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segunda-feira, 19 de fevereiro de 2024

Guiné 61/74 - P25186: Efemérides (426): "Pipito Ka Muri": foi há dez anos, a 18/2/2014, que deixou a Terra da Alegria, mas com ele, o seu exemplo, a sua memória, renasce agora a nova AD - Acção para o Desenvolvimento


Lisboa, Campus da Escola Nacional de Saúde Pública da Universidade NOVA de Lisboa > 7 de setembro de 2007 >

Neste rosto luminoso e fraterno, havia carisma, afabilidade, determinação, coragem física e moral, visão estratégica  e capacidade de liderança,  seis qualidades pessoais que eu identificava e admirava no engº agrº Carlos Schwarz da Silva (1949-2014), mais conhecido por Pepito ("nickname" que vem dos tempos da meninice: segundo o irmão João, o Carlos tinha um herói, uma das figuras de banda desenhada do "Cavaleiro Andante", o Agapito, um nome com 4 sílabas, difíceis de pronunciar por uma criança, e que ele abreviava, chamando-lhe "Pepito").  Na sua terra, continua a ser o "Pipito", mesmo dez anos depois da sua morte (física)... "Pipito Ka Muri": foi a singela homegem que os seus famliares, amigos e antigos colaboraradores lhe acabaram de fazer no bairro do Quelelelé, em Bissau, sede da "nova" AD - Acção para o Desenvolvimento (a ONGD tem novos corpos sociais e está resconstruir a sua sede.)

O Pepito tem 250 referências no nosso blogue. O irmão João escreveu-lhe,em 18 de dezembro de 2023, uma notável fotobiografia, no seu blogue.

Foto (e legenda): © Luís Graça (2024). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Programa da homenagem ao Pepito,  "nickname", do eng. Carlos Schwarz da Silva  (Bissau, 1949-Lisboa, 2014). 



1. Mensagem de Catarina Schwarz, filha do Pepito e da Ilsabel Levy Ribeio, e membro da nossaTabanca Grande, com data de hoje, 7h21,

Olá, Luís,

Espero que estejam todos bem!

Nós andamos por Bissau, naquela "rotina" tão nossa.

A AD vai assinalar amanhã os 10 anos da morte do meu pai. Apesar da distância, partilho contigo o programa.

É possível que a RDP África passe uma peça.

Beijinhos,

Catarina

2. Resposta do editor LG:

Catarina, fico muito feliz por saber de ti... e da "nossa" AD!,,, Pois é, já se passaram dez anos que o teu querido pai e nosso saudoso Pepito deixou, sem tempo de se despedir, a Terra da Alegria... Queremos associar-nos a essa homenagem... Vamos estar atentos também à RTP África.

Já fui ao Facebook da AD, vi e o programa e os vídeos de homenagem ao nosso Pepito...

Obrigado pelo teu alerta. (Não sou muito "facebook...eiro".)   Parabéns a todos, vamos ver se retomamos os nossos contactos (a Tabanca Grande tinha uma relação especial com a AD no tempo do teu pai)... 

Houve aqui um tremendo vazio de 10 anos, depois do "golpe de estado" que se seguiu à sua morte...Beijinhos para ti e o resto da família. Boa saúde, bom trabalho paara os cooperantes da AD. Luis.

___________

Nota do editor:

Últumo poste da série > 13 de janeiro de 2024 > Guiné 63/74 - P25065: Efemérides (425): O António Marques, meu companheiro de infortúnio, na CCAÇ 12, cujo relógio parou às 13h30 do dia 13 de janeiro de 1971: nunca se esquece de me telefonar todos os anos, neste dia e hora (Luís Graça)

terça-feira, 15 de junho de 2021

Guiné 61/74 - P22283: (De)Caras (172): Pepito, o amigo sportinguista (Carlos Fortunato, ex-fur mil trms CCAÇ 13, "Os Leões Negros", Bissorã, 1969/71, e presidente da direção da ONGD Ajuda Amiga)


1. Mensagem do nosso camarada Carlos Fortunato, (ex-Fur Mil TRMS da CCAÇ 13, "Os Leões Negros", Bissorã, 1969/71, e presidente da direcção da ONG Ajuda Amiga):

Luís
Tenho-me lembrado mais frequentemente do nosso falecido amigo, o Pepito, porque o Sporting esta época arrasou e isso seria uma grande alegria para ele.

Quando do seu falecimento escrevi o texto que envio em anexo, que era para integrar um livro de memórias, mas que não se concretizou e que poderiamos publicá-lo no blog. Juntem uma foto minha com ele se acharem bem.

A primeira fase do projeto da construção da escola em Nhenque pela Ajuda Amiga, está nos seus acabamentos finais, terminando este mês, depois farei um pequeno texto e enviarei fotos da mesma, mas fica ja aqui mais uma vez o nosso agradecimento pelo apoio dado a esta obra, que também é vossa.

Esperemos que a consignação do 0,5% do IRS nos ajude a concluir a mesma, relembramos que o nosso NIF é o 508617910. As fotos do andamento da construção estão no site da Ajuda Amiga http://www.ajudaamiga.com

Um grande obrigado a todos pelo empenho e dedicação que têm dado ao blog e um alfa bravo romeo alfa charlie oscar.

Carlos Fortunato
Ex-Furriel da CCaç 13 (1969-1971)
Presidente da Direção da Ajuda Amiga


Guiné-Bissau > Bissau > C. 2006 > Pepito (1949-2012) e Carlos Fortunato

Foto: © Carlos Fortunato (2021). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Pepito, o amigo sportinguista

A minha amizade com o Pepito foi algo que me honrou e me marcou, porque são raros os homens com as suas qualidades, e não digo isto apenas por dizer, a sua obra na AD fala por si, relembro apenas um episódio que se passou entre nós, para mostrar a sua grandeza e amizade.

Um dia ofereci-lhe uma carrinha de caixa aberta que comprei na Guiné-Bissau, para me poder deslocar durante as curtas estadias que ali faço (3 semanas uma vez por ano ou de 2 em 2 anos), ele poderia fazer dela o que quisesse, era dele, o que lhe pedia era que, enquanto estivesse na sua posse e operacional, me disponibilizasse a mesma quando eu ali me deslocasse, pois era difícil alugar carrinhas.

A carrinha estava legalizada, o seu estado era impecável, tinha tido uma grande reparação, parecia nova, ficar proprietário dela seria, para qualquer um, uma tentação, no entanto a resposta do Pepito foi negativa, não aceitou, e apesar de ter muito trabalho ofereceu-se para ficar responsável pelo seu aluguer, e por assegurar a sua manutenção, colocando o dinheiro deste aluguer no banco em meu nome.

Não aceitei a sua oferta amiga, porque não era minha intenção sobrecarregá-lo com trabalho, mas não pude deixar de admirar o seu desprendimento pelos bens materiais.

O Sporting era o nosso tema de brincadeira e quando lhe disse que não tinha clube, "batizou-me" de sportinguista, e confessou-me que quando via o Sporting jogar se exaltava e vivia aqueles momentos com uma estranha intensidade.

Um dia uns amigos animistas,  na fé de o protegerem, convidaram-no a ir ao anoitecer fazer uma cerimónia secreta, junto a um poilão sagrado, o Pepito aceitou, curioso em conhecer esse ritual.

A cerimónia envolveu um banho, mas nesse dia jogava o Sporting e, atrasado para o jogo, o Pepito vestiu-se à pressa sem se enxugar, ficando a camisa toda molhada.

A esposa, Isabel, ao ouvir a sua entrada em casa, foi à sala saber dele, e conhecedora da sua paixão pelo Sporting, quando o viu assim todo molhado a olhar para a televisão, pensou que era devido ao jogo, e admirada por o ver já naquele estado, exclamou:
- Já começou! - e saiu da sala, porque,  se já estava assim, as coisas não estavam a correr bem, e o melhor era deixá-lo sozinho.

O Pepito contou-me esta história a rir, comentando:
- Não sei explicar o porquê de ficar assim. No resto das coisas, no dia a dia, isso nunca acontece.

Por isso Pepito, aqui fica um "VIVA O SPORTING!".

J. Carlos M. Fortunato
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Nota do editor

Último poste da série de 14 DE JUNHO DE 2021 > Guiné 61/74 - P22280: (De)Caras (137): Manuel Maurício, fur mil, chefe da equipa do BENG 447, que fez a construção das instalações do aquartelamento de Dulombi, ao tempo da CCAÇ 2700 (1970/72)

quinta-feira, 25 de março de 2021

Guiné 61/74 - P22038: Ser solidário (237): Consignação do IRS - uma ajuda à ONGD "Ajuda Amiga", NIPC 508617910 ...Foi fundada por um grupo de antigos combatentes...Vamos ajudar a acabar a construção da escola de Nhenque, Bissorã


Foto nº 1 > 2010 – Armazém da Ajuda Amiga na Amadora: orrganizando e embalando livros escolares: da esquerda para a direita, Carlos Silva, Helder Pereira, Bernardes, Armando Pires, António Ortet e Ilídio.
 

Foto nº 2 > Guiné-Bissau > Região do Oio > Bissorã > Nhenque [, a nordeste de Bissorã, na margem direita  do Rio Mansoa].  > 23 de março de 2021 > Construção da Escola da Ajuda Amiga de Nhenque,  em progresso


Foto nº 3 > Guiné-Bissau > Região do Oio > Bissorã > Nhenque > 2020 > Faia Djaló, filho de pai português


Foto nº 4 > Guiné-Bissau > Região do Oio > Bissorã > Nhenque > 2019 > Crocodilo aguarda oportunidade


Foto nº 5 > Guiné-Bissau > Região do Oio > Bissorã > Nhenque > 2020 > Pequeno crocodilo capturado na bolanha.


Foto nº 6 > Guiné-Bissau > Região do Oio > Bissorã > Nhenque > 31 de março de 2019  > As crianças pedem ajuda 

Fotos (e legendas):: © Carlos Fortunato (2021). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



1. Mensagem dp Carlos Fortunato, ex- ao Carlos Fortunato (ex-fur mil trms, CCAÇ 13, Os Leões Negros, Bissorã, 1969/71, e presidente da direcção da ONG Ajuda Amiga) [, foto à direita]:

Assunto - Ajuda Amiga

Data - 24 mar 2021, 13h33

Amigo e Camarada Luís Graça

Envio-te um post pedindo o favor de o publicarem. É um post na continuação de outro que foi publicado em 13-04-2019.

O projeto está a avançar de acordo com o planeado, começamos a preparação em 2020 e vamos terminar esta fase até Abril, para podermos abrir a escola em Outubro.

Darei noticias quando da conclusão desta fase.

Um abraço, tudo a correr pelo melhor e muito obrigado pela vossa colaboração e apoio.

J. Carlos M. Fortunato
Presidente da Direção da ONGD Ajuda Amiga
E-mail jcfortunato2010@gmail.com | E-mail jcfortunato@yahoo.com
Telem. +351 935247306

Escritório > Ajuda Amiga – Associação de Solidariedade e de Apoio ao Desenvolvimento
Rua do Alecrim, nº 8, 1º dtº
2740-007 Paço de Arcos

Sede > Ajuda Amiga – Associação de Solidariedade e de Apoio ao Desenvolvimento
Rua Mário Lobo, nº 2, 2º Dtº.
2735 - 132 Agualva - Cacém

Armazém > Centro de Atendimento da União das Freguesias do Cacém e São Marcos
Rua Nova do Zambujal, 9-A, Cave
2735 - 302 - Cacém

NIPC 508617910
ONGD – Organização Não Governamental para o Desenvolvimento
Pessoa Coletiva de Utilidade Publica

Telemóvel +351 937149143


SER SOLIDÁRIO > AJUDA AMIGA CONSTRÓI ESCOLA 
EM NHENQUE, BISSORÃ

por Carlos Fortunato 

A Ajuda Amiga foi constituída em 2008 por um grupo de antigos combatentes que estiveram na Guiné, sensibilizados pela situação daquele povo e dos seus antigos camaradas que por lá ficaram.

A Ajuda Amiga enviou e distribuiu desde 2008 até 2020 154,4 toneladas de artigos, entre os quais 208.290 livros, que beneficiaram mais de 300.000 alunos. Os elementos da Ajuda Amiga que acompanham os projetos pagam as suas despesas.(Foto nº 1)-

Em 2018 o principal objetivo da Ajuda Amiga passou a ser apoiar a construção de uma escola, pelo que todos os donativos passaram a ser canalizados para esse fim. O projeto será realizado por fases em função das receitas que se consigam angariar. (Foto nº 2) 

Em 2021 ficará construída uma sala polivalente, com uma pequena arrecadação que servirá de secretaria, biblioteca, sala de reuniões, etc., duas salas de aulas e duas latrinas, uma para as meninas, outra para os meninos. A escola entrará em funcionamento no inicio do ano letivo 2021/2022.

O Faia Djaló é o mestre-de-obras que está a construir a escola, não sabe quem é o seu pai, segundo a sua mãe foi um militar português que passou por Bissorã em 1965 ou 1966. (Foto nº 3)

A criação desta escola permitirá as crianças mais pequenas deixarem de ter que atravessar uma perigosa bolanha.

Os alunos do primeiro e terceiro ano irão ter aulas de manhã e o segundo e o quarto ano à tarde. As próximas estruturas a construir serão um poço, uma terceira sala de aulas para o quinto e sexto ano, uma cozinha e um refeitório.

A componente alimentar tem aqui grande importância, pois através do PAM – Programa Alimentar Mundial é possível conseguir alimentos e dar uma refeição às crianças, o que tem um impacto enorme.

Nhenque (localizada no setor de Bissora, fica perto de Binar e a uns 14 kms de Bula) foi escolhida pelo drama que as crianças vivem para ir à escola, pois têm que atravessar uma bolanha com crocodilos para lá chegarem. (Fotos nºs 4 e 5). 

Ao fazerem a travessia as crianças vão acompanhadas pelos familiares mais velhos para as proteger, vão armados com paus com os quais afastam os crocodilos, é uma tarefa arriscada e difícil, pois quando o crocodilo mergulha é impossível vê-lo naquela água castanha. 

O Sambu Utna Sanha,  de 22 anos. que estava a proteger as crianças foi apanhado pela perna por um crocodilo, valeram-lhe os restantes elementos que, ao baterem na cabeça do crocodilo com os paus,  o convenceram a largar o jovem

As crianças de Nhenque pedem ajuda e agradecem através da Ajuda Amiga todos os donativos (Foto nº 6), pois é com base neles que conseguimos cumprir esta nossa missão, eles são totalmente utilizados nos projetos, neste caso no projeto de construção da escola, as despesas de funcionamento da Ajuda Amiga são suportadas pelas quotas dos sócios. (**)

No site da Ajuda Amiga, na página “Noticias” estão mais textos, fotos e vídeos da nossa atividade como associação ao longo destes anos e na página “Atividades” os nossos Relatórios e Contas.

Vd aqui: http://www.ajudaamiga.com

Conta da Ajuda Amiga

NIB   0036 0133 99100025138 26

IBAN PT50 0036 0133 99100025138 26

BIC   MPIOPTPL




2. Comentário do editor LG:

Carlos, parabéns pela tua/vossa abnegação!... E mais: persistência, generosidade, solidariedade, credibilidade...Temos que falar mais destas resistentes e heróicas ONGD...

Zero vírgula cinco por cento do nosso IRS é como um afluente de um afluente do rio Geba... Não é muito, ajuda a aumentar o caudal que desagua no estuário...

Infelizmente não tenho notícias da AD - Acção para o Desenvolvimento, desde que o Pepito morreu... (e nos deixou um grande vazio e muita saudade).

Está o pedido publicado, estávamos justamente à espera de elementos informativos da Ajuda Amiga... Vamos também divulgar no Facebook da Tabanca Grande.

Mantenhas. Luis


3. Resposta do Carlos Fortunato:

Obrigado pela rápida resposta, disponibilidade e empenho.

Relativamente à AD, depois do falecimento do Pepito continuámos a colaborar com a AD e enviámos dois contentores com a sua colaboração, contudo houve falta de informação da parte AD, bem como o envio de documentos, fotos, etc., não podemos aceitar um buraco negro onde as coisas desaparecem, até porque sem elas também não podemos dar conta aos nossos doadores.

Depois de quase um ano à espera de respostas, perante a nossas insistência responderam que não eram nossos criados.., isso levou a deixarmos de colaborar com a AD e passámos a colaborar com a FED - Fundação Educação e Desenvolvimento, que é do Alexandre Furtado.

Presentemente não enviamos contentores, o que enviamos de bens é muito, muito pouco e essa colaboração no envio e distribuição deixou de ser importante.

Não há pessoas imprescindiveis, mas o Pepito faz muita, muita falta.

Aquele abraço

Carlos Fortunato
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Notas do editor:


(*) Vd. postes de 8 de março de 2020 > Guiné 61/74 - P20711: Ser solidário (227): Vamos ajudar a "Ajuda Amiga", consignando-lhe 0,5% do nosso IRS... Recebeu em 2019 a importância de 2.240,48 euros... Vamos utrapassar esta verba este ano.

segunda-feira, 4 de novembro de 2019

Guiné 61/74 - P20312: Notas de leitura (1233): “A Sociedade Civil e o Estado na Guiné-Bissau, Dinâmicas, Desafios e Perspetivas”, coordenação de Miguel Barros; Edições Corubal, 2014 (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 31 de Janeiro de 2017:

Queridos amigos,
Este documento que contou com a coordenação de um dos mais promissores sociólogos guineenses, Miguel de Barros, ativista da democracia participativa, dá-nos um entendimento da fragilização do Estado, das mudanças ocorridas na sociedade civil após 1991, com o reconhecimento do multipartidarismo, fica-se com um quadro de referência de quem é quem na sociedade civil, quais as vulnerabilidades e até perversidades existentes no universo associativo, procede-se a recomendações e não se ilude que no quadro dos cenários se impõem três vias: um Estado funcional, uma sociedade civil forte e um sistema democrático viabilizado, um Estado frágil, uma sociedade civil dependente de um sistema democrático de fachada ou, mais grave ainda, um Estado disfuncional, uma sociedade civil fraca e um sistema democrático ameaçado.
Sem querermos ser patéticos, tudo se encaminha, insidiosamente, para a terceira hipótese.

Um abraço do
Mário


A sociedade civil guineense: ásperos tempos, esperanças enormes

Beja Santos

Miguel de Barros
A obra intitula-se “A Sociedade Civil e o Estado na Guiné-Bissau, Dinâmicas, Desafios e Perspetivas”, coordenação de Miguel Barros, Edições Corubal, 2014.

O autor é um dinâmico sociólogo, diretor executivo da ONG Tiniguena e autor de trabalhos relacionados com a sociedade civil, em dimensões como a segurança alimentar, a participação das mulheres na política, a juventude e as transformações sociais na Guiné-Bissau. Graças a um programa patrocinado pela União Europeia, cujo objetivo é contribuir para a consolidação da boa governação e o envolvimento dos atores não estatais, procede-se neste trabalho a um diagnóstico para identificar as organizações da sociedade civil, em particular organizações não-governamentais (sindicatos, associações de base, redes e plataformas, grupos temáticos), e procurar entender os desafios que se põem para que estes parceiros desenvolvam parcerias com todas as organizações dedicadas ao desenvolvimento da sociedade civil.

Primeiro, o ambiente de trabalho, a grave crise económica e social permanente, em que o Estado reduziu a sua intervenção em simultâneo com a perda de capacidade económica e do poder de compra das famílias. As convulsões político-militares, os golpes de Estado, a fragilidade governamental, o próprio Estado frágil acarretam crescimento negativo, empobrecimento, quebra nos indicadores de desenvolvimento humano. A sociedade civil iniciou um processo de autonomização com o definhamento do partido-Estado e o multipartidarismo, fenómenos contemporâneos do fim dos monopólios estatais e da omnipresença do Estado na esfera dos negócios.

Segundo, foi nesse contexto que cresceram as iniciativas de mobilização coletiva, brotaram as organizações não-governamentais, fenómeno a que não foi indiferente o aparecimento de fundos oriundos da Ajuda Pública ao Desenvolvimento, constelação social que revela aspetos muito positivos mas também perversos, por estarem independentes das agendas dos financiadores e dos programas.

Terceiro, importa não esquecer que a ideia da sociedade civil no contexto guineense não está forçosamente ligada nem à implantação das estruturas modernas do Estado colonial nem ao próprio colonialismo, investigadores de mérito já identificaram uma sequência cronológica desde o período pré-colonial que atesta a existência de movimentos e associações de cidadãos cujo campo de ação está da esfera do Estado. Um desses investigadores, Carlos Cardoso recorda que a sociedade civil guineense retira a sua força de várias fontes históricas, incluindo a evolução das relações e das alianças interétnicas, das estruturas sociais baseadas em classes de idade, dos sistemas de autoridade das aldeias, das formações socio-religiosas, etc. Mas o atual quadro das organizações da sociedade civil deve ser entendido pelo dado primordial da incapacidade do Estado em satisfazer as necessidades elementares das populações e de não estar presente em todo o território. Miguel de Barros enuncia o quadro jurídico-legal constituinte da sociedade civil guineense, releva os seus dilemas, paradoxos e desafios, mostra as suas debilidades, fenómenos de tendência autocrática, inexistência de recursos apropriados, excessiva burocratização do sistema de financiamento das organizações internacionais, falta de criação de atividades alternativas geradoras de rendimento, uma gama de vulnerabilidades, em suma, a que não escapam os sindicatos, as associações socioprofissionais, as organizações não-governamentais, as redes e plataformas, até as universidades e centros de pesquisa.

Quarto, nesta atmosfera, e de acordo com o diagnóstico efetuado mediante questionário e conversas presenciais com estes diferentes agentes sociais, o relatório propõe dinâmicas, rasga perspetivas. É observado na sequência dos imperativos da guerra civil, emergiu uma nova rede de solidariedade e de ajuda humanitária, estabeleceu-se um amplo movimento congregacional, e dão-se exemplos. Um deles é o Movimento da Sociedade Civil para a Democracia e Paz, albergando no seu seio um elevado número de organizações não-governamentais, sindicatos, igrejas, organizações de jovens e de mulheres; outro é a Célula das ONGs (CECRON) que surgiu no âmbito do apoio e canalização da ajuda humanitária aos deslocados da guerra. O desmantelamento do sistema económico-social pós-conflito levou a repensar o Estado e a sociedade civil. Instalou-se a UNIOGBIS, com o intuito de garantir a segurança às populações. Os partidos políticos tiveram que apresentar propostas com base de superação da fragilidade do Estado. A sociedade civil envolveu-se no campo político, proliferam plataformas, certas ONGs como AD – Ação para o Desenvolvimento ou TINIGUENA adquiriram credibilidade, mas o mesmo se pode dizer das organizações religiosas e de muitas associações comunitárias, caso dos grupos de Mandjuandades e no campo dos direitos humanos a Liga Guineense é o farol da vigilância e da denúncia.

Quinto, há que repensar o Estado e sociedade civil, esta tem vindo a caminhar de forma lenta mas positiva. A sociedade civil implica a limitação da intervenção estatal e a clarificação de áreas de intervenção. Interroga-se a insustentabilidade das ONG, e Miguel Barros defende que é preciso encontrar um novo empreendedorismo político e económico baseado no contrato social. 

“Isto quer dizer que a economia deve estar implantada numa sociedade civil mais ampla e que albergue as interações sociais baseadas em normas como a confiança, fiabilidade, capacidade para o compromisso com todos os atores sociais e um reconhecimento mútuo não violento. Para isso é fundamental a reforma do sistema político”.

Sexto, no tocante a recomendações, estratégias e cenários futuros, o documento aponta para a revisão e atualização do quadro legal que enquadra as organizações da sociedade civil, que se esclareça as formas de normalizar a contribuição do Estado para estas organizações e como estas se devem relacionar com o setor privado. Segundo o relatório, temos três cenários pela frente: o primeiro com um Estado funcional numa sociedade civil forte e um sistema democrático viabilizado, portanto um ambiente promissor para a transformação estrutural do país, das instituições públicas, da economia e da estabilidade política; um segundo caraterizado por um Estado frágil, uma sociedade civil dependente de um sistema democrático de fachada, no qual o país continuará a viver ciclos de instabilidade controlada; e por último, um Estado disfuncional, uma sociedade civil fraca e um sistema democrático ameaçado.
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Nota do editor

Último poste da série de 1 de novembro de 2019 > Guiné 61/74 - P20298: Notas de leitura (1232): Missão cumprida… e a que vamos cumprindo, história do BCAV 490 em verso, por Santos Andrade (30) (Mário Beja Santos)

quarta-feira, 27 de dezembro de 2017

Guiné 61/74 - P18147: Feliz Natal 2017 e Melhor Bom Ano Novo 2018 (15): Anabela Pires, que vai voltar à Guiné-Bissau por quatro semanas, em 18 de janeiro...


Um Natal em Harmonia e um Feliz 2018, são os votos da Anabela Pires, ecologista, defensora da permacultura, e que nos manda um "cartanito" com a sua horta que dá de tudo (e que presumo que seja comunitária)...

Foto: © Anabela Pires (2017). Todos os direitos reservados [ Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Mensagem da nossa amiga e grã-tabanqueira Anabela Pires, com data de 22 do corrente




[Anabela Pires, nascida em Moçambique, técnica superior de serviço social no Ministério da Agricultura, reformada, amiga dos nossos grã-tabanqueiros Jero (Alcobaça), Alice Carneiro (Alfragide/Amadora), e do nosso saudoso Pepito, cidadã do mundo, "globetrotter", esteve três meses, entre janeiro e março de 2012, integrada, como voluntária, no projeto do Ecoturismo, da AD - Acção para o Desenvolvimento, e a viver em Iemberém; foi o golpe de Estado de 2012 que a obrigou a sair da Guiné-Bissau; vai lá voltar em 2018; tem 25 referências no nosso blogue, dela publicámos o "diário de Iemberém"; pacifista e feminista, ela não gosta que a gente lhe chame uma "mulher de armas"... mas é assim que a gente a vê, aqui da Tabanca Grande]


Queridos familiares, amig@s, ex-colegas, vizinhos ....

Hoje é dia de começar a preparar o Natal que passarei em Alcobaça com a minha irmã e sua família. Por razões profissionais os meus filhos não poderão estar presentes mas a 28 voarei até à Dinamarca para festejar o 2º aniversário do meu neto e a passagem de ano. 

Projetos para 2018: 

(i) dia 5 de Janeiro venho por aqui para levar os meus pertences para Coimbra e fazer a mala para ir a 18 quatro semanas à Guiné-Bissau; 

(ii) a 15 de Fevereiro regresso e começarei então a fazer o caminho de volta ao Algarve ao fim de 6 anos. 

Esta é a parte que vai ser mais complicada pois já me falta muito a paciência para arrumar e desarrumar, mas tem de ser. Bem, uma nova fase vai começar. Depois de colocar de novo todos os meus pertences no apartamento do Montenegro - o que vai levar tempo .... logo se verá o que vou fazer. 

Desejo-vos um Natal muito harmonioso e se possível muito alegre e que continuem todos em grande forma em 2018.

Reencontramos-nos em 2018? Desejo que sim! Em finais de Fevereiro estarei no Algarve muito embora depois ainda tenha de vir cá acima buscar caixotes e vasos.

Mil beijos e abraços para todos,
Anabela


P.S. Terminei ontem os meus trabalhos aqui na horta, a qual ficou conforme as fotos que mando em anexo [e de que se reproduz uma, acima]. Ainda falta plantar morangueiros Diamante e mais alfaces. As ervilhas de trepar, as favas, as cenouras, os espinafres, os canónigos (ou alfaces cordeiro) ainda não nasceram! Espero que chova! Colhi as últimas pastinacas (Cherovias ou Chírivias).

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quarta-feira, 23 de novembro de 2016

Guiné 63/74 - P16754: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande (106): meninos do Xime: numa foto de 1970, do José Nascimento, da CART 2520, vejo agachada a minha prima Sene Soncó, que depois viria a casar com um irmão meu que cumpriu serviço militar em Farim... Infelizmente, ambos já faleceram (José Carlos Mussá Biai, engenheiro florestal, Lisboa)


 Foto nº 1 A >  Guiné > Zona leste > Setor L1 >  Ao centro, a menina Sene Soncó



Foto nº 1 > Guiné > Zona leste > Setor L1 > Xime > CART 2520 > c. 1970 > Da esquerda paar a direita, de pé, fur Renato Monteiro, um dos picadores e o fur José Nascimento... Em baixo, "meninos do Xime", entre os quais a menina Sene Soncó, prima e cunhada do nosso amigo José Carlos Mussá Biai, que podia perfeitamente estar nesta foto, já que vivia nessa  altura no Xime...

 [O Zé Carlos é membro, da primeira hora, da nossa Tabanca Grande, vive hoje em Portugal onde se formou em engenharia florestal, trabalhando na Direção-Geral do Território (DGT), Direção de Serviços de Informação Cadastral (DSIC), Divisão de Cadastro Geométrico da Propriedade Rústica (DCG), Rua Artilharia Um, nº 107, 1099 - 052 Lisboa, tel. 21 381 96 00].


Foto (e legenda): © José Nascimento (2016). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




Foto nº 2 > Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Xime > 1/10/2006 > Os "minos do Xime", na escola primária, mais de 35 anos depois...


Foto nº 3 > Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Xime > 1/10/2006 >  Rua principal


Foto nº 4 > Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Xime > 1/10/2006 > Grupo de antigos combatentes que estiveram ao lado das NT durante a guerra colonial...Entre eles, dois irmãos e um primo do José Carlos Mussá Biai, membro da nossa Tabanca Grande.. (*)


Fotos (e legendas): © Domingos Fonseca  / AD - Acção para o Desenvimento, Bissau (2006). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Mensagem do nosso amigo, natural do Xime. José Carlos Mussá Biai, com data de hoje

Olá,  Luís, viva

Mais uma vez fui surpreendida pela riqueza deste nosso Blog. (**)

Nesta fotografia tirada pelo camarada José Nascimento,  da CART 2520, vejo agachada a minha prima Sene Soncó, que depois casou com um irmão meu que cumpriu serviço militar em Farim. (***)

Ambos, infelizmente já faleceram. Sene há poucos anos e o meu irmão faleceu no dia 27 de julho de 2016, vítima de alergia a um medicamento qualquer que lhe foi receitado no hospital.


Um abraço,

Zé Carlos

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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 20 de janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - P441: Estou emocionado (J.C. Mussá Biai)

(...) Estou emocionado!...

 (...) As fotos falam por si. Os locais por onde brinquei, onde dei alguns mergulhos... Melhor, ainda as pessoas que me viram nascer, que cuidaram de mim e com quem partilhei refeições, angústias e alegrias. Estou a referir-me aos meus irmaõs mais velhos (sim, meus irmãos de sangue) e de um primo-irmão dos quais lhe falei.

Os meus irmãos são, Fodé Biai, o primeiro a contar da direita para a esquerda e Bacar Biai, o segundo na mesma ordem e Malam Mané, o quarto, dos que estão de pé.

O Fodé e o Malam cumpriram o serviço militar em Farim e depois Bissau, sendo o Malam depois transferido para Bambadinca. O Bacar sempre esteve em Xime.

(...) O curioso de tudo isso, quem tirou as fotografias é um colega meu, o Domingos Fonseca, trabalhei junto com ele na Escola do Ensino Básico Preparatório Amizade Guiné Bissau - Suécia, em Bissau. Ele leccionava a língua portuguesa e eu matemática, antes de ele ir tirar o curso de engenheiro técnico agrário na Argélia. Estive com ele no ano 2000 em São Domingos onde ele estava como responsável de AD." (...)

segunda-feira, 11 de julho de 2016

Guiné 63/74 - P16293: Nota de leitura (857): As ONG na democratização da Guiné-Bissau (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 12 de Agosto de 2015:

Queridos amigos,
Não era sem tempo de procurar dar uma síntese da atividade das ONG na Guiné-Bissau, é redundante dizer que tem sido da maior importância. Basta recordar o desempenho da AD quando tinha o Pepito ao leme.
Tive o privilégio de assistir em 1991 ao aparecimento da associação dos direitos humanos que rapidamente entrou em conflito com o regime de Nino. É de lamentar que a rede internacional das ONG que ali labora não tenha um trabalho articulado com os projetos dos doadores, tudo tornaria estas inciativas para o desenvolvimento mais eficientes e compreensivas para a vida comunitária.
Entretanto, deu-me na telha andar a ver papéis da década de 1950 na Guiné, passou-me pela cabeça voltar ao romanesco como fiz com "A mulher grande", e ao mexer no relato da viagem de Craveiro Lopes à Guiné, em 1955, encontrei este preâmbulo de Sarmento Rodrigues na concessão do novo foral a Bissau, é um belíssimo texto que quero partilhar convosco.

Um abraço do
Mário


As ONG na democratização da Guiné-Bissau

Beja Santos

Na revista Africana Studia, n.º 18, primeiro semestre de 2012, encontrei um interessante artigo intitulado “A sociedade civil face ao processo de democratização e o desenvolvimento na Guiné-Bissau (1991-2011)”, da autoria de Miguel Barros. Trata-se do período que abarca o anúncio do pluripartidarismo até ao ano anterior ao golpe militar encabeçado por António Indjai.

O autor preambula com noções elementares, recordando que a democracia da sociedade civil pressupõe participação com livre expressão e pluralismo e que o regime democrático tem como mais sério obstáculo o autoritarismo. E depois traça o objetivo para o seu artigo, o de visar identificar e analisar as origens e progressos da sociedade civil guineense desde a instauração do multipartidarismo, passando pelo desafio que foi o conflito político-militar de 1998-1999. No passado, o partido-Estado (o PAIGC) controlava os trabalhadores, a juventude, as mulheres, a comunicação social, tudo em nome da unidade e segurança nacionais. Com a entrada em falência do partido-Estado, foram aparecendo e obtiveram reconhecimento outros atores sociais coletivos. Recorde-se que o desempenho da Igreja Católica face ao esvaziamento do Estado, concretamente nos anos 1980 foi o de reforçar a sua influência nos domínios cruciais da saúde e da educação. O conflito político-militar saldou-se por uma maior projeção da Igreja Católica e o seu bispo de então impôs-se como uma das grandes figuras morais na mediação do conflito. D. Camnaté Na Bsing, primeiro bispo de origem guineense, goza igualmente grande prestígio.

A liberdade sindical tornou-se uma realidade, o SINAPROF – Sindicato Nacional de Professores, e o SNTTC – Sindicato Nacional dos Transportes e Telecomunicações, por exemplo, foram decisivos nas denúncias das condições precárias de trabalho e salários na Guiné-Bissau. Para além da UNTG (que congrega 17 sindicatos filiados) existe hoje a Confederação Geral dos Sindicatos Independentes, onde estão os sindicatos mais ativos (justiça, professores, jornalistas, transportes e telecomunicações).

As ONG trouxeram uma nova abordagem para a promoção do desenvolvimento dos domínios dos serviços de base, ambiente e direitos humanos. A sua principal fragilidade passa pela dependência de apoio externo, quando ele desaparece a ONG também desaparece.

Na comunicação social, o pluralismo manifestou-se com o surgimento do jornal Expresso Bissau, depois com as rádios privadas Pindjiquiti e Bombolom, em 1995. A Guiné-Bissau conta com uma rede nacional de rádios comunitários, estão inscritas cerca de três dezenas de rádios.

O setor onde a dinâmica da vida associativa conheceu uma maior vitalidade foi o da associação de jovens e mulheres durante a década de 1990. Há um caráter instrumental destas organizações devido à filosofia dos projetos dos doadores que privilegiam o trabalho direto com os grupos sociais.

Ganharam uma grande projeção os grupos cuja finalidade é o de preservar e fortalecer o espírito de solidariedade e assistência mútua no seio da comunidade, mandjuandades. O contributo mais significativo da sociedade civil aponta para três direções: serviços de base (saúde e educação); direitos humanos e cidadania; informar, sensibilizar e consciencializar (caso do ambiente). Nos serviços base, reduziu-se o impacto da ausência do Estado nas zonas rurais mediante iniciativas que permitiram a construção de centros hospitalares e escolas geridas pela própria comunidade beneficiária. Houve o momento em que as ONG dos direitos humanos se perfilaram como o principal, defensor dos desfavorecidos e protetor contra a violência do Estado.

O grande teste posto à sociedade civil foi o conflito político-militar, criou-se o Movimento da Sociedade Civil para a Consolidação da Paz e Democracia. O período de transição pós-conflito e pós-golpe envolvendo o presidente Kumba Yalá (2003) confirmou a falta de confiança nos políticos e forças partidárias. Nesta época reafirmou-se a autoridade moral, política e social da sociedade civil, através da indigitação de uma figura independente dos partidos para o cargo de presidente da República de Transição, o empresário Henrique Rosa. São tempos de intensa participação, surgiram mais de duas dezenas de partidos políticos, hoje em grande parte volatizados. Na atualidade, assiste-se a uma estratégia destas ONG assente em compromissos com o Estado nalguns setores: um bom exemplo é a gestão das áreas protegidas, em que AD teve um papel de realce. Como conclusão dir-se-á que a inclusão dos atores não estatais é hoje encarada como um processo incontornável, Estado e sociedade estão condenados ao entendimento. Infelizmente nem toda a estratégia dos doadores contempla diretamente o apoio a estes atores.


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E um admirável texto de Sarmento Rodrigues sobre a cidade de Bissau

Ao folhear o Diário da Viagem Presidencial às Províncias Ultramarinas da Guiné e Cabo Verde, em 1955, Volume I, coordenação de Rodrigues Matias, Agência Geral do Ultramar, 1956, encontrei um texto do comandante Sarmento Rodrigues, quando governador da Guiné, em 1948, no preâmbulo do diploma legislativo em que concedeu à Câmara Municipal de Bissau novo foral:
“O alvará régio de 15 de Março de 1692 é o registo de nascimento de Bissau. Ordenara-se a construção da primeira fortaleza, ligara-se a gente à terra. E tão bem que, de então para cá, Bissau nunca mais deixou de ser a Praça.
No entanto, e apesar de em 1855 ter Comissão Municipal, e em 1859 ser vila, durante esses dois séculos ela não foi outra coisa mais do que uma Praça. Recinto fechado e muralhado, apenas com algumas casas de comerciantes, todas de barro ou taipa, aninhadas à sombra dos baluartes e cobertas por uma paliçada, depois um muro que da Balança corria até Pidjiquiti.
Vontade de crescer, todavia, não lhe faltou. E necessidade também. Em 1894, numa das muitas pazes temporárias e submissões fictícias do gentio irreverente, proclamou-se nova zona de expansão. Um polígono de 350 metros envolvendo as muralhas. Um padre abençoa, extramuros, um local para uma igreja. As habitações, aglomeradas por detrás da parede de tijolo, ameaçavam transbordar. Um povoado queria crescer.
Até que em 1913 o governador Carlos Pereira demoliu o muro asfixiante. Bissau passava agora a não conhecer outros limites além da barreira do mato impenetrável que na sua frente se levantava. E não teve mais descanso. Abrem-se ruas através dos matagais. Em 1914 é cidade e tem o primeiro plano de urbanização. Aumentam dia-a-dia os edifícios. Velez Caroço dá-lhe, em 1923, o seu primeiro foral. A cidade precisava de ser orientada na sua vida e o no seu avanço, que se não detinha. Era a primeira urbe da província.
Em 1941 fazem-na capital da Guiné. Já então possui bairros novos, muito para além das vistas da velha fortaleza abandonada. A área do plano de urbanização de 1914 e do foral de 1923 torna-se cada vez mais escassa.
Por isso em 1945 se procedeu aio estudo do seu alargamento, começando pelos levantamentos topográficos que haviam de conduzir à concessão de nova área e a um novo plano de urbanização e expansão. Desta vez é que se chegava à colina de Bandim.
Chegamos assim à situação presente. A cidade de S. José de Bissau tem hoje um apreciável conjunto de artérias e edificações. Todas elas não bastam, porém, para os seus numerosos habitantes que aumentam dia-a-dia. Possui hotéis, hospitais, estádio, praças, monumentos, uma catedral, água canalizada, luz e todas as modernas conveniências. Secaram-se os pântanos que a envolviam e empestavam. Era indispensável alargar-lhe a área e atualizar-lhe a vida. O seu desenvolvimento não poderia continuar sujeito aos velhos processos que foram excelentes para o seu tempo. O novo foral da Câmara de Bissau tinha de ser promulgado”.

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Nota do editor

Último poste da série de 8 de julho de 2016 > Guiné 63/74 - P16285: Notas de leitura (856): (D)o outro lado do combate: memórias de médicos cubanos: o caso do cirurgião Domingo Diaz Delgado, 1966-68, segundo o livro de H. L. Blanch (2005) - Parte III: onde se faz referência à possível operação das NT, no corredor de Sambuiá, onde terá morrido o cap inf QP José Jerónimo da Slva Cravidão, da CCAÇ 1585, em 4/6/1967 (Jorge Araújo, ex-fur mil op esp / ranger, CART 3494, Xime-Mansambo, 1972/1974)

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2016

Guiné 63/74 - P15722: Notas de leitura (806): Textos de Carlos Schwarz (Pepito), na Revista Sumara, publicação da responsabilidade da Fundação João Lopes, Cabo Verde (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 5 de Fevereiro de 2016:

Queridos amigos,
O essencial sobre o ativismo e a generosa militância do Pepito já foi plasmado em depoimentos aquando do seu desaparecimento.
Pepito tinha uma conceção muito particular sobre o funcionamento e a comunicação dos museus africanos, pretendia que os diferentes projetos museológicos se inserissem numa vasta envolvente ambiental, foi assim que sonhou a edificação dos projetos museológicos para Guileje junto ao Cantanhez, e o de Cacheu inserido num parque natural, ligando a comunicação da memória como uma cidadania ativa em prol da conservação da natureza.
É esta a essência dos trabalhos à volta de Pepito publicados no n.º 1 da revista Sumara, recentemente aparecida.

Um abraço do
Mário


Pepito a falar dos museus da Guiné

Beja Santos

Saiu recentemente o n.º 1 da revista Sumara, publicação da responsabilidade da Fundação João Lopes, Cabo Verde. Explica-se que a escolha do título Sumara adveio de um termo da língua cabo-verdiana, oriundo da filosofia popular, com o significado aproximado de meditar, refletir, examinar e avaliar. Sumara terá uma periodicidade anual. Carlos Schwarz, conhecido por Pepito aparece em dois textos da revista. O professor Henrique Coutinho Gouveia, também nosso camarada da Guiné, é responsável pela nota biográfica daquele que foi a cabeça, o coração e o estômago da “Ação para o Desenvolvimento”. O professor Gouveia tece considerações sobre a conceção museológica delineada por Carlos Schwarz, que aproximava o espaço de exibição de um dado património histórico de outro que compreende parques nacionais e naturais. Pepito trabalhou entusiasticamente nas matas do Cantanhez e deu alma ao projeto museológico de Guileje, vizinho de um centro de ambiente e cultura. Pepito falava em dois museus, um sobre a guerra da independência, intitulado “Memória de Guileje”, e outro centrado no ambiente e cultura, que passaria a ser designado pouco depois por “Centro de Interpretação Ambiental e Cultural”. Mas Pepito também animou o Memorial da Escravatura, um projeto que abarcaria toda a parte histórica de Cacheu e as tabancas vizinhas.

O artigo “Museus na Guiné, uma componente do desenvolvimento”, pode ser assumido como uma das últimas e mais significativas reflexões de quem tornou a ONG Ação para o Desenvolvimento uma das mais prestigiadas da Guiné-Bissau. No seu texto, ele conecta Guileje e o ambiente e o Caminho de Escravos, localizado em Cacheu ligado ao Parque Nacional dos Tarrafos de Cacheu. E escreve: “A breve história da Guiné-Bissau, enquanto país independente, mostra a força e a energia coletiva que se desenvolve a partir daquilo que nos uniu no passado, e que sendo referências das 32 etnias que constituem o povo guineense de mais de 1,5 milhões de habitantes, são também a sua força de coesão social. A luta pela independência, o processo da escravatura e do tráfico negreiro que marcaram profundamente o povo guineense, são factos históricos em que todas as gerações se reveem e que representam um cimento aglutinador”.


Lisboa > Campus da Escola Nacional de Saúde Pública da NOVA > 6 de setembro de 2007 > Engº Agrº Carlos Schwarz da Silva (Bissau, 1949-Lisboa, 2014). Pepito, para sempre!

Foto (e legenda): © Luís Graça (2007) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados.

Espraia-se sobre o Cantanhez, as suas matas e a Memória de Guileje, e falando de o Caminho de Escravos refere que o memorial tinha a sua conclusão prevista para Novembro de 2015, seria nessa ocasião que teria lugar em Cacheu o Simpósio Internacional sobre a escravatura em Cacheu. E adianta: “Muito mais do que um simples museu, o Memorial pretende englobar toda a parte histórica de Cacheu, como o cemitério dos ingleses, a rua grande, o M’pernal, a Igreja de Nossa Senhora da Natividade, o porto de escravos, a fortaleza, bem como as tabancas vizinhas de Mata, Bolol e Cobiana”. Haverá uma particularidade no processo interativo do Memorial: “Será sempre o Memorial a ir ter com a comunidade e nunca a isolar-se dentro das suas paredes, devendo ser avaliado em função das dinâmicas que conseguir incutir nas comunidades locais, nas associações, nos governo local e central, nos historiadores nacionais e estrangeiros, nas instituições congéneres e nos financiadores”. Também foi pensado no elenco de atores: os grupos de mandjuandades, os homens grandes e régulos, os investigadores e historiadores, os centros negreiros da sub-região (como Gorée, Ribeira Grande, Boké e St. Jules. Ao sumariar estas iniciativas, Pepito não deixa de exaltar o sentido prático da função do museu, e volta a destacar que “Os Museus são locais vivos de transmissão de conhecimento, mas especialmente centros de produção de conhecimento, onde os jovens entram descontraidamente, até porque participaram em todas as fases da sua criação, estes museus mostrarão na prática a grande importância da componente cultural como fator mobilizador de vontades”.

Este artigo foi redigido em Bissau em Janeiro de 2014. Perdemos um ativista, um espírito superior, um humanista que tinha o associativismo na massa do sangue, e que amava profundamente a sua terra. A sua falta é irreparável.
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Nota do editor

Último poste da série de 5 de fevereiro de 2016 Guiné 63/74 - P15708: Notas de leitura (805): “Trabalhos e Dias de Um Soldado do Império”, por Carlos de Azeredo, Livraria Civilização, 2004 (2) (Mário Beja Santos)