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quinta-feira, 15 de outubro de 2020

Guiné 61/74 - P21452: (Ex)citações (374): Colunas militares e populações civis como escudo contra minas e emboscadas, na zona leste, no "chão fula" (Cherno Baldé / Manuel Oliveira Pereira / Carlos Vinhal)



Ponte de Lima > 2019 > 50º aniversário da missa nova de José António Correia Pereira, aqui sentado, na primeira fila [nº 4], ex-alf mil capelão, BCAÇ 3884 (Bafatá,  1972/74): é o terceiro a contar da esquerda para a direita.

O primeiro da ponta é o nosso camarada Manuel Oliveira Pereira [nº 3]. Os restantes são amigos, ex-colegas e ex-camaradas do homenageado. 

O Cherno Baldé, que é um arguto observação e tem uma memória de elefante,  identificou o Manuel Mendes Sampedro [, nº 1], ex-capitão, e o Deus [nº 2], ex-furriel mil, ambos da CCAÇ 3547 , "Os Repteis de Contuboel, tal como o ex-fur mil Manuel Oliveira Pereira [nº 3]. E mais: em comentário da este poste, já acrescentou mais um elemento, do BCAÇ 3884, o Altamiro Claro, ex-alf mil. CCAÇ 3548, que estava em Geba. (Era um craque da bola; foi presidente da CM de Chaves e é o atual provedor da Misericórdia de Valpaços).

Foto (e legenda): © Manuel Oliveira Pereira (2020) Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Comentários ao poste P21433 (*)

(i) Cherno Baldé

Caros amigos,

O Capelão do BCAÇ 3884 [, José António Correia Pereira,]ia com frequência ao aquartelamento de Fajonquito, depois de Contuboel, e a nossa curiosidade de crianças não deixava nada escapar no quartel e arredores. A pequena Capela situava-se fora do arame farpado, pelo que as missas decorriam sob os nossos olhares atentos de crianças.

Um facto curioso que nos saltava à vista, era o número muito reduzido de participantes nessas missas dominicais, comparado com o numero de soldados presentes no quartel e/ou ao reboliço que provocavam as festas de Natal e do Ano Novo.

Na imagem vé-se o [Manuel Mendes Sampedro, que vivia em Fajonquito com a esposa e um filho pequeno] (Capitão da companhia 3549 que substituiu o Patrocinio],  na segunda fila ao meio [, nº 1] e o ex-Furriel Deus (o mais alto da segunda fila de óculos) [nº 2], que entre a população nativa era uma espécie de desmancha-prazeres quando chefiava as colunas para Bafatá, pois não raras vezes, talvez por razões de segurança, era obrigado a reduzir a lotação dos carros e os visados (sempre civis) viam-se assim privados de viajar até Contuboel ou Bafatá. 

Note-se que, na altura, a coluna era um dos poucos, senão o único meio, de as pessoas se deslocarem a uma distância de mais de 30 km nas zonas de guerra.

Com um abraço amigo,

Cherno Baldé

9 de outubro de 2020 às 13:07  (**)



Emblema da CCAÇ 3549 / BCAÇ 3884, "DExós Poisar" (Fajonquito, 1972/74)

(ii) Carlos Vinhal

Caro Cherno, de Mansabá para Mansoa, o único transporte que havia para os civis eram as colunas, não me lembro se de Mansoa para Bissau havia alternativa, mas pelo menos havia coluna diária.

Algumas vezes, principalmente quando vínhamos de Mansoa para Mansabá, o pessoal civil, vindo talvez já de Bissau, aproveitava o trajecto para comer alguma coisa. Eles descontraídos a merendar e nós, tensos, principalmente na zona do corredor da morte, que, vindo de leste, atravessava Mamboncó em direcçção ao Morés. Ali perdemos o Manuel Vieira e o José Espírito Santo Barbosa.

Passa bem
Carlos Vinhal
Leça da Palmeira

(iii) Manuel Oliveira Pereira

Meu caro Cherno Baldé, meu amigo, mais uma vez, estou a contradizer as tuas "verdadeiras" observações,e porquê? Porque eu, quando possível, e enquanto comandante de Destacamento ou de "coluna", "apostava" nas viagens acompanhado pelo maior número de "civis", fazendo-os, por razões tácticas e operacionais, "inscrever-se de véspera".

Assim, excluia (uma certeza?) a probalidade de uma emboscada ou mina na picada. Usei esta metodologia, em Galomaro, Dulombi, Sonaco para Gabú, Bafatá ou Massajá. Nesta última, recordo uma "reunião de Homens Grandes" para, presumo, escolher aqueles que iriam em peregrinação a Meca. 




Guiné > Região de Bafatá > Mapa de Sonaco (1957) > Escala de 1/50 mil > Posição relativa de Sonaco e Mansajã, na estrada para Pirada (fronteira com o Senegal). Distância entre Sonaco e Mansajã: cerca de 10 km. Pirada ficava a nordeste (c. 50 km) e Nova Lamego a sudeste, mais ou menos à mesma distância.

Infogravura: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2020)


Em Sonaco fui contactado pelo Farim (capitão de milicia) no sentido de transportar estas figuras importantes a Mansajã [vd. mapa de Sonaco]. Disse ao Farim serem muitos e eu não dispor de uma segunda viatura para fazer a escolta. Respondeu-me que não seria necessário, bastava o "condutor". Perante o desafio, disse-lhe "então serei o condutor!" . Estupefacto, abre ao máximo os olhos e diz-me: "seria uma honra".

"Pois então eu levo-os", disse eu! Acrescentei: "Se me acontecer coisa, ficam instruções para arrasar as vossas tabancas".

Com um sorriso, diz-me: "Muito obrigado, Alá será a sua proteccão!..". 

Fui e regressei sozinho. Não consigo, ainda hoje, por palavras, dizer o que senti naquela " longa" viagem de retorno a Sonaco.

Abraço.





(iv) Cherno Baldé

Caro amigo Manuel Pereira:

Ao tempo da CCAC 3549 ["Deixós Poisar"], eu teria 13/14 anos e estava permanentemente no quartel [de Fajonquito]. Do que disse sobre as colunas a Bafatá não inventei nada, os acontecimentos aparecem na minha memória como fotografias guardadas num arquivo. O Furriel Deus, na altura, era um jovem de uma enorme cabeleira que ele gostava de exibir e que raramente cortava.

Não posso contradizer aquilo que tu dizes, todavia a observação que posso fazer é para dizer o quanto vocês estavam mal informados sobre a população fula de Leste.

A realidade da guerra no Sul, onde os guerrilheiros eram familiares da população civil e existiam laços fortes de entreajuda entre os dois lados não era a mesma na zona Leste onde, sem excluir a possibilidade de informadores secretos, não existiam laços de parentesco com os homens do mato, quase todos pertencentes a outros grupos étnicos e quase sempre as aldeias fulas eram o alvo privilégiado dos guerrilheiros e sempre com muitas vítimas.

Não havendo ligações e cumplicidades entre os dois lados (população e guerrilha), não vejo qual seria a vantagem de levar civis para se protegerem de eventuais ataques e/ou colocação de minas. No contexto da guerra as populações do Leste, maioritariamente de etnia fula, eram consideradas como colaboradores dos "Tugas" porque eram contra a guerra movida pelo PAIGC.

Abraços,

Cherno AB.11 de outubro de 2020 às 19:51

____________

Notas do editor:


(**)  Último poste da série > 5 de outubro de 2020 > Guiné 61/74 – P21417: (Ex)citações (373): Pássaros que esvoaçavam os céus da Guiné. Abutres.(José Saúde)

quarta-feira, 19 de junho de 2019

Guiné 61/74 - P19902: Facebook...ando (51): Altamiro Claro, ex-alf mil op esp, da CCAÇ 3548 / BCAÇ 3884 (Geba, 1972/74), atual provedor da Santa Casa da Misericórdia de Valpaços







Fotos do álbum de Altamiro [da Ressurreição] Claro, disponíveis na sua página do Facebook (com a devida vénia...)

Fotos: © Altamiro Claro (2019). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Altamiro Claro: é natural de Valpaços, vive em Chaves, onde foi presidente da respetiva Câmara Municipal. Atualmente é provedor da Santa Casa da Misericórida da sua terra, desde 2012, uma das maiores IPSS - Instituições Privadas de Solidariedade Social, do país,

Tem apenas 4 referências no nosso blogue. Foi alf mil op especiais, da CCAÇ 3548 / BCAÇ 3884 , "Os Panteras" (Geba, 1972/74). Entrou para a nossa tertúlia em 22 de maio de 2007. E é o único representante da sua companhia na nossa Tabanca Grande.

Na altura, escrveu-nos o seguinte:

(...) Caro Camarada:

Só agora tomei conhecimento do teu blogue, que desde logo despertou em mim um enorme entusiasmo.

Chamo-me Altamiro R. Claro e também eu estive na Guiné entre 1972/74, mais concretamente em Geba, como Alferes Miliciano de Operações Especiais, pertencendo à CCAÇ 3548, do BCAÇ 3884 (2).

Chamou-me especial atenção no teu blogue anterior (Abril 2005 / Maio 2006 ) as crónicas do A. Marques Lopes sobre a CART 1690 que também esteve em Geba e em especial "Guiné 69/71 - XLVI : Em memória dos Bravos de Geba..." (...) , onde nos fala dos mortos e desaparecidos da sua companhia e do monumento que então erigiram na sede de companhia.

Pois bem, no ano de 2001, quando eu exercia as funções de Presidente da Câmara de Chaves, fiz uma geminação entre Chaves e Bafatá e desloquei-me à Guiné, tendo visitado Geba, Sare Banda e Cantacunda, lugares referenciados pelo Marques Lopes.

Envio duas fotos tiradas, uma em Geba junto aos destroços do dito monumento e outra em Sare Banda.


Voltarei a contactar-vos. (...)



Guiné-Bissau  > Região de Bafatá > Geba > 2001 > O na altura presidente da Câmara Municipal de Chaves,  ex-alf mil op esp Altamiro Claro, da CCAÇ 3548 / BCAÇ 3884 (Geba, 1972/74).  junto aos restos do monumento erigido em Geba aos mortos e desaparecidos da CART 1690, a que pertenceu, em 1967, o nosso camarada A. Marques Lopes.

Foto (e legenda): © Altamiro Claro (2007). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

Na altura demos-lhe as boas vindas nestes ter,mos:

Camarada Altamiro: És bem vindo. Fazendo jus à vossa proverbial hospitalidade transmontana, direi apenas: Obrigado, amigo, entra, a tabanca é grande e é toda tua. 

Faltavam-nos algumas fotos do tempo de Guiné, que fomos agora recuperar à sua página do Facebook, Desejamos-lhe saúde, longa vida e boa sorte na concretização dos projetos que ele e a sua equipa têm para a Santa Casa da Misericórida de Valpaços e o Hospital de Valpaços (, o maior hospital de miserircórdia, do interior Norte, a abrir em breve; a misericórdia, tem mais de 200 funcionários e 800 utentes.).

Cito um excerto de entrevista recente que o rpovedor deu, há pouco tempo, em 18/9/2018, ao jornal "A Voz de Chaves":

(...) "Orgulhamo-nos de sermos considerados uma instituição de referência, não só a nível regional, mas também a nível nacional. É uma Misericórdia já anteriormente gerida com equilíbrio, mas que ao longo dos últimos anos deu um grande salto quantitativo e qualitativo. Tem sido um trabalho motivador e reconfortante, este, de servir as populações mais fragilizadas e carenciadas do concelho e da região." (...)

É bom ver os camaradas da Guiné  ativos, produtivos, solidários e saudáveis. Parabéns, Altamiro! (**)

terça-feira, 18 de junho de 2019

Guiné 61/74 - P19899: 15 anos a blogar desde 23/4/204 (9): o ataque a Sare Banda, destacamento da CART 1690 (Geba, 1967/69), em 8 de setembro de 1968: o alf mil Carlos Alberto Trindade Peixoto e o fur mil Raul Canadas Ferreira jogavam às cartas, à luz de petromax, foram mortos por uma roquetada (A. Marques Lopes)



Guiné > Região de Bafatá >  Sector L2 > Geba > CART 1690 (1967/69) > Destacamentos e aquartelamentos > 1968 > A CART 1690, com sede em Geba, tinha vários destacamentos: Banjara, Cantacunda, Sare Banda, Sare Ganá... Os destacamentos não tinham luz eléctrica e as condições de segurança eram precárias. O IN tinha uma importante base em Sinchã Jobel, a oeste de  Geba, a sul de Banjara, a sudeste de Mansabá. (*)

Infografia: © A. Marques Lopes (2005). Todos os direitos reservados.





Guiné > Região de Bafatá >  Sector L2 > Geba > CART 1690 (1967/69) > Destacamento de Banjara > 1968 > O destacamento não tinha população civil e era defendido por um pelotão da CART 1690. Distava 45 km de Geba. O ataque a Banjara, a 24 de julho de 1968, às 18h00, já aqui foi descrito há 14 anos por A. Marques Lopes.


As instalações que se veem na foto pertenciam à antiga serração do empresário Fausto Teixeira ou Fausto da Silva Teixeira,
um dos primeiros militantes comunistas a ser deportado para a Guiné, em 1925,  dono de modernas serrações mecânicas aqui, em Fá Mandinga e em Bafatá, a partir de 1928, exportador de madeiras tropicais, colono próspero e figura respeitável na colónia em 1947, um dos primeiros a ter telefone em Bafatá, amigo de Amílcar Cabral, tendo inclusive ajudado o Luís Cabral a fugir para o Senegal, em 1960...




Guiné > Região de Bafatá > Sector L2 > Geba > CART 1690 (1967/69) > Destacamento de Banjara > 1968 > O abastecimento das NT era deficiente, pelo que se recorria aos "produtos naturais" da região...

Fotos (e legendas): © A. Marques Lopes (2005). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




Guiné > Região de Bafatá > Sare Banda > 2001 > Restos do antigo destacamento de Sare Banda > Na foto, o ex-presidente da Câmara Municipal de Chaves Altamiro Claro, membro da nossa Tabanca Grande, ex-alf mil op esp, CCAÇ 3548 / BCAÇ 3884 (Geba, 1972/74).

Foto (e legenda): 
© Altamiro Claro (2007). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Sinchã Jobel > 22 de abril de 2006 > Uma bomba da FAP (Força Aérea Portuguesa), das muitas que foram lançadas sobre a base do PAIGC, durante a guerra colonial, e que não chegaram a explodir. Na foto, o nosso amigo e camarada A. Marques Lopes. Em finais de 1967, Sinchã Jobel passou a ser uma ZLIFA (Zona Livre de 
Intervenção da Força Aérea). Ficava no regulado de Mansomine, entre Mansabá e Bafatá. A foto, histórica, é do organizador desta viagem, do Porto a Bissau, em abril de 2006, o Xico Allen [ex-1.º cabo at inf, CCAÇ 3566, Os Metralhas, Empada, 1972/74]. Levou o jipe, que lá ficaria para futuras viagens. O grupo regressaria depois de avião. Acompanhou, em 22 de abril de 2006, o A. Marques Lopes neste regresso, emocionante, à mítica Sinchã Jobel. (*)

Foto (e legenda): © Xico Allen (2006). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




Guiné > Região de Bafatá > Sare Banda > 2001 > Restos do antigo destacamento de Sare Banda > 22 de abril de 2006, "a caminho de Sinchã Jobel"


Fotos (e legenda): © A, Marques Lopes (2006). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Um ataque a Sare Banda, em 8 de setembro de 1968

por A. Marques Lopes


(i) amigo e camarada, um histórico da nossa Tabanca Grande, com 240 referências no blogue;

(ii) lisboeta, filho de pais alentejanos, que vive em Matosinhos;

(iii) cor art DFA, na reforma, ex-alf mil art, CART 1690, Geba, e CCAÇ 3, Barro (1967/68)];

(iv) ferido em combate e evacuado para o Hospital Militar Principal, na Estrela, onde esteve em tratamento durante nove meses, voltando depois ao TO da Guiné para completar a sua comissão de serviço; 

(v) em abril de 2006, (re)visitou Guiné-Bissau, num viagem de grupo organizada pelo Xico Allen; 




Sare Banda estava perto de Sinchã Jobel, e é natural que fosse atacada. O alferes morto foi o Carlos Alberto Trindade Peixoto, o meu segundo substituto [, o "Aznavour", por ser parecido com o Charles Aznavour, sendo natural de Moçamedes, Angola]. O outro morto foi o fur mil Raul Canadas Ferreira [, natural da metrópole]. Mas as circunstâncias da morte deles não estão devidamente relatadas. (**)


Foi assim: este, como todos os destacamentos da CART 1690, não tinham luz eléctrica, nem mesmo um miserável gerador. Eles estavam os dois numa tenda a jogar às cartas, com um petromax aceso. Para os guerrilheiros foi muito simples, foi só apontar o RPG. 

As fotografias de Sare Banda que mando tirei-as em Abril 2006, quando a caminho de Sinchã Jobel, passando por Geba, Sare Ganá e Sinchã Sutu.

8 de setembro de 1968 : desenrolar da ação

(i) Acção inicial do IN

Em 8 de setembro de 1968, às 20h21, um numeroso grupo IN, estimado em cerca de 100 elementos instalados em semi-círculo nas direcções NE-SW e SE-NW, atacou o destacamento de Sare Banda com o seguinte armamento:

- Canhão s/recuo- Morteiro 82
- Lança granadas RPG-2
- Lança granadas P-27 "Pancerovka"
- Metralhadoras pesadas
- Metralhadoras ligeiras
- Armas automáticas
- Armas semi-automáticas



O ataque foi iniciado com um tiro ao canhão S/R e dois Lança Granadas Foguete, dirigidos contra a cantina e depósitos de géneros que atingiram mortalmente o Alferes, Comandante do Destacamento e um furriel e provocaram ferimentos numa praça. 

Estes tiros iniciais do IN atingiram e destruíram ainda o mastro da antena horizontal do rádio, ficando assim o destacamento de comunicações cortadas com toda a rede de Geba. 

No seguimento da acção do IN atingiu com uma granada incendiária uma barraca coberta por 2 panos de lona de viaturas pesadas, onde costumavam dormir vários elementos das NT por não caberem todos nos abrigos, o que provocou a destruição de todo o material lá existente e iluminação das posições das NT.


(ii) Reação das NT


a) Das forças do destacamento



Após a surpresa inicial, os elementos que se encontravam fora dos abrigos correram para os mesmos e reagiram imediatamente ao ataque IN. Não obstante terem ficado sem o seu Comandante e sem comunicações logo aos tiros iniciais, nunca perderam a calma e o moral, opondo tenaz resistência aos intentos do IN. 

Refira-se que, logo no início da reacção, as NT atingiram com tiros de morteiro a guarnição IN do canhão s/r,  calando-o definitivamente, e em determinada altura do ataque repeliram energicamente uma tentativa de penetração de elementos IN ao destacamento, que para o efeito haviam conseguido chegar junto da rede do arame farpado. 

Essa reacção, feita só à base de tiros de espingarda G-3 e granadas de mão em virtude de se ter avariado o Lança Granadas Foguete (bazuca, 8.9), foi verdadeiramente eficaz e decisiva para o desenrolar dos acontecimentos, pois o IN foi obrigado a recuar deixando no terreno 3 mortos, além de armamento e arrastado consigo outros elementos feridos e mortos.

O IN sempre perseguido pelo fogo das NT recuou cerca de 200 metros, instalando-se entre Sare Banda e Sinchã Sutu, donde continuou a flagelar o destacamento até cerca das 22h30 (1 hora e 30 minutos depois do início do ataque), altura em que desistiu dos seus intentos retirando definitivamente.

b)Das forças de Geba (CART 1690)

Em virtude das péssimas condições atmosféricas não foram ouvidos em Geba os rebentamentos de forma a poderem ter sido localizados. Refira-se ainda que o facto do destacamento de Sare Banda ter ficado sem comunicações logo de início do ataque, só permitiu que em Geba se tivesse conhecimento do sucedido cerca das 09h02, do dia seguinte,  de 9 de setembro de 1968, e através de 2 praças do destacamento que haviam vindo a pé voluntariamente comunicar a ocorrência.


Prontamente saiu de Geba uma coluna de socorro que, ao atingir Sare Banda às 017h45, fez um reconhecimento nos arredores seguido de batida de madrugada, mas já não conseguindo contactar com o IN, que havia retirado na direcção de Darsalame e se dirigindo para Sinchã Jobel. 

(iii) Resultados obtidos:

Baixas sofridas pelo IN: 8 mortos confirmados. Muitos feridos sendo possível que hajam mais mortos devido aos rastos de sangue encontrados no carreiro de retirada do IN.


Material capturado ao IN:


- 1 Espingarda semi-automática SIMONOV cal. 7,62 mm
- 1 Espingarda automática G-3 / 7,62 mm
- 1 Granadas de canhão s/r
- 2 Granadas de lança-granadas foguete
- 1 Granadas de morteiro 82 mm
- 2 Granadas de mão ofensivas RG-4
- 8 Carregadores de Met. Lig.
- 2 Fitas de Met. Lig.
- 2 Facas de mato
- 2 Bolsas p/transporte de munições
- 2 Cantis
- Diversas Munições de armas aut.

Além de uma bolsa de medicamentos, com o seguinte material:

- 3 Streptomycin. Sulphite-ampolas de 5.000.000 (Frascos)
- 1 Éter (frasco)
- 1 Mercúrio cromo (frasco)
- 1 Bálsamo (frascos)
- 10 Injecções (desconhecidas em ampolas)
- 178 Aspirinas comprimidos (carteiras)
- 96 Madexposte em comprimidos
- 6 Chinim Sulfur (comp. emb. de 5)
- 5 Codemel (carteiras de 10 Comprimidos)
- 1 Adesivo (rolo)
- 1 Algodão cardado (maço)
- 1 Garrote
- 20 Ligaduras de gaze de 10 cm x 5cm
- 1 Seringa de plástico c/agulha


A. Marques Lopes
Alf Mil da CART 1690 


[Revisão / fixação de texto: LG](***)

____________

Notas do editor:

(*) Vd. postes de:


5 de outubro de 2015> Guiné 63/74 - P15202: Os jogos de cabra-cega: Sinchã Jobel (A. Marques Lopes) (Parte V): a partir da Op Invisível, de 18-19/12/1967, passa a ser uma ZLIFA (Zona LIvre de Intervenção da Força Aérea)... O alf mil Fernando da Costa Fernandes, de Santo Tirso, é morto, não sendo possível resgatar o seu corpo, e o soldado Manuel Fragata Francisco, de Alpiarça, é gravemente ferido, aprisionado e levado para Ziguinchor onde é tratado pelo dr. Mário Pádua e mais tarde, em 15/3/1968, entregue à Cruz Vermelha Internacional



(***) Último poste da série > 13 de junho de 2019 > Guiné 61/74 - P19887: 15 anos a blogar, desde 23/4/2004 (8): O soldado Machado, de etnia cigana: 'Ó Barrelas, pagas-me uma bejeca ?!'... Uma "estória" bem humorada do Mário Pinto (1945.2019)


quarta-feira, 21 de outubro de 2015

Guiné 63/74 - P15278: Os jogos de cabra-cega: Sinchã Jobel (A. Marques Lopes) (VI e última parte): 40 anos depois, entro eu mais o Xico Allen na famosa base IN do regulado de Mansomine, onde muito provavelmente repousam os restos mortais de camaradas nossos como o Agostinho Francisco da Câmara e o Fernando da Costa Fernandes


Foto nº 1


Foto nº 2

Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Sinchã Jobel > 22 de abril de 2006 > Uma bomba da FAP (Força Aérea Portuguesa), das muitas que foram lançadas sobre a base do PAIGC, durante a guerra colonial, e que não chegaram a explodir (Foto nº 1). Na foto nº 2, o nosso amigo e camarada A. Marques Lopes. Em finais de 1967, Sinchã Jobel passou a ser uma ZLIFA (Zona Livre de Intervenção da Força Aérea).

Fotos: © Xico Allen (2006). Todos os direitos reservados [Edição: LG]



Foto nº 3



Foto nº 4



Foto nº 5

Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Sinchã Jobel > 22 de abril de 2006 > Aspectos da atual tabanca, sita no local da antiga base do PAIGC. Fica a 200 metros da antiga base do PAIGC.


Fotos: © A. Marques Lopes (2006). Todos os direitos reservados [Edição: LG]


Foto nº 6

Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Sinchã Jobel > 22 de abril de 2006 > Mule Nabo, guerrilheiro do PAIGC, que esteve na base de Sinchã Jobel durante a guerra colonial, e que hoje mora lá. É irmão do Darami.



Foto nº 7

Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Sinchã Jobel > 22 de abril de 2006 > Darami Nabo, guerrilheiro do PAIGC, que esteve na base de Sinchã Jobel durante a guerra colonial, e que hoje mora lá. É irmão do Mulé.


Fotos: © A. Marques Lopes (2006). Todos os direitos reservados [Edição: LG]




Foto nº 8


Foto nº 9


Foto nº 10

Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Sinchã Jobel > 22 de abril de 2006 > Antiga base do PAIGC. Está-se ainda em plena época seca. Ainda existem árvores de grande porte.


Fotos: © A. Marques Lopes (2006). Todos os direitos reservados [Edição: LG]



Foto nº 11


Foto nº 12

Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Sinchã Jobel > 22 de Abril de 2006 > Vestígios ainda bem visíveis, nas árvores, dos bombardeamentos feitos pela Força Aérea Portuguesa.


Fotos: © A. Marques Lopes (2006). Todos os direitos reservados [Edição: LG]




Foto nº 13

Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Sinchã Jobel > 22 de abril de 2006 > Local onde se situava o posto de vigia ou sentinela dos guerrilheiros, segundo indicação do Dirami.



Foto nº 14

Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Sinchã Jobel > Local onde se situava o poço, agora tapado, para onde eram lançados os cadáveres.

Fotos: © Xico Allen (2006). Todos os direitos reservados

1. Texto de A. Marques Lopes, coronel DFA ref, ex-alf mil (CART 1690, Geba, 1967/68; e CCAÇ 3, Barro, 1968)... Em abril de 2006, (re)visitou Guiné-Bissau, num viagem de grupo organizada pelo Xico Allen...


Última parte desta série, "Jogos de Cabra-Cega: Sincha Jobel", com a reedição de alguns postes do A. Marques Lopes, que tem por objeto central a descoberta e a tentativa de destruição, pelas NT, de Sinchã Jobel, uma base ("barraca") do PAIGC, em pleno coração da Guiné, na zona leste, no regulado de Mansomine, entre Mansambá e Bafatá.


São os postes nº 35, 36, 39, 40, 45 e 763 (*), originalmente inseridos na I Série do nosso blogue, e como tal como pouco lidos e já esquecidos... Fizemos a revisão de texto (e atualizámos o texto de acordo com a ortografia em vigor). (*)

Estes "jogos de cabra-cega" fazem parte da trama do romance que o A. Marques Lopes lançou, recentemente, em junho passado, sob a chancela da Chiado Editora (capa ao lado). O autor, João Gaspar Carrasqueira, é pseudónimo literário. Aiveca, a personagem central do romance, é o "alter ego" do A. Marques Lopes. A editora meteu o livro na sua coleção "Bios", classificando-a como "biografia" e não como "romance"... Na realidade, é uma autobiografia ficcionada, de 582 pp.

Todos nos lembramos do jogo da cabra-cega, do nosso tempo de infância e de escola? "Tapam os olhos ao que é apontado para ser cabra-cega, Dão-lhe várias voltas para perder o sentido de orientação. Dão-lhe empurrões para o desorientar ainda mais e não saber para onde se virar" (, preâmbulo do livro). A vida (e a guerra) é um jogo de cabra-cega. (LG).



Pois, camaradas e amigos, eu e o Xico Allen acabámos por entrar na base do IN em Sinchã Jobel, que nunca fora tomada pelas NT, nem quando eu, sem querer, lá fui em 24 de junho de 1967 (Op Jigajoga I), nem em 31 de agosto de 1967 (Op Jigajoga II), nem em 16 de setembro de 1967 (Op Jacaré), nem 15 e 16 de outubro de 1967(Op Imparável), nem em 27 de outubro de 1967 (Op Insistir), nem em 28 de outubro de 1967 (Op Instar), nem em 19 de dezembro de 1967 (Op Invisível) e nem em 21 de dezembro de 1967 (Op Invisível II), a última que se fez para tomar essa base, comandada durante esse período por Lúcio Soares, como ele próprio me disse.

A clareira de Jobel (a tal onde sofri uma emboscada) tem agora uma tabanca (vd. fotos acima). Como chegámos lá? Fomos, eu e o Allen, até Sare Banda [vd. carta de Banjara] [Foto nº 15] e aí encontrámos um homem que nos acompanhou, indicando-nos o caminho para Sinchã Jobel.

Durante a guerra, Sare Banda era uma grande tabanca, fruto do reordenamento da zona, e onde esteve um destacamento da CART 1690. É agora pequena, vendo nós pelo caminho já várias outras tabancas, explicando-nos o homem que nos acompanhou que muita gente saíu de Sare Banda para formar outras tabancas. Naturalmente, é claro.

E chegámos a Sinchã Jobel, com alguma dificuldade, é verdade, pois existe para lá um simples carreiro. E eu cheguei à conclusão que seria mais fácil ter chegado à base se as NT tivessem ido por ali, apesar de a mata ser muito cerrada. Lá encontrámos o Dirami e o Mulé /(Fotos nºs 5 e 6), dois ex-guerrilheiros daquela base e agora moradores na tabanca de Sinchã Jobel.




O organizador desta viagem, do Porto a Bissau, em abril de 2006, foi o Xico Allen [ex-1.º cabo at inf, CCAÇ 3566, Os Metralhas, Empada, 1972/74]. Levou o jipe, que lá ficaria para futuras viagens. O grupo regressaria depois de avião. Acompanhou, em 22 de abril de 2006, o A. Marques Lopes neste "raide" até à mítica Sinchã Jobel. (LG)


Durante a guerrqa, a FAP bombardeava com regularidade a zona... Houve bombas que não rebentaram. Disse o Dirami que conseguiram rebentar várias, mas aquela que vimos [ Fotos nº 1 e 2] não tinham conseguido... e lá está ainda. Muitas delas, eu já sabia, rebentavam nas árvores, outras batiam nelas e caíam sem rebentar, porque já não caíam da forma adequada para rebentarem as espoletas. [Fotos nº 78, 9 e 10].

Duas coisas nos indicou o Dirami:

(i) uma, está ele de cócoras, "ali em frente, no tronco daquele poilão era o posto de vigia" [Foto nº 13] (as NT disseram que eles estavam em cima das árvores, mas o que sucedia é que o vigia começava logo a disparar assim que nos via entrar na clareira);

(ii) outra, está ele a dizer-me (vd. foto do cemitério, tirada pelo Allen) [Foto nº 14], "aqui, por baixo destes arbustos está um poço, para onde lançávamos os mortos, pois não havia tempo para fazer covas individuais", e está lá o poço, coberto de arbustos e já tapado com terra;

(iii) e - eu cá para mim - que "lá estarão os corpos do soldado Agostinho Francisco da Câmara, morto em 16 de outubro de 1967, e do alferes Fernando da Costa Fernandes, morto em 19 de dezembro de 1967 de dezembro de 1967, corpos esses que não foi possível recuperar durante as operações feitas nessas datas".

E ficou-me também a pena de as cabeças pensantes que mandavam na guerra terem insistido em várias operações, a começar nas bolanhas de Sucuta e Canhagina [vd. carta de Bambadinca] e na travessia do rio Gambiel, quando teria sido mais fácil e, se calhar, eficaz terem feito o caminho que eu fiz agora, tanto mais que em duas daquelas operações entrou a tropa especializada dos comandos. Coisas.

Abraços, A. Marques Lopes



Foto nº 15

Guiné > Região de Bafatá > Sare Banda > 2001 > Altamiro Claro, ex-alf mil op especiais, da CCAÇ 3548 / BCAÇ 3884 (Geba, 1972/74), e ex-presidente da Câmara Municipal de Chaves, em Saré Banda (vd. Carta de Banjara).

Foto: © Altamiro Claro (2007). Todos os direitos reservados [Edição: LG]


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Postes anteriores:

24 de setembro de 2015 > Guiné 63/74 - P15150: Os jogos de cabra-cega: Sinchã Jobel (A. Marques Lopes) (Parte IV): Op Insistir (27/10/1967): com a 5ª CCmds e dois 2 grupos de combate de cassanhos, da CART 1690

6 de junho de 2015 > Guiné 63/74 - P14707: Os jogos de cabra-cega: Sinchã Jobel (A. Marques Lopes) (Parte III): Op Jigajoga 2, 31/8/1967, e Op Jacaré, 16/9/1967... Fotos de Banjara

5 de junho de 2015 > Guiné 63/74 - P14700: Os jogos de cabra-cega: Sinchã Jobel (A. Marques Lopes) (Parte II): Depois de uma noite, perdido, na bolanha, de 24 para 25 de junho de 1967, "é tão bom estar vivo e saber onde estou e o que quero!... Bora, Braima, bora, rapaziada, toca a sair daqui"...

3 de junho de 2015 > Guiné 63/74 - P14695: Os jogos de cabra-cega: Sinchã Jobel (A. Marques Lopes) (Parte I): Op Jigajoga, 24 de junho de 1967, o meu dia de São João

terça-feira, 22 de maio de 2007

Guiné 63/74 - P1775: O Nosso Livro de Visitas: Altamiro Claro, ex-Presidente da CM Chaves e ex-Alf Mil Op Especiais da CCAÇ 3548 / BCAÇ 3884

Guiné > Zona Leste > Geba > CART 1690 (1967/69) > Croqui do monumento erigido, em Geba, aos "mortos que tombaram pela pátria"... Em 1995, a jornalista Diana Andringa visitou Geba e escreveu, a propósito deste monumento, semi-destruído, uma belíssima peça, pungente, no Público, de 10 de Junho de 1995, que merece ser retranscrita (1). Ainda recentemente ela me contactou, por telemóvel, por causa de um projecto cinematográfico que tinha em mãos, com filmagens na Guiné-Bissau, em colaboração com o conhecido realizador Flora Gomes, autor de Nha Fala (2002). Desejo, a ambos, boa sorte. Infelizmente não pude ajudá-la muito, com contactos, por estar fora de Lisboa.

Foto: © A. Marques Lopes (2005). Direitos reservados.

Guiné > Região de Bafatá > Geba > 2001 > O ex-presidente da Câmara Municipal de Chaves e ex-Alf Mil Op Especiais Altamiro Claro junto aos restos do monumento erigido em Geba aos mortos e desaparecidos da CART 1690, a que pertenceu, em 1967, o nosso camarada A. Marques Lopes.

Guiné > Região de Bafatá > Sare Banda > 2001 > O ex-presidente da Câmara Municipal de Chaves e ex-Alf Mil Op Especiais Altamiro Claro, em Saré Banda (vd. Carta de Banjara).

Fotos: © Altamiro Claro (2007). Direitos reservados.


1. Mensagem de Altamiro Claro:

Caro Camarada:

Só agora tomei conhecimento do teu blogue, que desde logo despertou em mim um enorme entusiasmo.

Chamo-me Altamiro R. Claro e também eu estive na Guiné entre 1972/74, mais concretamente em Geba, como Alferes Miliciano de Operações Especiais, pertencendo à CCAÇ 3548, do BCAÇ 3884 (2).

Chamou-me especial atenção no teu blogue anterior (Abril 2005 / Maio 2006 ) as crónicas do A. Marques Lopes sobre a CART 1690 que também esteve em Geba e em especial "Guiné 69/71 - XLVI : Em memória dos Bravos de Geba..." (3), onde nos fala dos mortos e desaparecidos da sua companhia e do monumento que então erigiram na sede de companhia.

Pois bem, no ano de 2001, quando eu exercia as funções de Presidente da Câmara de Chaves, fiz uma geminação entre Chaves e Bafatá e desloquei-me à Guiné, tendo visitado Geba, Sare Banda e Cantacunda, lugares referenciados pelo Marques Lopes.

Envio duas fotos tiradas, uma em Geba junto aos destroços do dito monumento e outra em Sare Banda.

Voltarei a contactar-vos.

Um grande abraço para todos os camaradas da Guiné.

Altamiro Claro


2. Comentário do editor do blogue:

Camarada Altamiro: És bem vindo. Fazendo jus à vossa proverbial hospitalidade transmontana, direi apenas: Obrigado, amigo, entra, a tabanca é grande e é toda tua. L.G.

3. Comengário postreior do A. Marques Lopes:

Caros camaradas: As minhas muito boas vindas ao Altamiro Claro, da CCAÇ 3548, que se designou por Panteras de Geba. Andou por onde eu andei e é bom tê-lo por cá.
Um abraço de boas vindas.


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Notas de L.G.:

(1) Vd. post de 22 de Junho de 2005 > Guiné 69/71 - LXXIII: Antologia (4): 'Homenagem aos mortos que tombaram pela pátria': Geba, 1995 (Diana Andringa)

Mortos. Estes nomes não podem ser senão de mortos. Guimarães, ...ndo Fernandes. Carlos A. Peixoto. ...ul C. Ferreira, ...ostinho Câmara, ...o Alves Aguiar, ...ime M.N. Estevão, ...sé A. V. Sousa, ...tónio D. Gomes.

Tudo em redor, aliás, fala de morte. As paredes em derrocada do que terá sido um quartel português. As viaturas a apodrecer sob o intenso sol africano. Os cacos de garrafas de cerveja. (Bebidas para enganar o medo? Suspensas por arame para, tinindo umas contra as outra, despertar os que dormissem ainda?).

E esta pedra caída, tumular.

Vivos, apenas os meninos que se cutucam, sorrindo, a olhar para nós, estranhos fotógrafos deste cemitério de metal e pedra.

A outra pedra, de pé, tem nomes de cidades, vilas, aldeias: Lisboa. S. Tirso. Moçâmedes. Alcobaça. Madeira. (Nas ilhas não haverá também povoações?) Ponte de Lima. Vila Nova de Ourem. Vila Pouca de Aguiar. Bissau. O tempo, ou a guerra, quebrou-lhe a parte de cima, e agora é uma pirâmide truncada, rasgada do lado direito, onde se inscrevem as primeiras letras dos postos, ou dos nomes, dos naturais dessas terras, que presumimos mortos.

De novo a primeira pedra, a que jaz por terra. A frente dos nomes dos que se presumem ter morrido, inscrevem-se o que supomos serem as datas dessas mortes: 1967, 1968. A última, na pedra, não em tempo, sobressalta-me: 21 de Agosto de 1967. Fiz vinte anos nesse dia. Nesse mesmo dia morreu António D. Gomes. Teria feito, sequer, os vinte anos?

Lembro-me de ter feito vinte anos. Das prendas dos meus pais. E pergunto-me como terão os pais do soldado António D. Gomes suportado a morte do seu filho. Se terão chegado um dia a conhecer este local onde uma pedra caída por terra assinala a data em que o perderam.

"Nós enterramos os nossos mortos nas nossas aldeias, ao lado das nossas casas... Os portugueses deveriam ter, também, um lugar para honrar os seus mortos, os que morreram aqui, durante a guerra", dissera-me, algumas horas antes, um antigo adversário. Aqui. Tão longe de casa, tão longe dos seus. Longe de mais para que possam trazer-lhes flores, arranjar-lhes as campas, preservar-lhes a memória.

Olho de novo as pedras, tentando compreender como se juntavam. Será a que jaz por terra a continuação da outra? Releio as terras e os nomes. Câmara pode ser da Madeira... Será mesmo? Sim. Lá estão em frente de Madeira o posto, sold., e as primeiras letras do seu nome: Ag...-

Agora cada morto tem o posto e a terra onde nasceu, excepto o primeiro, que parece ser de Lisboa, mas cujo posto e nome próprio se perderam, e João Alves Aguiar, de Ponte de Lima, a que o tempo corroeu o posto. Dois alferes, um furriel, sete soldados. Em cima, fragmentado, aquilo que parece a indicação do regimento a que pertenciam: ...RAL-1. ...Combate.

Postas assim as duas pedras em conjunto, apercebo-me de que o soldado que morreu no dia dos meus vinte anos era de Bissau, e de certa forma isso tranquiliza-me, porque não está, afinal, tão longe de casa- como se isso tivesse alguma importância depois de se estar morto, como se me tivesse contagiado essa lista de terras inscrita sobre a pedra, ou outras, sobre outras pedras encontradas ao longo da viagem, onde outros soldados, cabos, furriéis, escreveram como se a naturalidade fosse a sua primeira identificação e a mais forte, o nome da terra natal, primeiro, e só depois o posto, o nome, a data em que escreviam, por vezes uma frase de desesperança, algo como "até quando Deus quiser" — como que temendo que esse "até" fosse curtíssimo, coisa de poucas horas, minutos, talvez, e houvesse que inscrever urgentemente, sobre esses caminhos, placas, pontes, esse sinal de vida e de memória.

Parece estranho que alguém possa ter tido medo aqui, neste local tão calmo, com o tempo suspenso e o silêncio apenas cortado pelo ruído persistente das cigarras. É difícil imaginar, enquanto os meninos se agrupam à nossa volta, curiosos do que fazemos e olhamos, que em tempos houve aqui tiros e gemidos — e homens cumprindo a triste tarefa de escrever sobre estas pedras os nomes dos companheiros mortos.

Um pouco mais adiante, numa das paredes que ainda se mantêm de pé, alguém desenhou um rinoceronte e um leão. Tê-los-á visto realmente? Tê-los-á imaginado? Em frente, sobre uma paisagem aparentemente urbana de prédios e chaminés, voa uma ave. Uma gaivota? Uma pomba? Um símbolo de paz? Um piscar de olho a esse adversário que, a todo o momento, lembrava que a sua luta era "contra o colonialismo português e não contra o povo de Portugal"? E que, muito antes de disparar o primeiro tiro, advertira: "A via pela qual vai ser feita a liquidação total do colonialismo português na Guiné-Bissau e em Cabo Verde depende exclusivamente do colonialismo português. (...) Ainda não é tarde para proceder à liquidação pacífica da dominação colonial portuguesa nas nossas terras. A menos que o Governo português queira arrastar o povo de Portugal para o desastre de uma guerra colonial."

"O desastre de uma guerra colonial". Legenda para fotografia de pedras com listas de mortos, veículos destruídos, quartéis em derrocada — e, contrastando, os sorrisos dos meninos a dar-nos as boas-vindas.

Todos os anos, pelo 10 de Junho — esse dia que o regime colonial-fascista celebrava como Dia da Raça, e em que condecorava, no Terreiro do Paço, os pais, as viúvas e os órfãos dos militares caídos em combate —, ressuscitam algumas vozes saudosas do Império, a criticar a descolonizaçáo e a independência das ex-colónias portuguesas. Fazem-no, muitas vezes, usando a memória dos soldados mortos na guerra colonial. Escamoteando sempre que essas mortes se deveram, exclusivamente, à intransigência de um regime incapaz de compreender a inevitabilidade das independências, e à teimosia de um homem que, nunca tendo posto um pé em África, cuidava saber, bem melhor do que eles, o que melhor convinha aos africanos.

Releio a lista de mortos sobre a pedra e pergunto-me se, vinte anos depois, não será tempo de aceitar, claramente, que foram esses os únicos responsáveis dessas mortes... ».

Diana Andringa. Público. 10 e Junho de 1995.

(2) Sobre o BCAÇ 3884 (1972/74), vd. posts de:

9 de Outubro de 2005 > Guiné 63/74 - CCXXXIV: Camaradas do BCAÇ 3884 (Bafatá, 1972/74), procuram-se! (Maurício Nunes Vieira)

17 Outubro 2005 > Guiné 63/74 - CCXLV: Notícias do BCAÇ 3884 (Bafatá, Contuboel, Geba e Fajonquito, 1972/74) (Manuel Oliveira Pereira)

Estandarte do BCAÇ 3884 (Bafatá, Contuboel, Geba, Fanjonquito, 1972/74)

Foto: © Oliveira Pereira (2005). Direitos reservados.

(3) Vd. post de 5 de Junho 2005 > Guiné 69/71 - XLVI: Em memória dos bravos de Geba... (A. Marques Lopes)