Blogue coletivo, criado e editado por Luís Graça, com o objetivo de ajudar os antigos combatentes a reconstituir o puzzle da memória da guerra da Guiné (1961/74). Iniciado em 23 Abr 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência desta guerra. Como camaradas que fomos, tratamo-nos por tu, e gostamos de dizer: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande. Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
sábado, 27 de abril de 2024
Guiné 61/74 - P25452: Os 50 anos do 25 de Abril (14): 25 de Abril - Um golpe / Uma revolução (António Carvalho, ex-Fur Mil Enf.º da CART 6250/72)
25 de Abril - Um golpe / Uma revolução
Quando embarcávamos, uns mais contrariados que outros, alguma razão ou razões nos faziam aceitar aquela missão com mais ou menos sofrimento. Uns deixavam para trás para além da família e amigos, a esposa, a namorada e até filhos. E se a uma minoria, o soldo, de algum modo dava algum alento, a grossa maioria dos militares nem sequer recebia algo comparável ao mais pequeno salário, passando a comissão de mais de dois anos a contar os tostões para uma cerveja ou um maço de tabaco. Aquelas imagens do massacre de milhares de pessoas, incluindo homens, mulheres e crianças, no norte de Angola, às mãos de guerrilheiros selvagens, em 1961, permanentemente recordadas pelos serviços de propaganda do regime, serviam para a construção da ideia errada da justeza da guerra contra bandidos.
Quase todos nós estávamos formatados, desde o berço e dos bancos da escola que Portugal era assim um país pluricontinental e plurirracial e que tínhamos (nós lusitanos) uma missão civilizacional a cumprir no mundo. Estávamos assim formatados, como ainda hoje há regimes políticos e religiões que formatam os cidadãos com ideias retrógradas e mesmo imbecís: supremacia de raça, supremacia religiosa, missões divinas e doutrinas do fim do mundo.
Na verdade é muito mais fácil formatar ignorantes do que instruídos. Muitos de nós, só quando saíamos das nossas aldeias com destinos aos quarteis é que andávamos de combóio e víamos o mar. Então alguns alegravam-se quando, ao fim de seis meses de tropa entravam, embasbacados, num grande navio com destino ao Ultramar, julgando que enfrentariam uns insipientes guerrilheiros de catana e espingarda rudimentar. Muitos só gradativamente, como quem escala uma sucessão de montanhas de altitude cada vez mais acentuada, se apercebiam que aquilo era bem pior do que tinham preconcebido.
Então, instalados no meio, hão de penar, sob calor e chuva, afrontados por comichões e mosquitos, emboscadas e minas, sem terem como fugir do sítio onde mal se come e mal se dorme, onde se vê o sangue do camarada a tingir a terra e os seus olhos sem alma despedindo-se longe dos seus. Fica-se lentamente convencido de que tem que aceitar aquele sacrifício. Talvez não morra, talvez escape, nem que seja sem uma das pernas, coisa que é muito má, mas há muito pior. Depois, quase no fim, quando percebemos que não estamos ali a fazer quase nada, que o inimigo tem amigos que lhe fornece apoio e armamento mais moderno que a nossa G3, que não fomos solicitados para ali permanecer, é que concluímos que fomos enganados. Afinal, eles (os guerrilheiros) têm direito a ter os seus próprios governantes.
Ora, se os portugueses, por essa altura, não tinham o poder de escolher o seu próprio governo, o qual era escolhido por uma aristocracia económica e política, como podíamos ajudar os guineenses a tomar conta do seu próprio governo.
Salgueiro Maia e muitos outros militares perceberam, ainda que demasiado tarde, que não havia nenhuma razão para continuarmos a sofrer e morrer numa guerra sem sentido e injusta. Foi preciso o sacrifício inglório de muitos milhares de vidas, para se criar a massa crítica que deu alor ao movimento dos Capitães e a coragem a Salgueiro Maia para enfrentar o carro de combate no Terreiro do Paço.
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Nota do editor
Último post da série de 25 DE ABRIL DE 2024 > Guiné 61/74 - P25445: Os 50 anos do 25 de Abril (13): Testemunhos - Numa Das Malas Velhas Da Minha "Fundação" (António Inácio Correia Nogueira, ex-Alf Mil da CCAÇ 16 - CTIG, 1971 e ex-Cap Mil, CMDT da CCAV 3487/BCAV 3871 - RMA, 1972/74)
quinta-feira, 11 de abril de 2024
Guiné 61/74 - P25372: Os 50 anos do 25 de Abril (9): Honra a dois dos heróis que o país esqueceu, Salgueiro Maia e José Afonso (Juvenal Amado, ex-1.ª Cabo Condutor Auto da CCS/BCAÇ 3872)
Muito se fala de heroísmo e acabamos por pensar neles em termos de perfil como ficam bem nas capas da revistas onde passam a ser ícones, admirados como exemplo como estrelas de cinema onde são glorificados. Olham a morte de soslaio com o cigarro ao canto da boca, compondo imagem de deixós-poisar tipo super-homem que só temia a criptonite.
De heróis fala história, pelas suas conquistas, pelos seus actos de bravura e pelo que deram aos impérios.
Esses heróis foram-se com o fim dos mesmos impérios, não poucas as vezes receberam os louros pelo que outros menos importantes fizeram, mas que não tinham estatuto para isso. Foram mais os esquecidos dos que premiados.
Mas os heróis que eu conheci eram jovens perfeitamente normais e que se olhassem para eles em nada se vislumbraria essa gesta guerreira. Não eram bons soldados e não eram exemplos de postura, alguns não sabiam ler e escrever para além do nome. Iam para o mato com pouca ou nenhuma vontade e, não poucas vezes, remoíam e praguejavam contra quem os obrigava a ir. Tinham medo? Ter medo é normal e a valentia só aparece quando o vencemos.
As razões porque rejeitaram um impedimento na cantina para ficarem com os seus camaradas de pelotão e o caso do meu camarada David Leão, que rejeitou a hipótese de não ser mandado para a Guiné por o irmão ter sido morto em combate em Angola, são uma daquelas coisas difíceis de explicar.
Será que as escolhas nos definem ou é irreverência, falta de bom censo ou ainda a curiosidade pelo caminho que temos pela frente?
Contaram-me que um capitão de uma companhia, condecorado por feitos em Angola, fugiu para o quartel quando os homens que comandava caíram numa emboscada onde morreram vários. Era um herói que quebrou?
O homem e as suas contingências.
Por muito que nos custe, depois do regresso morreram camaradas, que durante as suas comissões praticamente nunca saíram do quartel onde tinham impedimentos, que serve de prova que nós não fazemos o caminho mas o caminho é que nos faz a nós.
Mas voltamos aos que gostariam de ser glorificados e para isso até fariam o pino. Mas o herói é aquele que dá com a mão direita sem que a esquerda veja. Perdoem-me a utilização deste trocadilho normalmente usado para fins de caridade. Melhor, o herói age em prol dos outros com desprezo pelo seu bem estar físico, mas não pensa nisso. Dá o que tem, mesmo que lhe custe a vida para a qual não instituiu preço nem contrapartida.
Aproxima-se uma data que encheu Portugal de actos heróicos. Marcharam pela paz e derrubaram com risco da sua vida e carreira, contra um regime que nos tinha mandado para um atoleiro que custou tantas vidas e lágrimas.
Não actuaram sozinhos, outros durante anos combateram, sofreram nas prisões e morreram para abrir o caminho para uma realidade nova, longe do obscurantismo pequenino e castrador.
Libertaram outros heróis anónimos, deram a esperança daquela madrugada à esperança de um país sem grades e sem correntes.
Foram homens que não correspondiam a nenhuma matriz, mas que o coração excedia em muito a país que os viu nascer.
Com a devida vénia a TimeOut
A História dos países faz-se desses homens que um dia resolvem que têm outra coisa a fazer do que preservar a sua vida.
O 25 de Abril é um dia inesquecível, impar e nada do que disserem dele lhe retirará o brilho, quando uma nação inteira rejubilou com a liberdade alcançada.
Honra a dois dos heróis que o país esqueceu, Salgueiro Maia e José Afonso.
Viva o 25 de Abril
Juvenal Sacadura Amado
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Nota do editor
Último post da série de 11 de Abril de 2024 > Guiné 61/74 - P25369: Os 50 anos do 25 de Abril (8): Convite para a inauguração da exposição "O MFA e o 25 de Abril", amanhã, dia 12 de Abril, pelas 17h00, na Gare Marítima de Alcântara - Lisboa (Pedro Lauret, Capitão-de-Mar-e-Guerra Reformado)
sexta-feira, 15 de março de 2024
Guiné 61/74 - P25275: Os 50 anos do 25 de Abril (1): Nos 50 Anos de Abril... O Meu Herói de Abril: Cap Salgueiro Maia (António Inácio Correia Nogueira)
Caros camaradas
Grato vos fico pelo gesto que tiveram p´ra comigo.[1]
Como agradecimento ofereço-vos esta despretensiosa poesia que acabo de produzir.
Abraço amigo
António Inácio Correia Nogueira
Trouxeste as G3, as Chaimites e os velhos tanques d´aço,
E muitos jovens estremunhados, mas de rosto novo; e Santarém deixaste.
Ó Maia tu nunca quebraste!
E ao som do rom-rom da coluna militar,
Numa mão agarraste a G3 e na outra a liberdade, e puseste-te a andar;
Nas sacudidelas da estrada sonhaste com a guerra em Guidage, na mártir picada,
P´ la tormenta do combate esburacada,
Da sua terra vermelha, salpicada de sangue, que trilhaste,
Nos senhores da Guerra, perversos, que encontraste.
Ó Maia tu nunca quebraste!
Chegou a hora, olhas o despontar da imaginada madrugada,
O casario lisboeta, as colinas e o mar dos Descobrimentos de espuma prateada;
Tudo já te parecia novo, libertado,
Enquanto os ditadores dormiam, o sono na tirania, sossegados.
Paraste, sem medo; puseste firme a bota na calçada e, logo a vitória vislumbraste.
Ó Maia tu nunca quebraste!
A Capital do Império, a Praça,
De repente ela é tua; o concebível revés, de repente é graça!
Sobes ao Carmo, o sangue da picada que lembraste, está de cravos vermelhos festejada,
O povo clama, arrebatado, liberdade, liberdade, liberdade!...
Embriagado, lança o mito o “povo unido jamais será vencido”.
As armas, lá longe no calor do capim, calaram,
Os soldados de além-mar regressaram.
O povo é todo teu,
Ai, quem diria, o ditador pereceu.
Porque tu, Maia, nunca quebraste!...
Fizeste tudo para além do que baste.
Tu és o herói, a essência, o corpo maior,
O âmago das coisas boas de Abril,
Da liberdade celebrada,
Há 50 anos.
Tu és um Salgueiro que não desfalece, não desalenta.
Eterno serás,
Porque não voltaste atrás.
Ó Maia, sabes, o meu herói de Abril és tu!... Sempre.
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Nota do editor:
[1] - Vd. Post de 7 DE MARÇO DE 2024 > Guiné 61/74 - P25247: O nosso livro de visitas (221): O nosso camarada António Inácio Correia Nogueira pôs à disposição da tertúlia a Tese que apresentou à Universidade Fernando Pessoa como parte dos requisitos para obtenção do grau de Doutor em Ciências Sociais, especialidade em Sociologia
segunda-feira, 11 de março de 2024
Guiné 61/74 - P25263: Notas de leitura (1675): Capitães/MFA – A conspiração na Guiné (Mário Beja Santos)
Queridos amigos,
O tema está longe de ser novo, já foi pelo menos abordado o longo depoimento de Carlos Matos Gomes e Jorge Golias, aqui reproduzidos.[1]
O Coronel Duran Clemente elenca as sucessivas etapas da constituição do núcleo dinamizador e como ele evoluiu até agregar as unidades fundamentais sediadas em Bissau, dos três ramos das Forças Armadas. Não se reproduzem aqui os textos de Moisés Cayetano Rosado sobre Salgueiro Maia pois igualmente já se fez recensão do livro que o investigador dedicou ao capitão de abril; as considerações de Mário Moitinho Pádua sobre o colonialismo português também já apareceram numa recensão dedicada ao seu livro.
Um abraço do
Mário
Capitães/MFA – A conspiração na Guiné
Mário Beja Santos
O boletim n.º 86 deste ano da revista “O Pelourinho”, da Deputação de Badajoz é dedicada ao estudo de conflitos coloniais. O seu diretor, Moisés Cayetano Rosado convidou vários intervenientes portugueses, como Duran Clemente, Mário Moutinho Pádua ou Luís Farinha, além de ele próprio ter dedicado um texto à consciencialização do Capitão Salgueiro Maia, a quem dedicou um trabalho que já está traduzido em português.
Duran Clemente, hoje Coronel reformado, tece uma apreciação sobre a conspiração na Guiné que acaba por completar e confirmar depoimentos de Carlos de Matos Gomes e Jorge Sales Golias, aqui já apresentados no blogue.
Tudo terá começado com a reação e repúdio dos oficiais do quadro permanente ao Congresso dos Combatentes do Ultramar. Escreve textualmente o autor:
“Almeida Bruno, Dias de Lima, Manuel Monge, Otelo Saraiva de Carvalho e outros, puseram ocorrente o general Spínola do descontentamento que apoderou dos oficiais em geral. Tratava-se de um congresso que mais não era do que uma encenação do governo com aproveitamento de antigos oficiais milicianos. Este descontentamento chegou a Lisboa, chegou também a Ramalho Eanes, Hugo dos Santos e a Vasco Lourenço, que encabeçavam na metrópole um vasto movimento de protesto. 400 assinaturas de oficiais do quadro permanente assinaram em Bissau”.
Enviou-se mesmo um telegrama para o Porto a partir de Bissau em que os subscritores diziam taxativamente que se consideravam totalmente alheios às conclusões do congresso. Duran Clemente chegara a Bissau a 28 de julho de 1973. Começaram as reuniões no Agrupamento de Transmissões, presentes Jorge Golias, Duran Clemente, Matos Gomes, Jorge Alves, José Manuel Barroso, este capitão miliciano. Debruçaram-se sobre um documento que Duran Clemente tinha feito à hierarquia militar e distribuído no Congresso de Oposição Democrática em Aveiro. Com consentimento dos presentes criou-se um núcleo dinamizador, assumiu-se como prioridade editar um documento destinado a todos os oficiais, no sentido de os sensibilizar para o que se estava a passar. É nesta fase em que se procura endereços de todos os oficiais em serviço na metrópole ou nas colónias que é publicado o Decreto-Lei n.º 353/73, que facultava a entrada de oficiais do Quadro Especial de Oficiais no quadro permanente através de curso intensivo na Academia Militar.
Iniciava-se uma fase de grande protesto, fora um tremor de terra que pôs este núcleo em ação e os oficiais começaram a reunir na sala de jogos do Clube Militar, efetuaram-se 4 reuniões no espaço de 8 dias, 3 delas no Agrupamento de Transmissões. Elaborou-se uma carta protesto assinada por 46 capitães a que se juntaram ainda as de 4 subalternos. Na metrópole, começara a haver reuniões de capitães; em setembro, foi eleita a 1.ª Comissão Coordenadora do Movimento de Capitães da Guiné. Houve informação da reunião de Évora, que se realizou em 9 de setembro, onde se encontraram mais de 130 oficiais do quadro permanente. Em Bissau entendeu-se dar conhecimento ao Comandante Militar da existência de reuniões. O Brigadeiro Alberto Banazol deu a devida autorização para se reunirem na Biblioteca do Quartel General. Banazol mostrou-se cordial e convidou-os para um jantar volante em sua casa, jantar que teve um final conturbado por ter havido intervenções acaloradas, chamava-se à atenção dos altos comandos que se estava a deixar resvalar para um caso semelhante ao da Índia. O oficial general mostrou-se evasivo e acabou por ser vítima de si próprio, em 25 de abril não quis mostrar que estava do lado dos capitães e até do seu irmão, o Tenente-Coronel Luís Ataíde Banazol.
Entrara-se numa atmosfera conspirativa, procurava-se angariar o maior número possível de adeptos. A Marinha aderiu em força, a Força Aérea destacou sempre em Jorge Alves e Faria Paulino e depois Sobral Bastos e o paraquedista Albano Pinela. No mês de outubro, Duran Clemente efetuou uma reunião com 14 oficiais pilotos-aviadores do quadro permanente, acompanhado de Faria Paulino. Constituiu-se igualmente o Movimento de Oficiais Milicianos, os seus principais mentores eram os alferes Barros Moura e Celso Cruzeiro, e o Capitão Miliciano José Manuel Barroso. Há a reunião de Óbidos em 24 de novembro de 1973, punham-se 3 hipóteses, a conquista do poder para uma Junta Militar criar no país as condições que possibilitem uma verdadeira expressão nacional, dar oportunidade ao governo de legitimar perante a nação perante eleições livres precedidas de um referendo sobre a política ultramarina, utilizar reivindicações exclusivamente militares como forma de alcançar o prestígio do exército e depressão sobre o governo.
E escreve Duran Clemente:
“A decisão de que na Guiné também optaríamos pela tomada do poder pelas armas já estava tomada há muito; daríamos, no entanto, a possibilidade à hierarquia militar para se pronunciar. Quem não estivesse connosco seria devolvido a Lisboa. No caso de insucesso das operações pelo Movimento em Portugal a nossa estratégia era a tomada do poder na mesma. Para isso, tínhamos de ter o completo domínio do comando em todos os setores e ramos das nossas Forças Armadas, instaladas no teatro de operações da Guiné. Iriamos ter.”
Houve alguns momentos de aflição, houve que travar a ansiedade do Tenente-Coronel Banazol que queria tomar o poder ocupando o Palácio do Governo.
E assim se chegou ao 25 de Abril. Tanto o Comandante-Chefe como o Comandante-Militar não aderiram ao Movimento. A Companhia de Polícia Militar tomou pacificamente as instalações do Comando-Chefe, Bettencourt Rodrigues seguiu uns dias depois por avião para Lisboa. O MFA colocou o Almirante Almeida Brandão como Comandante-Chefe interino e o Major Mateus da Silva como representante da Junta de Salvação Nacional, até 7 de maio, data em que chegou o Tenente-Coronel Carlos Fabião graduado em Brigadeiro, vinha ocupar as funções de Governador da colónia.
O depoimento de Duran Clemente traz um anexo com a síntese das reuniões havidas em agosto de 1973.
Notas do editor:
[1] - Vd. post de 21 DE FEVEREIRO DE 2014 > Guiné 63/74 - P12751: Notas de leitura (566): A descolonização da Guiné: Depoimentos de protagonistas - Parte 4 de 4 (Mário Beja Santos)
Último post da série de 9 DE MARÇO DE 2024 > Guiné 61/74 - P25254: Notas de leitura (1674): O Santuário Perdido: A Força Aérea na Guerra da Guiné, 1961-1974 - Volume II: Perto do abismo até ao impasse (1966-1972), por Matthew M. Hurley e José Augusto Matos, 2023 (15) (Mário Beja Santos)
quinta-feira, 4 de maio de 2023
Guiné 61/74 - P24283: Efemérides (391): No dia 25 de Abril, Faria celebrou a memória dos Alcaides e do Capitão Salgueiro Maia e Camaradas (Manuel Luís Lomba)
1. Mensagem do nosso camarada Manuel Luís Lomba (ex-Fur Mil Cav da CCAV 703/BCAV 705, Bissau, Cufar e Buruntuma, 1964/66), datada de 3 de Maio de 2023, dando notícia de uma homenagem pelo 650.º aniversário do feito dos Alcaides de Faria, assim como ao Capitão Salgueiro Maia, a cargo do Grupo Alcaides de Faria, de que o Lomba é presidente, e da Junta da União de Freguesias de Milhazes, Vilar de Figos e Faria:
Faria celebrou a memória dos Alcaides e do Capitão Salgueiro Maia e Camaradas
O 25 de abril de 2023 foi a oportunidade da celebração conjunta da memória daqueles heróis nacionais pelo Grupo Alcaides de Faria e a Junta da União de Freguesias de Milhazes, Vilar de Figos e Faria. A solenidade foi iniciada às 11H00, com o hastear da Bandeira Nacional junto ao memorial pelo descendente dos Alcaides de Faria, Eduardo Felgueiras Gayo, dignificada com o Hino Nacional pelo instrumental da Banda do Galo do CCO, a deposição da coroa de flores pelo presidente e o vogal da Junta de Freguesia e a alocução alusiva do presidente do Grupo Alcaides de Faria:
“O mês de abril português é fértil de eventos históricos. O 25 de abril de 1127 será celebrado um dia: indícios empíricos apontam-no como o dia em que D. Afonso Henriques assumiu os castelos do Neiva, de Faria e outros, baseou-se e neste castelo proclamou-se “Príncipe dos Portugueses” de Entre Douro e Minho, mais de dois terços do Condado de Portugal. Um dia chegará em que o 25 de abril celebrará também a fundação da nacionalidade.
O feito dos Alcaides de Faria culminou em abril de 1373, há 650 anos, com o levantamento do cerco ao seu castelo e a retirada dos invasores para a Galiza. O Alcaide Nuno Gonçalves foi dar batalha a essa Primeira Invasão Castelhana do Norte, foi derrotado e aprisionado na freguesia de Carapeços, convenceu o general invasor a conduzi-lo ao castelo, consciente da fatalidade da sua exortação ao filho Gonçalo Nunes:
- Filho alcaide! Maldito sejas tu e sepultado no inferno como o traidor Judas, se estes que me vão matar entrarem nesse castelo sem tropeçarem no teu cadáver!...
O Alcaide Nuno Gonçalves de Faria doou conscientemente a sua vida à pátria, salvou o seu castelo e a sua guarnição reteve a invasão com a sua resiliência. Caso o inimigo tivesse progredido livremente e o Porto tivesse caído, o Tratado de Paz de Santarém não teria acontecido. Ante o assassínio do alcaide pela sua heroicidade, o fidalgo Diogo Lopes Pacheco, matador sobrevivo da linda Inês, que incluía a invasão como conselheiro do general galego, passou a mediador das pazes, o rei castelhano estava a contas com o cerco anfíbio a Lisboa, que o desenformou é plausível, que a invasão do Norte estava encalhada em Faria e que as tropas de Barcelos e do Bispo do Porto estavam a cortar-lhe a linha de retirada por Ponte do Lima.
A motivação foi comum a D. Afonso Henriques, aos Alcaides de Faria, ao capitão de abri Salgueiro Maia e camaradas: a liberdade e a dignidade dos Portugueses. Há 49 anos, a exortação do “capitão de abril de “vamos acabar com o estado a que isto chegou” galvanizou os seus comandados, avançaram de Santarém sobre Lisboa, ele expôs o peito à metralha em toda a manobra, o seu feito culminou no Largo do Carmo, a dar o fim ao impopular regime político e a conceder a rendição com dignidade ao seu chefe”.
Seguiu-se a romagem ao Cemitério Paroquial, para homenagear os filhos da terra e combatentes da Pátria na sua última morada, a canora Banda do Galo encabeçou-a e dedicou-lhes músicas fúnebres, os sinos dobraram a finados e a celebração culminou com a chamada nominal dos combatentes da I Grande Guerra e da Guerra do Ultramar: Joaquim Luís de Faria, António Peixoto, Américo Ponte, António Marques, Cândido Ferreira, Domingos Figueiredo, Joaquim Gonçalves, Joaquim Brito, Joaquim Lomba, José Amorim, Manuel Boucinha, Manuel Ferreira, Manuel Peixoto e os omissos.
Manuel Luís Lomba
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Nota do editor
Último poste da série de 2 DE MAIO DE 2023 > Guiné 61/74 - P24277: Efemérides (390): Homenagem aos Combatentes da Guerra do Ultramar da Freguesia de Paus, Concelho de Resende, levada a efeito no passado dia 29 de Abril (Fátima Soledade / Fátima Silva)
sábado, 29 de abril de 2023
Guiné 61/74 - P24267: (In)citações (240): O meu 25 de Abril de 2023 (Hélder Valério de Sousa, ex-Fur Mil TRMS TSF)
1. Mensagem do nosso camarada Hélder Sousa, ex-Fur Mil TRMS, TSF (Piche e Bissau, 1970/72), com data de 28 de Abril de 2023:
O meu 25 de Abril de 2023
Sim, eu sei que não nos devemos meter a “falar” de política (já agora, nem de desporto ou religião) aqui no Blogue. Pode ser fraturante!
E, quando se fala do “25 de Abril”, aparecem sempre umas almas pouco piedosas, a dizer que é preciso contrapor o “25 de Novembro”… Claro que “Abril” é de 1974 e “Novembro” é de 1975, mas isso não lhes interessa nada. Faço notar que sem o “25 de Abril” não seria provável o “25 de Novembro”, por isso não vejo qualquer utilidade nesse “contraponto”, cada coisa em seu tempo.
Mas resolvi hoje, aqui e agora, dar público conhecimento de que este ano, finalmente, “desci a Avenida” nas ações comemorativas. E porquê? Em rigor não sei responder. Um impulso? Alguma necessidade de afirmação? Alguma “penitência”?
Na verdade, foi esta a primeira vez que participei no desfile. E gostei.
Integrei um pequeno grupo que se acolhia numa faixa da “Associação Salgueiro Maia”, que me pareceu apropriado, e considero que tal foi muito positivo.
Apesar de todo o desprezo a que os sucessivos poderes votaram o Homem, ao longo da descida da Avenida até ao Rossio, sempre que das laterais descortinavam a faixa com a sua figura e as palavras identificadoras, foram inúmeras as vezes, incontáveis mesmo, que os aplausos cresciam, as palavras incentivadoras e elogiosas se faziam ouvir. E não raras vezes aludiam às “maldades” que lhe fizeram.
Também foram muitas as fotos que foram tiradas, por naturais e muitos estrangeiros, alguns dos quais queriam saber mais sobre a figura.
Repito, senti-me bem, relembrei o que lhe devia, pela coragem demonstrada no Terreiro do Paço quando foi ao encontro do “tal Anselmo”, pelas atitudes de firmeza e de correção durante a ação no Largo do Carmo, onde, por sinal, também me encontrava na ocasião.
Aquando da minha estadia em Santarém, no 1.º Ciclo do CSM, o Maia foi o instrutor de granadas, na carreira de tiro e na Quinta das Ómnias. Por tal, não me surpreende nada que se mostre em filme (verdade, ou verdade ficcionada?) o Maia a ir ao encontro do “tal Anselmo” com uma granada mão, como medida preventiva para qualquer loucura do “defensor do regime” que, valha a verdade, só não aconteceu por firmeza e coragem do “Homem do tanque”.
Na foto que envio pode-se ver a faixa referida na qual não apareço por estar a tirar a foto mas, durante o percurso, fui segurando uma das pontas.
Hélder Sousa
Ex-Fur Mil Transmissões TSF
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Nota do editor
Último poste da série de 23 DE ABRIL DE 2023 > Guiné 61/74 - P24242: (In)citações (239): O nosso blogue faz hoje 19 anos, sabiam?!... Não é uma eternidade, é uma enormidade... de tempo, equivalente a 10 comissões no CTIG...
sexta-feira, 15 de abril de 2022
Guiné 61/74 - P23170: Humor de caserna (48): o major art José Joaquim Vilares Gaspar, o "Gasparinho", visto por Salgueiro Maia: loucura ou contestação do sistema?
“ (...) o major Gaspar vai comandar o CAOP 2 em Mansabá, onde, dando boa conta do recado, é solicitado para se deslocar a Bissau, à reunião semanal do Com-Chefe, onde deveria ser salientado o seu comportamento. Só que a coluna que, vinda de Farim, o devia transportar a Bissau nunca mais chegava.
[ Seleção / Revisão e fixação de texto / Negritos / Realce a amarelo, para efeitos de publicação deste poste no blogue: LG]
[19] Maia, Salgueiro, O Acaso, In Capitão de Abril – Memórias da guerra do Ultramar e do 25 de Abril, Editorial Notícias, pp. 56 e 57.
quarta-feira, 6 de abril de 2022
Guiné 61/74 - P23145: Recordando o Salgueiro Maia, que eu conheci, o meu comandante, bem como os demais bravos da minha CCAV 3420 (Bula, 1971/73) (José Afonso) - Parte IV: Histórias pícaras: (vii) Os Mais dos... Progressistas (divisa da companhia e também título do jornal de caserna)
O jornal de caserna da CCAV 3420 (Bula, 1971/3), Os Progressistas - Quinzenário de Divulgação, Cultura e Recreio da CCAV 3420. Director: Cap Cav Fernando José Salgueiro Maia. SPM 1898.
Detalhe do guião da CCAV 3420, que tinha duas divisas: "Os Progressistas" e "Perguntai ao Inimigo Quem Somos"...
1. O jornal de caserna podia ser (e deve ter sido) uma forma interessante de manter alto o moral das tropas, no CTIG, e fazer a ligação com a Metrópole (embora não devesse lá chegar). Alguns jovens capitães do QP, como o Salgueira Maia, o Mário Tomé, o Carlos Trindade Clemente, o Jorge Golias e outros (como o nosso António J. Pereira da Costa, membro da Tabanca Grande) perceberam a sua importância (*).
Do quinzenário Os Progressistas não sei sei quantas edições se fizeram. De qualquer modo, o José Afonso era um dos seus colaboradores. E revelou-se um bom contador de histórias, como já aqui pudemos comprovar (**).
2. Mas, "en passant", deixem-me ainda aqui fazer uma confidência: o Salgueiro Maia foi, circunstancialmente, meu colega, no ano lectivo de 1975/76, no Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas (ISCPS), embora eu pouco ou quase nada privasse com ele, porque eramos de cursos diferentes (eu, de ciências sociais; ele, de antropologia), com o estatuto de trabalhadores-estudantes. E penso que andávamos em anos diferentes, ele já tentara inscrever-se no ISCSP em 1969, antes de ir para a sua primeira comissão, em Moçambique.
Íamos às aulas à noite e a algumas Reuniões Gerais de Alunos (RGA), numa altura em que o ISCSP passava por um período de vida muito conturbado (saneamento de praticamente todos, senão todos, os docentes com assento no Conselho Científico, pelo menos os professores catedráticos e associados...), o que levou no final do ano lectivo de 1975/76 (ou nas férias...) ao seu encerramento, por ordem do então Ministro da Educação, o socialista Sottomayor Cardia (1941/2006), e ao consequente início de um duro processo de luta estudantil contra a tutela e o regresso das múmias (como, depreciativamente, eram então chamados os professores doutorados, alvo de saneamentos selvagens, de natureza claramente político-ideológica, incluindo o Prof Doutor Adriano Moreira, antigo Ministro do Ultramar).
Além disso, num ambiente, claramente esquerdista como era então o ISCSP, virado do avesso, com diversas fações a digladiarem-se (da UEC ao MRPP, do MES à UDP...), o Salgeiro Maia do 25 de Abril era ofuscado pelo Salgueira Maia do 25 de Novembro... Esta ambivalência não terá facilitado as aproximações pessoais...
Salgueiro Maia, como bom alentejano e como militar, oriundo da Academia Militar, era, por outro lado, um homem reservado e discreto... E rigorosamente apartidário. O início do ano letivo de 1975/76 foi claramente agitado pelo contexto, interno e externo, incluindo as "sequelas" quer do"verão quente" quer do "25 de novembro".
Histórias pícaras > (vii) Os craques, os "Mais" dos "Progressistas"
(**) Vd. postes de:
terça-feira, 5 de abril de 2022
Guiné 61/74 - P23142: Recordando o Salgueiro Maia, que eu conheci, o meu comandante, bem como os demais bravos da minha CCAV 3420 (Bula, 1971/73) (José Afonso) - Parte III: Histórias pícaras: (iv) A "guerra de Bissau": guardando as costas dos nossos "maiores" ; (v) Capunga: o furriel de calções à "pop"; (vi) O "Velhinho", antigo refractário
1. Na altura em que passam 30 anos da morte do Salgueiro Maia (1944-1992), continuamos a publicar algumas histórias dele e da sua companhia, já aqui contadas em 2009, pelo José Afonso (ex-fur mil, 3º Gr Comb, CCAV 3420 (Bula, 1971/73)-
Havia determinadas datas em que se fazia a chamada Guerra de Bissau. Datas como Natal e Páscoa, datas do aniversário do PAIGC e datas em que Bissau sofreu alguns ataques.
Assim fazia-se deslocar tropa para os sítios donde o IN alguma vez atacou Bissau ou para zonas de onde era possível atacar. Assim, 2 Pelotões da CCav 3420 por duas vezes foram mandados para Nhamate. Foi o 1.º pelotão por 2 dias duma vez e o 3.º de 19 a 24 de Novembro de 1971.
Achamos estranho quando no primeiro dia, ao pôr-do-sol, toca o clarim para a formatura do arriar da Bandeira. É formada a secção em frente mas o engraçado é que depois da bandeira descida, em vez de o Furriel mandar direita volver, manda meia volta volver. E, nesta posição, de costas para o pau da bandeira, cantava-se:
- E viva a Pátria, viva o nosso General!
- PUM!!!
Cap cav Salgueiro Maia, Lisboa, Terreiro do Paço, 25 de Abril de 1974. Foto de Afredo Cunha |
Um dia no Destacamento de Capunga aparece um helicóptero a sobrevoar a Zona e, de seguida, faz-se para pousar no minicampo de futebol. Desconhecia-se quem vinha nele, pois não havíamos sido informados.
Vinha no helicóptero o Coronel Paraquedista Rafel Durão, Comandante do CAOP1, de Teixeira Pinto,
Havia na Companhia um soldado que quis fugir à tropa e, então deu o salto para França. Mas, quando o irmão foi nomeado padre e disse a 1.ª Missa, não resistiu e, porque era de Monção, atravessou a fronteira para assistir à missa.
- Se um dia apanho um turra morto, o capitão vai deixar-me cortar uma orelha para fazer um porta-chaves e os testículos para fazer uma bolsa.
Era homem para isso, só que não estava autorizado a fazê-lo.
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(*) Último poste da série > 4 de abril de 2022 > Guiné 61/74 - P23140: Recordando o Salgueiro Maia, que eu conheci, o meu comandante, bem como os demais bravos da minha CCAV 3420 (Bula, 1971/73) (José Afonso) - Parte II: Histórias pícaras: (i) Os matraquilhos e a astúcia do capitão; (ii) Uma heli-evacuação e a enfermeira paraquedista que não queria levar o "passageiro" em pelota; (iii) As vacas roubadas que andam de mão em mão, acabam sempre comidas em boa ocasião
Guiné 61/74 - P23141: O que é feito de ti, camarada? (16): José Afonso, ex-fur mil at cav, CCAV 3420 (Bula, 1971/73) (Eduardo Silva / Luís Graça)
josebaptistaafonso1949@gmail.com
Pus-me saber notícias dele no Fundão, onde tenho uma mana que é enfermeira e que conheceu o nosso saudoso Torcato Mendonça...
No último dia em Bissau, antes do regresso à metrópole, o capitão fez um almoço de despedida com as praças, no Pelicano (se bem percebi), foi a companhia que pagou. Não era uma prática habitual... E à noite jantou com os graduados... Perderam o último autocarro para os Adidos (que levava a malta que ia ao cinema à noite), ficaram à espera de táxis, perto da Praça do Império e do palácio do Governador... A cantar canções "proibidas" na época... Alguns já com um grãozinho na asa... Mas quem tinha voltado a vestir o camuflado para socorrer Guidaje, merecia tudo... É bom lembrar essa história que não vem nos livros da CECA...
Fico feliz por ter (re)localizado o José Afonso (**). E também por receber a mensagem do seu antigo camarada e amigo, Eduardo Silva, a quem já forneci os contactos do José Afonso, e quem já convidei para integrar a Tabanca Grande.
3. Mensagem que enviei ao Eduardo Silva, por voltas 20h00 de ontem, e que obteve imediata resposta: ele aceitou o meu convite para integrar a Tabanca Grande, e compromete-se a mandar as duas fotos da praxe.
Gostei de o conhecer, ao telelé... Pode ser que nos encontremos, um dia, no Fundão. Mas ele agora vive no Freixial de Cima, Castelo Branco. E vai organizar o próximo encontro da companhia, em Abrantes, no dia 28 de maio. Já é o 20º encontro que organiza. Ele tem muito orgulho nessa missão. A viúva do Maia comparece sempre.
Outra coisa: quero que te juntes à malta da Tabanca Grande. Manda duas fotos digitalizadas, uma do tempo da Guiné, e outra mais ou menos atual. Tens aqui um histórico da Tabanca Grande, o António Marques Lopes, que esteve em 1968 na CCAÇ 3, a comandar o pelotão dos "Jagudis"... Hoje é coronel DFA, reformado... Escreveu um notável livro de memórias autobiográficas. Se acompanhas o blogue, sabes quem é. Aqui tens o seu nº de telemóvel, ele vai gostar de falar contigo (apesar de estar a enfrentar problemas de saúde) (...)
Um "alfabravo". Luís Graça
4 de abril de 2022 > Guiné 61/74 - P23138: Recordando o Salgueiro Maia, que eu conheci, o meu comandante, bem como os demais bravos da minha CCAV 3420 (Bula, 1971/73) (José Afonso) - Parte I: Um cartão pessoal... para a história: "Sinto-me feliz não só pelo acontecimento, mas por me permitir ter vingado todas as injustiças que nos fizeram na Guiné", disse-me ele, agradecendo um telegrama de felicitações, enviado logo a seguir ao 25 de Abril de 1974
(**) Último poste da série > 27 de janeiro de 2022 > Guiné 61/74 - P22942: O que é feito de ti, camarada ? (15): Abel Rei, ex-1º cabo, CART 1661 (Fá, Enxalé, Bissá, Porto Gole, 1967/68), autor do livro, "Entre paraíso e inferno, de Fá a Bissá, memórias da Guiné, 1967/68... O João Crisóstomo manda-te um "hello", de Nova Iorque
segunda-feira, 4 de abril de 2022
Guiné 61/74 - P23140: Recordando o Salgueiro Maia, que eu conheci, o meu comandante, bem como os demais bravos da minha CCAV 3420 (Bula, 1971/73) (José Afonso) - Parte II: Histórias pícaras: (i) Os matraquilhos e a astúcia do capitão; (ii) Uma heli-evacuação e a enfermeira paraquedista que não queria levar o "passageiro" em pelota; (iii) As vacas roubadas que andam de mão em mão, acabam sempre comidas em boa ocasião
Guiné > Região de Cacheu > Binta > CCAÇ 675 (1964/66) > c. 1965 > A ganadaria da "companhia do quadrado"..
1. Eis algumas histórias, já aqui contadas em 2009, pelo José Afonso (ex-fur mil, 3º Gr Comb, foto à esquerda), sobre o cap Salgueiro Maia e os demais bravos da CCAV 3420 (Bula, 1971/73). (**)
(i) Os matraquilhos e a astúcia do capitão
Quando a Companhia de Cavalaria embarca em Lisboa, leva já consigo a sua 1.ª receita: um jogo de Matraquilhos que em 6 dias de viagem esteve sempre ao serviço. Trabalhava de dia e noite sem parar. Foi um bom Fundo de Maneio.
Quando chegámos a Bula, o mesmo jogo foi posto em frente do alçado da caserna dos soldados da Companhia, continuando ali a dar a receita pretendida.
Talvez vendo a fonte de receita que ali tínhamos, o Comandante do Batalhão [BCAÇ 2928] pede a Salgueiro Maia que mande retirar dali os respectivos matraquilhos, pois estavam em local central do Batalhão e não davam muito bom aspecto.Não se tendo conseguido nessa altura demover a tomada de posição do Comandante do Batalhão, lá tiveram que ir os Matraquilhos para o Esquadrão de Reconhecimento Panhard. Aqui a receita era insignificante já que os homens eram muito menos, e também nem sempre o pessoal da Companhia ou Batalhão se deslocava cerca de 300 metros para jogar matrecos.
Salgueiro Maia tinha de arranjar maneira de os matrecos regressarem à origem. Como o Batalhão tinha falta de padeiros e os dois da Companhia estavam emprestados ao Batalhão, Salgueiro Maia vai dar a volta ao Comandante, dizendo que, com a falta de pessoal que tinha, necessitava dos padeiros da Companhia para alinharem para o mato. Levava já na manga a hipótese de deixar os padeiros onde estavam e, como contrapartida, os Matraquilhos regressarem ao Batalhão e colocados nas traseiras da caserna.
A esta proposta o Comando do Batalhão cedeu e uma vez mais Salgueiro Maia venceu.
(ii) Uma heli-evacuação e a enfermeira paraquedista que não queria levar o "passageiro" em pelota
Quando a 28 de Novembro de 1971, um elemento da Companhia acciona uma mina, ficando sem uma perna e outro elemento também ferido, ambos do 3.º Grupo de Combate, é solicitada a evacuação por via aérea para o Hospital de Bissau.
Ao chegar o helicóptero, sai dele uma enfermeira que, ao ver o soldado Santos sem roupa, diz que assim não leva o ferido. Para ser socorrido, utilizaram-se os restos das calças para fazer garrotes à perna e ao braço. E com tiras da roupa seguram-se alguns pensos que tapam feridas menores. O homem estava nu.
Para satisfazer o pedido da enfermeira, foi pedido ao enfermeiro que tinha uma camisola interior vestida para que a tirasse e com ela tapasse o soldado ferido.
(iii) As vacas roubadas que andam de mão em mão, acabam sempre comidas em boa ocasião
Em Abril de 1972 aos elementos da Companhia que estavam no período de descanso, Salgueiro Maia pede voluntários para ir ao Km 13 da Estrada Bula – S. Vicente onde o 1.º Pelotão da Companhia estava emboscado e necessitava de apoio devido a um grupo de Balantas, que vinha do Senegal onde tinha ido roubar vacas, ter caído no campo de minas e algumas vacas andarem na estrada. Assim vão elementos da CCAV 3420 até ao local.
São apanhadas 2 vacas que são carregadas numa GMC. Satisfeitos os elementos da Companhia, com Salgueiro Maia à frente entram em Bula, gritando:
- Queremos carne.
À entrada do Batalhão [BCAÇ 2928] está o Comandante que manda parar a coluna de 4 viaturas. Quando se pensava que ia dar um louvor aos voluntários, houve-se uma reprimenda do Comandante por a tropa vir a fazer muito barulho e, dá ordens para que a coluna entre na sede do Batalhão (a CCAV 3420 era uma Companhia de Cavalaria independente mas de reforço ao Batalhão de Infantaria). Toda a actividade mais perigosa era desempenhada pela 3420.
Contrariando as ordens do Comandante, Salgueiro Maia manda avançar a coluna para o Esquadrão de Reconhecimento Panhard 2641 que ficava aí a 300 metros do Batalhão pois, era ali que as vacas iriam ser comidas. Ao regressar ao Batalhão o Comandante dá ordem a Salgueiro Maia para que entregue as vacas porque diz ele que todo o material capturado ao IN tem de ser entregue ao Batalhão. Salgueiro Maia diz então que as vacas não foram capturadas, mas sim oferecidas e que foi o pessoal da Companhia que as foi buscar estando de descanso e o Batalhão não mandou sair nenhumas forças.
Mais diz Salgueiro Maia:
- As vacas roubadas que andam de mão em mão, acabam sempre comidas em boa ocasião.
(Continua)
[ Revisão / fixação de textos e títulos, paar efeitos de publicação deste poste no blogue: LG ]
Notas do editor:
(**) Último poste da série > 4 de abril de 2022 > Guiné 61/74 - P23138: Recordando o Salgueiro Maia, que eu conheci, o meu comandante, bem como os demais bravos da minha CCAV 3420 (Bula, 1971/73) (José Afonso) - Parte I: Um cartão pessoal... para a história: "Sinto-me feliz não só pelo acontecimento, mas por me permitir ter vingado todas as injustiças que nos fizeram na Guiné", disse-me ele, agradecendo um telegrama de felicitações, enviado logo a seguir ao 25 de Abril de 1974