, por isso iria substitui-lo (eu estava presente). No entanto ele esquecera-se de executar o serviço.

Conquanto à noite fora poste em movimento o gerador elétrico, em que o fio condutor ficou com corrente e como o neutro estava partido por isso não fechava o circuito.
Assim, por negligência deu-se a morte de um Camarada e Bom Amigo.

Recapitulando sobre o "sexo em Empada, em 1969," não concordo no excesso e generalizado.
Pois tirando aquela meia dúzia de bajudas que eram do conhecimento geral, que se acomodaram a outros tantos "felizardos" e não se indicam os seus nomes.
Quanto ao resto eram situações isoladas em que quem tinha quarto ou abrigo smi/privado, tinha a possibilidade de receber visitas e com a canção do bandido em "troca de" era ofertado algo compensatório.

Com um Abraço de Maioral
Arménio Estorninho

Zé Teixeira disse...

Caríssimos amigos
Ao reler a frase que escrevi no meu diário de guerra " o sexo avança em toda a linha...apetece-me rir ás gargalhadas. Na verdade eram outros os tempos e outra a visão da realidade, sobretudo na área dos afectos.
Eu era um jovem escuteiro católico com ideal de vida projectado para a paz, o respeito pelo outro e a disponibilidade para SERVIR, a viver forçado e contrariado uma guerra
Vivia assim, num ambiente de guerra, onde o respeito pelo outro era imposto pela força da G3. Intimamente revoltado, remetia-me a algum isolamento a um silêncio que me asfixiava.

Este escrito foi, visto à distância do tempo que curou as feridas, uma generalização abusiva, como diz o Luís Graça que resultou do conhecimento de alguns acontecimentos reais que me chocaram como homem, como cristão e como escuteiro.
Nos primeiros tempos de Guiné em Ingoré quase nunca saí do perímetro do quartel à Enfermaria.
Em Mampstá vivíamos em comunidade com a população, pois não havia quartel, mas o respeito pela pessoa quer pela atitude do José Belo o alferes comandante do G.C. que logo à partida chamou à atenção para duas realidades concretas: Todos somos homens e todos queremos regressar a casa, para tal temos de conviver com a população de forma a não criar o mínimo atrito. A tabanca era pequena, todos se conheciam e se respeitavam e faziam respeitar. É natural que tenha havido um caso ou outro de intimidade, sem deixar marcas.
Em Buba a azáfama era tanta que não havia tempo para se pensar nestas coisas.
Ao regressar à Guiné, retemperado após um mês de merecidas férias em Portugal, fresquinho de ideias e ideais, chego a Empada onde a Companhia se tinha instalado e encaro com as estórias de A, B, C,...O casado com um filho que anda com fulana, o alferes que julgava que era o único e quando deu pela situação, à noite formava-se uma carreirinha à espera de vez....etc. A casa das meninas(duas irmãs, o prometido noivo que era virgem e foi pedir ao camarada para ir falar à catraia para o atender bem e claro o tal camarada foi à frente e quem pagou foi o "noviço". Tudo isto foi um choque para mim aliado ao casa da velhinha que se prostituia por um cigarro que até o fumava com o lume dentro da boca, etc.
Tudo isto provocou em mim um choque a juntar a tudo o resto e o desabafo saiu no diário. Bem ou mal está lá, porque reflecte um estado de espírito. Exagerado, porque não reflecte a verdade.Eram apenas algumas lavadeiras e alguns camaradas e sobretudo era o efeito da realidade humana- Seres sexuados. Senti que havia alguma falta de respeito pela pessoa humana, pela maneira como as jovens eram motivadas a fazerem "favores sexuais" pelo valor do dinheiro. Tinha conhecimento de uma jovem na Chamarra que o marido ao saber que ela estava grávida de um branco, a repudiara e a pôs fora de casa. Enfim!
Zé Teixeira