domingo, 3 de setembro de 2017

Guiné 61/74 - P17726: Blogpoesia (527): "Calhamaço..."; "Ricochete da natureza..." e "Desembecilhar a desordem...", poemas de J.L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728

1. Do nosso camarada Joaquim Luís Mendes Gomes (ex-Alf Mil da CCAÇ 728, Cachil, Catió e Bissau, 1964/66) três belíssimos poemas, da sua autoria, enviados entre outros, durante a semana, ao nosso blogue, que publicamos com prazer:


Calhamaço…

Já faz um calhamaço o livro da minha vida.
Cada dia é uma folha que eu rabisco.
Encetei há pouco o quarto capítulo.
O da infância tem caligrafia pura em traço fino.
Revela cores e tons de sol nascente.
Se desfaz em luz.
Cheira a campo e mar.
Seu perfume é das flores e maresia.
Nele se cinzelou a minha alma.
Seu código foi a fraternidade e a boa
vizinhança.
Depois veio o da escola. Com tantos vícios.
Modelação insensível, à sombra de intenções malsãs.
Como a da competição e a adoração da força.
A do quanto mais se tem melhor.
Sem importar o como.
A seguir o da tropa. Com suas paradas de obediência à força.
Onde o gatilho era o valor supremo.
Depois veio o da vida. Mar tumultuoso. Com tantos ventos.
O naufrágio é a ameaça constante.
Agora, viver é fazer de conta e reler atrás…

Café Castelão, em Mafra, 29 de Agosto de 2017
Vê-se gente com guarda-chuva aberto…
Jlmg

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Ricochete da natureza…

Parece serena dormindo.
Assiste calada. Cala e regista.
Tolera com tino.
Quando se passa da escala,
Se levanta mostrengo,
No bojo do mar.
Urra. Estrebucha.
Assusta inclemente.
Arrasa e inunda.
Inferniza de fogo,
Searas, aldeias e matas.
Vira terror.
Ninguém a atice.
Tem garras de fera.
Arrosta potente o forte e o fraco.
Açoita, dizima
E fica sempre por cima.
Ninguém se meta com ela…

Café Castelão em Mafra, 1 de Setembro de 2017
8h52m
Jlmg

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Desenvencilhar a desordem

Quando sopram os ventos da desordem, tudo se ensarilha.
Num instante se instala a confusão.
O desencontro. O desalinho.
Trocam-se os caminhos. Os destinos certos ficam por alcançar.
O desespero alastra sobre as almas.
A constância dos confrontos.
Por tudo e nada.
A paciência morre e a guerra vem.
A ordem gera a paz e a harmonia.
A beleza emerge e tudo banha.
Surge o gosto por viver.
Frutificam as boas iniciativas e boas obras.
As almas bailam de alegria.
Festejam-se os sucessos e aniversários.
Sobram espaços para o lazer.
O calor do amor aquece os corpos de desejos.
Viver é doce e o tempo parece a eternidade.

Ouvindo o 4.º concerto de Beethoven em piano por Hélène Grimaud
Tapada de Mafra, 2 de Setembro de 2017
7h54m
dia de sol
Jlmg
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Nota do editor

Último poste da série de 27 de agosto de 2017 > Guiné 61/74 - P17705: Blogpoesia (526): "Por vielas e azinhagas..."; "Cada dia uma flor..." e "Três anos da minha vida...", poemas de J.L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728

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