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quinta-feira, 18 de janeiro de 2024

Guiné 61/74 - P25085: Operação Razia: sector S3, Catió: conquista da base de Cufar Nalu, 15/16 de maio de 1965, com a participação das CCAÇ 617, 763, 764 e CCAV 703


Foto nº 1 > Regão de Tombali > Sector S (Catió) > Op Razia, 15 de maio de 1965: embarque em NRP


Foto nº 2 > Regão de Tombali > Sector S (Catió) > Op Razia, 16 de maio de 1965: tiro de morteiro 60


Foto nº 3 > Regão de Tombali > Sector S (Catió) > Op Razia, 16 de maio de 1965: objetivo conquistado

Fonte: CECA (2014), pp. 315/316

1. Sobre a Op Razia, no Sector S3 - Catió, temos várias referências no n0sso blogue(*). Traduziu-se numa dura batalha em que  o PAIGC sofreu um grande revés. Transcreve-se um certo do livro da  CECA (2014) sobre a atividade operacional no CTIG (até ao fim do ano de 1966):

(...) " Em 15Mai65, durante a operação Razia, com a participação das CCaç 617, 763, 764 e CCav 703, o lN opôs forte resistência no interior da mata de Cufar Nalu e junto ao acampamento, tendo sofrido vários mortos. 

As NT mantiveram o cerco durante a noite, tendo sido assaltada a base de Cufar Nalu, no dia 16, que acabou por ser destruída, sendo capturados vários sabre-baionetas, granadas de lança-granadas foguete, munições, carregadores, catanas e outro material de guerra. 

As NT verificaram que o lN estava disperso pela mata e empoleirado nas árvores e junto ao acampamento estava instalado em trincheiras e abrigos dispostos na periferia. 

O acampamento dispunha de 3 abrigos enterrados, com seteiras e diversos abrigos individuais. A base era constituída por 10 casas de grandes dimensões e 5 mais pequenas, servindo uma delas de enfermaria; a construção era de pau a pique, com cobertura de zinco, numa lotação total de 200 homens; a densidade da mata dava-lhe uma perfeita dissimulação e tomava muito difícil a sua localização." (...)

Texto e fotos: Fonte: Excertos de Portugal. Estado-Maior do Exército. Comissão para o Estudo das Campanhas de África, 1961-1974 [CECA] - Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974). 6º volume:  aspectos da actividade operacionaç Tomo II: Guiné, Livro I. Lisboa: 2014. pp. 314/316.



Capa do livro do nosso camarada de Barcelos, Manuel Luís Lomba,“A Batalha de Cufar Nalu”  (Terras de Faria, Lda. 4755-204 – Faria, Barcelos, 2012). Uma batalha de meses, que começou em 20/21 de dezembro de 1964 (Op Ferro, com forças das
CCaç 617 e 728, CCav 703 e 4ª CCaç).  Ver aqui a  nota de leitura feita pelo Beja Santos.



Guiné > Região de Tombali > Carta de Bedanda (1961) (Escala de1/50 mil) > Posição relativa de  Cufar, Cufar Nalu, Rio Cumbijã, Boche Mende e Bedanda

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2016)


2. Comentário do editor LG:

A sinopse feita pela CECA (2014) estaria incompleta. No poste P16512, o nosso camarada Mário Fitas escreve:

(...) "15 de maio [de 1965]. Há que efectuar a denominada "[op] Razia”. Reforçada com a milícia do João Bacar Jaló em cooperação com as CCAÇ 728 e CCAÇ 764, a CCAÇ 763,  lança-se na operação que tem como objectivo a conquista e destruição do mítico acampamento do PAIGC na mata de Cufar Nalu. "(...). 

O Mário Fitas acrescenta participação da milícia do João Bacar Jaló e da CCAÇ 728, e por outro lado omite a CCAÇ 617.

(...) "Ocupando posições, a CCAÇ 764 do lado norte na estrada para Bedanda a nascente barrando o caminho de Boche Mende fica a CCAÇ 728, na orla a sul da mata a CCAÇ. 763, inicia a batida tendo como eixo o caminho que conduz à ex-tabanca de Cufar Nalu, com o 3.º Grupo de Combate em primeiro escalão, seguido do 2.º Grupo intercalando com o grupo de Comando e o João Bacar Jaló com o seu pessoal e o 1.º Grupo cobrindo a retaguarda, a CCAÇ [763] começa a progressão lenta e atentamente.

"Passados uns momentos pára tudo e ouvem-se vozes na mata vindo em direcção ao Grupo de Combate que seguia em primeiro escalão. Aos segundos de silêncio sucedem-se dois a três minutos de forte tiroteio. A CCAÇ 763 tinha sido desflorada para a guerra. No contacto com o IN é abatido um guerrilheiro e capturada uma pistola metralhadora de 9mm M25 com carregador e munições de origem checa". (...)

Por outro lado, há que ter em conta que estas conquistas de terreno, num guerra de guerrilha e contra-guerrilha, eram sempre "voláteis" e "efémeras"... Já antes em 16Ago64, se tinha realizada a Op Bornal com forças das CCaç 557, 617 e 4.ª CCaç:

(...) " O ln ofereceu resistência à penetração das NT na mata de Cufar Nalu, causando 1 morto e 2 feridos; emboscou 2 GComb da CCaç 557 na estrada Catió-Batambali, próximo do cruzamento de Cufar, quando se procedia à limpeza do itinerário (30 abatizes levantados), tendo sido posto em fuga pela reacção das NT; o ln sofreu 11 mortos, além de outras baixas não estimadas." (CECA, 2014, pág. 266).  

E em 20 e 21Dez64, haverá outra operação, a Op  Ferro, "com forças das CCaç 617 e 728, CCav 703 e 43 CCaç na mata de Cufar Nalú, apoiadas pela FA. O ln flagelou as NT fazendo 3 feridos e sofrendo 2 mortos e 1 prisioneiro; emboscou forças da CCaç 728  na parte sul da mata, causando 5 feridos às NT" (ECA, 214, pp. 267/268).
____________

Nota do editor:

(*) Vd. postes de:

17 de janeiro de 2024 > Guiné 61/74 - P25081: As mulheres que afinal foram à guerra (21): Cerca de 400 aerogramas estavam ainda esta manhã à venda, ao desbarato, no OLX - Parte I - O remetente era o nosso camarada José..., ex-1º cabo radiotelegrafista, nº mec. 1491/64, CCAÇ 763, "Os Lassas" (Cufar, 1965/67) - II ( e última) parte: As agruras de um operacional de trms no mato: a Op Razia, 15/16 de maio de 1965, relatada a uma jovem correspondente

(...) Amor, o motivo de eu não te ter escrito é o facto, primeiro de ter estado novamente com febres, mas desta vez foi pior que a outra. E a outra razão é motivada por ter que ter ido fazer uma operação especial, à tal mata que já te tinha dito, [aonde ] ainda não se tinha conseguido lá ir entrar, pois os terroristas não o consentiam.

Essa operação demorou vários dias, ou seja, ao certo três dias, os quais todos nós passámos o que só Deus sabe. Mas não interessa agora o cansaço, nem o susto que apanhámos, pois não tivemos um único ferido, nem morto e conseguimos lá entrar.

As balas [choviam] por todos os lados, os morteiros e as bazucas também não se calavam, enfim, isto contado não acreditam 99% do que se passou.

Os tiros que mais medo nos metiam, e que vinham de cima das árvores, e nós não conseguíamos [localizá-los].  Estivemos  assim uma boa hora que para nós  [pareceu] toda a nossa vida, até que o fogo cessou. Depois fomos nós ao ataque, mais tiros para ambos os lados, mas eles não consentiam que se lá [entrasse].

Tivemos, então, que recuar para dar vez da artilharia fazer a sua parte de ataque. Então começaram a cair morteiros e obuses em cima do acampamento inimigo. Por sua vez, os aviões bombardeiros  [T6] começaram a bombardear também. Num curto prazo de 15 minutos a mata começou a arder por todos os lados. Tivemos que esperar que ardesse para voltar novamente ao ataque.

Não fazes uma pequena ideia como é que nós estávamos nessa altura. Mesmo debaixo do fogo, nós andávamos para a frente. Nessa altura, não se pensa em ninguém, só se pensa em frente [?] e nada mais.

Juntamente connosco, estiveram também presentes mais três companhias e a aviação. Estiveram também presentes a equipa de cinema [fotocines] para mandarem depois para a metrópole. Qualquer dia destes deves ler no jornal, até podes ver a partir do dia 17, pois nós entrámos lá no dia 16, altura em que conquistámos a mata. (...)

quinta-feira, 29 de outubro de 2020

Guiné 61/74 - P21492: (In)citações (172): Crónica da Guerra da Guiné, segundo um seu Veterano - Parte I (Manuel Luís Lomba, ex-Fur Mil Cav da CCAV 703)

1. Em mensagem do dia 27 de Outubro de 2020, o nosso camarada Manuel Luís Lomba (ex-Fur Mil Cav da CCAV 703/BCAV 705, Bissau, Cufar e Buruntuma, 1964/66), enviou-nos um texto a que deu o título: "Crónica da Guerra da Guiné, segundo um seu Veterano", do qual publicamos hoje a I Parte. 


Crónica da Guerra da Guiné, segundo um seu Veterano - Parte I 

Manuel Luís Lomba

O blogue Luís Graça &Camaradas da Guiné constituiu-se o maior e o depositário mais fiel da história da Guerra da Guiné e os milhares de posts e de comentários a sua maior biblioteca e fonte. 

A chamada à colação pelo Jorge Araújo e pelo Luís Graça, no P21421, do livro “Guerra da Guiné: a Batalha de Cufar Nalú”, metáfora aplicada às sucessivas operações contra essa mata, redacção, revisão e edição da minha autoria (inclusive os erros ortográficos, gramaticais e outros), na evocação dos enfermeiros condecorados, incitou-me a evocar esse nosso passado. 

 A “Operação Tridente”, acontecida há quase 60 anos, foi a primeira grande manobra da Guerra da Guiné, o BCav 490 os seus actores principais, as ilhas do Como, Caiar e Catunco o seu palco, foram 72 dias de combates na mata e em campo aberto; a segunda grande manobra foram as Operações “Campo”, Alicate I e II”, a CCav 703 os seus actores principais, o eu palco foi Cufar, a sua malta escavou abrigos em todo o perímetro da sua desmantelada fábrica de descasque de arroz e viveu 63 dias como toupeiras, mais sob a terra que sobre a terra. 

 A “Operação Tridente”, entre Janeiro e Março de 1964, foi a “guerra da restauração” da soberania portuguesa sobre aquelas três ilhas, então a “República Independente do Como” proclamada por Nino Vieira, abandonadas em 1962 pelo fazendeiro Manuel Pinho Brandão, originário de Arouca (constava que passara a fornecedor do PAIGC); as operações “ Campo”, “Alicate I, II,´” e “Razia”, entre Dezembro de 1964 e Maio de 1965, foram a “guerra da restauração” da soberania portuguesa sobre a “área libertada” de Cufar, começada com a ocupação da tabanca e das ruínas da fábrica de descasque de arroz, abandonada pelo fazendeiro Álvaro Boaventura Camacho, madeirense originário de Cabo Verde (patrão e o “passador” para Conacry do então alfaiate e futebolista Bobo Quetá), continuada com a expugnação da base da mata de Cufar Nalu, comandada por Manuel Saturnino Costa, ora aumentada e reforçada com a força retirada do Como, consolidada em 15 de Junho pelas CCaç 763, 764 e 728 (Operação Satan?). 

Ilha do Como (Jan1964) - «Operação Tridente». Desembarque das forças do BCAV 490.
Foto do camarada Armor Pires Mota, ex-Alf Mil Cav da CCAV 498 (1963/1965) - P12386, com a devida vénia.

Chãos de balantas e nalus, gente laboriosa e guerreira, essas ilhas e a região continental de Catió eram terras úberes da produção de arroz e óleo de palma, a alimentação base dos guineenses, o “Celeiro da Guiné” e o garante da magra ração de combate dos seus combatentes da libertação, antes de o “espírito filantrópico” do governo do reino da Suécia lha ter melhorado. 

Amílcar Cabral tinha engravidado a Guiné Portuguesa com o sémen da “libertação”, nos mais de 10 anos da diacronia dessa luta armada, outras grandes manobras aconteceram, refiro apenas a “Operação Mar Verde” a Conacry e a escalada da “crise dos 3 G´s”, e o seu aborto terá falhado, mercê da miopia política, militar e diplomática do governo de Lisboa. 

Não se podia fazer nas bolanhas e matas da Guiné o que só poderia ser feito em S. Bento e no Terreiro do Paço, em Lisboa. 

De escalada em escalada a matarmo-nos e a estropiarmo-nos uns outros, a aniquilação mútua não aconteceu, mercê de uma deriva das FA Portuguesas, gerada, nascida e nutrida pela tradicional insatisfação corporativa da classe dos capitães, sob o “manto diáfano” do acrónimo MFA, que, para não a abandonar a Guiné nem como derrotados nem como vitoriosos, passou a aliado do PAIGC, tendo cometido dois pecados originais: primeiro, criou a situação de inferioridade, depois, avançou para as negociações, querendo resolver em Bissau o que só deveria ser resolvido em Lisboa. A política ultramarina foi, mas as FA Portuguesas não saíram derrotadas pelo PAIGC; portugueses houve que se derrotaram a si mesmos… 

Mas as maiores manobras da Guerra do Ultramar são activo do MFA: as aceleradas retracções dos dispositivos, retiradas militares para a Metrópole e a “ponte aérea” da materialização da “Descolonização exemplar” de Angola e Moçambique, que evacuou centenas de milhares de gente multirracial, a força criadora da sua riqueza estruturante, muitos com a roupa do corpo como único bem - os Retornados, para a insurreição/revolução ou os Devolvidos, para os outros. E, por ter degenerado em PREC e endossado a sua guerra ultramarina a outrem (Cuba, etc), o MFA não fez uma “Descolonização exemplar” e protagonizou a maior deslocalização mundial de gente, desde a II Guerra Mundial, só ultrapassada mais de 40 anos depois, pelos fenómenos dos refugiados, vítimas dos “prec´s” degenerescentes da Venezuela e da “Primavera árabe”. 

A par da sua revelação como estratega de alto nível, a partir de 1963, Amílcar Cabral (ora alçado a segundo maior líder mundial de todos os tempos, por um grupo de historiadores (?) a soldo da BBC), revelou também um talentoso criador de fake news militares, a base de sustentação do seu markting de que o PAIGC “libertara” e exercia a soberania em 2/3 da Guiné Portuguesa. Vontade e saber muito, mas verdade pouca… 

Passados 4 meses sobre o fim da “Operação Tridente”, o nosso BCav 705 chegou a Bissau estivado no cargueiro “Benguela”, concebido e equipado para o transporte de gado, e não no paquete “Índia”, erro piedoso da CECA. Entre meados de 1964 e meados de 1965, penamos em duras, demoradas e penosas “operações de intervenção”, por terra, água e ar, nas matas do norte, do sul da Guiné e colhemos duas evidências: a dinâmica doutrinal ou subversão cabralista irradiava por esses quadrantes, mas sem o domínio das suas dimensões territorial e social. A tropa andava (e nomadizava) em todo o lado e era a ela que generalidade das populações recorria. PAIGC significava sofrimento e problemas, a tropa significava segurança e soluções. 

Por que os revolucionários desse jaez são avessos ao sufrágio universal e livre? Porque o Povo não vota em organizações violentas! 

Os 2/3 de “áreas libertadas” não passavam de atoada propagandística. Tal dimensão corresponderia à totalidade das suas massas de água e florestais, isentas da colonização, condomínios da bicharada aquática e terrestre, a sua densidade humana era muito baixa, em crescimento com a instalação de bases revolucionárias e pelo êxodo das populações rurais (a relação da densidade populacional na Guiné seria de 15hab/km2). Teria fiabilidade, muito relativa, se se referisse às áreas colonizadas e habitadas, onde um ou dois dos seus guerrilheiros/sapadores infiltrados iam acrescentando valor de “libertação”, sabotando acessibilidades, equipamentos sociais, aterrorizando as tabancas com chefes hostis e indecisos, flagelando patrulhas e escoltas militares - actividades revolucionárias suficientes para condicionar autoridades, mobilizar meios militares, exponenciais em regra, confinar e condicionar a normalidade da vida a toda a gente. 

Província da Guiné. © Infogravura Luís Graça & Camaradas da Guiné

A partir da “Operação Tridente”, as FA portuguesas passaram a garante da soberania em toda a Guiné, desassossegando os revolucionários por todo o lado, por terra, água e ar, embargando-lhes a conquista e fixação em qualquer tabanca tradicional, sempre vencedoras - menos por combates, umas vezes pela desistência a meio do jogo, outras pela sua falta de comparência. A Guerra da Guiné foi paradoxal. As FA portuguesas nunca derrotadas, mas nunca vencedoras; o PAIGC sempre derrotado, mas nunca vencido. E o vencedor foi o derrotado!... 

A relação do PAIGC com a verdade tornara-se tão impudica que até descuidava o encobrimento das suas grandes mentiras. A sua publicitação do cerimonial da Declaração da Independência ao mundo foi quase fiel: a inospitalidade do local, a hospedagem dos convidados internacionais não com 5 estrelas, mas com todas constelações da abobada celeste, a visibilidade da temeridade e improvisação do evento, ao ar livre, num outeiro periférico à tabanca de Lugajole (a Montanha de Cabral era expressão de caserna e situa-se na Guiné-Conacry), no pico da pluviosidade da estação das chuvas, – a “manobra” para embargar as manobras da tropa, por terra e ar. Mais tarde, o embaixador soviético escreveu que apresentara as suas credenciais ao Presidente Luís Cabral, não sabe onde, num “palácio presidencial” que era uma cabana, a estrutura de troncos de cibes, as ramagens das suas copas a fazer de telhado e paredes… 

O PAIGC agendara a Declaração da Independência para 24 de Setembro de 1973, mês da efeméride do nascimento de Amílcar Cabral, da sua fundação, o Dia Internacional da Paz, e, também, do fim da II Guerra Mundial. A sua logística estava montada na zona de Cubucaré, bem conhecida dos bastidores da ONU, onde, ente 1 e 8 de Abril de 1972, a sua “Quarta Comissão” se hospedara e dependurara a sua bandeira no galho duma árvore, para conceber o relatório probatório de que o PAIGC exercia todas as funções estatais e administrativas na Guiné-Bissau, com base no qual a ONU pronunciou Portugal de seu ocupante ilegal, com 500 anos de efeito retroactivo. Mas, na antevéspera a Força Aérea de Biassalanca foi destruir-lhe a festa…

Assim, os 2/3 de “área libertada” não era apenas retórica, era sofisma de justiça, instrumental à manobra da ONU. “Se possuis, assim possuirás”, jurisprudência do Tratado de Utreque, subscrita por Portugal, em 1713, da Conferência de Berlim, subscrita por Portugal, em 1886, da Sociedade das Nações, subscrita por Portugal, em 1919, em St. Germain-en-Laye, da Carta da ONU, subscrita por Portugal, em 1955. 

Redigido em Conacry e avalizado pela OUA (Organização da Unidade Africana), foi com base nesse relatório que a ONU expendeu a jurisprudência de que, considerando que havia uma dúzia de anos que o PAIGC era o Estado da Gguiné-Bissau, considerando que o domínio português estava de facto limitado a uma estreita faixa litoral da ilha de Bissau, do Geba a Safim (à margem esquerda do canal Impernal), a soberania de Portugal era considerada prescrita, de Facto e de Direito. E Cabral tornou-se um assíduo queixoso à ONU, queixas que nunca domiciliou nos ora mais de 2/3 de “áreas libertadas”, mas em Conacry, de que o Estado exercido a partir de Bissau e presente nos quatro cantos da Guiné, as milícias armadas de autodefesa e os militares portugueses da sua guarnição, porque “iam até o Estado fosse”, eram agressores, ocupantes estrangeiros da Guiné e ameaça à paz mundial (maestria do líder bissau-guineense e nódoa à “terceiro-mundista”, caída no melhor pano do que é a Comunidade das Nações). 

À data da Declaração de Independência, o PAIGC fizera zero de equipamentos sociais e mais não destruíra porque não conseguira, nesses 2/3 de “áreas libertadas”, ao passo que as FA portuguesas faziam guerra, mas também tinham expandido e requalificado a sua rede de estradas, construído cerca de 16 000 casas, 160 escolas, 40 postos médico-sanitários, 56 fontanários, 3 mesquitas e feito 145 furos de água potável… 

Na verdade, as ilhas do Como, Caiar e Catunco, dada a sua condição estratégica de encostadas à Guiné-Conacry, a adesão massiva das suas populações e por necessárias, como celeiro da alimentação dos seus combatentes, terão sido as únicas “áreas libertadas” pelo PAIGC, de curta duração, entre finais de 1962 e princípios de 1964, também porque, naquele tempo, a representação regional da autoridade do Estado sediado em Bissau residia em Catió e o administrador dessa circunscrição militava clandestinamente no PAIGC. 

Tendo provocado o abandono pelos colonos, Amílcar Cabral fez da ilha do Como a mãe de todas as bases no interior sul (a de Koundara, a sua primeira, e as em instalação em Cadigné, Boké e Sansalé situavam-se no estrangeiro), dotou as três ilhas com o efectivo de 400 combatentes, muitos recrutados no seu adversário político MLG (que iniciara a Guerra da Guiné, em Susana e Varela), equipado de armamento ligeiro e pesado de Infantaria, reforçou-os com cooperantes especialistas estrangeiros, protegeu o “espaço aéreo” com metralhadoras antiaéreas Goryunov 7,62 e Degtyarev 12,7, os aviões de pistão e a jacto vindos da Base de Bissalanca passaram a ser atingidos e afugentados, e, no relativo à problemática das acessibilidades marítimas, estava confiante da sua protecção – Sekou Touré acabara de decretar unilateralmente a dilatação das águas internacionais do seu país em 130 léguas. 

Reforçou o comando de Nino Vieira, um dos seus primeiros 12 “discípulos” e o seu mais importante comandante de campo, que tirocinara guerra revolucionária na China e armamento na União Soviética. O governo de Lisboa mandava os seus capitães tirocinar guerra contra-revolucionária em França, tendo por mestres os perdedores no Vietname e na Argélia; Amílcar Cabral mandava os seus básicos tirocinar guerra revolucionária na China, tendo por mestres os vencedores Mao Tse-Tung e generalíssimo Vô Neguyen Giap. 

Resultado: o PAIGC concebeu e executou uma guerra total, a partir das matas e dos campos sobre as povoações rurais e urbanas – e ganhou; as FA portuguesas conceberam uma guerra contra-revolucionária de orgânica convencional, a partir dos povoados sobre campos e matas – e não ganharam. 

A braços com a crise de Angola, o governo de Lisboa deu uma ajuda por omissão, não levantou ondas no relativo à dilatação unilateral das águas, o problema era o PAIGC não a Guiné-Conacry; confiante na utopia do ministro Franco Nogueira da negociação de um tratado de paz e cooperação com a Guiné-Conacry, Salazar deu luz verde à “Operação Tridente”, mas proibiu a violação das suas fronteiras e o exercício do “direito de perseguição”. 

O líder da Guiné-Conacry nem se dignou responder. A “Operação Tridente” afundou nessas águas uma embarcação que transportava militares do exército regular guinéu (seria o União, para o PAIGC e Mirandela, para o seu dono, a Sociedade Ultramarina?) e Sekou Touré absteve-se de se meter com a Armada portuguesa. Saberia que, na batalha do Como, a derrota do PAIGC vinha pelo mar. 

Considerando que essas três ilhas somam pouco mais de 300 Km2 de superfície, a sua efémera “área libertada” estava muito longe dos 2/3, apenas significava 1 % da superfície territorial da Guiné. A verdade que o “polígrafo” da história poderá apurar: a limitação da soberania portuguesa a Bissau e Safim foi uma descarada mentira do PAIGC (a encomenda da ONU?). 

Excerto de uma infografia, relativa à Operação Tridente. Reproduzida com a devida vénia. In: Carlos de Matos Gomes e Aniceto Afonso: Os Anos da Guerra Colonial, Volumne 5: 1964 - Três teatros de operações. Lisboa Quidnovi. 2009. 17.

Derrota para o cabo de guerra Nino Vieira, o revolucionário Amílcar Cabral fez do fim da “República Independente do Como” um sucesso, a fazer jus às lições que, em 1960, recebera de Mao e do genial generalíssimo Giap (tinha derrotado o poderoso exército francês estava à beira de derrotar a poderosíssima América). Como não podia realizar o I Congresso na Cassacá da ilha do Como - “Operação Tridente” estava no auge -, mas salvou a face: realizou-o em Cassacá, na plataforma continental, entre 15 e 18 de Fevereiro, e ordenou a Nino Vieira a retirada e o acantonamento do remanescente dos 400 combatentes e famílias do Como para as bases das matas do Cantanhez e de Cufar Nalu.

Nino Vieira saiu com os seus companheiros para o Cantanhez, mas deixou no Como meia dúzia de guerrilheiros m/f, como chama residual da sua “libertação”, comandados pelo desenvolto e cabeludo jovem de 20 anos, Pansau Na Isna de nome, e pela amadurecida mulher balanta de “pistola na liga”, Sona Camará de nome, ambos heróis nacionais bissau-guineenses póstumos, que, cumprindo o “flagela e foge”, muito desassossegaram e desgastaram a malta da CCaç 557, subunidade que ficou na quadrícula em Cachile, comandada pelo Capitão João Ares (apelido do deus da guerra da mitologia grega).

(continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 27 de outubro de 2020 > Guiné 61/74 - P21485: (In)citações (171): Frei Henrique Pinto Rema, OFM, hoje com 94 anos, Comendador da Ordem do Infante Dom Henrique (2018), autor da "História das Missões Católicas na Guiné" (1982) (João Crisóstomo, régulo da Tabanca da Diáspora Lusófona, Nova Iorque)

domingo, 28 de abril de 2019

Guiné 61/74 - P19724: Blogpoesia (617): "O casal de esquilitos", "Meu pensamento" e "As fontes de prazer", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728

1. Do nosso camarada Joaquim Luís Mendes Gomes (ex-Alf Mil da CCAÇ 728, Cachil, Catió e Bissau, 1964/66) estes belíssimos poemas, da sua autoria, enviados, entre outros, ao nosso blogue, que publicamos com prazer:


O casal de esquilitos

Vivem nas árvores, perto do parque de brinquedos.
Quando as crianças se vão embora, eles descem.
Correm o chão à procura de alimento.

Convivem com a passarada miúda e as pombas ambulatórias.
Pacíficamente. Cada um no seu ofício.
Farejam a areia. Trepam aos bancos. Arrebitam as orelhitas e o pescoço. Miram em redor.
Sabem o que procuram.

Os passaritos, aos pares, esvoaçam de ramo em ramo.
Contentes, chilreiam todo o tempo.
Há um casal que vive infiltrado e em segurança, para lá dum buraco do prédio de habitações.

De vez em quando, poisam os melros pretos, muito vaidosos de como são.

E os corvos, em altos voos, lançam ufanos, para todo o lado, aquele grasnar rouco e pouco belo.
Indiferentes a todo o mundo. Como se mais ninguém aqui houvesse...

Berlim, 22 de Abril de 2019
9h26m
lindo dia de sol

********************

Meu pensamento

Monge vadio, meu pensamento,
Ave perdida
Seara de vento,
Emigrou do convento.

Sandálias nos pés.
Vestes pendentes.
Papiro enrolado.
De pena em punho.
Se fez ao caminho.

Vendo o presente.
Ouvindo as ideias,
Lembrando o passado.
Perscrutando o futuro

Claustros herméticos.
O silêncio um sepulcro.
Horizonte sem cores.
Definharam-lhe os sonhos.
Paraíso perdido.

Agora é livre.
Plana no alto.
Alcançando o mundo.
Sem mãos a medir.

O vento o sopra.
Se enche de cores.
Escreve o que sente.
Parece arder.

Por tudo se interessa.
Sente gosto em viver.
A vida é fugaz.
Tão rico o mundo
Não se pode perder.

Têm graça os rios,
De ventre bojudo,
Banhando as margens,
Correndo para o mar.

As aves nos céus
Que voam tão leves,
Vivendo a cantar.

As fontes jorrando,
Sem nunca parar,
Saciando as gentes.

As nuvens no céu,
Com formas bizarras,
Parecem paradas.
Deixam na terra
O que tiram ao mar.

Fico pensando
Que parar é morrer...

Berlim, 24 de Abril de 2019
10h17m
Dia de sol
Jlmg

********************

As fontes de prazer

Cansadas de dar prazer ao mundo, sem nada receber,
decidiram uma revolta.
Todas secaram até ver o que acontecia.

Uma nuvem negra e espessa de desencanto cobriu a terra.
Foi-se a alegria e a vontade de lutar.
Para quê comer se a comida não sabia a nada.
Se esmigalharam os casais. Para quê viver lado a lado, sem nada cobrar?
Para que serve tentar crescer harmoniosamente e fazer por parecer bem?
É melhor parar quieto e deixar correr o tempo.
Que importam as estações do ano com suas variações de oferta?

Para quê o vinho e a fruta?
A trabalheira que dá criá-las.

Em pouco tempo tudo ficou num ermo. Apático. Estéril e incolor.

De tal modo que as fontes sentiram pena.
Retomaram derramar prazer.

Com, depressa, tudo mudou.

Afinal, é o prazer que comanda o mundo, mas com equilíbrio, para não lhe ficar escravo...

Berlim, 26 de Abril de 2019
Jlmg
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Nota do editor

Último poste da série de 21 de abril de 2019 > Guiné 61/74 - P19704: Blogpoesia (616): "Melaço", "Os astros", "Fugazmente..." e "Variedade...", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728

domingo, 2 de setembro de 2018

Guiné 61/74 - P18972: Blogpoesia (582): "Brilhantina espanhola", "Magia das manhãs" e "O regato da serra", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728

1. Do nosso camarada Joaquim Luís Mendes Gomes (ex-Alf Mil da CCAÇ 728, Cachil, Catió e Bissau, 1964/66) estes belíssimos poemas, da sua autoria, enviados entre outros, durante a semana, ao nosso blogue, que publicamos com prazer:


Brilhantina espanhola

Aos Domingos, depois da missa, vinha o adro.
O convívio com os da freguesia.
Roupas novas, muito bem brunidas.
Xailes compridos, vários temas.
Vestidos de seda, até ao chão, em grandes folhos.
Fatos de fazenda, em corte fino.
Camisas azuis em popelina.
E as gravatas variavam muito.
Largas ou fitas,
Segundo a moda.
E os cabelos, reluzindo ao sol.
Da brilhantina,
Vinha de Espanha
. Cruzavam-se olhares.
Olhos vivaços.
Moças trigueiras, crestadas do sol.
Seios ardentes,
Apetite à vista.
E os rapazes ariscos vinham de longe,
Desconhecidos, sem história.
Lançando a isca,
Tentavam a sorte.
Se era um sucesso.
Primeiro o namoro.
Depois o altar,
Com brilhantina…

Berlim, 29 de Agosto de 2018
8h32m
Jlmg

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Magia das manhãs

É vaidosa a fidalga manhã.
Cada dia uma veste diferente,
Folhos compridos,
De seda ou de lã.
Indiferente à chuva e ao sol,
Avança impante pela avenida do dia,
Cobrindo-o de cor e de luz.
Corre as montanhas,
Desliza nos vales,
Se banha no mar.
Se enxuga ao sol, deitada na praia,
Como se fosse uma dama esbelta,
Sedenta e com fome.
Se despede ufana, à chegada da tarde,
Sua vizinha e da noite.
Viaja sózinha
E vai descansar.
Ninguém sabe onde fica.
Adora a missão.
À hora certinha ela aí está...

Berlim, 31 de Agosto de 2018
8h9m
Jlmg

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O regato da serra

Corre um regato ao fundo da aldeia.
Vem lá da serra aos saltos,
Rasgando o caminho,
Parece um puto tratante,
A caminho da escola.
Assobia e canta ao ritmo das pedras,
Inunda as margens humildes e secas
Que lhe pedem esmola.
Rouba areia e semeia açudes e ilhas,
Onde crescem as canas
Com ninhos de pássaros,
Em frente de praias.
De longe a longe, se torna lagoa
E puxa a mó de moinhos,
Apesar de ser pedra,
Transformando o milho em farinha.
É um amigo atento,
Não pára quieto,
Em visita constante,
Através das aldeias.
Dizem que vai a caminho do mar.
E, muito lá à frente,
É tal o caudal,
Há barcos a remos e vela,
Levando fregueses,
Dum lado para o outro.
Vão para as romarias e feiras.
Rezam as lendas que antanho,
Até as sereias e fadas,
Vinham da serra de noite
E assombravam as gentes
Com cantos e loas,
Pareciam de anjos...

Berlim, 1 de Setembro de 2018
10h49m
Jlmg
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Nota do editor

Último poste da série de 26 DE AGOSTO DE 2018 > Guiné 61/74 - P18955: Blogpoesia (581): "Para que servem as palavras", "Soletro os meus versos, letra a letra" e "O essencial", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728

domingo, 19 de agosto de 2018

Guiné 61/74 - P18936: Blogpoesia (580): "Portão da poesia...", "Pingantes à borda do mar" e "Se alguém me vier bater à porta não terei poema para lhe dar...", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728

1. Do nosso camarada Joaquim Luís Mendes Gomes (ex-Alf Mil da CCAÇ 728, CachilCatió e Bissau, 1964/66) estes belíssimos poemas, da sua autoria, enviados entre outros, durante a semana, ao nosso blogue, que publicamos com prazer:


Portão da poesia...

É de bronze o portão da poesia.
Está fechado.
Um letreiro:
- Quem procura já cá não mora.
Fiquei triste.
Habituado a vê-la, mal batia à porta.
- Onde parará agora?
Faz tanta falta.
Atónito e aturdido,
Volto a casa.
Pela madrugada, liguei o rádio.
Antena 2.
Estava a dar um programa de "música e poesia".
A voz doirada de Vítor Nobre ia dizer um poema.
Depois duma introdução musical bem conhecida.
De Joaquim Luís Mendes Gomes
"O comboio amarelo de Cascais"...
Senti um baque.
De olhos marejados fiquei a ouvi-lo e recordei como tudo se passou:
"Ano dois mil.
Um dia à tarde, quando fazia tempo, esperando alguém,
não sei que foi,
senti vontade de escrever poesia.
Olhei. Um comboio estava parado na estação de Algés. Esperando partir.
Conhecia-o tão bem...
Num girar sem fim, só o utilizava entre o Cais do Sodré e Algés.
Tinha comigo o caderno onde apontava as minhas prosas para os jornais.
Soltei o bico à caneta e deixei-o correr à solta.
Foi por onde quis. Foi só segui-lo.
Como ele sabia tão bem de tudo sobre aquele comboio amarelo que ia e vinha.
No fim, comecei a ler.
As lágrimas explodiram nos meus olhos...
"O comboio amarelo de Cascais" o meu primeiro poema.
Nunca mais parei."

Mafra, 13 de Agosto de 2018
20h46m
Jlmg

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Pingantes à borda do mar

Escorrem pingantes das grades da minha varanda.
Foi-se o sol e veio o trovão.
Raios de luz faíscam no céu.
As gaivotas corridas tentam a sorte mesmo à bordinha das ondas.
Da praia debandaram as gentes que esperavam um fim de semana em grande.
Os banheiros à chuva recolhem as cadeiras-espaldares.
Lavados reluzem os carros parados no parque.
Há tormenta no ar.
Chora o negócio das esplanadas que ficaram sombrias.
Só os gelados em bola lambem os beiços gulosos das gentes.
Calou-se o comboio das voltas turísticas daqui até ao cimo do monte.
Bastou um leve clique do sol e tudo ficou do avesso...

Roses, 17 de Agosto de 2018
15h47m
Jlmg

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Se alguém me vier bater à porta não terei poema para lhe dar...

Passei o dia a palmilhar a estrada.
Seca e calcinada.
Como um foragido a fugir do sol.
Atravessando um mar de areia que já foi mar.
Agora é leito. Só Aragão.
Com muito trabalho, coberto de girassois e palha seca.
Abandonado, não.
Por fim a recompensa.
Rose e seu mar calmo e azul.
Brando, me banhei nele e afoguei o calor.
Tudo o mais esqueceu...
na minha varanda sobre o Mediterrâneo ao nascer do dia

Roses, 17 de Agosto de 2018
9h1m
Jlmg
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Nota do editor

Último poste da série de 12 DE AGOSTO DE 2018 > Guiné 61/74 - P18916: Blogpoesia (579): "Passou para trás...", "Três dias de ausência..." e "Mar de poesia", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728

domingo, 12 de agosto de 2018

Guiné 61/74 - P18916: Blogpoesia (579): "Passou para trás...", "Três dias de ausência..." e "Mar de poesia", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728

1. Do nosso camarada Joaquim Luís Mendes Gomes (ex-Alf Mil da CCAÇ 728, Cachil, Catió e Bissau, 1964/66) estes belíssimos poemas, da sua autoria, enviados entre outros, durante a semana, ao nosso blogue, que publicamos com prazer:


Passou para trás...

Passou para trás o dia que, ontem, foi hoje
e não volta a ser.
Passam todos por mim enquanto eu vou.
Depois, serei do passado
como tantos que já não são.
Com outros, sem mim, continuará a passar.
Não sei donde vim e para quê.
Não sei para onde vou.
Só sei que, agora, sou...

Mafra, 5 de Julho de 2018
14h2m
Jlmg

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Três dias de ausência...

Troquei minha ausência de Mafra por três dias de presença a velejar pela minha aldeia.
Profundas vibrações das pisadas que ali deixei iluminaram minha lembrança.
Figuras respeitáveis de gente ida. A que sabia bem o nome que me chamavam.
Vieram à minha saudade.
Com a ternura familiar da vizinhança sã.
Era o tempo da fidalguia pura e da honestidade.
Quando o sol nascente nos espreitava a arder pelas fragas longínquas do Marão.
Sorriam verdes as latadas altas, bordejando os campos e as searas.
E, nos rostos rubros das pessoas, refulgiam os sorrisos da honestidade.
- "O Senhor te abençoe..." - assim me dizia um desconhecido que passava.
Tudo me ressoou fremente, nestes breves dias de passagem...

Mafra, 10 de Agosto de 2018
10h7m
ouvindo Kathia Buniatishvili, tocando Grieg
Jlmg

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Mar da poesia

Banhei meu pensamento no mar da poesia.
Expu-lo ao sol e ao vento para secar.
Depois soprei-o e fiquei a vê-lo adejando versos como aves soltas a brincar no céu.
Como eram belos.
Quem os ditava não era eu.
Pus-me a lê-los.
Grandioso.
Um painel de cores.
Faiscando belo.
Lindas mensagens.
Sereno apelo.
De amor e esperança.
Oxalá o vissem de todo o mundo...

Ouvindo Sheherazade de Rimsky-Korsakov
No Bar "Castelão" em Mafra,
12 de Agosto de 2018
10h10m
Jlmg
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Nota do editor

Último poste da série de 5 de Agosto de 2018 > Guiné 61/74 - P18898: Blogpoesia (578): "Sombras...", "Minha sonda..." e "Laçadas falsas...", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728

domingo, 8 de julho de 2018

Guiné 61/74 - P18823: Blogpoesia (574): "Os desafios de viver", "Ao nascer do dia..." e "Um outro piano negro...", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728

1. Do nosso camarada Joaquim Luís Mendes Gomes (ex-Alf Mil da CCAÇ 728, Cachil, Catió e Bissau, 1964/66) estes belíssimos poemas, da sua autoria, enviados entre outros, durante a semana, ao nosso blogue, que publicamos com prazer:


Os desafios de viver

Largar o cordão umbilical e começar a respirar, sorver da mãe o pão de leite sem ter de o ferver.
Olhar sorrindo quem nos dá tudo, até as mãos, para não cair ao aprender a andar.
Saber a usar a boca para dizer olá aos pais em cada manhã.
Descobrir que só usando os pés se chega a todo o lado, custe lá o que custar.
Ver que na vida nem tudo é bom e saber ultrapassar sem se deixar vencer.
Voltar atrás para tomar o bom caminho e aprender bem a lição de cada erro.
Saber calar para ouvir quem sabe mais do que nós sobre aquele assunto.
Perdoar quem nos fez mal sem lhe guardar rancor.
Acudir a quem não tem mais ninguém para o salvar.
Saber pedir quando chegar a nossa vez e nunca o esquecer…

Ouvindo "Sinfonia n.º 3 de Brahms"
Mafra, 7 de Julho de 2018
7h00m
Jlmg

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Ao nascer do dia…

É a vida que se renova.
O descanso regenerou-nos as forças e energias.
A majestade solene do nascer do dia, com sol ou não, assombra a nossa mente e nos impele para a beleza.
Despertam em nós as boas tendências, por bem, inscritas pela natureza.
Conforme o talento de cada um.
Escrever, pintar, musicar ou operar na oficina.
Tudo artes da nossa forja.
Neste momento, um grande clarão de luz decora a tapada à minha frente.
Apontando a imensidão dos céus.
Como o limite da nossa existência.
Uma dezena de cavalos viçosos já se entrega à sua sorte de mesa posta, em plena liberdade.
Eu, aqui, oiço as notas veementes dum piano habilidoso, pelas mãos duma pianista, quebrando em cacos toda a minha indiferença…

Ouvindo “Fantasias de Mendelsson”
Mafra, 6 de Julho de 2018
7h6m
Jlmg

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Um outro piano negro…

Um outro piano negro começou a tocar.
Suas teclas desfecham flechas com matizes de luar e a pujança forte dum mar enfurecido contra a praia faminta à sua espera.
Tem artes nunca vistas. Outras eras.
Outras luzes.
Se apagaram como mestras perante o brilho dos novos talentos que ajudaram a surgir.
Como soam bem as teclas negras deste piano velho adormecido…

Ouvindo Maria Grinberg plays Grieg Holberg Suite Op. 40
Mafra, 6 de Julho de 2018
7h16m
Jlmg
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 Nota do editor

Último poste da série de 29 de junho de 2018 > Guiné 61/74 - P18791: Blogpoesia (573): Mulher (ou lembranças da minha terra), de Júlio Corredeira (Mário Santos, ex-1.º Cabo Especialista MMA da BA 12)

domingo, 24 de junho de 2018

Guiné 61/74 - P18774: Blogpoesia (572): "Festa das ventanias", "Lagoa de Melides" e "Pérolas na vidraça", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728

1. Do nosso camarada Joaquim Luís Mendes Gomes (ex-Alf Mil da CCAÇ 728, Cachil, Catió e Bissau, 1964/66) estes belíssimos poemas, da sua autoria, enviados entre outros, durante a semana, ao nosso blogue, que publicamos com prazer:


Festa das ventanias

Vinha de tempos imemoriais.
Todos os anos, pelo São Pedro,
Arribavam de todo o mundo
Os ventos intemporais.
Como migrações.
Era a peregrinação universal das intempéries, com seus matizes.
Do oriente, os mais ferozes.
Habituados às asperezas asiáticas,
Desde o Evereste aos Himalaias.
O que valia era a distância.
Quando ali chegavam, vinham brandos. Ninguém suponha o que eles seriam na sua origem.
Chegavam à praça rodopiando em arcos leves. Descreviam formas vistosas de iluminuras.
Como serão as ninfas orientais.
Contrastavam com os do ocidente ameríndio, enigmático e imprevisível, das florestas amazónicas, com volutas voluptuosas das planícies verdes.
Vinham arfantes da travessia longa do oceano.
Se instalavam pacíficos pelas bancadas como se turistas.
Os do norte vinham trementes nas suas vestes longas. Insuficientes. Tiniam de frio. Aspiravam calor.
Para recuperar quem eram. O seu vigor.
Os do sul cheiravam a África. Eram agrestes como as vertentes do Killinmanjaro.
Exalavam perfumes inebriantes do equador.
Insinuantes como as dunas desérticas que atravessaram.
Só depois da primeira noite cada vento, já recomposto, mostrava quem era.
A seguir, era a festa da convivência.
Durava um mês.
Onde a fraternidade universal era a rainha…

Mafra, 23 de Junho de 2018
7h14m
Jlmg

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Lagoa de Melides

Abriram-lhe a porta...
Vi-a fugir.
Abriram-lhe a porta.
Pôs-se a correr.
Parecia uma louca.
Afogou-se no mar.
Escrava da terra.
Espelho do céu.
Queria ser livre.
Bem se enganou.
O mar a engoliu,
Sem faca nem garfo.
Ficou só o leito,
Ao vento e ao sol,
Até que a terra o vista de verde
E o dê a pastar.

Bar Castelão, 22 de Junho de 2018
9h57m
Jlmg

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Pérolas na vidraça

Escorrem-me pérolas na vidraça que dá para a Mata.
São da chuva intemperã.
Escorraçou o sol e pintou de cinza o tempo.
Um bombo de festa nas suas mãos.
Nunca sabe onde vai parar.
Ainda, ontem, radioso, reinou toda a manhã.
Fui ver o mar a brilhar de verde.
Me regalei sentado na minha cadeira à sombra, absorvendo a brisa.
Afinal, quem manda nesta república?
O rei não é…

Mafra, 21 de Junho de 2018
Jlmg
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Nota do editor

Último poste da série de 17 de junho de 2018 > Guiné 61/74 - P18748: Blogpoesia (571): "Catedral do Universo", "Corrimão da escada" "Com sentimento..." e "Parece que já não há mais...", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728

domingo, 17 de junho de 2018

Guiné 61/74 - P18748: Blogpoesia (571): "Catedral do Universo", "Corrimão da escada" "Com sentimento..." e "Parece que já não há mais...", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728

1. Do nosso camarada Joaquim Luís Mendes Gomes (ex-Alf Mil da CCAÇ 728, Cachil, Catió e Bissau, 1964/66) estes belíssimos poemas, da sua autoria, enviados entre outros, durante a semana, ao nosso blogue, que publicamos com prazer:


Catedral do Universo

Vivemos como parte integrante, mergulhados na catedral do Universo.
Sumptuosa, rica e imponente, se ergueu do nada pela mão omnipotente do Criador.
Suas torres agudas vão do chão ao infinito.
Seus dois hemisférios, sul e norte, são as naves cravejadas de rosáceas
Por onde a luz do sol entra, tudo inundando de luz e cores, desde os cumes mais altos às profundezas dos oceanos.
Tem dois braços de igual tamanho que abraçam o mundo, o dia e a noite.
O sol e a lua são os dois turíbulos, em combustão constante, que a incensam em contínuo movimento pendular
Espalhando a vida com seu calor e luz.
Nela habita e ora, desde sempre, a privilegiada humanidade.

Ouvindo “Adágios Russos”
Mafra, 10 de Junho de 2018
7h9m
Amanhecer cinzento e chuvoso
Jlmg

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Corrimão da escada

Tem horas na vida em que subir ou descer é um calvário de dor.
Quando falte a mão ou o braço de alguém,
Haja sempre um corrimão, à mão.
Quanto bom e bem ficou na vida por fazer porque faltou alguém com sua mão.
Com ajuda se chega ao infinito.
O impossível desaparece
E o sonho se realiza.
Mesmo os órfãos, tenros meninos, podem chegar a ser alguém
se, naquela hora, houver alguém que lhes estenda as mãos.
Com ajuda, tudo se faz mais fácil...

Bar Polo Norte em Mafra, 12 de Junho de 2018
9h1m
Jlmg

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Com sentimento…

Como o sol, Dá cor à vida o sentimento.
De que serve viver sem sabor?
Ser matéria inerte que o vento não agita e a chuva não fecunda.
Passar o tempo alheio à dor ou alegria que anda à volta.
Num tanto faz, nada me toca.
Indiferente ao mundo. Espectador sentado que vem e vai.
Entrou, assim saiu.
Peso morto o dia a dia.
Nem bom nem mau.
O Senhor nos livre de quem é assim…

Ouvindo Mendelssohn, concerto para violino por Hilary Hahn
Mafra, 14 de Junho de 2018
7h9m
Jlmg

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Parece que já não há mais...

Compro vinho em caixotes de cartão, aos cinco litros.
Adoro dar à torneirita e vê-lo, todo contente, a correr para o copo.
Uma sensação boa. De fartura e liberdade.
O pior é quando se adelgaça a bica, avisando do fim.
Olhos em bico. Tudo acaba. Já não dá mais.
O que vale, as vinhas já estão cheias.
E o verão está aí.
Entretanto, há que ir ao mercado e abastecer.
Um bom almoço requer bom vinho.
É bom sinal. Ainda há gosto!...

Bar Castelão, em Mafra, 15 de Junho de 2018
10h9m
Jlmg
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Nota do editor

Último poste da série de 10 de junho de 2018 > Guiné 61/74 - P18730: Blogpoesia (570): "É como um rio a nossa vida...", "Forças invisíveis..." e "Visita do Sol...", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728

domingo, 10 de junho de 2018

Guiné 61/74 - P18730: Blogpoesia (570): "É como um rio a nossa vida...", "Forças invisíveis..." e "Visita do Sol...", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728

1. Do nosso camarada Joaquim Luís Mendes Gomes (ex-Alf Mil da CCAÇ 728, Cachil, Catió e Bissau, 1964/66) três belíssimos poemas, da sua autoria, enviados entre outros, durante a semana, ao nosso blogue, que publicamos com prazer:


É como um rio a nossa vida…

Fio de água, flor em botão, grão em semente,
Cresce do chão. Se eleva ao alto. Em correria louca.
Se dispõe a tudo. A viver sem fim.
Se espraia ao sol. Gemendo ao vento,
Aqui, avança, ali se espraia.
Alegria louca.
Tudo querendo. Sulcando fundo.
Cataratas. Escarpas rochosas.
Remoinhos. Num catavento.
Tem um destino a descobrir.
Marcha veloz. Cheia de riscos.
Umas vezes, vencendo. Outras, perdendo.
Belos encontros. Festas felizes.
Apetece ficar. Remanso de sonho.
Mas cá por dentro, há um apelo.
Há que seguir. Sem retorno.
É o dia a dia.
Gemendo e chorando.
Cantando e rindo.
Horas bravias, as melhores são doces.
Deixam saudade. Fazem sonhar.
Grande mistério.
Para quê viver?...

Ouvindo dois violoncelos em “moon river”
Dia chuvoso
Mafra, 6 de Junho de 2018
7h11m
Jlmg

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Forças invisíveis…

O mundo é um mar imenso, de ondas convulsas que se digladiam incessantemente.
Numa propulsão contraditória de elementos cuja origem ultrapassa o imaginário.
Uma rede de malha fina e consistente
Sustenta a existência onde habita a humanidade.
Há mistérios insondáveis que permanecem em segredo.
Qual o rumo e o fim do futuro.
Temos consciência de que somos.
Mas não do fim para que existimos.
Há apelos íntimos que nos acompanham a cada momento.
Qual é a sua origem e finalidade.
Uma insatisfação constante e insaciável nos estigmatiza a vida.
Caminhamos no cume do abismo e da sede de glória.
Oscilamos entre a terra e os céus com vontade inelutável de aqui ficar.
Até o mundo gira frenético numa busca ingente, desde a terra, o sol e as galáxias
Que nos deixa perplexos…

Mafra, 3 de Junho de 2018
7h44m
Ouvindo Fauré - Requiem aeternum
Jlmg

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Visita do sol…

Abençoado seja este sol que me visita neste amanhecer.
Oxalá não fosse uma furtiva amostra
Mas ficasse o dia todo acompanhando nossa existência.
Faz-nos falta sua luz e seu calor.
É a base da nossa existência, viva e iluminada.
Quando não vem, avança a tristeza crescente embora velada.
Não nascemos para viver na sombra.
Nem com frio.
A chuva venha em doses certas.
Não empape nossos caminhos.
Precisamos de nos mover na secura das estradas.
Queremos banhar nossos olhos nas cores que encantam os campos e valados.
Rejubilem os pássaros com seus voos endiabrados e o canto que lhes brota sem ensaios.
Beba o sol das ondas salsas e bailarinas o sal da força que puxa este mundo.
Suas visitas respeitem o calendário das estações da natureza.
Nunca confunda o inverno com o verão
Para que o outono seja fecundo.
Fica aí reinando nesse trono, de paz e de abundância…

Ouvindo o concerto n.º 1 de Tchaikowsky por Martha Argerich
Mafra, 5 de Junho de 2018
Jlmg
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Nota do editor

Último poste da série de 3 de junho de 2018 > Guiné 61/74 - P18706: Blogpoesia (569): "Como os tempos mudaram...", "Tivesse voz a borboleta..." e "Os sinais da vida", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728