quarta-feira, 21 de maio de 2014

Guiné 63/74 - P13172: Blogpoesia (381): De Catió ao Cachil, na minha canoa, ao som da serenata de Schubert... (J. L. Mendes Gomes)


Guiné > Região de Tombali > Ilha do Como > Cachil > 1966 > Interior do aquartelamnento

Foto: © Benito Neves (2008). Todos os direitos reservados.



Guiné > Região de Tombali > Catió > BCAÇ 619 (1964/66) > Grupo de oficiais à mesa, no famoso bar Tombali, em Catió. Há dois palmeirins, da CCAÇ 728: o alf mil J.L. Mendes Gomes, o 2º a contar da direita, de óculos escuros, assinalado com um círculo vermelho; e o alf mil Gonçalves, o 1º a contar da esquerda. Os restantes pertenciam à CCS do BCAÇ 619, então sedeado em Catió, com destaque para o major Luís [António Moura] Casanova Ferreira [, hoje coronel reformado,] de bivaque na cabeça e camuflado, ao fundo (era o homem grande da logística do batalhão e foi um dos mentores e atores do 25 de Abril). Da direita para a esquerda, são ainda visíveis o alferes de transmissões do batalhão - o Teixeira; a seguir ao J.L.Mendes Gomes, o alferes, do Pel Art, de apelido Maia); e por fim, o alferes Pires Marques, de cavalaria (Pel Rec).

Foto do álbum do nosso camarada e amigo J. L. Mendes Gomes, ex-alf mil da CCAÇ 728, (Cachil, Catió e Bissau, 1964/66), jurista reformado e poeta, vivendo entre Mafra e Berlim.

Foto (e legenda): © J. L. Mendes Gomes (2006). Todos os direitos reservados.



De Catió ao Cachil
(na minha canoa...)


por J.L. Mendes Gomes


Tomo minha canoa,
Dum tronco apenas.
Vou serenamente,
De Catió ao Cachil.

Rio Cumbijã ou seu afluente,
Já não lembro o nome.

Agora posso olhar
Ambas as margens,
Sem espingarda nas mãos.

Rio cinzento,
Sinuoso,
Ora tão largo,
Ora tão estreito.
Jacarés a dormir.

Há jagudis,
De asas tão largas,
Poisados nas árvores.
Parecem lacraus.
Onde metem o bico,
Tudo se vai.
Só dá para fugir.
Há tanta lama,
Debaixo dos ramos.
Fazem trincheira.
Ninguém se atreve
A pôr-lhe os pés.

Ao cabo dum dia,
Sempre a remar,
Chego esvaído
Ao cais do Cachil.

Ele lá está,
Chão de palmeira.
Que estrada-avenida,
Sempre a subir.

Vou a caminho.
Pé ante-pé.
Sobre os toros.

Lembro o passado.
Vestido de tropa.
Olhos trementes.
O inimigo à espreita.

Depois da granada,
Para espantar jacarés,
Lançávamo-nos ao rio,
Ó que banhoca.
Parecia uma praia,
Povoada de peixes,
Que o estrondo matou.

E aquele quartel,
Onde passei nove meses,
Era um palácio real,
Defendido com todos os dentes.
Hoje é repasto de rãs,
Cobras, serpentes.
Pedaços de vidas,
Tão jovens,
Que não mais voltam a ser.
Ali jazem sepultados.
Porquê?...E para quê!?...

Que fadário mais triste!.


Ouvindo “serenata de Schubert
Berlim, 10 de Maio de 2014
15h47m
Joaquim Luís Mendes Gomes


_____________

Nota do editor:

Último poste da série > 8 de maio de 2014 > Guiné 63/74 - P13113: Blogpoesia (381): Gestor de ausências (António Eduardo Ferreira)

4 comentários:

Luís Graça disse...

Joaquim:

Gostei deste teu "regresso" ao Cachil... Mas o rio não pode ser o Geba, como constava no teu original e que eu emendei... O Geba era, com o Corubal, o meu rio, fica no leste....

O rio onde navehas com tua imaginmária canoa é um afluente de um afluente do Rio Cumbijã... Qual ?
Tens aqui a carta de Caiar onde fica(va) o Cachil... Estive a ver com detalhe mas perdi-me...

http://www.ensp.unl.pt/luis.graca/guine_guerracolonial61_mapa_Ilha_Caiar.html

Abraço forte. Luis

Anónimo disse...

Benito Neves
21 maio 2014 18:27

Olá, Luís, boa tarde

Julgo e quase tenho a certeza de que o rio que banhava o Cachil era um afluente do rio Cobade, que também banhava Catió.

Este poema do J M Gomes retrata bem o que era aquela viagem, o acesso e o quartel...

Abraço

BNeves

Luís Graça disse...

OLá, Benito, obrigado, pela leitura (rápida) da carta do Cachil, também me pareceu ser um afluenet do rio Cobade...

Aquilo é uma rede emaranhada de rias e braços de mar... SE calhar, rio, rio, só há memso o Corubal...

Anónimo disse...

José Colaço
21 maio 2014 19:30

Joaquim e Luís

É bem possível que o Humberto Reis descalce esta bota. o B. Neves já deu uma boa dica há tempo em conversa sobre este tema com dois camaradas que estiveram em Catió a dúvida permaneceu.