domingo, 11 de junho de 2017

Guiné 61/74 - P17455: Blogpoesia (514): "Ponte do silêncio"; "Sarilhado de fios" e "Leitura das almas", poemas de J.L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728



1. Do nosso camarada Joaquim Luís Mendes Gomes (ex-Alf Mil da CCAÇ 728, Cachil, Catió e Bissau, 1964/66) três belíssimos poemas, da sua autoria, enviados entre outros, durante a semana, ao nosso blogue, que publicamos com prazer:


Leitura das almas

Perscruto nos olhos das gentes
suas almas ocultas.
Nuvens de angústia toldam seus rostos.

O peso dos anos é muito
e escassa a esperança de vida.
É brando o fogo que lhes arde lá dentro.

Aquele apelo de luta que o dia-a-dia exigia
extinguiu-se com a última saída dos filhos.

Agora, navegam sozinhos, ao longe,
no mar das distâncias.

Implacável é a lei que assim ordenou,
sem prévia consulta,
a ver se as almas queriam...

Bar do Reichelt em Berlim, 7 de Junho de 2017
8h47m
Jlmg

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Ponte do silêncio

Feriado nacional, depois do Sábado e Domingo.
Uma ponte com sabor a mel.

Seis da manhã.
Seria a hora do fervilhar da vida laboral.
Estradas e passeios cheios.
A caminho da escola e do trabalho.

Em vez disso, um deserto de silêncio.
Até os canitos são sacrificados
Sem passeio matinal.

Apenas os melros e os passaritos
Cirandam nas suas lidas.

E eu que não sou alemão
Me passeio só,
Com minhas canadianas,
Testemunhando a paz e a harmonia verde
Que por aqui reina.

Num placar ao alto,
Demarcando uns cem metros,
Há um aviso aos carros estacionados:
- "Proibido estacionar aqui,
de sete a dez de Junho,
para se cuidar das árvores"

Cada uma delas ostenta no tronco,
uma ficha com seu número de identidade!...

Berlim, Bar dos motocas, 5 de Junho de 2017
9h33m
Jlmg

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Sarilhada de fios

Para pôr o computador a carburar,
Há uma sarilhada de fios a desenlaçar.
É o da corrente que se esconde na mala enrodilhado.
É o rato ladino que se esgueira ao trabalho como um rato.

É o da net que se emaranha numa teia sem aranha.
E o dos fones para calar os megafones.

Só depois eu páro e acendo a combustão.

Depois, é o clarão do mundo que se abre e aproxima.
Vêm as boas e muitas más.

Uma a uma, se acende verde o facebook.
Vem a troca. Cada um com seu farnel.
Cada um o seu sabor.

Aqui se chora, ali se ri.
Há os sérios e meditabundos.
E os cegos que só a si se vêem.
Mas também os generosos.

Os que pintam e os que escrevem lindamente.
Cada um na sua língua.

Depois, é a debandada.

Valeu a pena a trabalheira...

Berlim, no bar do Reicheld, 6 de Junho de 2017
8h55m
Jlmg
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Nota do editor

Último poste da série de 4 de junho de 2017 > Guiné 61/74 - P17430: Blogpoesia (513): No Dia dos Amigos (Juvenal Amado, ex-1.º Cabo Condutor Auto Rodas do BCAÇ 3872)

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