quarta-feira, 29 de abril de 2015

Guiné 63/74 - P14544: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande (98): 42 anos depois, recordo-me bem de ti, José Carlos Mussá Biai... Eras o único menino no Xime com nome cristão, e eu dormia no mesmo quarto do teu professor, o fur enf Osório (António Duarte, ex-fur mil, CCAÇ 12, Xime, 1973/74)



Guiné > Zona leste > Setor L1 (Bambadinca) > Subsetor do Xime > Xime > Posto Escolar Militar nº 8 > 1972 > "Alunos participando na cerimónia do içar da Bandeira Nacional em  10 de junho de 1972 (,s egundo creio).  Ao centro o professor da Escola de Mansambo [?], presente a convite do camarada Carvalhido da Ponte". [Um dos miúdos era o José Carlso Mussá Bai, hoje engenheiro silvicultor a trabalhar e a viver em Lisboa] (*)

Foto ( legenda): © Jorge Araújo (2014). Todos os direitos reservados. (Edição: M.R.)


1. Mensagem de António Duarte, com data de 28 do corrente, enviada ao José Carlos Mussá Biai (**),  com conhecimento aos editores: 


[foto à esquerda: António Duarte, ex-fur mil da CART 3493/BART 3873, Mansambo, Fá Mandinga, Cobumba e Bissau, 1972-1974; foi transferido para a CCAC 12 (em novembro de 1972; economista, bancário reformado, formador, com larga experiência em Angola]

Boa tarde,  José Carlos.

Andava para te escrever, mas tenho adiado.

Agora a propósito desta discussão levantada pelo Luís Graça (***), vejo referência ao teu nome, pelo que opto por te escrever este email.

Quero dizer-te que estive na CCaç 12, em 1973,  no Xime,  e como dormia no mesmo quarto do teu professor, o Furriel  Enfermeiro da CCaç 12,  de nome Osório, recordo-me bem de ti, ainda pequenito ires espreitar à janela para o chamares.

O curioso era o facto de tu seres o único menino no Xime que tinha nome cristão, razão pela qual é fácil recordar-me, apesar dos já 42 anos de distância e dos meus 64 longos anos de idade.

Fico extremamente feliz por constatar que hoje és um homem de vida organizada e de bem com o mundo.

Abraço de fraternidade e tudo de bom para ti e para os teus. (****)

António Duarte

________________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 27 de outubro de  2014 > Guiné 63/734 - P13812: Memória dos lugares (277): Os meninos do Xime do tempo da CART 3494 - O caso de José Carlos Mussá Biai (Jorge Araújo)

(**) Vd. poste de 10 de maio de 2005 > Guiné 63/74 - P16: No Xime também havia crianças felizes (2) (Luís Graça)

(...) Acabei de falar com o José Carlos Mussá Biai: nasceu em 1963, no Xime, e era menino no tempo em que por lá passaram a CART 2715 e a CART 3494. Era menino no tempo em que eu estive no Setor L1 da Zona leste, correspondente ao triângulo Xime-Bambadinca-Xitole [julho de 1969/março de 1971].

Sei que, até ao fim da guerra, ele, a família e os vizinhos da sua tabanca sofreram muitos ataques. Uma família inteira, perto da sua morança, morreu [, em 1/12/1973]. A sua infância não foi fácil. A vida também não foi fácil para a população civil, de etnia mandinga, que ficou no Xime.

(...) Em contrapartida, também houve algumas coisas boas. Por exemplo, o furriel miliciano enfermeiro José Luís Carvalhido da Ponte, natural de Viana do Castelo, foi alguém especial na sua vida e na vida dos outros meninos do Xime. Foi seu professor primário na única escola que lá havia, o PEM (Posto Escolar Militar) nº 14. O Mussá Biai também teve como professor, depois da CART 3494 ter ido para Mansambo [, em novembro de 1972], o furriel Osório, da CCAÇ 12, que dava aulas no Posto Escolar Militar nº 14, juntamente com a esposa. (...)

(***) Vd. poste de 28 de abril de 2015 > Guiné 63/74 - P14535: História do BART 3873 (Bambadinca, 1972/74) (António Duarte): Parte XXIII: dezembro de 1973: flagelação do Xime, com foguetões 122 mm: sete mortos civis

3 comentários:

Mário Beja Santos disse...

Meu prezado António Duarte, O professor chama-se José Pereira, era um dos meus três furriéis do pelotão de caçadores nativos n.º 52 quando cheguei a Missirá, no princípio de Agosto de 1968. Tinha uma expressão admirável, uma cultura incomum e um trato cuidadoso. Já fora anteriormente professor, era Balanta de Bissorã, saiu de Missirá e passou para Bambadinca. Encontrámo-nos em 2010, logo me avisou que estava a tratar de tudo para vir para Portugal, queria trabalho, pediu-me ajuda. É penoso explicar a um velho da nossa idade que não há trabalho compatível. Obstinado, veio mesmo. Tentei arranjar-lhe ocupação a cuidar de seniores, deficientes ou muito limitados. Também não resultou. Cabisbaixo, regressou à Guiné. Dou estes pormenores porque me tocou no coração ver este homem elevado na estatura física e moral na velha fotografia, a acompanhar o içar da bandeira. Obrigado pelo bem que me fizeste, Mário

Antº Rosinha disse...

O pior e mais negativo do relacionamento de crianças ou jovens africanos com o "branco" traduzido para crioulo "colon", continuou também imensamente negativo, e talvez muito mais negativo, após as independências, com a chegada do que se chamou, estrangeiros "cooperantes".

Onde está essa coisa tão negativa?

Está na diferença de perspectivas.

As perspectivas de quem chega são umas, e quem está são outras.

E tanto umas como outras de um lado e do outro, são em geral totalmente irreais.

Por ignorância mútua, princioalmente.

E a primeira consequência nefasta e imediata, é um esforço louco e até psicologicamente violento, de afastamento do jovem da sua ancestralidade.

O pior que se passa hoje em África, é exactamente os milhões de jovens acantonados em enormes cidades, com as tais perspectivas irreais.

Claro que há outras contradições africanas tão violentas que nem eles as mencionam.

Mas para mim, penso que nós tugas fizemos tudo para evitar o pior.

Não adiantou nada? Sei não, como diz o brasileiro.

João Candeias da Silva disse...

António Duarte!
Porra ando sempre atrasado. Troquei de Fone e lá se foi o teu contacto.
De vez em quando e este de vez em quando chega a ser de anos.
Uma das últimas vezes li que um dos nossos Camaradas furriel da 12 nos tinha deixado.
Hoje falas no Osório. Eu fui a terceira perna da trempe qu fque habitava no Xime o T0 sem WC.
Não sei se depois da "limpeza feita pelo Spinola se alguém ocupou o meu lugar no To.
Do Osório nada sei. De ti pouco e a culpa é minha.
Sei que já não moras perto do meu colega e amigo Manuel Coelho da Silva que também muito pouco tenho visto como consequência da pandemia.
Não tarda estamos em 2021 como o tempo passou por nós à velocidade da luz. A excepção foram os 24 meses de Guiné.
Abraço.

João Candeias da Silva