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quinta-feira, 16 de abril de 2020

Guiné 61/74 - P20861: (De)Caras (153): O comerciante Mário Soares, de Pirada, quem foi, afinal? Um "agente duplo"? - Parte II (Depoimento do nosso saudoso camarada Carlos Geraldes)


Guiné > Região de Gabu > Pirada > 1973 > "Foto tirada por mim, é de Pirada, mostra a distância entre o aquartelamento e o marco da fronteira [, com o Senegal]".

Foto (e legenda): © António Martins de Matos (2016). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Guiné > Região de Gabu > Pirada > 2018 >  Antiga casa do comerciante Mário Soares


Guiné-Bissau  > Região de Gabu > Pirada > 2018 > Rua principal:  à esquerda, a antiga casa do comerciante Mário Soares (que viveu na Guiné até novembro de 1975).


Guiné - Bissau > Região de Gabu > Pirada >   2018 > Antiga delegação local da PIDE/DGS, e hoje esquadra local da polícia de segurança pública.


Guiné - Bissau > Região de Gabu > Pirada >   2018 > Ruínas da casa do Sr. Palha, um antigo comerciante que ficou na memória local como um homem "muito bondoso". Do outro lado da rua, em frente, ficava a casa do Mário Soares.


Guiné - Bissau > Região de Gabu > Pirada >   2018 > Sem legenda


Guiné - Bissau > Região de Gabu > Pirada >   2018 > Sem legenda: parece ser a rua principal

Fotos: cortesia da página do Facebook Pirada Guiné-Bissau (2018). Editadas pelo Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné.


Mário Soares > Pirada > 14/2/1974.

Foto: António Rodrigues (2015)
1. Quem foi  Mário Soares, o  comerciante de Pirada,  de seu nome completo Mário  Rodrigues Soares, que muitos de nós, que passsaram pelo leste da Guiné,  conheceram, ou ouviram falar ele, ao longo da guerra ?  (*)

Conviveu com vários camaradas nossos,  a começar pelos veteranos, o alf mil António [de Figueiredo] Pinto (BCAÇ 506 e 512, 1963/1965), o alf mil médico Luiz Goes (BCAÇ 506, Bafatá, 1963/65) (**), e Carlos Geraldes, em (CART 674, 1964/66), os dois últimos já falecidos. (O António Pinto vive em Vila do Conde.)

Dizia-se que o Mário Rodrigues Soares (, mais conhecido por Mário Soares,)  tinha "relações privilegiadas" com os dois lados do conflito, as NT e o PAIGC. Dizia-se inclusive quer era um "agente duplo", trabalhando tanto para a PIDE/DGS como para o PAIGC.

Ora, não temos provas disso. Está em causa a sua honra (ou a sua memória, no caso de já ter morrido, como será muito provável).

Temos que ser cautelosos, não fazer juízos apressados (ou nem seqiuer fazer juizos, como mandam as boas regras do nosso blogue!)  sobre o comportamento dos comerciantes portugueses e outros (libaneses, cabo-verdianos...) que ficaram no mato, apesar da guerra. Afinal, a guerra foi também uma oportunidade de negócio(s). O exército passou a ser o maior empregador no mato, para a população civil, das lavadeiras aos milícias, dos camionistas aos jovens em idade militar...

Em boa verdade, a tropa tinha tendência para pôr em causa a "lealdade" dos comerciantes, colocados numa posição difícil no interior da Guiné. O alf mil Carlos Geraldes que conviveu estreitamente com ele (e com a sua família), em Pirada, nos anos de 1964/66, escreveu que ele era era um "velha raposa" que, na situação em que se estava, sabia "estar de bem com Deus e o Diabo".

O seu nome  é referido, de facto,  com muita frequência nas cartas que o Carlos [Adrião] Geraldes (1941-2012), ex-alf mil da CART 676 (Bissau, Pirada, Bajocunda e Paunca, 1964/66) mandava para casa, e de que foi publicada uma seleção no nosso blogue, em 2009.

O Carlos Geraldes conheceu o Mário Rodrigues Soares quando a sua companhia, a CART 676, chegou a Pirada, em 15 de outubro de 1964, vinda de Bissau (via Bambadinca, Bafatá e Nova Lamego). Tornar-se-iam amigos. O Carlos passa a ser visita frequente da sua casa. E descreve-o logo nestes termos:

 "É uma excelente pessoa. Muito gordo, de bigodinho à brasileiro, mas sempre de boa disposição, irradiando simpatia na forma franca e directa com que trata toda a gente branca ou preta." (Pirada, 15/10/1964).

 E defendo-o das suspeitas de colaborar com o IN:

(...) "É o nosso Anjo da Guarda. Todos os dias manda cá o criado dele, o Demba, com uma garrafa de água filtrada e um termos com cubos de gelo, para que nunca nos falte água fresca no quarto. É um indivíduo que, mesmo aqui, longe da nossa civilização, não descura todos os pormenores de conforto para criar à sua volta um ambiente requintado e de um bom gosto que se julgaria inacreditável encontrar por estas paragens. (Pirada, 15 de outubro de 1964).

(...) "O M. Santos, como sempre, faz questão em receber-me para jantar, o que eu nem me atrevo a recusar, tão maravilhosos são os jantares em casa dele." (Pirada, 8 de fevereiro de 1965)

(...) O ataque  [, a Pirada, em 28 de maio de 1965,] já era esperado, pois o M. Santos, como sempre, tinha sabido da coisa com alguma antecedência e correu a informar o Capitão (...). (Pirada, 13 de junho de 1965)

O Mário Soares era um "lisboeta de gema, recém incluído nestas guerras por ter tido dificuldades financeiras na Metrópole, segundo se consta" (Pirada, 8 de fevereiro de 1965). O Carlos também era lisboeta, se bem que levado, aos 4 anos, para Viana do Castelo onde pai trabalhou, como desenhador técnico, nos Estaleiros Navais de Viana do Castelo.

Do Mário Soares sabe-se que tinha bons contactos no Senegal. E que desempenhou o seu papel na história da indepência da Guiné-Bissau. Foi através dele que o gabinete do Governador António Spínola consegiu chegar ao Leopoldo Senghor (como se depreende de um histórico depoimento do embaixador Nunes Barata, ex-alf mil, na altura, chefe de  gabinete, a partir de maio de 1971,  do general  Spínola; certamente por lapso, chama-lhe António Mário Soares. (*).

Não sei o que é feito dele, o cometrciante de Pirada, é provável que já não esteja entre o número dos vivos. Em 1974 já teria cerca de 40 e tal anos, a avaliar pelas poucas fotos que temos com ele (*).

Sabemos, pelo Carlos Geraldes, que em 1964/65, era casado, tinha duas filhas e um filho e era natural de Lisboa. Luísa era o nome da esposa. A filha mais velha chamava-se Rosa, o filho do meio era José (e estudava em Lisboa) e a mais nova, Eva Lúcia, tinha nascido em 11/9/1957.

Segundo a historiadora Maria José Tístar ("A PIDE no Xadrez Africano: Conversas com o Inspector Fragoso Allas", Lisboa, Edições Coilibri, 2017), o comerciante Mário Soares, estabelecido em Pirada, na fronteira com o Senegal, seria  um "agente duplo": informador da PIDE/DGS, e ao mesmo tempo informador do PAIGC.

Contrariamente ao Rodrigo Rendeiro, comerciante de Bambadinca (, também "grande amigo" da tropa local), que terá tido problemas logo a seguir ao 25 de Abril, pela sua ligação à PIDE/DGS, o Mário Soares decidiu ficar  na Guiné independente... Mas rapidamente terá "caído em desgraça" e sido expulso do país, no tempo do Luís Cabral, um ano e picos depois, em novembro de 1975. (*)

Quanto à  CART 676,  foi mobilizada pelo RAP 2, partiu para o CTIG em 8/5/1964 e regressou a 27/4/1966. Esteve em Bissau, Pirada e Bissau. Comandante: cap art Álvaro Santos Carvalho Seco (, comandante da EPA - Escola Prática de Artilharia, enre 1978 e 1980).

2. Pergunta-se: alguém mais se lembra dele, do Mário Rodrigues Soares ? Alguém mais tem fotos e histórias dele ?

Estamos a reler as cartas do Carlos Geraldes, que nos ajudam a perceber melhor a personalidade e o comportamento deste comerciante português, "bon vivant", hospitaleiro, insinuante, amável, generoso, prestável, com um vasto capital de relações sociais, a nível interno e até externo (com as autoridades e os comerciantes do outro lado da fronteira, no Senegal).

Nesta II parte, continuamos a publicar excertos, selecionados,  das cartas remetidas para a família, no período de abril a setembro de 1965, e em que o Carlos faz referências ao seu "amigo M. Santos [leia-se: Soares]"


3. Depoimento do nosso saudoso camarada Carlos [Adrião] Geraldes (1941-2012), ex-alf mil da CART 676 (Bissau, Pirada, Bajocunda e Paunca, 1964/66), que se tornou amigo do comerciante de Pirada, Mário Soares e visita frequente da sua casa...

Reprodução de excertos das suas cartas com referência explícitas ao Mário Soares [, ou M. Santos]:


Parte II (abril de 1965 - setembro de 1965) (*****)


Pirada, 11  de abril de 1965


O M. Santos [Mário Soares] zangou-se com a tropa!

É o caso mais falado por estas bandas e a história foi a seguinte: como precisávamos de um frigorífico para a cantina que estamos a fazer, o 1.º Sargento falou nisso ao M. Santos e este prontificou-se logo a mandar vir um do Senegal, onde conhecia uma pessoa que tinha um e o queria vender. Adiantou, no entanto, que custaria 12 contos [se fossem escudos da metrópole equivaeriam hoje a 4.717,50 €, mas é preciso ter em conta os 10% de cambial: 100 "pesos" da Guiné valiam 90 escudos na metrópole.]  O 1.º Sargento respondeu que o mandasse vir, para se ver e, depois, discutir o preço.

Resultado: veio o frigorífico e verificou-se que nem 6 contos de réis, valia. Ao fim de uma semana não tinha sequer conseguido fabricar uma única pedra de gelo.

O 1.º sargento falou no caso ao Capitão e decidiram dizer ao M. Santos que não queriam o frigorífico.
Aí é que este ficou que nem uma barata, alegando que já se tinha comprometido com o vendedor a ficar com o referido aparelho, etc., etc.

Desde então (e já se passaram 3 ou 4 dias), todas as noites a porta do quintal da casa do M. Santos que dá para a esplanada, onde habitualmente íamos, eu e o doutor, depois do jantar, tomar o nosso cafezinho e conversar um bocado, encontra-se fechada. Ultimamente, alguns sargentos também se faziam de convidados e creio que foi também por isso que o nosso amigo fechou a porta em sinal de desagrado.

Pessoalmente comigo não existe nada e, tanto ele como a família continuam a tratar-me bem. Eu, que já conheço o feitio dele, finjo que não sei de nada.

Anda um bocado amuado mas aquilo passa-lhe.


Pirada, 18 de abril de 1965

Hoje foi dia de Páscoa. Dia que não tem grande significado para mim mas que serviu de pretexto para nos reunirmos e fazermos uma pequena festa.

O M. Santos já esqueceu a zanga com a tropa e ontem à noite estivemos em casa dele a comer e a beber.

O [alferes] Castro esteve cá, assim como o Gabriel, aquele meu companheiro de Bajocunda, que ficou também para o jantar.

Os soldados divertiram-se à maneira deles, vestindo-se à Fula e a Páscoa aqui em Pirada redundou num autêntico Carnaval.

Até eu me mascarei de Fula!

(O interregno entre esta carta e a seguinte explica-se por em Maio ter vindo à Metrópole, gozar um mês de férias e efectuar o meu primeiro casamento)


Pirada, 13 de junho de 1965


(..) Assim que aparecemos em Pirada [, de regresso de férias], nem queiram saber a festa que me fizeram!

Ainda o jeep não tinha estacionado já toda a gente me vinha cumprimentar. Depois fui apresentar-me ao Capitão que estava bastante doente com disenteria. Em rápidas palavras contei-lhe como tinha passado as férias. (Afinal, sempre receberam os meus postais!).

Em seguida tive de ir visitar, é claro, o M. Santos para lhe entregar as lembranças que trouxe. A D. Luísa ficou contentíssima com a toalha regional, e o galo de Barcelos conseguiu chegar intacto. 

Agora têm cá mais um filho que estava a estudar em Lisboa e que, pelos vistos, não se portou lá muito bem este ano. Chama-se José e tem mais idade que a Eva Lúcia, a mais nova (que ainda não vi; está em Bafatá) e menos que a Rosa, a filha mais velha.

À noite jantei em casa deles e foi uma longa conversa sobre o mundo maravilhoso da metrópole. (...)

Mas cá por Pirada, entretanto, também aconteceram muitas outras coisas durante o mês de Maio (...)

O Capitão quer agora que a tabanca de Velingará Pinto Silva, a tal aldeia estratégica, passe a ser um novo destacamento e tinha mandado para lá o Alferes Carvalho passar 15 dias. Seguidamente calhava a vez ao alferes Cardoso (pois eu estava ainda de férias), mas como havia notícias de um possível ataque do IN àquela zona, este encheu-se tanto de medo que fez todos os possíveis para adiar a ida para lá, esperando que eu, quando chegasse, o substituísse. A cobardia evidenciada por ele foi de tal maneira irresponsável que o Capitão decidiu mesmo obrigá-lo a ir à força.

Sem mais hipóteses de fuga, acabou por ir suplicar ao M. Santos, quase de joelhos, para que o informasse com a máxima prioridade, sempre que soubesse de qualquer novidade sobre as intenções do IN que dissessem respeito àquela tabanca, por mais insignificantes que lhe pudessem parecer. Assim poderia precaver-se o melhor possível.

[Nota do editor: Os nomes dos camaradas europeus são fíctícios, por razões de privacidade, segundo o autor das cartas que foram publicadas no blogue...]

Até hoje e já lá está há 12 dias, só 5 é que os passou completamente com os soldados no próprio destacamento. No resto do tempo, [, o alferes Cardoso]  vai sempre para Paunca almoçar e jantar (pois fica perto) e já adoeceu várias vezes para poder vir para Pirada ao médico. Tem procedido de maneira tão escandalosa que todos o ridicularizam.

Mas ainda fez mais! Na passada segunda-feira foi a Bafatá sem dar conhecimento a ninguém, falar com o Coronel, Comandante-Chefe desta zona,  e, entre outras coisas, como para justificar o inusitado da visita, caluniou o M. Santos, acusando-o de ser um agente duplo. (...)

Estupidamente, no dia seguinte, ao almoçar em Paúnca, gabou-se do facto e, não tardou nada que isso não chegasse aos ouvidos do visado.

M. Santos, indignadíssimo, exigiu um imediato pedido de desculpas e um completo desmentido desta situação. Queria mesmo ir a Bafatá falar com o Coronel.

O Capitão mandou logo chamar o Cardoso para esclarecer tamanha borrada e justificar aquela ida a Bafatá sem a devida autorização.

Quando o Cardoso chegou fez-se de mil cores, ficando a tremer como varas verdes. Começando por negar tudo, acabou por confessar. Por ordem do Capitão foi de imediato pedir desculpas ao M. Santos.

Este disse-me que de facto ele tinha ido a sua casa, a chorar, pedindo-lhe que o perdoasse e que não dissesse nada para Bafatá, pois decerto acabaria por ser castigado e talvez impedido de ir de férias em Julho próximo. O M. Santos, coração de manteiga, lá se comoveu, mas não deixou de lhe pregar uma valente descompostura.

Acabada essa cena, o Cardoso regressou novamente à Messe, onde eu, o Carvalho o alferes médico Cláudio, que está cá para substituir o nosso que foi de férias, aguardávamos o desenrolar dos acontecimentos.

Sem querer dar o braço a torcer continuou a disparatar em todas as direcções, acusando inclusivamente, o nosso próprio médico (o ausente) de o ter denunciado ao M. Santos o que de facto até era uma tremenda mentira. Gerou-se logo ali uma acesa discussão e o Cláudio que, não é nada macio, queria mesmo obrigá-lo a ir novamente à presença do M. Santos para esclarecer definitivamente o assunto. E tanto insistiu que o Cardoso, atarantado, fez menção de se levantar e puxar pela pistola Parabelum que traz sempre à cinta, num arremedo ridículo de autoridade. Deu-se logo ali uma caricata cena de pancadaria. Eu, na confusão, consegui desarmar o Cardoso que se atirou para o chão, inanimado como um saco de batatas.

Quando o fizemos vir a si, deixou-se ficar, sentado no chão, a chorar como um bebé. Ao fim e ao cabo, ficámos todos com pena dele, pois ele apenas tinha conseguido demonstrar que não passava de um pobre diabo desorientado sem saber o que fazer para sobreviver a esta vida. Cláudio, o médico, acabou por lhe administrar uma injecção calmante que o fez ficar a dormir o resto do dia na cama do capitão.

Mais tarde veio pedir desculpas a todos, especialmente a mim, dizendo-me que eu era o seu primeiro e único amigo, que eu era a pessoa que melhor o compreendia, etc.

Jantámos em sossego e esquecemos completamente o caso. Hoje de manhã lá partiu novamente para o destacamento de Velingará Pinto Silva todo encolhido no assento do jeep.

Em parte, talvez seja eu, de facto, quem melhor o compreende e quem tenha a coragem de lhe dizer as coisas mais duras. Mas foi tudo causado pela sua infame e nevrótica cobardia que mexe com os nervos de todos nós.

Parece que, para se reabilitar, decidiu ficar no destacamento até às vésperas de embarcar para férias. Depois calha-me a mim ir para lá que, vai ser um consolo. (...)

No passado dia 28 de maio [de 1965], um numeroso grupo de guerrilheiros invadiu Pirada e atacou o quartel, sem no entanto causar qualquer baixa e causar danos de maior. Apenas queimou algumas palhotas da periferia, num acto intimidatório.

O ataque já era esperado, pois o M. Santos, como sempre, tinha sabido da coisa com alguma antecedência e correu a informar o Capitão que, prontamente se barricou no quartel e aguardou os acontecimentos, enviando, no entanto, um Pelotão (o do Carvalho) para os lados da bolanha com o intuito de montar uma emboscada ao grupo que viria fazer o ataque, mas como já era de noite, o sonso do Carvalho fez-se de mula e preferiu entrincheirar-se o melhor possível e deixar correr o marfim.

Nem chegou a ver o IN, que andou pela povoação completamente à vontade a fazer fogo para o quartel, abrigado até debaixo do alpendre da casa do M. Santos.

No entanto, não tocaram em qualquer das casas comerciais, respeitando um hipotético e provável acordo de cavalheiros, pois quando necessitam, também sabem recorrer, secretamente, a estas fontes irregulares de abastecimentos, e o M. Santos, como velha raposa que é, sabe que na actual situação é sempre útil estar de bem com Deus e o Diabo.

Foi por isso que achou que aquela tola tentativa do Cardoso de o intrigar junto do governo militar foi uma palermice de todo o tamanho que, além de ser perigosa para ele próprio, era também prejudicial para os interesses de todos nós, pois assim poderíamos vir a perder uma importante fonte de informação sobre os movimentos do IN na região. Mas como, com esta malta da tropa, nunca se sabe, achou que evidentemente o melhor seria mostrar bem alto a sua indignação para que ficasse devidamente registada.

Voltando à vaca fria, nesta guerra, como se pode ver mais uma vez, tive sorte. Pois foram logo escolher o dia do ataque para quando estava de férias. Parece que eles ainda pensaram em voltar, mas viemos a saber depois que tinham resolvido ir atacar outra zona que, se calhar, lhes seria mais favorável. Entretanto a população regressou e tudo voltou à normalidade.

O Presidente do Senegal (Senghor) enviou para esta região membros da guarda republicana senegalesa para correr com todos os grupos armados que circulam por aqui e que já o estavam a inquietar, de maneira que hoje de manhã tivemos a inevitável confraternização, mesmo sobre a linha de fronteira.

Confraternização essa que levámos a efeito em regime estritamente confidencial, pois mais ninguém deveria saber, para não se armarem as habituais confusões junto do poder central. De um lado, eu, o Capitão, o alferes Carvalho, e o alferes médico representando a tropa. O M. Santos representando os civis. Do outro lado, três guardas senegaleses.

O ambiente foi bastante cordial e prometeram-nos nunca mais autorizar a permanência, nesta zona, de grupos de guerrilheiros armados que, pelos vistos, também já os estariam a preocupar e incomodar. (...)


Paunca, 27  de junho de 1965

(...) No meu aniversário ainda estava no destacamento de Velingará, mas o [alferes] Castro, numa atitude que dificilmente virei a esquecer, convidou-me para jantar em Paunca, nesse dia. Foi um jantar maravilhoso com o quartel todo enfeitado com ramos de palmeira. Comemos juntamente com os soldados e pelo menos nisso, para eles houve rancho melhorado pois comeram o mesmo que nós, sopa, leitão assado, ananás e até cigarros para finalizar. Depois sentámo-nos todos numa roda e serviu-se Cinzano e whisky para toda a gente.

Mesmo assim senti-me um bocado triste, mas não dei parte de fraco. Nessa mesma noite regressei ao acampamento de Pinto da Silva. Nem o M. Santos, nem o Capitão se lembraram do meu aniversário, embora fosse até este último quem mais teria a obrigação de o fazer já que foi ele que, no ano passado, determinou que este dia passaria a ser o dia da nossa Companhia. (...)


Paunca, 10 de julho de 1965


(...) Esta gente daqui é mais rica que a de Pirada, pois enquanto lá, os quatro comerciantes existentes, vivem principalmente do comércio que fazem com o Senegal, estes aqui (e são cinco!) vivem do comércio que fazem apenas com os indígenas desta região e com os que vêm do interior para se abastecerem. 

Estamos agora na época em que se lavra a mancarra e o trigo e é precisamente nesta altura que os agricultores estão sem dinheiro. Mesmo assim ainda conseguem fazer algum negócio, vendendo arroz e tabaco para poderem comprar o que necessitam. É agora que nós aproveitamos também para lhes comprar os ovos e as galinhas que quisermos, pois deixam tudo muito mais barato. (...)

[Revisão e fixação de texto para efeitos de publicação neste blogue: LG]

(Continua)
____________

Notas do editor:

(*) Último poste da série > 15 de abril de 2020  > Guiné 61/74 - P20858: (De)Caras (125): O comerciante Mário Soares, de Pirada, quem foi, afinal ? Um "agente duplo" ? - Parte I (Depoimentos do embaixador Nunes Barata, e do nosso saudoso camarada Carlos Geraldes)

(**) Vd. poste de 18 de setembro de 2012 > Guine 63/74 - P10404: In Memoriam (127): Luiz Goes (1933-2012), figura incontornável da canção de Coimbra, foi ten mil médico, BCAÇ 506 (Bafatá, 1963/65), e conviveu com o nosso camarada António Pinto

(**) 23 de Setembro de 2009 > Guiné 63/74 - P4997: Cartas (Carlos Geraldes) (10): 2.ª Fase - Abril de 1966 - Epílogo - O Regresso

(***) Vd. postes de

10 de Setembro de 2009 > Guiné 63/74 - P4933: Cartas (Carlos Geraldes) (7): 2.ª Fase - Julho a Setembro de 1965

7 de Setembro de 2009 > Guiné 63/74 - P4916: Cartas (Carlos Geraldes) (6): 2.ª Fase - Abril a Junho de 1965

sexta-feira, 3 de novembro de 2017

Guiné 61/74 - P17929: (D)o outro lado do combate (16): O Rodrigo Rendeiro, depois de regressar a Bissau, terá fornecido preciosas informações à FAP , permitindo a localização (e bombardeamento) das bases do PAIGC em Morés e Dandum, segundo Maria José Tístar, autora de "A PIDE no Xadrez Africano: conversas com o inspetor Fragoso Allas", Lisboa, Colibri, 2017 (pp. 191/192)


Guiné > Zona Leste > Região de Gabu > Piche > BCAÇ 506 > Abril de 1964 > Da esquerda para a direita: (i) o alf mil António Pinto; (ii) o Mário Soares, comerciante de Pirada e "agente duplo";  (iii) o alf méd médico (e grande intérprete do fado de Coimbra) Luiz Goes (1933-2012( ; e (iv) e o alf mil Spencer.

Foto (e legenda): © António Pinto (2007). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Segunda a historiadora Maria José Tístar ("A PIDE no Xadrez Africano: Conversas com o Inspector Fragoso Allas", Lisboa, Edições Coilibri, 2017, pp. 191/192), o comerciante Rodrigo José Fernandes Rendeiro deu à FAP ou à "aviação militar" indicações muito precisas (e preciosas...) sobre a localização das bases do PAIGC em Morés e de Dandum. 

Recorde-se que ele passou lá, na base do Morés, duas semanas, em setembro de 1963, entre depois de ter sido "capturado" pela guerrilha em Porto Gole, e levado para o Senegal.  Pelo caminho conheceu comandantes da guerrilha como o Caetano Semedo (, (Baroudulo), Osvaldo Vieira (Morés), Mamadu Indjai (Fajonquito / Olossato), Lourenço Gomes (Samine / Senegal), Pedro Pires (Dacar, Senegal).

O documento que ele assinou em Dacar, declarando a sua adesão ao PAIGC, só podia ter sido feito para lisonjear os seus captores. (*)

Em Dacar, com liberdade de movimentos, acabou para fugir para a Gâmbia e depois regressar a Bissau, com a ajuda de informadores da PIDE bem como das embaixadas da Suíça e da Inglaterra. Na altura a Suiça representava os interesses de Portugal no Senegal.

O inspector Fragoso Allas nunca contactou pessoalmente o Rendeiro. Tanto quanto se lembra ele, enquanto informador, acha que devia estar ligado ao posto de Farim. Mas era mais lógico que fosse o posto de Bafatá, já que o Rendeiro vivia em Bambadinca.

O supracitado livro, que só folhei na FNAC, utilizou o nosso blogue como fonte, por mais de uma vez (vi referências à batalha de Guidaje e ao nosso saudoso Daniel Matos (1949-2011), um dos "marados de Gadamael", ex-fur mil da CCaç 3518, Gadamael, 1972/74.

No índice onomástico do livro, deparei-me logo com um erro: o comerciante Rodrigo José Fernandes Rendeiro vem referido como citado na pág. 216, quando devia ser nas pp. 191/192, donde retirei a informação supra.

Acrescente-se que outro informador da PIDE/DGS, melhor conhecido da opinião pública, e ao mesmo tempo informador do PAIGC, era o António Mário Soares, estabelecido em Pirada, na fronteira com o Senegal. Contrariamente ao Rendeiro, que terá tido problemas logo a seguir ao 25 de Abril, pela sua ligação à PIDE/DGS,  o António Mário Soares ficou na Guiné independente mas terá "caído em desgraça" e sido expulso do país, um ano e tal depois, em novembro de 1975, segundo a fonte que estamos a citar, a investigadora Maria José Tístar. (***)

2. Sobre o Fragoso Allas, encontrei algumas valiosas notas biográficas, anexas à notícia do do lançamento do livro da doutora Maria José Tístar, no portal Dos Veteranos da Guerra do  Ultramar - Angola, Guiné, Moçambique, 1959-1975. (Curiosamente,  no livro não há um  CV tão detalhado como o do portal Ultramar Terraweb.)

Com a devida vénia aos camaradas que editam o Ultramar Terraweb, faço aqui um pequeno resumo do CV do homem que foi um dos braços direitos do general Spínola, em 1971/73, no CTIG:

(i) António Fragoso Alas nasceu em 1934, em Reguengos de Monsaraz, distrito de Évora;

(ii) em 1956/57 faz o COM (Curso de Oficial Miliciano), em Mafra,  na Escola Prática de Infantaria;

(iii) aspirante a oficial milicano, é colocado no RI 2, em Abrantes;

(iv) em meados de 1957 oferece-se como voluntário, em regime de rendição individual, para uma comissão especial de quatro anos integrado na guarnição normal do Comando Territorial Independente da Guiné (CTIG);

(v) integra, a partir de 1957, a 4.ª Companhia de Caçadores Indígena, aquartelada em Bolama;

(vi) já como alferes miliciano, vai formar e comandar, em Bedanda, em setembro de 1959, o 1.º Pelotão da 4.ª Companhia de Caçadores Indígena;

 (vii) em final de 1960, é promovido a tenente miliciano; e em outubro de 1961 regressa à Metrópole;

(viii)  em abril de 1962 ingressa nos quadros da Polícia Internacional e de Defesa do Estado (PIDE), sendo  colocado nos serviços centrais,  em Lisboa;

(ix) em abril de 1963 é chefe-de-brigada da delegação da PIDE em Angola;

(x) no final de 1968, já inspector-adjunto, é colocado em Kinshasa como "adido comercial" na missão portuguesa junto da embaixada espanhola;

(xi) em 13 de julho de 1971 é transferido para Bissau, tomando possse como chefe da subdelegação da Guiné da Direcção-Geral de Segurança (DGS);

(xii) em 10 de setembro de 1973 é transferido para a delegação  da DGS, em Lourenço Marques, Moçambique; menos de três meses, em finais de novembro de 1973, é  transferido para os serviços centrais da  DGS, em Lisboa;

(xiii) em 24 de abril de 1974 está de volta a Moçambique e, em 10 de junho de 1974, está em Luanda, para logo regressar a Lisboa, em 6 de julho desse ano;

(xiv) a seguir aos acontecimentos do 28 de setembro de 1974,  emigra para a Rodésia;  em 1978 instala-se na África do Sul, em Joanesburgo, como empresário.
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Notas do editor:

(*) Vd. 30 de outubro de 2017 > Guiné 61/74 - P17917: Notas de leitura (1009): “A PIDE no Xadrez Africano, Conversas com o Inspetor Fragoso Allas”, por María José Tíscar; Edições Colibri, 2017 (1) (Mário Beja Santos)

(**) Vd. 2 de novembro de 2017 > Guiné 61/74 - P17926: (D)o outro lado do combate (15): continuação da odisseia do Rodrigo Rendeiro que acabou por regressar a Bissau, com um salvo-conduto do consulado da Suíça em Dacar, que o levou até à Gâmbia...

(***) Vd. 31 de outubro de 2017 > Guiné 61/74 - P17920: (D)o outro lado do combate (14): a odisseia do português, da Murtosa, Rodrigo Rendeiro: uma viagem atribulada, de cerca de mil km, de 3 a 26 de setembro de 1963, de Porto Gole, onde tínha um estabelecimento comercial e era casado com uma senhora mandinga, de linhagem nobre, Auá Seidi, e tinha cinco filhos,até ao Senegal (Samine, Ziguinchor e Dacar), unindo ocasionalmente o seu detino ao do PAIGC... Relatório, assinado por ele, mas de autenticidade duvidosa...

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Guiné 63/74 - P10406: Evocando a trágica emboscada com mina, de 28 de novembro de 1964, em Madina do Boé, que vitimou 7 camaradas da equipa de comandos Os Fantasmas, alguns dos quais morreram nas mãos do alf mil médico Luiz Goes (1933-2012) e do alf mil António Pinto


Guiné > Mapa geral > 1961 > Escala 1/500 mil > Detalhe: da esquerda para a direita, Gobije, Madina do Boé e Béli...  O Rio Gobije, afluente do Rio Corubal,  ficava a sudeste de Guileje, na fronteira com a Guiné-Conacri.


1. Excerto de um  mensagem, de 2006,  do nosso camarada António Pinto (ex-alf mil, BBCAÇ 506, 1963/65, foto de 2007 à direita), em que se fala dos 7 mortos da equipa de comandos Os Fantamas, em Madina do Boé, em 28 de novembro de 1964. Alguns destes infelizes camaradas  morreram nas mãos do António Pinto e do alf mil médico Luiz Goes (1933-2012), que foi enterrar hoje, na sua terra natal, Coimbra (*)

(...) A memória já me vai traindo um bocado, mas há momentos que jamais poderei esquecer e com certeza que me acompanharão para sempre. Guardei alguns documentos daquele tempo e, vasculhando-os, verifico que pertenci à 3ª Companhia de Caçadores, em Nova Lamego, e aos Batalhões de Caçadores, sediados em Bafatá, nºs 506 e 512 e finalmente ao Batalhão de Cavalaria nº 705.

Sobre Madina do Boé,  estive lá no 2º ano de comissão, lembro-me que fomos os primeiros a lá chegar e montar o 1º aquartelamento que ficou ao fundo da estrada, onde havia uma escola desactivada. Os primeiros tempos passámo-los sem sobressaltos de maior até que houve o 1º ataque, não posso precisar a data. Não tivemos feridos.

Há um episódio, no entanto, entre vários, que me marcou bastante. Vou tentar resumi-lo:


Guiné > 1964 > Brá, Comandos > Equipa Os Fantasmas. "Foto do Furriel Artur Pereira Pires (ao meio, de bigode), a quem fui substituir, e da sua equipa, os Fantasmas, composta por António Joaquim Vieira Ferreira, Manuel Coito Narciso, José da Rocha Moreira e João Ramos Godinho. Foram umas das vítimas do rebentamento da mina em 28 de Novembro de 1964 [, na estrada de Madina do Boé para Contabane, a uma escassa centena de metros do pontão sobre o rio Gobige]" (JSP).

Foto: © João S. Parreira (2005). Todos os direitos reservados.

Uma tarde estávamos no Destacamento, quando, de repente, ao fundo da tal estrada vimos chegar, com grande alarido dois ou três jipes com uma velocidade inusitada e alguém aos gritos, que só conseguimos entender quando chegaram à nossa beira. Era um grupo de Comandos, chefiados pelo alferes [Maurício] Saraiva (um homem tremendamente marcado pela guerra em Angola, onde assistiu à morte de familiares seus ) . Aos berros, pediu-nos viaturas e homens para efectuar uma operação (de que eu não tinha conhecimento ) nos arredores de Madina. De tal maneira ele estava transtornado que chegou a puxar de pistola para um Furriel do Destacamento, que esta a apertar as botas, tal era a sua pressa.

O que não posso esquecer é o pedido que um dos nossos soldados fez para substituir o condutor duma viatura, salvo erro, uma Mercedes, argumentando que, sendo ele pequeno (e era-o de facto),  se uma mina rebentasse ele saltava com mais facilidade, pedindo só para deixar tirar a capota da viatura. Não me recordo do nome dele mas vejo-o constantemente...

Essa patrulha, em que não participei, pois o Saraiva não o permitiu, foi atacada, após o rebentamento de minas. Morreram vários camaradas nossos, entre eles o referido condutor, que teve uma morte horrorosa.

Alguns desses camaradas deixaram este mundo nos meus braços e nos do médico que, na altura, estava conosco e que é por demais conhecido - o Luiz Goes, que todos conhecem, com certeza, pelos seus fados de Coimbra.

Este foi um dos momentos mais dramáticos que vivi na Guiné, para além de outros, especialmente em Beli, onde fui ferido e que noutra altura relatarei. (...)

2. Nota do editor:

Trata-se do mesmo episódio, já aqui evocado pelo  Virgínio Briote [, foto à esquerda], na I Série do nosso blogue (*)

(...) "Novembro de 64, dia 28. Na estrada de Madina do Boé para Contabane, a uma escassa centena de metros do pontão sobre o rio Gobige, os Fantasmas detectaram uma mina anti-carro. Levantaram a mina e simularam o rebentamento. Ficaram emboscados nas proximidades cerca de 2 horas. Viram um grupo IN aproximar-se e afastar-se logo que deram pela presença de mulheres na estrada. Uma hora depois viram um elemento IN a fugir. Afinal, estavam em igualdade de circunstância, todos sabiam da presença uns dos outros.

"No dia seguinte voltou com o grupo ao local. Meteu-se com alguns soldados no Unimog mais pequeno à frente, e encaixou dezasseis militares no Unimog maior atrás. A 1ª viatura passou, a outra, uma dezena de metros atrás, não. Pisou uma mina. Ao mesmo tempo que em cima deles caía uma chuva de balas de armas automáticas, o Unimog incendiou-se e as munições explodiram como foguetes num arraial minhoto. Quase todos os homens foram projectados a arder. 7 mortos logo ali e três feridos graves. Tinham partido 22 de Bissau, regressaram doze. Com o grupo dizimado, poucos dias depois arrancou com os restantes para uma operação".  (...)

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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 20 de dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1384: Com o Alferes Comando Saraiva e com o médico e cantor Luiz Goes em Madina do Boé (António de Figueiredo Pinto)


(**) Vd. psote da I Série > 13 Dezembro 2005 > Guiné 63/74 - CCCLXV: Brá, SPM 0418 (3): memórias de um comando (Virgínio Briote)

terça-feira, 18 de setembro de 2012

Guine 63/74 - P10404: In Memoriam (127): Luiz Goes (1933-2012), figura incontornável da canção de Coimbra, foi ten mil médico, BCAÇ 506 (Bafatá, 1963/65), e conviveu com o nosso camarada António Pinto




Guiné > Zona Leste > Região de Gabu > Piche > BCAÇ 506 > Abril de 1964 > Da esquerda para a direita: o alf mil António Pinto (, membro da nossa Tabanca Grande, que vive atualmente em Vila do Conde), o Mário Soares, o popular comerciante de Pirada, o alf ou ten mil médico Luiz Goes (já então conhecido como um dos grandes e promissores  intérpretes da canção de Coimbra)  e o alf mil Spencer.  Foto do álbum de António Pinto.

Luiz Goes acaba de falecer, em Mafra, aos 79  anos, vítima de doença prolongada, sem que conseguíssemos prestar-lhe, em vida, uma pequena homenagem, na série Os Nossos Médicos...Faltaram-nos depoimentos de camaradas, seus contemporâneos, no TO da Guiné (,com a honrosa exceção do António Pinto, seu camarada de batalhão). O seu funeral será amanhã, em, Coimbra, onde os seus mortais restos deverão chegar por volta das 13h00. A foto que publicamos da Guiné é. até agora, a única que conhecemos dele como militar, disponível no nosso blogue.

Foto: © António Pinto (2007). Todos os direitos reservados.


Resenha biográfica:

(i) Luiz Fernando de Sousa Pires de Goes [, foto à esquerda, cortesia do blogue  Guitarra de Coimbra III], cantor, poeta e compositor português,  nasceu a 5 de janeiro de 1933, em Coimbra, no seio de uma família com sensibilidade e cultura musicais;

(ii) Sem nunca se ter profissionalizado como artista, é uma das principais referências da canção de Coimbra e um dos artistas portugueses  com maior currículo internacional (há quem o considere mesmo a melhor voz da canção de Coimbra da sua geração);

(iii) Começou a cantar e a compor muito cedo por influência do seu tio, o coimbrão Armando Goes,  sendo já aos 14 anos considerado um menino-prodígio;

(iv) Ainda na adolescência chegou a seracompanhado pelo grande Artur Paredes, pai de Carlos Pasresm, duas referências maiores da guitarra portuguesa;

/(v) Aos 19 anos gravou o seu primeiro disco, a convite de António Brojo;

(vi) No liceu foi colega e amigo de José Afonso e António Portugal, tendo gravadovários álbuns em conjunto com ambos; mas a sua maior influência sempre foi Edmundo Bettencourt;

(vii) Licenciou-se em Medicina, em Coimbra, em 1958;

(viii) Nos seus anos de estudante cruzou-se com muitas figuras do meio literário e cultural (v. g., Manuel Alegre, Miguel Torga, Bernardo Santareno, Teolinda Gersão, Yvette Centeno);

(ix) No final da década de 50 formou o Coimbra Quintet, com os instrumentistas António Portugal, Jorge Godinho, Manuel Pepe e Levy Batista;

(x) O disco Serenata de Coimbra (1957) é um dos álbuns mais vendidos da música portuguesa, em Portugal e no estrangeiro; o referido quinteto teve uma projeção ímpar, mas uma vida breve; [, imagem da capa do LP,  Philips, 1957, à direita, cortesia do blogue A Nossa Rádio: "Serenata de Coimbra é o primeiro LP de música portuguesa a ser lançado à escala internacional (pela Philips) e ainda hoje o disco de música de Coimbra mais vendido em todo o mundo" ];

(xi) Com a mobilização de Luiz Goes para a guerra colonial, e já casado (1º casamento), o  grupo desfez-se;

(xii) Luiz Goes é colocado na no TO da Guiné, como alf mil médico (BCAÇ 506, Bafatá, 1963/65) (*), tendo passado pelos piores sítios da zona leste; mas essa experiência, dura, recorda-la-á mais tarde, em entrevistas, foi também uma aprendizagem da fraternidade,solidariedade e camaradagem entre combatentes;

(xiii) No regresso, muda-se para Lisboa, onde exerce a profissão de médico-estomatologista  até à sua reforma (em 2003);

(xiv) É um dos artistas portugueses mais internacionais;

(xv) Tem um extenso reportório, com muitas canções da sua autoria, algumas delas com mensagens subliminares de oposição ao regime salazarista; entre outros temas, ficaram célebres "Homem Só", "Meu Irmão", "Balada do Mar", "É preciso acreditar", "Canção do Regresso", "Canção da Boneca de Trapo", "Canção para quase todos", "Canção Pagã" ou "Cantiga para quem sonha".

(xvi) Da sua extensa discografia, destacam-se os álbuns:

Coimbra do mar e da vida (1969), 
Canções de Amor e de Esperança (1969) 
Canções para quase Todos (1983);

(xvii) Em 1998 foi editado, em livro, uma autobiografia sua:  Luiz Goes de Ontem e de Hoje, de Luiz Goes,  com a colaboração do poeta e seu amigo  Carlos Carranca (Lisboa, Universitária Editora, 43 pp.):

(xviii) Em 2003, a Emi-Valentim de Carvalho lançou, numa caixa de quatro CDs, a sua obra completa (Canções Para Quem Vier);

(ix) Luiz Goes, que sempre defendeu que não existia um fado coimbrão, mas sim uma balada ou uma canção de Coimbra, recebeu as mais altas distinções, entre as quais a de Grande Oficial da Ordem do Infante Dom Henrique, a Medalha de Ouro da Cidade de Coimbra, a Medalha de Mérito Cultural da Câmara Municipal de Cascais e o Prémio Amália Rodrigues 2005, na categoria Fado de Coimbra.

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Fonte: Adaptado de:

Luiz Goes. In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2012. [Consult. 2012-09-18].
Disponível em http://www.infopedia.pt/$luiz-goes

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Notas do editor:

Último poste da série > 5 de setembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10334: In Memoriam (126): António Rodrigues Soares da CART 1689/BART 1913 (Guiné, 1967/69)


(*) Nota sobre o BCAÇ 506, coligida pelo nosso colaborador permanente José Martins:

BCAÇ 506 (1963/65)

(i) Mobilizado no Regimento de Infantaria 2, em Abrantes, era seu Comandante o Ten Cor Inf Luís do Nascimento Matos;



(ii) Desembarcou em Bissau em 20 de Julho de 1963, recebendo os elementos do recompletamento do BCAÇ nº 238, que rendeu, assumindo a mesma zona de acção, que passou a ser designada por sector D;

(iii) Em 1 e 8 de Agosto de 1963 e 8 de Julho de 1964, foram criados no sector, pela chegada de novas unidades, os subsectores de Piche, Xitole e Fajonquito; a zona de acção foi reduzida em 24 de Agosto de 1964 dos subsectores de Bambadinca e Xitole, e aumentada do subsector de Pirada (onde se incluía Bajocunda) em 29 de Outubro de 1964;

(iv) Em 11 de Janeiro de 1965 a zona D passou a designar-se por Sector L2, abrangendo os subsectores de Bafatá e Fajonquito;

(v) Foi rendido pelo BCAV  nº 757 em Bafatá e regressou à metrópole em 29 de Abril de 1965.

terça-feira, 23 de janeiro de 2007

Guiné 63/74 - P1456: Gabu: Fotos com legendas (António Pinto, BCAÇ 506 e 512) (1): Pirada e Piche






Fotos e legendas: © António Pinto (2007). Direitos reservados.


Mensagem datada de 5 de Janeiro do corrente, enviada pelo António Pinto, ex-alf mil dos BCAÇ 506 e 512 (Zona Leste, 1963/1965):

Caro Luís Graça

Cada dia que passa mais eu recuo no tempo, graças ao que vou lendo de tantos Camaradas que queimaram parte da sua juventude em terras da Guiné.

É de louvar a tua iniciativa, que descobri tarde demais, mas que, julgo, ainda vou a tempo de contribuir para que os nossos vindouros se apercebam do que foram aqueles anos em que nos obrigaram a fazer tanta coisa, quer contra os nossos princípios, quer contra as nossas convicções.

Sem querer ser fastidioso e inoportuno vou tentar enviar umas fotos, que julgava já ter enviado, mas não tenho a certeza se foram recebidas. Mando-as somente porque numa das conversas que tivemos, falei no Luís Góis, no meu grande Amigo Gramunha Marques e na empanagem da granada de morteiro que me ia levando desta vida.

Vou legendá-las aqui, pois apesar de ter escrito abaixo das fotos, julgo não se perceber:

-1ª, do lado esquerdo > Pirada > Janeiro de 1964 > Parte do Destacamento de Pirada. Era um celeiro. Pode ver-se o refeitório.

-2ª, do lado direito > Pirada > Fevereiro de 1964 > Construção de um dos abrigos

-3ª , do lado esquerdo > Pirada > Março de 1964 > Obras de ampliação do Quartel e continuação dum abrigo com troncos de cibe

4ª, do lado direito > Pirada > Janeiro de 1965 > Em primeiro plano o Martinho Gramunha Marques, de que te falei, eu e o Sarg Piedade.

5ª, do lado esquerdo > Piche > Abril de 1964 > Comigo um comerciante de Pirada, chamado Mário Soares, depois o conhecido Dr Luís Góis e o Alf Spencer .

6ª, do lado direito > Foto que tirei há pouco tempo da empanagem da granada de morteiro que Maio de 1965, em Beli, quase me levava; caíu a cerca de um metro de mim.


Um grande abraço e desculpa se me estou a repetir.

Pinto

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Nota de L.G.:

(1) Vd. posts anteriores:

17 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1437: Estórias de Madina do Boé (António Pinto) (1): a morte horrível do Gramunha Marques e o ataque a Beli em que fui ferido

3 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1397: Ataque ao destacamento de Beli em Maio de 1965 (António Pinto, BCAÇ 512)

20 de Dezembro de 2006> Guiné 63/74 - P1384: Com o Alferes Comando Saraiva e com o médico e cantor Luiz Goes em Madina do Boé (António de Figueiredo Pinto)

18 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1378: António de Figueiredo Pinto, Alf Mil do BCAÇ 506: um veterano de Madina do Boé e de Beli

(...) " Alguns dados sobre a minha estadia na Guiné:

(i) Embarquei em Novembro de 1963, em rendição individual. Fui substituir um colega que se pirou para o Senegal;

(ii) Estive algum tempo em Nova Lamego, tendo sido, em seguida destacado para Pirada onde reconstrui o aquartelamento.

(iii) Estive algum tempo em Geba, zona na altura um bocado perigosa, mas sem problemas.

(iv) Vim de férias em Outubro de 1964 (...);

(v) No regresso, fui destacado para Madina do Boé, tendo sido o primeiro pelotão a chegar lá onde montei o primeiro aquartelamento.

(vi) Depois fui para Beli , onde ao fim de algum tempo, e depois também de ter sido o primeiro pelotão a lá chegar e ter montado o destacamento, em Maio de 65, fomos atacados tendo aí sido ferido (mais seis companheiros) mas, felizmente ninguém morreu. Os meus ferimentos foram motivados pelo rebentamento de uma granada de morteiro, que me encheu o corpo de pequenos estilhaços, mas depois de um mês no hospital em Bissau, fiquei OK.

(vii) Depois de sair do hospital, mandaram-me para Bolama, dar instrução onde terminei a comissão.

quarta-feira, 20 de dezembro de 2006

Guiné 63/74 - P1384: Com o Alferes Comando Saraiva e com o médico e cantor Luiz Goes em Madina do Boé (António de Figueiredo Pinto)

Guiné > 1964 > Brá, Comandos > Equipa Os Fantasmas. "Foto do Furriel Artur Pereira Pires (ao meio, de bigode), a quem fui substituir, e da sua equipa, os Fantasmas, composta por António Joaquim Vieira Ferreira, Manuel Coito Narciso, José da Rocha Moreira e João Ramos Godinho. Foram umas das vítimas do rebentamento da mina em 28 de Novembro de 1964 [, na estrada de Madina do Boé para Contabane, a uma escassa centena de metros do pontão sobre o rio Gobige]" (JSP).


Foto: © João S. Parreira (2005). Direitos reservados.

Mensagem do novo membro da nossa tertúlia, o ex- Alf Mil António de Figueiredo Pinto, BCAÇ 506 (1963/65) (1):

Caro José Martins:

Foi por mero acaso que, pesquisando na Internet assuntos sobre a Guiné, encontrei o site do Amigo Luís Graça (feliz acaso !), apartir do qual e em pouco tempo começo a receber notícias de Amigos, que, como eu, passaram por terras da Guiné.

És o primeiro que eu constato que palmilhou muitos dos caminhos por onde andei. Já estou quase nos 68 anos, um bocado entradote na idade mas um novato nestas andanças de computadores e Internet.

A memória já me vai traindo um bocado, mas há momentos que jamais poderei esquecer e com certeza que me acompanharão para sempre. Guardei alguns documentos daquele tempo e, vasculhando-os, verifico que pertenci à 3ª Companhia de Caçadores, em Nova Lamego, e aos Batalhões de Caçadores, sediados em Bafatá, nºs 506 e 512 e finalmente ao Batalhão de Cavalaria nº 705.

Sobre Madina do Boé (2) estive lá no 2º ano de comissão, lembro-me que fomos os primeiros a lá chegar e montar o 1º aquartelamento que ficou ao fundo da estrada, onde havia uma escola desactivada. Os primeiros tempos passámo-los sem sobressaltos de maior até que houve o 1º ataque, não posso precisar a data. Não tivemos feridos.

Há um episódio, no entanto, entre vários, que me marcou bastante. Vou tentar resumi-lo:

Uma tarde estávamos no Destacamento, quando, de repente, ao fundo da tal estrada vimos chegar, com grande alarido dois ou três jipes com uma velocidade inusitada e alguém aos gritos, que só conseguimos entender quando chegaram à nossa beira. Era um grupo de Comandos, chefiados pelo alferes Saraiva (um homem tremendamente marcado pela guerra em Angola, onde assistiu à morte de familiares seus ) . Aos berros, pediu-nos viaturas e homens para efectuar uma operação (de que eu não tinha conhecimento ) nos arredores de Madina. De tal maneira ele estava transtornado que chegou a puxar de pistola para um Furriel do Destacamento, que esta a apertar as botas, tal era a sua pressa.

O que não posso esquecer é o pedido que um dos nossos soldados fez para substituir o condutor duma viatura, salvo erro, uma Mercedes, argumentando que, sendo ele pequeno ( e era-o de facto) se uma mina rebentasse ele saltava com mais facilidade, pedindo só para deixar tirar a capota da viatura. Não me recordo do nome dele mas vejo-o constantemente...

Essa patrulha, em que não participei, pois o Saraiva não o permitiu, foi atacada, após o rebentamento de minas. Morreram vários camaradas nossos, entre eles o referido condutor, que teve uma morte horrorosa.

Alguns desses camaradas deixaram este mundo nos meus braços e nos do médico que, na altura, estava conosco e que é por demais conhecido - o Luiz Goes, que todos conhecem, com certeza, pelos seus fados de Coimbra (3).

Este foi um dos momentos mais dramáticos que vivi na Guiné (4), para além de outros, especialmente em Beli, onde fui ferido e que noutra altura relatarei.

Penso não estar a ser fastidioso.

Tu mo dirás se posso relatar outros factos que agora se estão a soltar e vir ao consciente.
Fiquei bastante emocionado ao ver no teu contributo de Memórias da Guiné ao ver o nome do meu maior Amigo, dentre tantos Amigos que lá tive - Martinho Gramunha Marques. Sobre ele também gostaria de falar um dia.

Amigo José Martins, breve voltarei, se não fôr inconveniente.
Um grande abraço.Tudo de bom para ti e toda a tua Família.

Pinto

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Notas de L.G.:

(1) Vd. post de 18 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1378: António de Figueiredo Pinto, Alf Mil do BCAÇ 506: um veterano de Madina do Boé e de Beli

(...) "Alguns dados sobre a minha estadia na Guiné:

(i) Embarquei em Novembro de 1963, em rendição individual. Fui substituir um colega que se pirou para o Senegal.

(ii) Estive algum tempo em Nova Lamego, tendo sido, em seguida destacado para Pirada onde reconstrui o aquartelamento.

(iii) Estive algum tempo em Geba, zona na altura um bocado perigosa, mas sem problemas.

(iv) Vim de férias em Outubro de 1964, conhecer o meu primeiro filho, com 3 meses de idade.

(v) No regresso, fui destacado para Madina do Boé, tendo sido o primeiro pelotão a chegar lá onde montei o primeiro aquartelamento.

(vi) Depois fui para Beli, onde ao fim de algum tempo, e depois também de ter sido o primeiro pelotão a lá chegar e ter montado o destacamento, em Maio de 65, fomos atacados tendo aí sido ferido (mais seis companheiros) mas, felizmente ninguém morreu. Os meus ferimentos foram motivados pelo rebentamento de uma granada de morteiro, que me encheu o corpo de pequenos estilhaços, mas depois de um mês no hospital em Bissau, fiquei OK" (...).

(2) Vd. posts recentes do José Martins:

18 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1292: Madina do Boé: contributos para a sua história (José Martins) (Parte I)

15 de Dezembro de 2006> Guiné 63/74 - P1370: Madina do Boé: contributos para a sua história (José Martins) (Parte II)

(3) Vd. blogue Fado de Coimbra e... > Luiz Goes

(...) "Luiz Fernando de Sousa Pires de Goes nasceu em Coimbra, em 1933 e licenciou-se em Medicina, em Outubro de 1958.

"Sobrinho de Armando Goes (que foi contemporâneo de Edmundo de Bettencourt, António Menano, Lucas Junot, José Paradela de Oliveira, Almeida D’Eça e Artur Paredes), Luiz Goes cedo se iniciou nas cantorias do fado por influência de seu tio.

(...) "Terminado o curso de Medicina em 1958, Luiz Goes fixou-se em Lisboa como médico estomatologista. De 1963 a 1965 o cantor prestou serviço militar na Guiné, na guerra colonial, como alferes-médico. Mas depois, continuou a sua carreira artística, como aliás se demonstra pela quantidade de discos que gravou a partir dessa altura.

"Nesta segunda fase, Luiz Goes foi acompanhado, à guitarra, por Carlos Paredes (que com ele participou na gravação de discos, embora sob pseudónimo), por João Bagão, António Andias, Aires de Aguiar e esporadicamente, por Jorge Tuna e Octávio Sérgio; à viola, por Fernando Alvim, João Gomes, António Toscano, Fernando Neto, e Durval Moreirinhas.

"Para além de excelente intérprete, Luiz Goes é também autor da música e da letra de muitos fados e baladas de Coimbra (25 e 18 respectivamente)" (...).

(4) Julgo tratar-se do mesmo episódio já aqui evocado pelo Virgínio Briote (que comandou o Grupo de Comandos Diabólicos):

Vd. post de Virgínio Briote, de 13 de Dezembro 2005 > Guiné 63/74 - CCCLXV: Brá, SPM 0418 (3): memórias de um comando (Virgínio Briote).

Extracto:

"Novembro de 64, dia 28. Na estrada de Madina do Boé para Contabane, a uma escassa centena de metros do pontão sobre o rio Gobige, os Fantasmas detectaram uma mina anti-carro. Levantaram a mina e simularam o rebentamento. Ficaram emboscados nas proximidades cerca de 2 horas. Viram um grupo IN aproximar-se e afastar-se logo que deram pela presença de mulheres na estrada. Uma hora depois viram um elemento IN a fugir. Afinal, estavam em igualdade de circunstância, todos sabiam da presença uns dos outros.

"No dia seguinte voltou com o grupo ao local. Meteu-se com alguns soldados no Unimog mais pequeno à frente, e encaixou dezasseis militares no Unimog maior atrás. A 1ª viatura passou, a outra, uma dezena de metros atrás, não. Pisou uma mina. Ao mesmo tempo que em cima deles caía uma chuva de balas de armas automáticas, o Unimog incendiou-se e as munições explodiram como foguetes num arraial minhoto. Quase todos os homens foram projectados a arder. 7 mortos logo ali e três feridos graves. Tinham partido 22 de Bissau, regressaram doze. Com o grupo dizimado, poucos dias depois arrancou com os restantes para uma operação".