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segunda-feira, 12 de fevereiro de 2024

Guiné 61/74 - P25160: Álbum fotográfico do Padre José Torres Neves, ex-alf graduado capelão, CCS/BCAÇ 2885 (Mansoa, 1969/71) - Parte XIV: visita a Dugal e Encheia


Foto nº 1A


Foto nº 1B


Foto nº 1C


Foto nº 1


Foto nº 2


Foto nº 3


Foto nº 3A


Foto nº 4


Foto nº 5


Foto nº 6


Foto nº 6A


Foto nº 7


Foto nº 7A


Guiné > Região do Oio > Sector 4 (Mansoa) > BCAÇ 2885 (Mansoa, 1969/71) > sd > Visita do capelão  Dugal e Encheia>


Fotos (e legendas): © José Torres Neves (2023). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. O nosso camarada Ernestino Caniço mandou-nos mis umas fotos do ex-capeláo José Tores Neves, ontem, às 11h35

Caros amigos

Votos de ótima saúde.

Na foto em Dugal (nº 7) e Encheia (nº 1), à esquerda parece-me o Padre (civil) Patrocínio, sediado em Mansoa.

Um abraço,

Ernestino Caniço


2. Continuação da publicação do álbum fotográfico do Padre José Torres Neves, ex-alf graduado capelão, CCS/BCAÇ 2885 (Mansoa, 1969/71) (*).

Hoje algumas fotos da sua visita a Encheia, destacamento e a tabanca que ficava a noroeste de  Mansoa ms que, na altura, pertencia a outro Sector, o Secto Oeste 1 (O1), originalmente com sede em Bial e depois Bissorã (incluia os subsetores de Bissorã, Olossato, Bibar, Bissum, Encheia, Nhamate e Biambe). A responsabilidade deste Sector O1 era do BCAÇ 2861. Em Encheia estava a CCAC 2466. Não sabemos o que é o nosso capelão lá foi fazer, se calhar foi visitar a missão católica, e o padre Patrocínio.

 A organização e a seleção das fotos são feitas pelo seu amigo e nosso camarada, o médico Ernestino Caniço, ex-alf mil cav, cmdt do Pel Rec Daimler 2208 (Mansabá e Mansoa), tendo passado depois pela Rep ACAP - Repartição de Assuntos Civis e Ação Psicológica, (Bissau) (Fev 1970/Dez 1971).

O José Torres Neves é missionário da Consolata, ainda no ativo. Deve estar com 87 anos (!). Vive num país africano de língua oficial portuguesa. Esteve no CTIG, como capelão de 7/5/1969 a 3/3/1971. Estamos-lhe muito gratos pela sua generosa partilha.

As fotos (de um álbum com cerca de 200 imagens) estão a ser enviadas, não por ordem cronológica, mas por localidade, aquartelamentos ou destacamentos do sector de Mansoa (O4)  e, neste caso, do setor O1 (Bissorã).

Vamos tentar legendar as fotos, com os escassos elementos que temos:

Foto nº 1 > Encheia: o padre José Torres Neves, fardado, parece ser o segundo elemento da foto de grupo, a contar da direita; do lado esquerdo, o padre Patrocínio e a seu lado um elemento da administração, talvez o chefe de posto.

Foto nº 2  e 3 > Encheia: Missão católica, escola;

Foto nº 4 > Capelinha de Encheia;

Foto nº 5 > Encheia, vista de canoa, ao fundo;

Foto nº 6 > Chegada a Encheia, de canoa; em primeiro plano, mãe, em equilíbrio instável,  segura criança (às costas) e alguidar (à cabeça);

Foto nº 7 > Dugal (que ficava a meio caminho entre Nhacra e Mansoa).


Guiné > Carta da antiga Província Portuguesa da Guiné > Esca 1/500 mil (1961) >Posição relativa de Bissau, Nhacra, Dugal, Mansoa, Porto Gole, Encheia e Bissorã


Infografia: Blogue LUís Grça & Camaradas da Guiné (2024)


Guiné > Região do Oio >  Mansoa > Dois elementos da CCAÇ 413 (1963/65), junto à placa toponímica que indicavam algumas das localidades mais próximas  e respetivas distâncias: (i)  para sudoeste, Nhacra, a 28 km, e Bissau, a 49 km);  (ii) para sudeste, Porto Gole, 28 km;  (ii) para Leste (Enxalé, a 50 km; Bambadinca, a 65 km, e Bafatá, a 93 km); (iv) para noroeste, Encheia, a 18 km. 

Foto do livro «Nos celeiros da Guiné», de Albano Dias Costa e José Sá-Chaves, com a devida vénia: vd. poste  P21130.

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terça-feira, 5 de dezembro de 2023

Guiné 61/74 - P24922: Fichas de unidade (32): CCAÇ 15 (Bolama e Mansoa, 1970/74); divisa: "Taque Tchife" (Agarra à mão)

Crachá e brasão da CCAÇ 15 


Fichas de unidade > Companhia de Caçadores nº 15

Identificação: CCaç 15

Cmdt:

  • Cap Inf Manuel José Reis do Nascimento
  • Cap Inf Luís da Piedade Faria
  • Cap Mil Inf João Nuno Rocheta Guerreiro Rua
  • Cap QEO José Eduardo Marques Patrocínio
  • Cap Inf Idílio de Oliveira Freire
  • (oficial n/ identificado)
  • Alf Mil João António de Magalhães

Divisa: "Taque Tchife" (Agarra à mão)"

Início: 29Jan70 | Extinção: finais de Ju174

Síntese da Actividade Operacional

Foi constituída e organizada no CIM, em Bolama, com quadros e algum pessoal especialista metropolitano e o restante pessoal natural da Guiné, da etnia Balanta, sendo inicialmente designada por CCaç Balanta e tomando a designação de CCaç 15 a partir de 28Fev70.

 Após a instrução inicial, efectuou a IAO no CIM, em Bolama, de IS a 28Fev70.

Em 04Mar70, deslocou-se para Mansoa, a fim de substituir a CCaç 2857 na  função de intervenção e reserva do sector, tendo actuado em diversas operações na região de Locher-Changalana, na interdição da ligação Sara-Sarauol e na segurança e protecção de itinerários e dos trabalhos das estradas Mansoa-Bissorã e Jugudul-Bambadinca. 

Destacou ainda pelotões para reforço de outras guarnições, nomeadamente de Mansabá, de 08 a 25Nov70 e de Cutia, de 27Nov70 a finais de Mar71).

Em finais de Ju174, foi desactivada e extinta.

Observações - Tem História da Unidade até 31Mar72 (Caixa n." 130 - 2." Div/4." Sec, do AHM).

Tem 22 referências no nosso blogue. Na Tabanaca Grande temos dois camaradas que pertenceram à CCAÇ 15: o António Sampaio e o Joaquim Mexia Alves.

Fonte - Adapt de Portugal. Estado-Maior do Exército. Comissão para o Estudo das Campanhas de África, 1961-1974 [CECA] - Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974). 7.º volume: fichas das unidades. Tomo II: Guiné. Lisboa: 2002, pág. 635
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Nota do editor:

segunda-feira, 4 de dezembro de 2023

Guiné 61/74 - P24916: Notas de leitura (1643): "Era Uma Vez na Tropa, Rescaldos da guerra em desfile de memórias", por Ireneu de Sousa Mac; Europa Editora, 2022 (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 6 de Junho de 2022:

Queridos amigos,
Permitam-me justificar a minha incredulidade face à leitura desta narrativa. Passado meio século, manda a sabedoria do perdão que acompanha os velhos, há ressentimentos, azedumes e horas más que passam para a categoria dos desperdícios. Irineu Mac apresenta-se como uma exceção, di-lo frontalmente: 

"Toda a guerra depois de finda ainda vive em nós. Uma guerra não acaba enquanto houver um último sobrevivente e enquanto os familiares ou amigos que sofreram danos colaterais tiverem memória. Aqui são retratadas as vivências de um miliciano, em jeito de alter ego, forçado a entrar numa guerra de causas e motivações alheias em condições muito adversas".

 É uma narrativa confessional, onde a guerra propriamente dita e a sua relação com os outros merece escassos parágrafos, no entanto, terá vivido uma experiência bem dura em territórios marcadamente hostis em derredor de Mansoa, foi cofundador e professor na escola regimental de Mansoa, voluntariou-se na escola primária da aldeia na preparação para exames de 4.ª classe, são assuntos tratados de raspão, questionamos porquê, numa narrativa onde o timbre é dado pelos tais azedumes e recordações de que a idade nos liberta, tal como ele observa nos encontros de ex-combatentes teimamos nesta bonomia de avançar para o outro de braços abertos.

Um abraço do
Mário



Lembranças da CCAÇ 15 (1970-1971), com amargores e ressentimentos

Mário Beja Santos

É cada vez mais raro encontrar nas obras de cunho memorial sobre a guerra colonial algo que fez parte da 1.ª fase deste ramo literário: os ajustes de contas, a revolta incontida pelos comportamentos militarões, o azedume pelo facto da tropa ter impedido os estudos, a catilinária sobre a absurdez e a perversidade daquelas guerras. 

A idade e o peso da memória fazem outros escrutínios, é aquela sabedoria em que o fel e a bílis já não têm papel na nossa vida. Era Uma Vez na Tropa, Rescaldos da guerra em desfile de memórias, por Ireneu de Sousa Mac, Europa Editora, 2022, é uma história pessoal de um furriel miliciano que pertenceu à Companhia de Caçadores Nativos, a 15, sediada em Mansoa. Revela que lhe interromperam os estudos, que o mundo desabou à sua volta, estava preste a concluir o 7.º ano de liceu. Quando regressou era uma amostra de si próprio, pesava 54kg com 170cm de altura, já tinha os dois irmãos mais velhos nas penas de África, ainda hoje não consegue esquecer o olhar de despedida e a compaixão de familiares e amigos quando lhe disse que ia para a Guiné. 

A guerra não acabou para Mac. É a vivência na Guiné que ele vai relatar. Antes, porém, conta-nos que estudou num colégio privado, chegou o dia mais infeliz da sua vida, assentou praça nas Caldas da Rainha, confessa que nunca foi capaz de abrir o baú e deixar que as memórias viajassem pelo mundo fora. Agora, já está mais descontraído, fala-nos da sopa intragável, dos treinos nas serranias laterais ao rio Séqua, estava desarranchado, tinha um companheiro de quarto que acabou por desertar. 

“As atitudes danosas e injustas da tropa, deixaram ao Mac marcas desagradáveis e de aversão, ainda hoje, à flor da mente e dentro da pele”.

Irineu Mac esboçou a arquitetura sobre a forma de diálogos com o amigo, há pergunta e resposta, e depois de se falar em classificações do curso, ei-lo que parte em rendição individual para CCAÇ Nat 15. 

“O mundo de Mac sofre um segundo terramoto. Faliram os projetos, desabaram os sonhos. Nunca mais o futuro se escreveu da mesma maneira”

E parte, em estado lúgubre, em 3 de fevereiro de 1970. Dá-nos a nota de rodapé a composição do quadro de oficiais, sargentos e praças oriundos da metrópole, juntam-se todos em Bolama, onde diz que as condições de vida eram péssimas. E partem para Mansoa, descobre que não pode vir a férias até à metrópole por ter 8 dias de prisão no cadastro, coisas que se passaram em Tavira, tudo má sorte. Tira carta de condução de mota. Foi forçado a ir votar num cidadão qualquer, coisas de eleições do Estado Novo. Conta a história de uma cobra que se escapuliu para um buraco da bota, segue-se um rol de peripécias, mete caça, comida, a vida em Cutia tinha as suas durezas. Não se escapa às considerações erótico-sexuais. Não lhe escapou à memória uma encenação feita para jornalistas estrangeiros, um simulacro de combate na mata, uma autêntica montagem cinematográfica. Há acidentes com armas, fala-se de ataques de abelhas.

Nova confissão, há ressentimentos que pesam: 

“Mac foi impelido para a tropa pela intimação, pela força da lei e dos homens dominados, pela obsessão na qual não navega a razão. Ainda tentei, por duas vias, adiar a tropa para a incorporação seguinte. Em especial porque queria muito concluir o ano letivo. Nunca obtive resposta. Voltei com a guerra às costas. Sem bater à porta, fez-se de convidada, entrou sem autorização e sentou-se à mesa da vida. Enquanto a malária, de febre em riste, entrava pelo postigo, pelas frestas das janelas e pelos interstícios dos telhados. Mas não penses que foi fácil regressar. Inventavam atrasos atrás de adiamentos. Já nos íamos adentrando pelo 25.º mês e ainda não tínhamos sido substituídos. Quanto mais o tempo passava, mais o medo aumentava e a coragem e a vontade de arriscar escasseavam. Ninguém queria morrer ao quebrar da onda na areia”.

Há referências esporádicas a operações, patrulhamentos, situações de fogo cruzado. E vem a história de Zé Mamede que em outubro de 1970 abalou de Mansoa em direção ao seu destacamento, Infandre. Chegou notícia cerca do meio-dia de ter havido uma emboscada entre Braia e Infandre, foi logo gente em auxílio. 17 feridos, 10 mortos, entre eles o Zé Mamede. O alter ego de Mac pergunta-lhe se o Zé Mamede deve ser homenageado enquanto herói, resposta do Mac: 

“O Zé Mamede não é herói. É uma vítima, mortal, inocente, de estratégias alheias e inconsistentes das ideologias reinantes. O Zé é uma vítima de ambições de grandeza desproporcionadas, ultrapassadas e nefastas. O Zé é uma vítima da ambição errónea e condenável de outros. Da opção do orgulhosamente sós”.

Mais adiante, sentencia:

“Jamais psicólogo algum ou alguma psiquiatria salvará do trauma a quem matou mesmo para sobreviver”.

O alter ego de Mac tem acesso à sua correspondência:

“A solidão é a minha companheira. Oh esperança, não me abandones! Fica comigo. Agora. Alimenta e alenta a minha vida em frágil equilíbrio sobre o gume das armas. Agora.” 

Escreveu poesia. Em jeito de rememoração, dá-nos a saber que fazia parte da estratégia de Spínola formar companhias de caçadores nativos de elite, Mac integrou uma força operacional, atuou nas matas cerradas. Deu trabalho, mas ao fim daquele tempo todo, foram metidos num avião, regresso a Lisboa. Ficamos a saber que entre a tropa metropolitana e os soldados africanos houvera solidariedade devido à luta vital conjunta que se travava. E descreve demoradamente as peripécias do regresso. Confessa ao seu alter ego: 

“Não tenho estátua, mas tenho um louvor e uma insígnia. Não me perguntes como nem porquê. Nem sei bem responder. O que posso garantir é que, decerto, não foi pela minha valentia ou por qualquer ato de heroísmo. Acredito que possa ter sido por me voluntariar a instaurar uma escola regimental para os soldados africanos aprenderem a ler. E isso bastou-me para obter benefícios propinários, deu-me direito a isenção de propinas extensível aos filhos. Cumpri deveres porque me sujeitei a eles. Também não abdiquei daquele direito. Contudo, preferia não os ter tido”.

Despede-se do leitor, desta vez sem azedumes nem ressentimentos:

“A guerra tira, mas também dá. Enobreceu em nós o espírito de entreajuda e o sentido da amizade. Continuamos unidos pela amizade construída sobre a solidariedade vivida nas matas do Oio, do Olossato, do Morés, do Changalana, do Locher. Eu sei que, ainda hoje, essa união se mantém na trajetória de muitos ex-combatentes. Eu sei porque tenho observado muitos dos seus almoços-convívios. Paro, sempre extasiado pelos abraços emotivos que vejo”.

Vista parcial do destacamento de Cutia, imagem extraída do blogue Rumo a Fulacunda, com a devida vénia
Localização do destacamento de Cutia
Crachá da CCAÇ 15
Estandarte do CCAÇ 15
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Nota do editor

Último poste da série de 3 DE DEZEMBRO DE 2023 > Guiné 61/74 - P24912: Notas de leitura (1642): Boletim da Sociedade Luso-Africana do Rio de Janeiro (1931-1939) - Parte III: A lenda de Ohbapuma (ilha de Orango, arquipélago dos Bijagós)

domingo, 12 de novembro de 2023

Guiné 61/74 - P24843: S(c)em Comentários (15): Ainda a propósito da Operação Jaguar Vermelho, levada a efeito entre 26MAI e 11JUN70, na Região do Morés, com a participação da CART 2732 (Carlos Vinhal)

Localização do MORÉS - Região do Oio - no triângulo formado pelos itinerários Mansoa-Bissorã-Mansabá-Mansoa
Infografia: © Luís Graça & Camaradas da Guiné

Recorte da pág. 486 do 6.º Volume - Aspectos da Actividade Operacional - Tomo II - Guiné - Livro II da Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974)


1. Ainda a propósito da Operação Jaguar Vermelho, levada a efeito entre 26MAI e 11JUN70, na Região do Morés, transcreve-se o constante nas páginas da HU da CART 2732:

DA HU DA CART 2732, CAP II / FASC 1 /PÁG 6 E 7:

26 DE MAIO DE 1970 - INÍCIO DA OPERAÇÃO "JAGUAR VERMELHO"

Na 1.ª Fase, de 25 a 26MAI, 02 GCOMB emboscaram em MAMBONCÓ sem resultados.

Em 30MAI, a CART a 4 GCOMB reforçada com 01 SEC do PEL MIL 250, deslocou-se para a Regiãi de CÃ QUEBO. Ao entrar na mata de CÃ QUEBO, foram detectados 02 elementos IN armados. As NT abriram fogo sem que estes fossem atingidos. Fez-se uma batida a numerosos trilhos e vestígios da fuga IN. Montada uma emboscada sem resultado. Às 19h00 encontro com um grupo IN armado com armas aur. e mort. 60. As NT abriram fogo pondo em debandada o grupo IN, e, por ser escuro, não se efectuou batida.

Em 31MAI às 05H00 iniciou-se a batida à procura de casas de mato cuja localização aproximada se adivinhava. Em FARIM 1A5 encontradas 4 tabancas que foram destruídas, tendo sido apanhados 2 carregadores de arma aut. e material sem significado. Às 18H00, golpe de mão a um aldeamento com cerca de 100 casas, já abandonado, onde foram capturadas munições de armas ligeiras e utmsílios domésticos. Em FARIM 1A5 montou-se uma emboscada e apareceram 2 el IN que fugiram depois de as NT abrirem fogo sobre os mesmos. Fez-se uma batida e então o IN estimado em 2 grupos fortemente armados, emboscou as NT causando um ferido (milícia), e 1 praça do Pel Caç Nat partiu um dedo ao fazer fogo de morteiro.

Em 01JUN foi pedido fogo de artilharia pois ouviam-se vozes e tinha-se que passar a bolanha para o regresso a MANSABÁ onde se chegou pelas 15H00.

Na 2.ª fase, de 03 a 05JUN, 2 GCOMB montaram emboscada em FARIM 1F3 sem resultados.

Em 07, a Companhia a 4 GCOMB deslocou-se em meios auto para MAMBONCÓ. As NT dirigiram-se para BIGINE. Encontraram em seguida o trilho CAI-MORÉS que não tinha nenhuns vestígios de passagem. Montaram emboscada e pernoitaram na zona. No dia seguinte dirigiram-se a TAMBATO. Dirigiram-se depois à bolanha de MANSOA 9I3 para serem reabastecidos de água e fazerem a evacuação de 3 doentes. Cerca das 16H00 à ordem iniciaram o regresso à estrada CUTIA-MANSABÁ onde chegaram às 17H30.

Posição relativa de Mansabá-Cã Quebo-Bigine e Cai. © Infografia da Carta de Farim 1:50.000 (Luís Graça & Camaradas da Guiné)
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Notas do editor

Vd. poste de 9 DE NOVEMBRO DE 2023 > Guiné 61/74 - P24836: A minha ida à guerra (João Moreira, ex-Fur Mil At Cav MA da CCAV 2721, Olossato e Nhacra, 1970/72) (16): HISTÓRIA DA COMPANHIA DE CAVALARIA 2721: Capítulo II - Actividades no TO da Guiné - Operação "Jaguar Vermelho", de 26 de Maio a 8 de Junho de 1970 na região do Morés

Último poste da série de 10 de Novembro de 2023 > Guiné 61/74 - P24838: S(c)em Comentários (14): Os fulas, que se alistaram nas forças armadas portuguesas, valorizavam o dinheiro, mas nunca perdiam de vista o mais importante que eram objectivos políticos a longo prazo (Cherno Baldé, Bissau)

Guiné 61/74 - P24842: Álbum fotográfico do Padre José Torres Neves, ex-alf graduado capelão, CCS/BCAÇ 2885 (Mansoa, 1969/71) - Parte XIII: Cutia: últimas fotos: mulheres, bajudas e crianças sempre à volta de um recurso escasso mas vital para a sua comunidade, a água











Guiné > Região do Oio > Sector 4 (Mansoa) > BCAÇ 2885 (Mansoa, 1969/71) > Cutia > s/d> Mulheres, bajudas e crianças sempre à volta de um recurso vital, para a sua comunidade, a água.

Fotos (e legendas): © José Torres Neves (2023). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Continuação da publicação do álbum fotográfico do Padre José Torres Neves, ex-alf graduado capelão, CCS/BCAÇ 2885 (Mansoa, 1969/71).

Anexa-se a última parte da série de fotos sobre Cutia, destacamento e a tabanca que ficava a meio caminho entre Mansoa e Mansabá. (*)

Na altura, havia em Cutia um Pelotão da CCAÇ 2589 / BCAÇ 2855 (Mansoa, 1969/71) e ainda o Pel Caç Nat 61 (ou Pel Caç Nat 57) e ainda um Esquadrão do Pel Mort 2004. 

A organização e a seleção das fotos são feitas pelo seu amigo e nosso camarada, o médico Ernestino Caniço, ex-alf mil cav, cmdt do Pel Rec Daimler 2208 (Mansabá e Mansoa), tendo passado depois pela Rep ACAP - Repartição de Assuntos Civis e Ação Psicológica, (Bissau) (Fev 1970/Dez 1971).

O José Torres Neves é missionário da Consolata, ainda no ativo. Deve estar com 87 anos (!). Vive num país africano de língua oficial portuguesa. Esteve no CTIG, como capelão de 7/5/1969 a 3/3/1971. Estamos-lhe muito gratos pela sua generosa partilha.

As fotos (de um álbum com cerca de 200 imagens) estão a ser enviadas, não por ordem cronológica, mas por localidade, aquartelamentos ou destacamentos do sector de Mansoa.
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Nota do editor:

(*) Último poste da série > 19 de setembro de  2023 > Guiné 61/74 - P24671: Álbum fotográfico do Padre José Torres Neves, ex-alf graduado capelão, CCS/BCAÇ 2885 (Mansoa, 1969/71) - Parte XII: Cutia: capinadores, missa, coluna para Mansoa, Berliets

quinta-feira, 12 de outubro de 2023

Guiné 61/74 - P24749: Ataques ou flagelações com foguetões 122 mm: testemunhos (3): A guerra vista do CAOP1 (Canchungo/Teixeira Pinto, Mansoa e Cufar, 1972/74) (António Graça de Abreu)


Lisboa > Museu Militar > O foguetão 122 mm ou a arma especial Grad (ou ainda "jacto do povo", na gíria do PAIGC). Capturada em Cufar, em 1/1/1973.

Era uma arma de artilharia, de bater zona e não de tiro de precisão, com alcance máximo de 11.700 metros para 40º de elevação. Segundo um relatório do PAIGC a distância maior a que se efectuou tiro, teria sido contra Bolama, em 4 de Novembro de 1969, a 9.800 metros. 

O foguete dispunha de um perno (assinalado a vermelho) que, percorrendo o entalhe em espiral existente no tubo, imprimia uma rotação de baixa velocidade a fim de estabilizar a vôo. As alhetas só se abriam depois do foguete sair do tubo.  

Fotos (e legenda): © Nuno Rubim (2007). 
Todos os direitos reservados. [Edição e kegendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Abreu, António Graça de - "Diário da Guiné: Lama, Sangue e Água Pura". Lisboa: Guerra e Paz, Editores. 2007, pp. 104-105. (Capa do livro, reproduzida com a devida vénia).


BI militar, emitido em Teixeira Pinto, 
6 de agosto de 1972.



1. Do nosso camarada e amigo, António Graça de Abreu publica-se uma série de excertos do seu Diário da Guiné: Lama, Sangue e Água Pura (Lisboa: Guerra & Paz Editores, 2007, 220 pp), com o descritor "foguetões 122 mm" (*),

Selecionámos as passagens em que há referências a ataques ou flagelações a aquartelamentos e destacamentos com foguetões 122 mm, enquanto ele esteve no CAOP1 (Canchungo ou Teixeira Pinto, Mansoa e Cufar, 1972/74).

Tudo somado, ao fim de quase dois anos de comissão foram muitas centenas de rebentamentos, vistos ou ouvidos,  com especial especial destaque para os que caíram no sul, na região de Tombali... 

O António  esteve em Cufar, no CAOP1, de junho de 1973 a abril de 1974.  Mais uma vez, com a devida vénia ao nosso camarada que nos autorizou a utilização do seu trabalho...

Tudo indica que junto à fronteira o PAIGC, no final da guerra (1973/74 (e contra aquartelamentos como Bedanda e Gadamael),  já utilizava viaturas com o sistema de  lançamento múltiplo (ou multitubo) de foguetes 122 mm: nas flagelações ou ataques, já não se limitavam a lançar dois ou três foguetes, mas dezenas, e durante uma ou duas horas. A CECA faz referência ao sistema de lançamento múltiplo de foguetes BX-10, mas não lhe chama Grad ou BM-21 Grad. (Há uma grande confusão com as várias versões deste sistema e as suas siglas...)
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Canchungo, 7 de Julho de 1972

(...) Recebi carta da minha mãe. Diz-me que foi ao Porto e que, por amor de mim, colocou um grande ramo de flores no altar de Santo Ildefonso, na igreja da praça da Batalha. Que o santo me proteja!

Mas não me parece viver em situação de grande perigo. Tenho muitos privilégios, não sou propriamente um operacional, não saio para o mato de G 3 em punho em busca do IN. Há apenas o problema dos bombardeamentos, flagelações ou de uma emboscada na estrada.

Quase há um ano que Canchungo não é atacada pelo PAIGC. A última vez, a 3 de Agosto de 1971, foi com foguetões 122 disparados a onze quilómetros de distância. 

Durante quatro minutos sobrevoaram o quartel, sibilando no ar e foram rebentar lá longe, na bolanha, nos arrozais a sul. Foi só susto, não houve mortos nem feridos, apenas um capitão, ao fugir, caiu numa vala e partiu uma perna.
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(...) Canchungo, 22 de Agosto de 1972

Existe um CAOP 2. Fica em Nova Lamego, terra dos homens de etnia fula, lá no leste, não muito longe da fronteira. É uma zona menos pacífica do que a nossa. Foram agora flagelados com foguetões 122

Não sei ainda o que são, nem o estrago que provocam. A semana passada, nos arredores de Nova Lamego, uma mina anti-carro fez ir pelos ares um camião Berliet, tendo provocado 19 feridos, alguns graves. Nova Lamego nem é do pior. 

Aqui a nordeste, o aquartelamento de Olossato foi bombardeado a semana passada durante hora e meia. Nós, em Canchungo, fomos atacados (?) durante um minuto. O ataque em Olossato veio de todas as direcções com um potencial de fogo de arrepiar. No entanto, não se deve abrir muito a boca nesta guerra, as nossas tropas só tiveram um ferido grave e três feridos ligeiros. Os abrigos e as valas para alguma coisa servem.
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(...) Canchungo, 27 de Janeiro de 1973

Mansoa é o nosso destino. Entre as três possibilidades, Bula, Bissorã e Mansoa, não sei qual é a melhor, é dos tais casos em que “venha o diabo e escolha.”

Pouco sei sobre Mansoa, o meu baluarte nos próximos catorze meses. Mas é a maior das três que nomeei atrás e tem uma vantagem, a sua proximidade de Bissau - uns 60 quilómetros, -   e o facto de existir uma estrada asfaltada onde se circula normalmente sem escolta. Para oeste, entre Mansoa e Bissau, o IN não actua. No entanto, a vila é menos pacífica do que Teixeira Pinto. Para norte, leste e sul já os guerrilheiros se movimentam entre a malha dos aquartelamentos portugueses e encontram-se bases IN não muito distantes. Não vou falar mais da sagrada e intocável Caboiana, agora vai ser o Morés, o Queré, o Choquemone, o Oio.

Mansoa tem a grande desvantagem de “embrulhar” em média uma vez por mês. Tanto quanto sei, fazem pontaria para o quartel e disparam os foguetões 122, os canhões sem recuo, a uma distância que varia entre os quatro e os dez quilómetros. 

Eles são maus artilheiros, não costumam acertar na tropa e pelo que tenho lido nos relatórios diários que historiam esta guerra, quem normalmente paga as favas nas flagelações a Mansoa é a população negra das tabancas. A tropa tem abrigos, os disparos IN acertam com mais facilidade nas casas da vila do que no quartel.
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(...) Mansoa, 12 de Março de 1973

Bissá, um pequeno aquartelamento doze quilómetros a sul de Mansoa, foi atacado sábado passado às nove e meia da noite, estava eu a beber um café na esplanada do Simões, o restaurante. Foi um ataque a sério que se prolongou por quarenta e cinco minutos, apesar da distância ouviam-se os disparos e rebentamentos com muita nitidez. Os dois obuses de Mansoa ajudaram ao barulho e dispararam cinquenta e sete granadas de canhão sobre as zonas prováveis de retirada do IN. Só hoje soube os números.

Resultado, o IN destruiu e queimou oitenta e sete tabancas, houve três mortos entre a população, muitos feridos e gente intoxicada. As NT de Bissá não sofreram nada, além do desgaste psicológico que uma flagelação tão dura como esta costuma provocar.

Mantive-me tranquilo, mas se em vez de Bissá a ser atacada tivesse sido Mansoa diria, por certo, adeus à pacatez e à calma. Estar dentro de um quartel cercado de arame farpado e experimentar as sensações fortes de ouvir os foguetões, as granadas de morteiro e canhão sem recuo a vir em nossa direcção ou a cair não muito longe de nós, faz com que os rebentamentos comecem a ficar cá dentro. 

Agora entendo melhor porque é que, depois do regresso a Portugal, um ex-combatente ouve um foguete rebentar na romaria da aldeia e corre, tremebundo, a esconder-se no primeiro buraco que lhe aparece.
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(...)  Mansoa, 19 de Março de 1973

Foi a vez de Infandre “embrulhar”, um aquartelamento com quarenta militares e cerca de mil habitantes, dez quilómetros a norte daqui. Levaram com foguetões, canhão sem recuo, RPG, morteiros, armas automáticas, foram atacados com um enorme potencial de fogo. No destacamento, não houve feridos, apenas os usuais estragos materiais. A pobre da população é que pagou as favas.

Em Infandre, como em muitos outros lugares da Guiné, os negros tanto fazem o nosso jogo como apoiam o PAIGC. Mas a população é sempre infeliz. Nas flagelações à distância, os guerrilheiros não acertam na tropa portuguesa e acabam por provocar mortos e feridos nos habitantes negros que tantas vezes até não lhes são adversos. É a guerra impiedosa, cruel.
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(...) Mansoa, 6 de Maio de 1973

Os militares do quartel de Bula, ainda na zona se acção do CAOP 1, estão a passar por dificuldades. A vila fica mais perto de Bissau do que de Mansoa, a norte, e é um lugar estrategicamente importante. Um grupo grande de guerrilheiros anda por lá a fazer estragos. Numa emboscada próxima da povoação, as NT tiveram sete mortos, quatro soldados brancos e três negros e bem podem agradecer a Deus. Eram só trinta e cinco soldados portugueses contra duzentos guerrilheiros, não foram todos dizimados por acaso.

Em seguida, Bula foi atacada com foguetões, sem consequências. O batalhão da terra é constituído por “periquitos” acabados de chegar de Portugal, inexperientes e medrosos. Os guerrilheiros sabem que eles são novos na Guiné e vá de atacar, atacar, atacar.

O meu coronel [paraquedista, Rafael Durão, comandante do CAOP1] foi hoje de urgência para Bula, às cinco da manhã, orientar as operações de contra-guerrilha, dar força aos militares de lá. Seguiu sozinho de jipe, por companhia apenas a sua espingarda Kalashnikov, em sessenta quilómetros de estrada. 

Se o itinerário não é muito perigoso porque atravessa zonas controladas pelas NT, não posso deixar de reconhecer a coragem deste homem, já com mais de dois anos de comissão na Guiné. Tenho tido os meus problemas com ele, sobretudo devido à minha incompetência como pequeno oficial do exército, mas reconheço-lhe uma enorme valentia e excepcionais qualidades de comando.

Ao meio-dia e meia hora, estava de regresso a Mansoa, de novo sozinho no jipe, depois das reuniões com os oficiais de Bula. Voltou célere porque para hoje estava marcado um almoço de despedida em sua honra, oferecido pelos oficiais e sargentos do CAOP1. Não me admira que amanhã parta outra vez para Bula, ou para qualquer outro lugar da Guiné onde se justifique a sua presença, o seu comando de operações. (...)
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Sistema ou rampa de lançamento monotubo de foguetões 122 mm. Arma, de origem soviética, capturada  em 1 de janeiro de 1973 em operação a partir de Cufar.  Tinha sido usada no ataque a Cufar a 23 dezembro de 1972, atingiu a pista de aviação, sem consequèncias de maior. Cortesia da página da CCAÇ 4740  (Cufar, 1972/74 > Fotografias de sempre. 


(...) Cufar, 25 de Junho de 1973

Não estou encantado com o lugar que vim encontrar, mas Cufar é melhor do que eu imaginava. Em termos de guerra, segurança pessoal, companheiros de armas e instalações.

Ponto Um: Estou no sul da Guiné, rios, canais, bolanhas, florestas. Até Dezembro de 1972, isto era quase tudo território do PAIGC. Havia os aquartelamentos de Catió, Cufar e Bedanda bem defendidos onde a tropa portuguesa não punha muito o nariz de fora. 

Em Abril de 1972 estiveram por aqui observadores do Comité de Descolonização da ONU para conhecer as realidades das zonas libertadas pelos guerrilheiros. Vieram de Conacry, entraram pela zona de Guileje, chegaram até perto de Cufar, sempre a pé, abrigados pelas florestas. (...)

Há três meses, em Março [de 1973], Cufar foi atacada com uma dezena de foguetões 122. Só um caiu dentro do nosso arame farpado e, por incrível que pareça, bateu numa árvore, tombou para uma vala onde estavam quatro soldados e não rebentou. Só vendo se acredita, e eu vi. Os soldados penduraram na árvore o resto da fuselagem do foguetão, como um autêntico troféu de guerra. O local fica a trezentos metros da minha secretaria e esta tarde voltei lá para confirmar o que os meus olhos tinham visto, claramente visto. (...) 
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Cufar, 2 de Julho de 1973

Catió “embrulhou” ontem às seis e meia da tarde. Seis foguetões, como de costume caíram fora do quartel. Em Cufar, ouvem-se sempre os rebentamentos mas a maioria do pessoal está tão habituado que já nem estranha. Hoje, às seis da manhã, acordei com mais pum, catrapum, pum, pum, tão diluídos na distância que voltei a adormecer. Era Gadamael.

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(...) Cufar, 20 de Julho de 1973

 A guerra acalmou, sossegou na nossa zona. Anda tudo admirado, mas isto tem uma explicação, é por causa da época das chuvas que conhece agora o seu auge. Chove todos os dias, as bolanhas, o mato enchem-se de água, é difícil caminhar quilómetros e quilómetros por trilhos na floresta, carregando às costas foguetões, morteiros, granadas, etc., para flagelar um aquartelamento. Num ataque em forma, o terreno precisa de estar firme para um bom apoio e eficiência das armas mais pesadas. No período das chuvas, a terra está mole, húmida, empapada em água. As saídas das granadas de morteiro, por exemplo, fazem com que o tubo de morteiro recue e se enterre no solo. Com as chuvas, os guerrilheiros aproveitam a menor actividade das NT para se reabastecerem, construir tabancas, trabalhar nos arrozais.

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(...) Cufar, 26 de Setembro de 1973


 O PAIGC declarou ontem  a independência. Por aqui nada mudou a não ser que agora, oficialmente, somos nós portugueses quem está a ocupar a pátria deles.

Temos um novo tenente-coronel no CAOP 1, com apenas cinco dias de Guiné. Andou pelo Estado-Maior e fez comissões em Angola e Moçambique, sempre nas delícias do ar condicionado. Está a estranhar as realidades deste abençoado lugar. Ontem até chamou Cafur a Cufar! 

No dia em que chegou, Bedanda esteve aí a “embrulhar” durante uma hora, com foguetões 122, mais de trinta, sem consequências. Meio assustado, o tenente-coronel perguntou-me: “Isto é sempre assim?” Eu respondi-lhe: “Não, meu tenente-coronel, isto costuma ser muito pior!”
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(...) Cufar, 8 de Novembro de 1973

 Os dias fabulosos, as histórias que não conto, os whiskies que bebemos, às vezes a morte, espantalho de sangue agitado ao vento diante da menina dos olhos.

De madrugada, Gadamael, chão com cadáveres, juncado de medos. Quarenta e seis foguetões 122 disparados pelos guerrilheiros do PAIGC sobre o aquartelamento, aqui a sul, na fronteira. Apenas me apercebi de rebentamentos distantes, no sono do resto da noite. É normal, já nem estranho. Mas na mente de cada um de nós, a preocupação cresce. Quarenta e seis foguetões sobre Cufar, como seria?

As bebedeiras, cerveja, vinho, whisky, o álcool a circular no sangue temeroso. Os homens tontos de mágoa, solidão e medo.

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(...) Cufar, 11 de Novembro de 1973

 Outro dia duríssimo para Gadamael. Às seis da manhã, eu dormia mas acordei sonolento com os muitos rebentamentos distantes. Foram duas horas de flagelação com quarenta e dois foguetões 122. Tiveram dois mortos e muitos feridos.

Quando chegou a Cufar, o meu tenente-coronel “periquito” vinha cheio de ideias para pôr num brinquinho o que resta do CAOP 1. Começa a baixar a cabeça, a entrar na realidade. Ficou alterado com os ataques a Gadamael, hoje à noite apanhou uma bebedeira monumental. As pessoas, quer as do pequeno, quer as do grande mando, quando têm vinho dentro ficam claras como água.

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Guiné >Região de Tombali > Cufar> CAOP 1 > O António Graça de Abreu, de camuflado, à esquerda, no aeródromo de Cufar, com o alf mil Miguel Champalimaud.
 
Foto (e legenda): © António Graça de Abreu (2008). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem comp'lementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné


(...) Cufar, 14 de Novembro de 1973

Vieram os “jactos do povo”, como os guerrilheiros lhes chamam. Gostei, desta vez não apontaram aos vizinhos do lado, era connosco e, como costuma acontecer, tivemos sorte. Foram disparados oito foguetões 122 e só rebentaram três, a mais de quinhentos metros de Cufar.

Eram oito da noite, eu estava no gabinete do capitão a jogar xadrez com o Eiriz, o alferes das transmissões, quando ouvimos o silvo de um foguetão e um primeiro rebentamento. Saltámos rapidamente para a vala situada ao lado do edifício onde já havia gente abrigada, caímos uns por cima dos outros e ficámos quietinhos, à espera. Uns dez minutos depois, porque não havia mais foguetões, saímos da vala, não muito assustados. Foi um ataque pequeno, daqueles que só servem para criar insegurança e medo.

O médico, o Bastos, ficou por baixo de uma molhada de alferes e saiu da vala zangadíssimo, agastado com o Miguel Champalimaud (sobrinho do António Champalimaud, o “tio Patinhas” português). O rapaz caíra-lhe em cima e, com os foguetões a rebentar, o Miguel peidara-se, cagara-se como um rei por cima da cabeça do Bastos. Uma cena de antologia digna do Chaplin, do “Charlot nas Trincheiras da Guiné”. (...)

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(...) Cufar, 21 de Novembro de 1973

Guerra todos os dias. Ontem às seis de tarde, hoje às seis da tarde. Ontem foi Cobumba, estávamos a começar a jantar e pum, catrapum, pum, pum. Alguns de nós saltaram das mesas e começaram a correr para as valas. Cobumba fica aqui mesmo ao lado e como têm lá uma nova companhia de “periquitos”, os guerrilheiros trataram de lhes fazer condigna recepção, com foguetões, morteiros, canhão sem recuo, tudo a disparar numa cadência de fogo impressionante. O pessoal de Cobumba teve sorte, estão lá estacionados quatrocentos homens – a companhia velha e os “periquitos” que os vêm substituir – e não sofreram uma beliscadura.

Hoje foi a vez de Gadamael, já não era atacada há dois dias e meio! Embora muito mais distante do que Cobumba, ouviam-se os rebentamentos com extrema nitidez. Foram só vinte minutos de fogo, também a um ritmo capaz de assustar o mais valente, as granadas rebentavam de dez em dez segundos. Não sei se houve consequências para as NT em Gadamael, mas a flagelação foi tremendamente feia. O ataque a Cufar dia 13 passado, comparado com estes dois que ouvi ontem foi uma brincadeira.


Em resumo, a nossa tropa anda acagaçada. O PAIGC movimenta-se, põe, dispõe e manda lembranças. Começamos a ver a guerra com os olhos cada vez mais tortos. A aviação actua, os Fiats fartam-se de bombardear aqui em redor, numa cintura aí de quarenta quilómetros. Volta e meia ouvimos o zumbido dos aviões a jacto e os rebentamentos secos das bombas a cair. (...)
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(...) Cufar, 4 de Dezembro de 1973


Mais foguetões 122 e de novo para Cufar, direccionados para o interior do nosso aquartelamento. O Chugué, há dois dias levou com vinte e cinco foguetões, sem consequências, Gadamael tem sido tão flagelada, com consequências, que já perdemos a conta ao número dos foguetões. Nós, mais humildes, fomos brindados com dez projécteis explosivos disparados durante quinze minutos.

Eram nove e um quarto da noite, eu estava na varanda do meu quarto a ouvir a BBC e senti o silvo, os rebentamentos próximos. Logo de seguida soaram as rajadas das nossas metralhadoras. Os foguetões IN caíram todos fora do perímetro de Cufar, felizmente. É o costume, são disparados de muito longe, a onze quilómetros de distância, os guerrilheiros têm má pontaria, os foguetões são difíceis de orientar, ou desorientam-se no ar, e por isso não costumam acertar. Mas assustam, assustam sempre.

Vim ter com os meus soldados. Havia uma certa excitação, ainda para cúmulo choveu esta tarde. As valas estavam cheias de água e lama, e uma vez mais havia soldados que saíam das valas cobertos de lama, borrados de medo.

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(...) Cufar, 9 de Dezembro de 1973

 Esta noite fui obrigado a ir dormir a cama alheia. Ao chegar ao quarto, deparei com uma majestosa invasão de formigas gigantes baga-baga, aquelas que ostentam umas tenazes afiadas e mordem como santolas. Haviam entrado por duas frinchas na parede grossa e começavam a fabricar o seu formigueiro exactamente sob o vão do colchão da minha cama. Não as contei, mas seriam cinco a dez mil formigas laboriosas e trabalhadoras que tinham tido o bom gosto de habitar o espaço onde durmo. Era tarde, quase meia-noite, estivera a jogar xadrez, limpei cinco alferes, começo a jogar bem. Depois, não havia insecticida à mão e, à paulada, não era fácil correr com aqueles milhares de monstros pequeninos. Por isso, peguei nos meus lençóis, na almofada e resolvi ir pedir asilo ao meu amigo alferes Neto, da 4740, que habita um quarto grande, com duas camas.

Às cinco menos dez da manhã, fomos acordados pelos pum, catrapum, pum, pum. Era Cobumba, os nossos vizinhos mais próximos. Mais um ataque filho da puta! Estava tudo a dormir e durante meia hora a cadência de fogo era impressionante. Se fosse connosco, lá teria eu de fugir em cuecas para a vala. Cobumba levou o tratamento do costume, foguetões, canhão sem recuo, RPG e morteiros. Também como é habitual, nem uma beliscadura nos duzentos homens que por lá padecem.

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Guiné >Região de Tombali > Cufar> CAOP 1 > O António Graça de Abreu, no aeródromo  de Cufar, em dezembro de 1973, posando junto a um heli, Alouette III. No mês anterior, o aquartelamento de Cufar tinha sofrido uma flagelação com foguetões 122, e um ataque com RPG [lança-granadas foguete] e armas automáticas, nas proximidades dos arame farpado... Dezete meses depois do início da comissão, o António recebia finalmente o tão desejado quanto temido baptismo de fogo. Recorde-se que o António Graça de Abreu foi alf mil, CAOP 1, Teixeira Pinto, Mansoa e Cufar (1972/74), e trabalhou diretamente com o cor prqt Rafael Durão, seu comandante (e em relação ao qual não esconde a sua admiração pelas suas qualidades como militar).

Foto (e legenda): © António Graça de Abreu (2008). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem comp'lementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné


(...) Cufar, 21 de Janeiro de 1974 

Cumpriu-se um ano sobre o assassinato do Amílcar Cabral e o PAIGC comemorou a data. Aqui na zona atacaram os aquartelamentos de Gadamael, Cafal, Cafine, Cadique, Cobumba, Bedanda, Chugué, Catió e… Cufar. 

Eram dez da noite, sozinho no quarto, lia umas “Vidas Mundiais” antigas e ouvia uma cassete com o Concerto de Aranjuez, de Joaquin Rodrigo. Por cima da guitarra e dos violinos espanhóis gravei outra música, outro concerto, uma parte do ataque, rebentamentos, tiros, rajadas, mais rebentamentos, meti na fita a minha reacção onde se nota algum nervosismo e se ouvem demasiados palavrões. Assim:
(…)

Boum, boum, pum, catrapum, pum.
-Aí está, um ataque!... Caralho! Um ataque, foda-se!

Tá, tá, tá, tá, tá.
- Um ataque, caralho! Venham mais. Aí vêm elas!...

Boum, boum…
- Tumba, um foguetão, caralho!...

Boum, boum, tá, tá, tá, tá, tá, tá, tá, pum.

- Dá mais Manel! Estamos a levar no coco, estamos a “embrulhar”, caralho!

Pum, catrapum, tá, tá, tá, tá, tá, tá…
- Espera aí um bocadinho!

Boum…
- Espera aí que me eu vou-me já vestir, espera aí um bocadinho!
- Tumba, aí vem outra… Toma lá mais!... Espera aí um bocadinho, João…

Boum, boum…
- Estou-me a vestir, é preciso é calma!

Boum, pum, pum…

- Espera aí um bocadinho, estou-me a vestir, é preciso é calma.

Boum, boum…
- Estamos a “embrulhar”, caralho! É preciso ter calma. Estou no meu quarto. Hoje é o dia…

Boum, boum…
- Tumba, tumba, tumba!...

Boum, boum, tá, tá, tá, tá, tá, tá, tá, tá, tá, tá tá, tá, tá, tá, tá, pum, catrapum, pum...

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(...) Cufar, 22 de Fevereiro de 1974

Regressei [de Bissau,] no Nordatlas, na viagem certinha até cá abaixo. Tudo calmo em Cufar. No nordeste da Guiné, em Copá junto à fronteira, é que tudo vai mal. Mal para as NT, bem para o IN. Ouvi falar num ataque com cem foguetões, valha-lhes Deus! Começa a ser insustentável aguentar Copá.

Em Portugal as coisas também aquecem, com manifestações contra a carestia de vida organizadas pelos maoístas do MRPP. Houve pancadaria da grossa, três polícias feridos, um deles levou uma pedrada na cabeça. O povo não anda bom.

Em Bissau rebentou uma bomba no quartel-general. E que dizer do novo livro de António de Spínola “Portugal e o Futuro”? O antigo Caco Baldé, meu ex-comandante-em-chefe, propõe soluções federalistas para a resolução dos conflitos do Ultramar. O livro vai ter sucesso entre os liberais, o grupo do Balsemão e do “Expresso, e também entre alguma da Oposição. Abençoadamente, agitará os espíritos de muitos portugueses.

O Marcello Caetano começa a ficar exasperado. No essencial, o mestre de Direito limitou-se a dar continuidade à política de Salazar e não sabe, ou esqueceu-se, como diz o Bob Dylan que “the times, they are a’changin”. O general Spínola aponta caminhos enviesados, é verdade, mas indica possíveis saídas para o pântano fétido em que vivemos.

Que futuro para Portugal?
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(...) Cufar, 28 de Fevereiro de 1974

O nosso 1.º sargento Afonso informa-me que o tal alferes Saldanha nomeado para me render, já está em Bissau mas não virá para Cufar, foi colocado na secretaria do Batalhão de Comandos, no Cumeré, logo ali às portas da capital. Quer isto dizer que já estou substituído na província, o que vai acelerar a minha rendição definitiva. A partir de Bissau, o 1.º Afonso é impecável, interessa-se pela nossa vida, conhece todas as capelinhas de Bissau, trata dos nossos assuntos com extremo cuidado e rigor. É um diamante no CAOP1.

Mais uma história de guerra. D. Cecília Supico Pinto, a “generala Cilinha” do Movimento Nacional Feminino anda de visita à Guiné, a dar coragem e conforto moral aos briosos militares que defendem a integridade do império. 

No seu peregrinar por este sagrado solo pátrio desembarcou segunda-feira passada em Cacine, de helicóptero, às nove da manhã. Às onze o aquartelamento foi atacado com trinta e seis foguetões, uma flagelação que se prolongou por hora e meia. Só se registaram alguns estragos em tabancas, mas dizem-me que a Cilinha mostrou alguma coragem, aguentou-se muito bem, aninhada como toda a gente no fundo de uma vala.
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(...) Cufar, 12 de Março de 1974

Os guerrilheiros continuam a marcar pontos. Caboxanque tem sido massacrada. Ontem, flagelação às quatro e vinte da madrugada. Acordei sobressaltado. Caboxanque fica mesmo aqui em frente, a oito quilómetros em linha recta e, ao ouvirem-se os primeiros rebentamentos, não sabemos se é com os outros ou connosco. Estes nossos vizinhos estão a ser atacados todos os dias.

Bedanda, ontem, também esteve sob o fogo dos foguetões durante duas horas. Tiveram dois feridos, um deles gravíssimo, com um estilhaço na cabeça. Noite, escura desceram o rio até Cufar, depois, a cena habitual, iluminar a pista, esperar pelo Nordatlas, evacuar o rapaz para Bissau.

Não estamos livres, um destes dias de sermos também atacados. Todos pensamos nisso, todos pensamos que da próxima vez pode ser qualquer um de nós a levar com um estilhaço, a ser desfeito por um projéctil qualquer.

Ontem também tivemos um problema grave mas de outra natureza, um enorme incêndio. Se soprasse mais vento ardiam as tabancas todas dos negros. As casas são construídas com estacas e adobe, têm telhados de colmo, não chove desde Dezembro, está tudo ressequido e em três tempos o fogo avançou de tabanca em tabanca. Arderam seis.

Parece que o incêndio começou com o rebentamento de um fogareiro a petróleo. Teria sido fácil controlá-lo se não se tivesse pegado à tabanca do lado onde o pessoal das Fox, as viaturas blindadas, guarda o seu material e tem uma espécie de paiol. Ora com as tabancas a arder e com muitas granadas dentro de uma delas, foi um festival de rebentamentos e estilhaços projectados pelo ar. A maioria da população negra fugiu para longe, mesmo assim houve imensa sorte porque ninguém foi atingido. Mais desgraças para os pobres negros que ficaram sem casa.

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(...) Cufar, 3 de Abril de 1974 

A guerra está feia. Bedanda embrulhou durante todo o dia, um ataque tremendo, doze horas consecutivas de fogo. A festa só acabou à noite com uma espécie de cerco à povoação levado a cabo pelos homens do PAIGC.

Em Cufar, tão próximo, além de distinguirmos nitidamente as rajadas de metralhadora de mistura com os rebentamentos dos RPG, foguetões e canhão, à noite viam-se as balas tracejantes e as explosões no ar. 

Uma novidade, os guerrilheiros utilizaram viaturas blindadas na flagelação a Bedanda. Existe uma estrada que vem da Guiné-Conacry, passa junto a Guileje – abandonada pela tropa portuguesa, – entra pela região do Cantanhez e termina em Bedanda. O IN está a utilizar esse percurso para deslocar camiões carregados com todo o tipo de armamento, em seguida é só despejar sobre os aquartelamentos portugueses mais expostos e fáceis de alcançar, como Chugué, Caboxanque, Cobumba, Bedanda, Cadique e Jemberém.

Bedanda é uma povoação grande, a maior do sul da Guiné depois de Catió. Terá uns cinco mil habitantes e ontem já se falava em abandonar o aquartelamento. A população africana saiu da vila, ficando por próximo.

Bedanda levou com mais de sessenta foguetões e centenas e centenas de granadas de RPG, morteiro e canhão sem recuo. Foi medonho, há muita coisa destruída, mas tiveram sorte, contam-se apenas dois feridos, um furriel e um negro que levou um tiro nas costas. A tropa passou mais de doze horas metida nas valas.

Espera-se novo ataque a Bedanda. As NT já foram remuniciadas e há promessa de se enviarem mais militares para defender a terra. Os guerrilheiros também devem ter ido descansar e reabastecer-se.

Todas estas flagelações, apesar de serem destinadas aos vizinhos do lado, deixam marcas em todos nós. São horas, dias, meses a ouvir continuamente o atroar dos canhões da guerra. Eu ando um bocado desconexo, excitado, “apanhado”. Quase não tenho dormido, são as sensações finais, o cansaço, o desamor à mistura com o alvoroço do regresso a casa. (...)

(Seleção / revisão e fixação de texto / Negrios e realces a amarelo: LG)
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Nota do editor: