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terça-feira, 6 de fevereiro de 2024

Guiné 61/74 - P25142: Convívios (977): Almoço/Convívio do pessoal do BCAV 3846 (Ingoré, S. Domingos e Susana, 1971/73), a levar a efeito no próximo dia 3 de Março de 2024, em Fátima (Delfim Rodrigues, ex-1.º Cabo Aux Enfermeiro)

Ingoré, S. Domingos e Susana, 1971/73


ALMOÇO DE CONFRATERNIZAÇÃO DO BCAV 3846

DIA 3 DE MARÇO DE 2024 EM FÁTIMA

Caros amigos,
Vamos a  Fátima para o nosso regular encontro anual, onde haverá lugar a alegre e são convívio para recordar os episódios da nossa história conjunta na Guiné-Bissau.

O evento ocorrerá no Domingo, dia 3 de Março de 2024 no Restaurante Pastilha & Filhas, Estrada de Fátima, 34 Batalha

Apelamos a que compareças com a tua habitual alegria, se quiseres com a família e ou amigos, e nos ajudes a divulgar esta iniciativa por todos os teus amigos que estiveram connosco na Guiné e não receberam este convite. Estamos com dificuldade em ter a base de dados completa.

O programa será o seguinte:
Chegada e registo entre as 11h00 e as 12h00

Almoço com a seguinte ementa:
- Entradas: pão, azeitonas, camarão, rissóis, morcela e pastéis de bacalhau
- Aperitivos: martini, porto e ricard
- Bebidas: vinho maduro e verde, águas, refrigerantes e cervejas
- Sopas: legumes ou peixe
- Bacalhau à Zé do Pipo
- Cordeiro à padeiro
- Sobremesa: prato misto (gelado, fruta e pudim)
- Café e digestivos (aguardente, licores e whisky)

O preço será 30€/pessoa, (não se aceita Multibanco) e todas as bebidas estão incluídas.
(Crianças de 0 a 5 anos é grátis e de 6a 11 anos pagam 50%)

- Encerramento pelas 17h00 com bolo e espumante.

Confirma a tua presença com urgência (máximo até 20 de Fevereiro) para:
- Carlos Conceição (Xina) tlm 919 489 378 - email: carlosconceicaonovoa@gmail.com
- João Catarino tlm 919 805 205 email: catarino.isilva@gmail.com
- Abel Miranda tlm 966 963 841 email: miranda abel@hotmail.com
- Joaquim Monteiro tlm 964 071 285 email: monteiro.quito@gmail.com

AVISA TODA A GENTE QUE CONHEÇAS DAS NOSSAS RELAÇÕES no CTI Guiné

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Nota do editor

Último post da série de 16 DE JANEIRO DE 2024 > Guiné 61/74 - P25077: Convívios (976): A CCAÇ 4544/73 (Cafal Balanta, 1973/74) vai realizar o seu convívio comemorativo dos 50 anos do regresso a Portugal, em Setembro próximo, na zona de Coimbra (António Agreira, Fur Mil TRMS)

quinta-feira, 17 de agosto de 2023

Guiné 61/74 - P24561: A minha ida à guerra (João Moreira, ex-Fur Mil At Cav MA da CCAV 2721, Olossato e Nhacra, 1970/72) (4): Tropa depois da Especialidade

Posição relativa de Ingoré


"A MINHA IDA À GUERRA"

4 - TROPA DEPOIS DA ESPECIALIDADE

João Moreira

Em Janeiro de 1969 fui colocado no RC 3, em Estremoz, onde fui promovido a Cabo Miliciano no dia 6.


Cabo Miliciano João Moreira. Estremoz

Em Fevereiro fui para Tancos para tirar o curso de Minas e Armadilhas.

Voltei ao RC 3.
Mobilizado para a Guiné.

Dei instrução aos militares da CCAV 2540, que fazia parte do BCAV 2876. Na semana de campo tive nova crise - Espinha bífida - e o médico mandou-me para o Hospital Militar de Évora, onde estive até ao fim de Setembro de 1969.

Regressado ao RC 3 fui gozar os 10 dias da mobilização, para ir ter com a minha CCAV 2540 que já estava em Ingoré, na fronteira do Senegal.

Ao 2.º ou 3.º dia recebi uma chamada telefónica do 1.º sargento da secretaria do RC 3 a dizer para voltar para o quartel porque tinha sido desmobilizado.

Estive colocado no Gabinete de Estudos até Dezembro. Nessa altura voltei a ser mobilizado para a Guiné.

Em Dezembro de 1969 fui para o RC 4, em Santa Margarida, para formar a CCAV 2721, novamente mobilizado para a Guiné.


O Cabo Miliciano Enfermeiro José Manuel CARVALHO e eu na semana de campo no RC 4 - Santa Margarida
Furriel João Moreira, com a farda n.º 1


Embarquei no T/T Carvalho Araújo em 4 de Abril de 1970. Cheguei a Bissau no dia 11 de Abril.

Quando embarquei já era furriel, embora ainda não tivesse sido promovido, porque já era cabo miliciano desde 6 de Janeiro de 1969 e na data de embarque já tinha 15 meses de cabo miliciano. Por isso a graduação em furriel que me fizeram em 4 de Abril de 1970, foi corrigida para promoção com a data de 15 de Janeiro do mesmo ano.

No embarque já tinha 21 meses de tropa efetiva mais 6 meses das 2 especialidades perdidas, num total de 27 meses desde a data da incorporação.


(continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 10 DE AGOSTO DE 2023 > Guiné 61/74 - P24547: A minha ida à guerra (João Moreira, ex-Fur Mil At Cav MA da CCAV 2721, Olossato e Nhacra, 1970/72) (3): EPC - Escola Prática de Cavalaria - Santarém: Especialidade

domingo, 5 de março de 2023

Guiné 61/74 - P24121: S(C)em comentários (4): A Massiel de Ingoré, ou melhor, a cantora espanhola, que venceu o Festival da Eurovisão da Canção em 1968, e que deu a alcunha à autometralhadora Daimler ME-78-63, ao tempo em que o nosso Zé Teixeira passou por lá (e também deu uma voltinha com ela...), entre maio e julho de 1968


Guiné > Ingoré > 1968 > CCAÇ 2381 (1968/70) > O 1º cabo auxiliar enfermeiro José Teixeira, dando uma voltinha  numa autrometralhadora Daimler, no início da sua comissão que o levaria do Cacheu (Ingoré) até ao Sul, às regiões de Quínara (Buba, Empada) e Tombali (Quebo, Mampatá, Chamarra).

O veículo tem a matrícula ME-78-63. Viemos a descobrir que  a alcunha, Massiel, era uma homenagem à cantora espanhola María de los Ángeles Félix Santamaría Espinosa (nascida em Madrid, em 1947), mais conhecida como Massiel, que no ano de 1968 havia vencido o Festival Eurovisão da Canção em Londres, à frente do concorrente da casa, e o favorito (com a canção "Congratulations"), Cliff Richard. A canção vencedora chamava-se "La, la, la". (Vd. aqui o vídeo no You Tube, 2' 02''.)

Ora cá temos, mais uma cançonetista em voga na época, outra mulher, a seguir à Sandie Shaw (*), a ser homenageada pelos rapazes das Daimler...  O Pel Rec Daimler deveria ser o mesmo do tempo do Manuel Seleiro, o 2043 (Ingoré e São Domingos, maio de 1968/ março de 70).(**)

Foto (e legenda): © José Teixeira (2005). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].


1. Não sabíamos, até há pouco tempo quem era a Massiel, mas sabemos, desde 2005, quem é o nosso querido amigo e camarada José Teixeira, um dos históricos régulos da Tabanca de Matosinhos... e que tem no nosso blogue nada menos do que cerca de 4 centenas de referências...  E foi, na guerra, um simples (mas valente) 1º cabo auxiliar de enfermagem... É ele mesmo quem se apresenta:

(i) "Fui enfermeiro de campanha na CCAÇ 2381. Fui para a Guiné em fins de Abril de 1968 e regressei em Maio de 1970. Estacionei cerca de 3 meses em Ingoré, no Norte, onde a companhia fez o seu treino operacional [de maio a julho de 1968].

(ii) "Seguimos depois para Buba e fixámo-nos em Quebo (Aldeia Formosa), [no final de Julho de 1968]. Aí a CCAÇ 2381 teve como missão fazer escoltas de segurança às colunas logísticas de abastecimento entre Aldeia Formosa/Buba e Aldeia Formosa/Gandembel, ao mesmo tempo que garantia a autodefesa de Aldeia Formosa, Mampatá e Chamarra;

(iii) "Regressámos a Buba, em Janeiro de 1969, para servirmos de guarda às equipas de Engenharia que construiram a estrada Buba/Aldeia Formosa;

(iv) "Face ao desgaste físico/emocional fomos enviados, a partir de 1969, para Empada onde vivemos os últimos meses de Comissão".
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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 27 de fevereiro de 2023 > Guiné 61/74 - P24104: Sem Comentários (2): A cantora descalça, Sandie Shaw, britânica, vencedora do Festival Eurovisão da Canção (Viena, 1967) que deu o nome a uma Daimler, a ME-90-93, do Pel Rec Daimler 1130 (Ingloré e São Domingos, 1966/68)

(**) Último poste da série > 4 de março de 2023 > Guiné 61/74 - P24116: S(C)em comentários (3): "A gratidão é uma doença canina que não se transmite ao homem"

sexta-feira, 3 de março de 2023

Guiné 61/74 - P24115: Álbum fotográfico de Manuel Seleiro, 1º cabo ref, DFA, Pel Caç Nat 60 (São Domingos, Ingoré e Susana, 1968/70) - Parte II: Mais imagens de Ingoré... e de pessoal da CCAÇ 1801 (Ingoré, Bissum-Naga, São Domingos)


Foto nº 7 > Guiné > Região do Cacheu > Ingoré > Pel Caç Nat 60 (1968/70) > Despedida do pessoal da CCAÇ 1801 (1968/69), que estava em Ingoré e no destacamento de Antotinha  O Manuel Seleiro, nesta foto, parece ser o segundo, ao centro, de bigode,


Foto nº 8 > Guiné > Região do Cacheu > Ingoré > Pel Caç Nat 60 (1968/70) > O quartel de Ingoré


Foto nº 9 > Guiné > Região do Cacheu > Ingoré > Pel Caç Nat 60 (1968/70) > "Dois batelões" (... no Leste, no rio Geba, eram chamados "barcos turras" que faziam transporte de mercadorias e de pessoal civil...)


Foto nº 10 > Guiné > Região do Cacheu > Ingoré > Pel Caç Nat 60 (1968/70) > Pôr do sol

Fotos (e legendas): © Manuel Seleiro (2009). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].


Guiné > Região de Cacheu > Carta de Sedengal  (1953) (Escala 1/50 mil) > Posição relativa de Sedengal, Ingoré, Antotinha e rio Cacheu.

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2023)


1. Continuação da publicação de uma seleção de fotos do álbum do Manuel Seleiro (*), membro da Tabanca Grande nº 870 (**). Trata-se de mais algumas imagens de Ingoré, editadas pelo nosso blogue, com a devida vénia e a autorização do autor. Numa destas fotos vê-se pessoal da CCAÇ 1801, que estve destacado em Antotinha. A CCÇ 1801 passou por Ingoré, Bissum-Naga, S. Domingos, Cacheu e Antotinha (destacamento de Ingoré) (1968/69).  Sobre Ingoré temos mais de 80 referências. INgoré fica na carta de Sedengal (1953) (escala 1/50 mil),

Recordamos que o Manuel Seleiro era o sapador do seu Pel Caç Nat 60. Tirou um curso de minas e armadilhas, de 10 dias, em Bissau. Quando lhe faltavam dois meses para terminar a comissão, foi vítima, em combate, da explosão de uma mina A/P. 

Mesmo totalmente cego, e apenas com dois dedos na mão esquerda, o nosso camarada edita dois blogues (Pel Caç Nat 60 e Luar da Meia Noite). Só reconhece as suas fotos pelas legendas (que procuramos manter). Segue (e comenta) o nosso blogue há muito. O seu exemplo de tenacidade, resistência, camaradagem, e amor à vida e à sua terra natal, Serpa, Baixo Alentejo,  é digno da nossa admiração e do nosso maior apreço. Podemos apontá-lo como um grande exemplo de capacidade de luta contra a adversidade.

Estas fotos, que constam, da  página pessoal do Manuel Seleiro, Luar da Meia Noite, também podem ser, algumas, da autoria do Nelson Gonçalves, que foi o segundo comandante do Pel Caç Nat 60 (criado em São Somingos, em 1968), e também ele vítima de uma mina (neste caso A/C), e DFA.

Julgo que o Nelson Gonçalves vive nas Caldas da Rainha, é viúvo da nossa amiga Manuela Gonçalves, a Nela, falecida em 2019; não temos, infelizmente, o contacto do nosso camarada Nelson Gonçalves que gostaríamos ainda dever sentado à sombra do nosso poilão.
Da CCAÇ 1801, só temos infelizmente quatro referências: o  Carlos Sousa, o Carlos Fernando da Conceição Sousa [ex-alf mil op esp /ranger, CCAÇ 1801, Ingoré, Bissum-Naga, S. Domingos, Cacheu e Antotinha (destacamento de Ingoré) 1968/69] é membro da nossa Tabanca Grande. E é o único representante da CCAÇ 1801.

Guiné 61/74 - P24113: Álbum fotográfico de Manuel Seleiro, 1º cabo ref, DFA, Pel Caç Nat 60 (São Domingos, Ingoré e Susana, 1968/70) - Parte I: Imagens de Ingoré


Foto nº 1 > Guiné > Região do Cacheu > Ingoré > Pel Caç Nat 60 (1968/70) > O 1º cabo Manuel Seleiro com a bazuca 8.9

Foto nº 2> Guiné > Região do Cacheu > Ingoré > Pel Caç Nat 60 (1968/70) > O 1º cabo Manuel Seleiro com o LGFog 3.7

Foto nº 3 > Guiné > Região do Cacheu > Ingoré > Pel Caç Nat 60 (1968/70) > O 1º cabo Manuel Seleiro com o morteiro médio, 8.1

Foto nº 4 > Guiné > Região do Cacheu > Ingoré > Pel Caç Nat 60 (1968/70) > O 1º cabo Manuel Seleiro na fonte

Foto nº 5 > Guiné > Região do Cacheu > Ingoré > Pel Caça Nat 60 (1968/70) > O 1º cabo Manuel Seleiro  a beber água



Foto nº 6 > Guiné > Região do Cacheu > Ingoré > Pel Caça Nat 60 (1968/70) > O 1º cabo Manuel Seleiro na tabanca (... provavelmente à procura de um leitãozinho).

Fotos (e legendas): © Manuel Seleiro (2009). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].


1. Seleção de fotos do álbum do Manuel Seleiro, membro da Tabanca Grande nº 870 (*). Amostra de fotos tiradas em Ingoré, editadas pelo nosso blogue, com a devida vénia e a autorização do autor.

Tirou um curso de minas e armadilhas, de 10 dias, em Bissau. Quando lhe faltavam dois meses para terminar a comissão, foi vítima da explosão de uma mina A/P. Mesmo totalmente cego, e apenas com dois dedos na mão esquerda, o nosso camarada edita dois blogues (Pel Caç Nat 60 e Luar da Meia Noite). Só reconhece as suas fotos pelas legendas (que procuramos manter). Segue (e comenta) o nosso blogue há muito. O seu exemplo de tenacidade, resistência, camaradagem, e amor à vida  e à sua natal,  Serpa, é digno do nosso maior apreço.
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Nota do editor:

terça-feira, 26 de abril de 2022

Guiné 61/74 - P23201: 18º aniversário do nosso blogue (6): O enviado especial do "Diário de Lisboa", Avelino Rodrigues, em julho de 1972, no CTIG: uma "crónica imperfeita" em quatro artigos - Parte II: 29 de agosto de 1972: no mato com Spínola, "a simpatia como arma de guerra"




Citação: (1972), "Diário de Lisboa", nº 17847, Ano 52, Terça, 29 de Agosto de 1972, Fundação Mário Soares / DRR - Documentos Ruella Ramos, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_5495 (2022-4-25)

Cortesia de Casa Comum | Fundação Mário Soares | Pasta: 06815.165.26101 | Título: Diário de Lisboa | Número: 17847 | Ano: 52 | Data: Terça, 29 de Agosto de 1972 | Directores: Director: António Ruella Ramos | Observações: Inclui supl. "DL Economia" |b Fundo: DRR - Documentos Ruella Ramos.


DL / REPORTAGEM, pp. 12/13

2. GUINÉ: CRÓNICA IMPERFEITA

A SIMPATIA COMO ARMA DE GUERRA


















(Com a devida vénia ao autor, Avelino Rodrigues,
aos herdeirtos do António Ruella Ramos, e à Fundação Mário Soares)

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Nota do editor:

Último poste da série > 25 de abril de  2022 > Guiné 61/74 - P23200: 18º aniversário do nosso blogue (5): Roteiro da nossa saudosa Bolama (Antonio Júlio Emerenciano Estácio, luso-guineense, nascido em 1947, e escritor)

quinta-feira, 24 de setembro de 2020

Guiné 61/74 - P21387: Tabanca Grande (503): António Baltazar Valente Ramos Dias, ex-Alf Mil Art MA da CART 1745 (Ingoré e Bigene, 1967/69): senta-se no lugar n.º 819 do nosso poilão

1. Mensagem do nosso camarada e novo tertuliano António Baltazar Valente Ramos Dias, ex-Alf Mil Art MA da CART 1745 (Ingoré e Bigene, 1967/69), com data de 22 de Setembro de 2020:

Boa noite,

Desejando acolher-me à sombra do poilão que alberga muitos dos meus camaradas de armas que, tal como eu, sofreram as agruras da guerra da Guiné, segue o meu pedido para que me recebam na vossa companhia.

Segue em anexo uma breve resenha da minha breve (???) passagem pelo GEP (Glorioso Exército Português).

Oportunamente enviarei um relato com a minha versão sobre uma operação realizada no norte da Guiné em Janeiro de 1969.

Abraços
A. Dias


********************


Nome: António Baltazar Valente Ramos Dias
Nascido em 21 de Abril de 1945 em Montijo – Distrito de Setúbal
Ex-Alferes Miliciano de Artilharia
Fazendo parte da CART 1745, embarcou para a Guiné em 13 de Julho de 1967 e regressou a Lisboa em 13 de Junho de 1969.


Ganturé - António Baltazar Dias, então com 22 anos


Breve resenha:

Iniciei a minha vida militar em maio de 1966, tendo sido incorporado no COM em Mafra.
Após o 1.º ciclo de recruta fui destacado para Vendas Novas onde cumpri um 2.º ciclo na especialidade de atirador de artilharia.

Com a minha promoção a Aspirante fui colocado no RAL 1 (muito depois RALIS e hoje, tanto quanto sei, unidade relacionada com transportes).

Seguiu-se Tancos (“pós-graduação” em Minas e Armadilhas), GACA 2 (Torres Novas - hoje Escola Prática de Polícia), Santa Margarida (Treino Operacional), de novo GACA 2 para formar companhia e, posteriormente, Guiné, na CART 1745.

No CTIG estive na fronteira Norte, em Ingoré e Bigene entre julho de 1967 e junho de 1969.




Posição relativa de Bigene e Ingoré - Estrada Bigene Sedengal. © Infografia Luís Graça & Camaradas da Guiné - Carta da Província da Guiné - 1:500.000


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2. Comentário do editor

Caro António Baltazar Dias - vai ser este o teu "nome de guerra" porque já cá temos o António Dias, ex-Alf Mil da CCAÇ 2406 - sê bem-vindo à nossa Tabanca Grande.

Escusado será dizer que podes escolher o melhor lugar à sombra deste nosso poilão sagrado, uma tertúlia onde se juntam os antigos combatentes da Guiné (e não só) para de certo modo fazerem a sua catarse, ao escreverem as suas memórias e enviando as suas fotos. 

Simultaneamente contribuímos com as nossas vivências para memória futura, quiçá uma fonte de conhecimento para os futuros historiadores e estudiosos da Guerra de África de 1961-1974.

Consultando o Blogue, apenas encontramos uma referência à CART 1745, pelo que te cabe a responsabilidade de dar a conhecer aos nossos leitores a actividade da tua Unidade, assim como possíveis "roncos", ou circunstâncias menos boas.

Eu tive um percurso idêntico ao teu, tirei a Especialidade de Atirador de Artilharia do CSM no 3.º turno de 1969 na EPA de Vendas Novas. Findo o curso, já com a alta patente de Cabo Miliciano, fui colocado no GACA 2 de Torres Novas, onde estive apenas uma semana antes de ingressar na EPE de Tancos - filial do Casal do Pote - para frequentar o XXX III Curso de Minas e Armadilhas. A Guiné esperava-me, não sem antes passar pelo BAG 2/GAG 2 do Funchal, onde formámos a primeira Unidade ali mobilizada e embarcada para o Ultramar.

Vou terminar, não sem antes te deixar um fraterno abraço em nome da tertúlia e dos editores em particular, que por aqui ficam ao teu dispor. Não esqueças que as fotos devem vir acompanhadas de legendas que nos indiquem pelo menos, a data, local e o nome dos retratados.

Carlos Vinhal
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Nota do editor

Último poste da série de 12 de setembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21351: Tabanca Grande (502): Carlos Arnaut, ex-alf mil art, 16º Pel Art (Binar, Cabuca, Dara, 1970/72): senta-se, no lugar nº 817, à sombra do nosso poilão

domingo, 17 de novembro de 2019

Guiné 61/74 - P20359: Tabanca Grande (487): Leonel Teixeira, natural da Madeira, luso-americano, Vice-Cônsul, Vice-Consulado de Portugal em Providence, Conselheiro da Diáspora Madeirense para os EUA, ex-alf mil, CCAV 3364 (Ingoré e Cumeré, 1971/73)... Senta-se à sombra do nosso poilão, no lugar nº 799.




Guiné > Região de Cacheu > Sedengal > CCAV 3364 > Na foto, a partir da esquerda: capitão Saraiva, comandante da CCAV 3364 (, a companhia do Carlos Nóvoa) e presente no almoço [1]; major Sampaio, oficial de operações [2] ; major (tenente-coronel?) Mateus [3]; com barba, alf il Ribeiro,  da CCAV 3364 [4]; de frente, alf mil trms  Almeida 5]; com o copo na mão, alf mil Agostinho Miranda [6]; o oficial de óculos não foi identificado [entre o 6 e o 7];  alf mil art Vasco Pires [7]; o último à direita é o tenente Nobre da CCS [8]; de costas, alf mil Teixeira (?),  da CCAV 3364 [9].


1. Mensagem do João Crisóstomo, ex-alf mil, CCAÇ 1439 (Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67), nosso camarada da diáspora, a viver desde 1975 em Nova Iorque, conhecido ativista social (de causas como as Gravuras de Foz Coa, Timor Leste ou Aristides Sousa Mendes), recentemente promovido a régulo da Tabanca da Diáspora Lusófona (que é tão grande como o mundo):

Data - domingo, 10/11, 10:28

Assunto -  Camarada Leonel Teixeira



Caro Luis Graça, e demais camaradas, 

É com muito orgulho que vos apresento um novo camarada, Leonel Teixeira, um amigo que tenho o privilégio de conhecer há muitos anos, mas que em algumas coisas apenas "vim a conhecer melhor” há dias, quando me disse ser madeirense e ter estado na Guiné. 

 Imediatamente o convidei para membro da nova "Tabanca da Diáspora Lusófona ”e da Tabanca Grande (, com o nº 799),  o que, para grande satisfação minha e de todos nós evidentemente, aceitou.
É uma grande honra para nós, ( entre outras coisa já foi agraciado com a Ordem do Infante D. Henrique!) como podem ver por algumas palavras de apresentação que recebi há momentos. (São agora 04.27 da manhã… e eu tenho a infeliz mania de dormir muito pouco.). Como faço frequentemente a primeira coisa que fiz foi consultar o computador para ver os emails. E deparei com uma mensagem do Leonel Teixeira que com a devida vénia copio:



José Leonel Rodrigues Teixeira,  conselheiro da Diáspora Madeirense para os EUA. Nomeado em 2016, conforme resolução, de 4 de agosto, do Governo Regional da Madeira.  


Caro João Crisostomo,

Já conhecia o blog em boa hora criado pelo Luís Graça. Duas surpresas que vieram logo que comecei a ler:


Na foto, a partir da esquerda: Capitão Saraiva, Comandante da CCAV 3364 (a Companhia do Carlos Nóvoa) e presente no almoço; Major Sampaio, Oficial de Operações; Major (Tenente-Coronel?) Mateus; com barba, Alf Mil Ribeiro da CCAV 3364; de frente, Alf Mil de Transmissões Almeida; com o copo na mão, Alf Mil Agostinho Miranda; o Oficial de óculos não foi identificado; Alf Mil Vasco Pires; o último à direita é o Tenente Nobre da CCS; de costas, Alf Mil Teixeira (?) da CCAV 3364.

É verdade, 
sou eu. Leonel Teixeira,  que estou de costas. Era no aquartelamento do Sedengal onde a CCAV 3364 tinha 2 pelotões e os outros dois estavam na sede em Ingoré. O Capitão Saraiva foi o segundo comandante da companhia,  depois do primeiro (esqueço o nome) ter sido punido e foi transferido para algures na Guiné. 

O Capitão Saraiva depois de alguns meses, creio que foram 6, foi também transferido e fiquei o resto da comissão, cerca de 7 meses, a comandar a companhia em Ingoré. 

Antes de vir para os EUA, em 1980, participei em 3 jantares do Batalhão que eram organizados pelo capelão. Uma vez nos EUA,  nunca tive oportunidade de conviver com os camaradas,  acrescido que de Lisboa seguia quase de imediato para a Madeira donde sou natural e tenho família. 

Na semana passada estive em Lisboa alguns dias,  participando num convívio com os meus colegas do 7º ano (o ano passado celebramos os 50 anos) e consegui, graças a camaradas que vivem em Lisboa, reunir num almoço. Foram 11 e quem organizou foi o Carlos Nóvoa (Xina). A minha mulher também esteve presente. No final, de um longo e saudável almoço, concordamos que possivelmente já nos havíamos cruzado mas nem eu nem eles nos reconheciamo-nos.

Desde 1980 que exerço funções no Consulado de Portugal em Providence e, quando foi transformado em Vice-Consulado,  fui nomeado titular do Posto, em 2009, cargo que deixei quando decidi passar à aposentação em 2014. 

Ainda nesse ano, por ocasião do Dia de Portugal, no 10 de Junho de 2014, fui agraciado pelo Sr. Presidente da República com o grau Oficial da Ordem do Infante D. Henrique.  Em jeito de brincadeira entre amigos, costumo dizer que jogo na mesma equipa do meu conterrâneo Cristiano Ronaldo, porquanto ele foi também agraciado com a Ordem do Infante, gau Grande Oficial. Presentemente, e já há alguns anos, sou o Conselheiro da Diáspora Madeirense para os EUA

Um muito obrigado e um grande abraço desde o mais pequeno Estado dos EUA.

Leonel Teixeira


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Não preciso de dizer mais. Peço-vos o favor do "trabalho da papelada”, que sei vai ser um prazer para vocês.
Como ele me mencionou já ter conhecimento do nosso blogue,  fui logo procurar essa foto e a mencionada info que encontrei num post de 23 de Março de 2013, ( que junto a seguir só para vos poupar tempo, aliás seria mesmo "estar ensinar o padre nosso ao vigário”) (*)

Agradeço me incluam em cc , está bem?

João Crisóstomo

2. Comentário do editor LG:

Meu caro João: mais uma vez podemos repetir o aforismo: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande!"... Em boa hora, trouxeste.nos o Leonel Teixeira, que se reconheceu numa foto, tirada m Ingoré ou Sedengal... Enfim, estás a fazer o teu trabalho como régulo da Tabanca da Diáspora Lusófona (e não apenas lusitana, já que temos camaradas, que estiveram connosco no TO da Guiné, e que têm hoje outras nacionalidades: guineenses, cabo-verdianos, angolanos, moçambicanos, são tomenses, timorenses, chineses de Macau, luso-americanos, etc.). 

Meu caro Leonel Teixeira: tratamo-nos por tu, sem cerimónias, independentemente dos antigos e atuais títulos... A Guiné é  nosso traço de união. E este blogue foi criado, em 2004, justamente para a gente se ir reunindo debaixo de um simbólico poilão de uma Tabanca Grande virtual onde todos cabemos com tudo o que nos une e até com aquilo que nos pode separar... As nossas regras de convívio são simples e estão aqui disponiveis "on line".

Passas a sentar-te no lugar nº 799. à sombra do nosso poilão. Há mais de um mês que não entrava "sangue novo" (**)... Bem hajas!... E ficas desde já convidado para para nos mandares, por email, para efeitos de publicação (, tarefa que cabe aos editores,) memórias, histórias e fotos da tua comissão de serviço na Guiné.

Infelizmente temos poucos representantes do teu batalhão. E da tua companhia, és o primeiro a dar a cara... Vejo que conheceste o Vasco Pires, infelizmente já falecido no Brasil, em 2016.... Da tua companhia, só temos até agora 4 referências no nosso blogue... Do batalhão temos mais, cercade 3 dezenas.

Para tua / nossa informação, o BCAV 3846,  além da  CCAV 3364 (Ingoré, Cumeré), era composto pela CCAV 3365 (S. Domingos, Cumeré) e CCAC 3366 (Susana, Cumeré). A unidade mobilizadora foi o RC 3. O Comando e a CCS ficaram em Ingoré, o cmdt do batalhão era o ten cor cav António Lobato de Oliveira Guimarães. O pessoal do teu batalhão partiu para o TO da Guiné em 8/4/1971, no T/T Angra do Heroísmo, regressou a casa em 8/3/1973, exceto o da CCAV 3365 que embarcou mais tarde (17/3/1973). Tens aqui fotos dessa viagem para o CTIG.

CCAV 3364 teve, de facto,  3 comandantes, como tu dizes: (i) cap mil cav Rodrigo José Afreixo Ferreira; (ii) cap  cav José Rafael Lopes Saraiva; e (iii) tu próprio, alf mil inf José Leonel Rodrigues Teixeira, novo membro,  nº 799, da Tabanca Grande.

Fico duplamente feliz por já conheceres o nosso blogue e agora poderes passar a partilhar também, através dele, as tuas memórias, e, por outro lado,  por seres um madeirense e um português do mundo, com um bela força de serviços prestados à Pátria... Deixa-me dizer-te que tenho lá, na região autónoma da Madeira, alguns bons amigos (e também alguns camaradas), e acabo de ter uma neta, de mãe madeirense...

Quando puderes, arranjas-nos uma foto do teu tempo da Guiné, de preferência tipo passe. A foto atual que publico acima, fui pedi-la emprestada ao sítio do Centro das Comunidades Madeirenses e Migrações. Não hesites em escrever-nos e em "recrutar" para a Tabanca Grande mais camaradas da diáspora lusófona, a viver nos EUA, em particular madeirenses e açorianos, que estão aqui subrerrepresentados.

 Boa sorte para as tuas novas funções como conselheiro da Diáspora Madeirense nos EUA.
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Notas do editor:
(...) Em mensagem do dia 20 de Março de 2013, o nosso camarada Vasco Pires (ex-Alf Mil Art, CMDT do 23.º Pel Art, Gadamael, 1970/72), dá-nos conta dos resultados da investigação que lhe deu a certeza de não ter passado os seus últimos tempo de comissão em S. Domingos, como pensava, mas em Ingoré.

Colaboraram nesta pesquisa os camaradas Delfim Rodrigues e Carlos Nóvoa.

Caro Carlos,


Encerrando o assunto "São Domingos ?"... Em primeiro lugar quero agradecer a tua ajuda nesta busca, para encontrar o local dos últimos meses da minha comissão.

No P10525, fiz um resumo desses três meses, e sempre que via as os fotos desse tempo, o nome que vinha à minha memória era São Domingos, contudo, li mais tarde neste blogue, que São Dominngos não era sede de Batalhão.

No P11262 coloquei a dúvida, apesar de ser São Domingos o nome que assomava à minha memória. No dia em que publicaste a minha dúvida, coincidentemente, foi publicado o Convívio do BCAV 3846; o camarada Delfim Rodrigues, organizador do Convívio a quem recorreste, não pôde ajudar na confirmação de que os oficiais da foto eram desse BCAV, pois a sua CCAV esteve estacionada em Suzana e Varela. Forneceu o e-mail do Carlos Nóvoa, que tinha servido na sede do BCAV, e que levou a foto para o almoço em Estremoz.

E realmente o Mundo é Pequeno ...e a nossa Tabanca é Grande. O Major Sampaio, presente no almoço, se identificou e a quase todos os Oficiais da foto [, vd. foto acima, e respetiva legenda].
(...) Sim, os últimos meses da minha comissão foram em Ingoré, todavia, essa palavra continua "adormecida' no meu inconsciente... Vai saber...!!! (...)

(**) Último poste da serie > 8 de outubro de 2019 > Guiné 61/74 - P20216: Tabanca Grande (486): Manuel Viegas, algarvio de Faro, ex-fur mil, CCAÇ 1587 (Cachil, Empada, Bolama e Bissau, 1966/68)... Senta-se à sombra do nosso poilão, sob o nº 798. Padrinho: José António Viegas, régulo da Tabanca do Algarve.

terça-feira, 6 de agosto de 2019

Guiné 61/74 - P20038: Escritos do António Lúcio Vieira (2): De novo o tempo se quedou... (Excerto do livro "O Mouro da Praia da Foz")


Guiné > Região do Cachei > Rio Cacheu > c. 1966/1967 > Destacamento de São Vicente, ligando Bula a Ingoré.  Uma LDM [, a 308,] da Marinha fazia a cambança do rio Cacheu. Na foto, o Lúcio, à direita, com o Miranda e outro militar.

(...) Estive seis meses de intervenção em Bula e 17 meses em Ingoré, na fronteira norte com o Senegal. Daí conhecer muito bem as passagens em João Landim e S. Vicente- (...) O Machado era um dos vários exemplares da Companhia [, a CCAV 788 / BCAV 790, Bula e Ingoré, 1965/67], com aptidões variadas. Uma delas era exactamente a apetência para dar nas vistas. Representava, como poucos, as cenas mais desconcertantes que possas imaginar. As vítimas, muitas vezes, eram os "maçaricos" das Companhias que "estagiavam" connosco, tanto em Bula, como depois em Ingoré.

[...) Trata-se de uma barraca do pequeno destacamento da Marinha que ali assegurava a manutenção da LDM que fazia a travessia do rio. Vejam-se mensagens e os "autógrafos" que a rapaziada lá ia deixando, "grafiatadas" nas paredes"! (...): "Visite o hotel Bandalho",  "LDM 308 C/M Rego", "Coruche, 31-1-66", Parque de Nudismo"...

Foto (e legenda): ©Lúcio Vieira (2019). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Guiné > Carta da Província (1961) > Escala: 1/500 mil > Posição relativa de São Vicente, no rio Cacheu entre Bula e Ingoré. Hoje há uma moderna ponte, de tecnologia e construção portuguesas, em São Vicente, no Rio Cacheu, É a chamada "euroafricana" (*)

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2019)



Guiné-Bissau > Região do  Cacheu > Rio Cacheu > Ponte de São Vicente (ou ponte Euro-Africana). Início da construção construção em 2007.


Guiné-Bissau > Região do  Cacheu > Rio Cacheu > Ponte de São Vicente (ou ponte Euro-Africana), em betão armado, com 670 metros de comprimento, inaugurada em 2009. A construção esteve a cargo da portuguesa Soares da Costa.

Fotos do geólogo e fotógrafo Pedro Moço, autor do blogue "Construção da Ponte de S. Vicente - Guiné.Bissau" (com a devida vénia).


António Lúcio Vieira, ex-fur mil,
CCAV 788 / BCAV 790 (Bula e Ingoré, 1965/67)
DE NOVO O TEMPO SE QUEDOU - Nenhum acto é mais irracional que a morte de um ser humano às mãos de outro (**)

por António Lúcio Vieira (***)

Os contornos alaranjados, de um sol que prometia calcinar, surgiram por entre as copas do mangal. A um sinal do guia, a coluna parou. Embora soprasse uma brisa fresca, naqueles derradeiros dias da época das chuvas, quando as temperaturas se tornam impiedosas, os corpos transpiravam abundantemente, como resultado da longa  caminhada nocturna, de muitas horas. Por isso parámos.

Daí a pouco – diziam-nos a experiência e os sentidos – as aves acordariam com o som infernal das rajadas e rebentamentos e nenhum homem podia estar fisicamente cansado, quando entrasse no mortífero jogo. olhámos uns para os outros, em busca de reacções, mas os rostos denotavam a mesma frieza e impassibilidade de tantas outras ocasiões anteriores.

Estávamos, “apenas”, mergulhados em mais uma operação de assalto a um reduto inimigo, desta feita na região de Zinguichor, na linha de fronteira com o Senegal. Só isso. E isso era o que de mais vulgar nos podia acontecer, naqueles estranhos dias, no mato húmido e ardiloso da Guiné. Havia já tanto tempo que vestíamos a pele de guerrilheiros experimentados, que as recordações dos dias banais quase se haviam desvanecido. Porquê preocuparmo-nos agora com um acontecimento, tão aparentemente banal, como pode ser um desafio à morte?

A guerrilha transformara-se, com a rotina permitida pelo tempo, num indelével estigma da nossa existência: um poderoso e inebriante elixir, que nos provocava os sentidos, com desusado vício, e uma quase constante sensação de embriaguez. Tratava-se, afinal, de mais um banal desafio às nossas capacidades e nenhum de nós sabia porquê, nem de que modo, se recusam assim os levianos desafios de vida e morte. A voz do capitão soou no AVF, num aviso sussurrado e lacónico: “Entrámos na zona do objectivo. Máximo silêncio, progressão fantasma”.

Lentamente, com mil cautelas, de olhos e sentidos despertos, recomeçámos a caminhada, agora medindo os passos e as sombras, já de armas em riste e prontas a  iniciar acção de fogo. À frente a atrás da coluna, sentiam--se os olhares de muitas dezenas de homens perscrutando a barreira verde-densa, que ornava as margens da picada, sinuosa e atapetada de ramos e folhas secas. Da progressão de mais de centena e meia de militares, apenas pairava no ar um breve quebrar abafado, provocado pelas folhas secas esmagadas pelas botas de lona.

O pesado silêncio que se abatera sobre a mata – dizia-nos o saber adquirido – não augurava nada de bom. Cherno, o experimentado guia fula, sábio na leitura de pistas e sinais, agitava-se, inquieto e olhava-nos, a espaços, com uma estranha expressão que nunca antes lhe vira. Um pouco adiante, ao dobrar um pequeno renque de cajueiros, a testa da coluna entrou em zona menos arborizada, pejada de mato rasteiro e bordejada por um pequeno mangal. Bruscamente, uma estreita barreira de capim anunciava o fim da savana. À nossa frente, em semicírculo, perfilava-se de novo a mata densa, de árvores enormes, de musculados troncos. Entre a parede de capim e a fronteira da mata, abria-se uma extensa clareira, demasiado extensa e aberta, como as suspeitas e o temor que nos assaltaram.

Quando as primeiras rajadas de pistola-metralhadora acordaram o silêncio, lançadas raso ao solo por duas sentinelas entrincheiradas em abrigos individuais, os homens da  frente, na testa da coluna, atingiam a orla da mata. Era uma ratoeira. Apercebemo-nos da situação no primeiro instante, quando o fogo inimigo começou a esventrar o solo à  nossa volta, abrindo, com incessantes rajadas, caprichosos sulcos mortíferos, como bichas-de-rabear, que nos zurziam aos ouvidos, se infiltravam enfileiradas no chão, quais formações de formigas e nos contornavam os corpos deitados, como se batucassem uma ritual dança de morte.

A mata à nossa frente abria-se em apertado circulo e o inimigo acoitava-se aí, em todo o redor da “ferradura”, a coberto dos trocos espessos e, lá no cimo, dissimulado na ramagem frondosa das imponentes árvores centenárias. No meio, desprotegidos na calva clareira que a mata envolvia, estávamos nós. Expostos e vulneráveis.

O matraquear medonho das armas esboçava uma visão de apocalipse, abalando-nos o âmago e acordando-nos de novo para a eminência do perigo que, em tantas ocasiões semelhantes, de imediato nos tornava animais acossados. E era desse medo, estranhamente inconsciente, porém controlado, que germinava um quase sobre-humano, levianamente inevitável e incorrigível, desprezo pelo silvar das balas, com que, persistente e com demasiada eficácia, tentavam silenciar-nos.

Era imperiosa uma leitura serena da situação e uma tomada urgente de decisões, antes que os morteiros 82, dos artilheiros do PAIGC, corrigissem o ângulo e a Companhia de Infantaria, recém-desembarcada em Bissau – que nos reforçava a retaguarda, naquele que foi o seu baptismo de fogo – se visse envolvida pelos experimentados guerrilheiros guineenses.

O capitão mandou assim avançar o grupo de assalto “Os Dragões”, para envolvimento pela direita, enquanto me ordenava que deslocasse, pelo flanco esquerdo da ferradura, os homens dos “Craques”, numa tentativa de espartilhar os elementos mais avançados do inimigo.

À minha frente, o Jaime, um dos mais hábeis artilheiros do meu grupo, praguejava com a Dreyse, que se encravara, enquanto, muito perto da minha posição e à ilharga dos homens sob o meu comando, o recém-transferido Furriel Miranda, surpreendentemente calmo, acendia um cigarro e percorria com o olhar as copas das árvores, em busca de alvos. Impressionava a frieza e domínio daquele moço cabo-verdiano, serenamente sorridente e despreocupado.

Do interior da mata, ceifando capim e descarnando arbustos, soavam novas rajadas, por entre as quais se distinguia, com enervante nitidez, o cantar irritante de duas metralhadoras ligeiras, estrategicamente instaladas nos flancos da mata. A escassos metros dos homens do meu grupo, o “Aranha”, artilheiro-mor dos “Dragões”, procurava raivosamente silenciar uma delas, à morteirada – com o morteiro 60 abraçado junto ao sovaco, em posição de tiro tenso – e com a destreza e o sangue frio que toda a Companhia lhe reconhecia.

Ao segundo disparo, a metralhadora suspendeu o matraquear e, como que obedecendo a um sinal, todas as armas, de ambos os lados do campo, se calaram. Um manto impressionante de silêncio desceu na mata e envolveu tudo e todos. Olhei em redor os homens do meu grupo, em busca de feridos. Ilesos, dispersos pelo chão, acoitando-se à protecção de troncos caídos, ou nos pouco numerosos morros de baga-baga – altas formações de rijo barro, construídas pelas vorazes colónias de formiga salalé – rompiam com o olhar a densidade da mata, tentando adivinhar as sombras e os segredos, que se aprestavam para um confronto que, do outro lado do bosque, se suspeitava persistente e se tornaria, se necessário, desprendida e pacientemente longo.

Sentia-se, em muitos daqueles jovens militares, uma inabalável decisão, uma quase  teimosa valentia, denunciadas pela estranha tranquilidade nos rostos e nos gestos. Homens, tão arreigadamente decididos, quase sempre aldeões, tão cedo e tão abruptamente arrancados ao conforto materno, viam-se movidos, quantas vezes sem sequer entenderem princípios e razão, para as malhas de obstinados interesses, tão distantes e desligados dos sonhos de futuro, com que, no dia-a-dia, alimentavam a pacatez da arrastada existência, que ao povo humilde coubera em sorte.

Quase sempre, também, sem um gesto de revolta, sem uma palavra de raiva, sem um arredar da barricada, sem comida e sem água, tanta vez, sem uma lágrima de desespero. Sem pernas, sem braços, quantos deles; sem futuro nem esperança: outros ainda sem vida.

Alguns metros atrás, no flanco direito da orla da mata, o furriel enfermeiro, irrequieto madeirense, gracejava, enquanto acudia ao braço do Cabo “Mané”, riscado por uma bala, felizmente sem sorte. Mesmo ali, enquanto dispersas salvas de rajada, mantinham vigilantes as forças em confronto, o funchalense Ilídio – meu particular companheiro de ócios e perigos – mantinha o apurado e incorrigível sentido de humor, que o distinguia no conjunto da Companhia, enquanto se entregava à nobre tarefa de sarar os corpos dos homens no terreno.

Escolhi esse momento para me levantar e correr para um abrigo melhor, que vislumbrara pouco antes, formado por um tronco caído, junto a um trilho, trinta metros  adiante. Mal me havia erguido do chão quando, de uma árvore próxima, saiu uma curta rajada e depois outra mais longa. A primeira cravou-se no extremo do tronco onde antes me abrigava: a segunda, alguns metros adiante, levantou um sopro de poalha acastanhada, quando se cravou num morro de salalé, onde um dos homens do meu grupo pouco antes se havia recolhido.

Corri a trintena de metros, em busca de melhor local para me acoitar, enquanto disparava pequenas rajadas para as copas de duas das árvores, de onde me visavam. Mas os meus disparos já não se ouviam, confundidos na macabra sinfonia do estouro das muitas armas dos rapazes da frente. Recomposto, o “Mané” aprontara já o morteiro 60 quase na vertical, soltando-lhe, logo depois, uma granada. Segundos volvidos, o projéctil mergulhava na copa do bissilão, fazendo saltar ramos e folhas, pedaços de tronco, carne humana e metal.

Depois, o silêncio abateu-se de novo. Pelo ANGRC9 a troante voz de tenor do capitão perguntava se os T6 estavam demorados. Respondeu-lhe o comandante da pequena esquadrilha, avisando da chegada do apoio aéreo ao objectivo em cerca de três minutos. E pedia coordenadas para o lançamento das bombas. No alto, sobrevoando  a zona, a bordo da pequena Dornier, o comandante de batalhão informava: “Abutres na zona”. O Poiares afastou, por momentos, o ouvido do AVF, olhou-me e gritou: “Estão a chegar os aviões. Ouvi agora no rádio”.

Não tardou o som tonificante dos motores dos dois T6 da Força Aérea. Localizado o alvo, picavam, em sucessivas passagens sobre o denso bosque, com manobras de voo rasante, libertando das asas cargas mortíferas, que afundavam crateras e mutilavam árvores e homens, enquanto as armas ligeiras, dos efectivos do PAICG, disparavam descoordenadamente sobre eles, tentando abatê-los. Tudo em redor pareceu eclodir, num apocalíptico derrocar da própria natureza e das vidas que ali se acoitavam.

Respirámos fundo, por escassos momentos. Aliviados de munições, os Harvard T6 rumaram à base em Bissalanca, deixando no seu rasto, para além de sementes da morte, um estranho e cavado silêncio. Pelo rádio chegou o aviso de que as munições  dos “Dragões”, que ocupavam a frente da flecha, ameaçavam esgotar-se. A uma ordem do capitão, o meu grupo e o do Furriel Miranda avançaram. Possuíamos um resto de munições e era-nos ordenado que reforçássemos a vanguarda, na zona mais próxima da primeira linha da guerrilha africana, dissimulada na mata. Cerca de trinta homens apenas, naquela ponta da flecha e uma, preocupantemente reduzida, reserva de munições. Ninguém, no seio dos dois pequenos grupos de assalto, queria pensar no que aconteceria quando, balas e granadas, do nosso escasso grupo de homens, se acabassem.

Éramos, nas circunstâncias, a derradeira esperança de romper a passagem e fazer recuar a força sitiante, após horas de confronto, sem avanços, nem vislumbre de saída daquela armadilha em que, mesmo após a eternidade de uma já longa experiência de guerrilha, havíamos ingenuamente caído.

Algures, já em “chão francês” – como ainda, muitos anos após a independência, era apelidado o território senegalês – na orla da densa floresta, por entre pragas e gritos, sentíamos a movimentação dos homens acoitados na mata, deslocando apressadamente para a retaguarda, nos subterrâneos da base de Zinguichor, situada a escassas dezenas de metros, os mortos e os feridos, que a acção conjunta das forças no terreno e os aviões bombardeiros haviam causado.

Era aí, na referenciada base, agora estrategicamente instalada centenas de metros para o interior, em recém-construído conjunto de instalações e estreitos corredores, dissimulados no subsolo, onde não faltava um improvisado hospital de campanha, que se havia apontado o objectivo da missão. E era a segunda vez que as nossas forças demandavam o local, meses antes arrasado, aquando de uma primeira incursão à estratégica base inimiga.

Algures, alguém pedia desesperadamente um helicóptero, para evacuação de feridos. Na “DO” de comando, que sobrevoava a zona, estava-se por certo a pedir à torre de controlo de Bissau o apoio aéreo, porque, durante breves minutos, nenhum som se ouvia no auscultador do meu rádio. Quando o silêncio pouco depois foi quebrado, a voz serena do comandante Calado restabelecia o contacto, informando que o heli se dirigia a norte, rumo ao objectivo, na zona de fronteira onde nos encontrávamos.

Logo depois vi o Morais, em terreno aberto, deitado sobre um ensanguentado braço esquerdo, que a outra mão amparava. Quando ao longe se destacou a silhueta do helicóptero, chamei o cabo enfermeiro, indiquei-lhe a posição do ferido e ordenei aos homens que avançassem para a língua de bolanha à nossa esquerda, onde se montaria a segurança para a aterragem. Era um local ornado de palmeiras esguias e de frondosa ramagem, alto capim e arbustos flexíveis, que dificilmente se deixam quebrar. Não era a posição ideal para o pouso, mas a urgência da evacuação de, pelo  menos um dos feridos e a proximidade das forças adversárias, não permitiam escolha melhor e mais segura.

Metros atrás, no interior da “ferradura” da clareira, dispersas pelo chão, o grosso das nossas forças vigiava. Estava-se, claramente, numa fase de mútuo estudo de estratégia, durante a qual apenas pequenas rajadas, ou tiros isolados, quebravam o silêncio e mantinham atentos os atiradores de ambos os lados. O mato estendia-se a todo o espaço que a vista abrangia, da orla do pântano à densa floresta ao longe, que uma névoa difusa só agora, várias horas após a nossa chegada, aparentava dissipar-se. Aproximávamo-nos de meio do dia e o chão queimava. Reflexos castanho-avermelhados rodopiavam ao sol, espelhavam nos caules de capim e nas águas lodosas do braço pantanoso da bolanha.

Quando o heli, numa súbita elipse, se aproximou do solo, o vento levantado pelas pás do hélice envolveu-nos numa onda de frescura. Do interior do aparelho saíram o mecânico e uma, estranhamente calma, enfermeira paraquedista. Escassos minutos após o pouso, enquanto da mata os homens do PAIGC metralhavam a zona onde nos encontrávamos, numa tentativa de abatê-lo, o aparelho elevou-se no ar, num quase acrobático salto, brusco e veloz, levando a bordo um primeiro grupo de feridos. Antes, porém, deixara-nos o mais desejado dos presentes: garrafões de fresca água e cunhetes de munições de G3, de Dreyse, de morteiro e bazooka.

Decorreu uma silenciosa eternidade. As munições recém-chegadas distribuíam-se pelos homens, em breves lances de corrida, quase sempre acompanhados por curtas  rajadas de cobertura. Entretanto, quase sem nos apercebermos, o Alouette III regressava, terminando a evacuação dos feridos. Concluída a missão de segurança, atravessámos, em sentido inverso, a estreita língua de pântano, agora sob uma mais cerrada barreira de fogo da guerrilha. As granadas de morteiro caíam à frente e atrás de nós, erguendo cogumelos de lodo e água pestilenta e poupando, milagrosamente, o punhado de homens, que me seguiam de volta à zona da clareira que nos fora destinada.

A bolanha ali era pouco profunda, porém o facto de estarmos enterrados nela até quase aos joelhos e com as botas encalhadas no fundo lodoso e movediço, criava-nos  uma incómoda sensação de aprisionamento. De pé, quase sem capacidade de movimentos e à mercê das balas que, do interior da mata encetavam nova flagelação, tentávamos desesperadamente encetar uma resposta. “Tá um gajo de camisa verde naquela árvore, meu furriel!”- gritava o China, enquanto disparava na direcção do atirador furtivo, que se dissimulara com a ramagem, na forca formada pelo tronco. Na frente, bem no interior da ferradura, já se respondia de novo às armas do PAIGC, que pouco depois voltaram ao silêncio.

Era, porém, um silêncio pesado e angustiante, que nem as aves ousavam quebrar. um silêncio que se elevava no espaço, que parecia subir velozmente rumo ao céu, como se fosse uma maldição, ou uma prece. Mas foi efémero. Daí a pouco, por entre gritos e pragas, as forças inimigas voltaram a disparar.

Abateu-se o céu naquela antecâmara do inferno, dividida pelo espaço aberto da clareira e a fiada de árvores que escondiam a floresta. o estrondo enorme de todas as nossa armas e a consciência de que não estávamos dispostos a ceder, deve ter abalado a moral dos homens na mata porque, pouco depois, os sentimos recuar. Sabíamo-lo porque os tiros nos chegavam agora mais dispersos e distantes.

Entretanto, reabastecidos, os aviões voltaram a rasar o terreno, lançando, uma e outra vez, pesados projecteis, que abalavam a mata até às vísceras. Era uma estranha e assustadora melopeia, que se esbatia, lá longe, em ondas sucessivas. o Micas olhava os enormes pássaros de fogo, com uma expressão quase patética, enquanto gritava, eufórico, naquele seu jeito de dizer as coisas que, mesmo ali, às portas do inferno, arrancava sorrisos aos companheiros.

Era o espectáculo da morte, no seu apogeu, traduzido em nós como algo de imponente e cruelmente tonificante. O nosso primeiro objectivo era a própria sobrevivência e os T6 estavam, decididamente, a contribuir profundamente para a conseguirmos. Era isso, afinal, a premissa de todas as guerras, dos grandes conflitos às curtas escaramuças; das legítimas, onde se defende o berço, o sangue e os haveres, às movidas por obscuros interesses de hegemonia e de conquista.

Enquanto os T6 cumpriam o ritual do extermínio, em bombardeamentos retaliatórios, sentado junto a um morro de baga-baga, um cigarro tremulando entre os dedos, todo esse incómodo desfiar de ideias me atormentava a mente e repercutia no cérebro, quase tanto como o estrondo das bombas lançadas pelos Harvard, a escassos cem metros do meu improvisado abrigo. Quando nos levantámos para o assalto, cumprindo a clássica acção de busca e recolha na mata, após o som dos aviões se ter perdido para os lados do Cacheu, o equipamento pesava-nos como chumbo. A lama e o lodo,  colados ao camuflado e ao corpo e a quase incapacidade de raciocínio, inspiravam-nos laivos de inquietante irracionalidade e desvario.

E isso notava-se bastante mais quando riscávamos os olhares uns pelos outros, sem nos atrevermos a fitar demoradamente os companheiros de missão, de infortúnio, porém de sobrevivência. Autómatos, como muitos de nós pareciam ter por condição, naqueles decisivos momentos da existência. Filhos retirados às mães, perdidos num turbilhão fervente de decisões e tratados e manobras, de uma política que nenhum aprendera a ler e da qual muito menos sabia os reais motivos.

Entrámos, cautelosos, afoitando a densidade da floresta. A frescura provocada pelas sombras da mata colidiu connosco, fazendo-nos sentir, por breves instantes, seres humanos. Mas foi curto o fragor da sensação. A visão apocalíptica dos corpos mutilados, ou totalmente desfeitos, por onde o sangue ainda abundantemente se derramava, regando a terra e ceifando o que de vida lhes restava, ribombou aos nossos olhos.

Ali nos confrontávamos com o cru dilema e nenhum de nós era capaz de discernir o que os nossos olhos viam: se peças de uma máquina desfeita pelo homem, se o próprio homem esmagado pela máquina. No fundo, para as estatísticas oficiais, tratava-se apenas de, fria e levianamente, inimigos abatidos, números para constar nos relatórios, com que os feitores da guerra – habitualmente alheios às dores e traumas dos conflitos – geriam a sorte dos que matam e dos que morrem.

Autómatos, como então pensei, sorriamos, incredulamente renascidos, esquecidos já de perigos e canseiras, mesmo na presença daquela tão cruel e irreparável visão da morte. No chão, cadáveres ou moribundos, deixados para trás, jaziam homens cujo crime se resumia à ignomínia de terem nascido na sua própria terra, a uma teimosa vontade de liberdade, de viverem e morrerem naquele chão que os parira e alimentava, livres de opressões e de destinos alheios.

A acção da guerrilha, sabíamo-lo pela propaganda do movimento, não visava o povo dominador e menos ainda o dominado, que aceitava o jugo, o alvo eram os teimosamente cegos e insensíveis poderes instalados em Lisboa, que rodeavam de grilhetas todos os pulsos e todos os destinos do povo. Pior; dos povos. Sofria-se, “do Minho a Timor”, um longo e desgastante cativeiro, disfarçado, além fronteiras, pelo folclore e pela psicossocial. “Não voltaremos a ser um campo de trabalhos forçados”,  ecoava nas palavras serenas, determinadas e contidas de Amílcar Cabral.

Açoitavam-nos a mente as avisadas palavras dos líderes da guerrilha. os panfletos de propaganda, recolhidos nas tabancas, ou de mistura com o espólio capturado em bases inimigas, açoitavam-nos os olhos e as palavras transmitidas via rádio, a partir de Conacri, invadiam-nos as horas de sono e latejavam-nos na mente, tanto quanto as granadas, que se abatiam sobre a débil moral dos homens, nos esventravam abrigos e casernas e nos minavam a resistência. Que luta aquela e o que fazia, naquela distante terra de outras gentes, a juventude de um país que apenas ambicionava viver solidária e, se possível, feliz. E em paz.

De casa, bem longe, chegavam aerogramas; palavras pungentes, escritas com tinta de lágrimas, linhas de trémula caligrafia, por entre as banais consultas sobre a saúde e o bem-estar, no habitual tropel de interrogações, se queria saber se “já cá vens passar o Natal?”.

Nos homens quase em fim de comissão, prenhes de incertezas, vazios de destino e de futuro; homens de brandos costumes, cansados de guerra e de medos e raivas, os silêncios, mais do que gritados nas entrelinhas das cartas, sentiam-se nos rostos e nos olhares vazios, nos desalentos, de quantos sabíamos não poder responder a muito do que, na longínqua e descuidada “Metrópole”, nos perguntavam os do nosso sangue e os do nosso afecto: os da nossa raça.

E era maior o sentimento de frustração quando, junto às perguntas para as quais, de todo, desconhecíamos resposta, se juntavam as respostas que a prudência aconselhava a evitar. Tal como o amor, imortalizado por Camões, também as palavras, escritas ou faladas, chegadas aos ouvidos atentos dos que, na sombra, “zelavam pela defesa do Estado”, mesmo ali na antecâmara da morte, eram algo que soava como um perigoso “fogo que ardia sem se ver”, uma geração inteira, o sangue novo, generoso e  fértil da juventude de um país, levado em porões de navio para terras que não sabia, sofria amordaçado a sina de ser povo e os caprichos de quantos, muito antes ainda de ter nascido, lhe traçaram o destino e lhe ameaçaram a existência e o futuro.

Pensava-se em tudo isso, numa amálgama confusa de sensações e sentimentos, de razões e motivos, que nenhum de nós, em verdade, conseguia conscientemente entender. Embarcaram os melhores filhos de uma nação em porões de barcos e eles foram. Decretaram-se neles ordens de matar ou, heroicamente morrer. E os filhos do povo, que já tanto sofria na carne a agrura de ser cativo na sua própria terra, partiram, tão espiritualmente vulneráveis, como galhardamente afoitos. Matando, muitos deles; morrendo, ingloriamente, outros tantos. Crianças, há tão pouco, tantos de nós por ali errantes, por entre os nevoeiros da vida, procurando nortes e caminhos, sem saber, quantas vezes, que passos encetar em busca de futuro e sorte.

Pensamentos que, tantos de nós, nos rincões da branda terra portuguesa, ou nos densos e ardilosos matos africanos, sentíamos ecoarem nas mentes, martelando com desusado estrondo as horas de vigília das longas noites de atalaia. ou furtando os pés aos segredos, em longas progressões nocturnas no terreno, semeado de mistério e incertezas. As nossas noites eram, havia muito, noites sem sono, noites sem estradas nem destinos. Sem luar, ou um farol: noites, sequer, sem certezas de haver amanhecer.

Naquele discreto espaço, anichado ao Golfo da Guiné, que a imprensa estrangeira tenebrosamente apelidava de “Vietname de África”, parcela de território pouco mais vasta do que a continental superfície alentejana – escassos 36 mil quilómetros quadrados de chão pantanoso, onde as febres mortais abundam; nesga de África espartilhada pelos limites do moderado Senegal e da hostil República da Guiné-Conacri – ali mesmo, perdido no abafado e castigador clima tropical, adiava-se o futuro de dois povos, distintos e distantes.

De um lado o sangue novo e válido de Portugal que, na mente e no corpo, sofria traumas, que as gerações seguintes não iriam poder sarar. Do outro lado do conflito, a juventude africana que, em recurso, de armas na mão, dizia ao secular colonizador que era tempo de assumir nas suas mãos os destinos do seu próprio povo e que apenas a ele cabia escrever o futuro da sua própria terra.

Já por todo o mundo civilizado as potências colonizadoras tinha escutado e entendido as legítimas aspirações do martirizado continente africano. Menos em Lisboa, onde repousava o autismo e a alma de todo um povo se vestia de luto, em cada barco que chegava, em cada medalha póstuma.

Vinha-nos à mente tudo isso enquanto, perscrutando a ardilosa floresta, invadimos a proibida barreira da fronteira senegalesa. Para além dela, em zona tabu, a base inimiga desalojava, apressadamente, para o interior, os mortos e feridos que, ao longo daquela longa manhã, os guerrilheiros conseguiram evacuar. Numa rápida acção de busca e recolha, capturámos armas e documentos e encetámos o regresso. Não era aconselhável prolongar o avanço, já que o território que pisávamos era soberano e o Senegal não se apresentava como opositor declarado de Portugal. Nada mais havia ali a fazer. As duas centenas de homens, autómatos macerados das duas companhias no terreno, estavam exaustos após seis terríveis horas de fogo.

Sobreviver a um dia assim, dilacera na alma cicatrizes, tão dolorosamente insanáveis e tão eternamente demoníacas, que nenhum homem, nascido e moldado no barro dos afectos e da razão, espiritualmente lhe resiste. Algures, o poema recorda: “nunca se regressa apenas vivo / ainda que a guerra finja não matar”.

Ouvem-se os tambores da guerra, por uma vez, “e nunca mais se retoma a inocência / nem a vida”. E nenhum bálsamo era, ainda assim, mais prodigioso do que a certeza que, para além do germinar dos sinistros e infindáveis pesadelos, arautos do ruir do humano, que nos enfeitiçara a existência, a epopeia da morte não lograva dissipar o pensamento de que podíamos, apesar de tudo, lidar com o inferno e a sombra da mortalha. o sol do meio-dia, que só então parecia ter despertado, espelhava-se a oeste num ténue cirro de nuvens, que se alongava em línguas poeirentas, como tempestades de areia e queimava, mais do que o sibilar das balas e o explodir das granadas, que nos haviam tentado o corpo.

Mas a ligeira brisa que se levantou de sul surgia como uma revigorante terapia de esperança, rasgando as fronteiras de um dia que se anunciava mais promissor e radioso, porque a vida nos devolvia aos recantos da alma, onde o espectro da morte, uma vez mais, se tentara dissimuladamente insidiar.

Depois, na penosa caminhada para sul, a coluna regressou, pelos meandros sinuosos da picada.

António Lúcio Vieira

In “O Mouro da Praia da Foz”  (Lisboa, Chiado Editora, 2014) (cortesia do autor) (****)
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Notas do editor: