quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Guiné 63/74 - P12429: Memória dos lugares (259): Ainda a Ilha das Galinhas e a sua "colónia penal e agrícola", criada em 1934 (José António Viegas, ex-Fur Mil do Pel Caç Nat 54, 1966/68)



Guiné > Arquipélago dos Bijagós > Ilha das Galinhas > Colónia Penal e Agrícola > c.julho/setembro de 1968 > Da esquerda para a direita, o chefe Joaquim e o fur mil Viegas, posando com um tubarão capturado.


Foto: © José António Viegas (2013). Todos os direitos reservados


1. Resposta do José António Viegas (ex-Fur Mil do Pel Caç Nat 54, Guiné, 1966/68) a algumas perguntas nossas sobre a "colónia penal e agrícola da Ilha das Galinhas" (*):

 (i) Mensagem de L.G., de 4 do corrente:

Zé: Tens mais fotos deste tempo e deste lugar ? O que sabes mais do funcionamento da colónia ? Eram presos comuns ou "turras" ? Não fugiam ? A população não tinha medo deles ? Onde dormiam ? Onde comiam e o que comiam ? O Chefe Joaquim era branco ? Era militar ou civil ? ... E vocês, militares (1 fur, 1 cabo, 3 praças...), o que faziam ? Apenas segurança ? Com tão escassos meios ? ... 

Enfim, entende a minha/nossa curiosidade: pouca malta, no nosso tempo de Guiné, ouviu falar da "colónia penal e agrícola da Ilha das Galinhas"... Saúde. Luís Graça

(ii) Resposta do José António Viegas:

Na parte central na ilha, chamado o campo, havia uma casa colonial e uma parada grande com dois barracões que era onde viviam os presos. Na altura estavam lá perto de cento e tal prisioneiros entre os de delito comum e os presos  politico. Pessoalmente, não não sabia quais deles eram, n~
aop sabia distuingui-los,  pois o chefe [Joaquim] não falava comigo nesse aspecto.

O chefe Joaquim que está comigo na foto com o tubarão, esteve na GNR com o Spínola e depois foi  chefiar o campo. Penso que estivesse ligado à Pide.

Os presos circulavam à vontade. Alguns mais antigos viviam em palhotas junto ao campo,  faziam trabalho agricola, não havia problema com a população e poucas hipóteses tinham de fugir.

A vida da guarnição era fazer umas rondas pela ilha no Uunimog pequeno (Pincha) [, o 411] e pesca. Nada mais.

A comida dos prisioneiros era na base do arroz,  algum peixe e carne.

Naquele tempo eu não estava bem dentro dos assuntos,  não fazia muitas perguntas ao chefe que ele,  sempre de má cara com a sua úrsula [,úlcera], pouco respondia.

Só falei com um preso politico, que eu saiba, quando fui mordido por uma cobra verde, não sei se era médico ou enfermeiro , sei que tinha estado na  Repúbklica Checa [, na altura Checoslováqui,] e que veio tratar de mim.

Se encontrar mais fotos no baú,  logo envio
Um abraço
Viegas


2. Comentário de L.G. ao poste P12383 (*)

 Estou grato ao Zé António Viegas por nos mandar estas curtas memórias da Ilha das Galinhas (**)... Não imaginava que lá houvesse tropa... Um ano depois, em finais de 1969, haveria lá uma guarnição a nível de pelotão, conforme se pode ler no seguinte documento, consultado no Arquivo Amílcar Cabral, portal Casa Comum:

(...) "9) Ilhéu das Galinhas – Tem um Quartel. Tem 25 soldados armados de G3, granadas, tem bipé [sic]. Tem Polícia de Segurança. Tem Pide tuga e africana. Há 1 Pide tuga. O Chefe de Tabanca da Ilha das Galinahs, de nome Ansumane Bêcó [sic], é um Pide. Está junto com a sua família.

No quartel há um só carro: um Enimog [sic] [Unimog]. Há algumas pessoas favoráveis ao Partido  PAIGC]. Por exemplo, a tabanca de Amitite. Há uma pessoa favorável ao Partido, de nome Curancô, chefe de Amitite. Tem campo de aviação grande. Pousam lá os aviões que vêm de Bissau" (...)


Citação:

(1969), "Informações sobre o Arquipélago dos Bijagós. Organização, formação política e ideológica dos Bijagós", CasaComum.org, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_41391 (2013-12-3).

Ver documento completo em Casa Comum
Instituição: Fundação Mário Soares
Pasta: 07073.128.006
Título: Informações sobre o Arquipélago dos Bijagós. Organização, formação política e ideológica dos Bijagós.
Assunto: Informações de carácter militar, extraídas da audição com os "camaradas" vindos dos Bijagós, sobre Soga, Bubaque, Formosa, Uno, Caravela, Orango, Orangozinho, Canhabaque, Galinhas e Uracane. Organização e formação política e ideológica dos Bijagós, manuscritos por Vasco Cabral.
Data: Terça, 2 de Dezembro de 1969.
Observações: Doc. incluído no dossier intitulado Relatórios 1965-1969.
Fundo: DAC - Documentos Amílcar Cabral

Tipo Documental: Documentos
Direitos: A publicação, total ou parcial, deste documento exige prévia autorização da entidade detentora.


3. Ainda sobre a "colónia penal e agrícola" da Ilha das Galinhas:


Sabemos que foi criada em 1934 (ou pelo menos já existia nesta data). Cite-se o preâmbulo do Diploma Legislativo nº 884 (Boletim Oficial nº 44, de 29/10/934).

"O Governo da Colónia da Guiné, integrado na Política Nacionalista do País, empenhou-se na realização de uma obra profícua de assistência geral, pela protecção  social e revigoramento moral  de que tanto carecem as  populações admninistradas no momento que passa.

"Neste campo foi já promulgado um conjunto de medidas conducentes a tal desiderato: ontem a instituição do Reformatório de Menores e Asilo da Infância Desvalida de Bor, depois a criação da Colónia Penal Agrícola da Ilha das Galinhas; recentemente o diploma de protecção aos nacionais contra a crise do emprego e, hoje, a assistência geral sob os aspectos de trabalho, médico e social”  (…).

Era então governador da colónia (1932-1940), como então se dizia, sem complexos, Luís António de Carvalho Viegas, um militar de carreira, mais tarde general. Enquanto major de cavalaria, foi o herói da batalha de Canhabaque. Tem vários publicações sobre a Guiné dos anos 30: vd. por ex, Ilha de Canhabaque : relatório das operações militares em 1935-1936 (Bolama: Imprensa Nacional, 210 pp.)  [Vd. o sítio da Universidade de Aveiro > Memórias de África e do Oriente]. 


Fonte: (1934), "Promulgação de medidas de assistência geral pelo Governo da Colónia da Guiné", CasaComum.org, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_42954 (2013-12-4)

Ver e ampliar documento aqui > Casa Comum
Instituição: Fundação Mário Soares
Pasta: 07063.036.028
Título: Promulgação de medidas de assistência geral pelo Governo da Colónia da Guiné
Assunto: Cópia do Diploma Legislativo n.º 884 (Boletim Oficial n.º 44, de 29 de Outubro de 1934) sobre a promulgação de medidas de assistência geral pelo Governo da Colónia da Guiné. Instituição do reformatório de Menores e Asilo da Infância Desvalida de Bor; criação da Colónia Penal Agrícola da Ilha das Galinhas.
Data: Segunda, 29 de Outubro de 1934
Observações: Doc. incluído no dossier intitulado Operação de Cadigue / com. em 1-3-1963 / Notas gerência mercearias.
Fundo: DAC - Documentos Amílcar Cabral
Tipo Documental: Documentos
Direitos: A publicação, total ou parcial, deste documento exige prévia autorização da entidade detentora.
______________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 3 de dezembro de 2013 > Guiné 63/74 - P12383: Memória dos lugares (257): Ilha das Galinhas em 1968 (José António Viegas)

(**) Último poste da série >10 de dezembro de  2013 > Guiné 63/74 - P12423: Memória dos lugares (258): Bissau, 1968, aquando da visita do Presidente da República à Guiné (José António Viegas)

3 comentários:

Luís Graça disse...

Não sei porquê, mas estava equivocado quanto a este topónimo, Ilha das Galinhas. Associava-o à Op Mar Verde. Ora não foi lá, mas sim na Ilha de Soga, que foram renunidos e treinados os cerca de 200 homens do "Front de Libération National Guinéen" (FLNG) que participaram na Op Mar Verde (invasão de Conacri, 22 de novembro de 1970) ao lado dos nossos fuzileiros e comandos africanos.

A Ilha de Soga fica a sudoeste da Ilha das Galinhas e a noroeste da Ilha de Bubaque. Foi aí que foram concentrados, isolados e submetidos a treino militar intenso os homens da FLNG.

E foi de lá, no dia 19 de novembro de 1970, que partiu, em navios da nossa marinha, a força que iria desembarcar em Conacri, sob o comando de Alpoim Calvão

Ernesto Pacheco Duarte disse...

Boa tarde Zé
Posso estar descansado que não estar a cunfundir com outras ilhas !?
Cada úm tem o destino traçado ! O teu foi andares sempre por perto de Ilhas.
Foi quando foste para a Ilha das Galinhas que siste da outra Ilha, aquela em que estavas cercado e eu digo só de costureira !
Um abraço Zé

José Viegas disse...

Pois foi Ernesto antes de ir para a Ilha das Galinhas estive a comandar a Ilha das Cobras, vou escrever em breve sobre isso.
Um abraço
Viegas