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segunda-feira, 18 de dezembro de 2023

Guiné 61/74 - P24971: Notas de leitura (1650): "Comandante Pedro Pires, Memórias da luta anticolonial em Guiné-Bissau e da construção da República de Cabo Verde - Entrevista a Celso Castro, Thais Blank e Diana Sichel"; FGV Editora, Brasil, 2021 (2) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 14 de Junho de 2022:

Queridos amigos,
Entrevistado na dimensão ainda em voga da História Oral, o comandante Pedro Pires fala da sua vida ao serviço do PAIGC e do PAICV. Confesso que me toca positivamente o que ele comenta quanto à dedicação às causas pela luta da independência dos dois países, não há para ali nem charamelas nem o vemos atrelado a nenhuma carro triunfal, resistiu a muita insídia e comentários soezes por parte da oposição, quando perdeu em 1991, faz-nos ver que Cabo Verde caminha saudavelmente como uma democracia liberal, é um verdadeiro farol africano. Não se entenderá, à luz dos conhecimentos históricos, que continue a dar como certo e seguro que Spínola e a PIDE/DGS mandaram matar Amílcar Cabral, foi mantra de grande conveniência durante algum tempo, acontece que não há nenhum, absolutamente nenhum, documento que comprove qualquer ligação do Governo de Bissau, da delegação da polícia política com o assassinato de Cabral, houvesse e dele se teria feito a devida publicitação, mas não há, não houve marinha portuguesa à espera do barco de Inocêncio Kani, e é preciso ter um grande estômago para pôr como coordenador do complô Momo Touré, não sei como pessoas com pesadas responsabilidades históricas ainda têm e tanta desfaçatez, e parecem aliviadas quando propalam tais inverdades.

Um abraço do
Mário



Comandante Pedro Pires, memórias da sua vida e da sua luta na Guiné-Bissau (2)

Mário Beja Santos

Pedro Verona Pires, após a sua deserção das Forças Armadas portuguesas juntou-se ao PAIGC em Conacri, foram-lhe atribuídas múltiplas missões, acompanhou a luta da libertação da Guiné-Bissau e de Cabo Verde. Após a independência de Cabo Verde, foi Primeiro-ministro entre 1975 a 1991 e seu Presidente de 2001 a 2011. Este livro sobre o Comandante Pedro Pires é o resultado de uma longa entrevista realizada em Cabo Verde por uma equipa da Escola de Ciências Sociais da Fundação Getúlio Vargas: Comandante Pedro Pires, Memórias da luta anticolonial em Guiné-Bissau e da construção da República de Cabo Verde, entrevista a Celso Castro, Thais Blank e Diana Sichel, FGV Editora, Brasil, 2021. O entrevistado regista a história da sua vida, mediada pelo método da História Oral. Obviamente que nos vamos circunscrever das suas declarações até à independência da Guiné-Bissau e sequelas da rutura Guiné-Cabo Verde.

Pedro Pires assume elevadas responsabilidades na luta da Guiné-Bissau, é um quadro político de peso e é nessa altura que é questionado pela equipa entrevistadora sobre o assassinato de Amílcar Cabral em 20 de janeiro de 1973. Começa por referir que Amílcar Cabral já tinha alertado sobre a probabilidade desse risco, a partir da recolha de várias informações de amigos no seio do exército português. Considera ter havido falhanço nos serviços de segurança, o próprio Amílcar Cabral não teria dado o valor necessário a tais informações. Nesse dia, 20 de janeiro, Pedro Pires encontrava-se na base de Kandiafara, na Frente Sul, as informações pareciam suspensas, só quase ao anoitecer é que alguém lhe veio dizer que ouvira na BBC a notícia do assassinato. Através de um emissário enviado a Boké receberam-se pormenores dos acontecimentos pelo responsável local, José Pereira, fora em Boké que Inocêncio Kani fora detido.

Uma semana depois, na companhia de outros líderes, como Nino Vieira e Cármen Pereira, estão em Conacri, assistem às cerimónias de homenagem a Amílcar Cabral, o ambiente encontrado era pesado e de muita tristeza. Pedro Pires propõe aos seus colegas do Comité Executivo de Luta a realização de uma reunião extraordinária para análise da situação, fez-se a reunião e traçaram-se novas linhas de orientação, todos voltaram para as frentes de luta, ele regressou à Frente Sul. Dá-se a sua visão sobre o apuramento das responsabilidades sobre os acontecimentos do assassinato, justifica a importância da operação Amílcar Cabral que tinha como objetivo geral a intensificação e multiplicação da ação militar nas três frentes, era necessário tornar a vida insuportável aos militares portugueses. Associa tais acontecimentos ao golpe de Estado de 25 de Abril, detalha ao pormenor o cerco a Guileje, e não deixa de ressalvar a diferença introduzida na luta pelos mísseis Strela. Fala num embate que teria tido lugar em território manjaco da qual um tenente dos Comandos africanos se passou para as forças do PAIGC.

A explicação para o assassinato do líder fundador do PAIGC pôde dar muito alívio a Pedro Pires, mas não tem qualquer consonância com factos documentais e elementos de prova. Que era urgente travar Amílcar Cabral antes que fosse tarde demais para a sobrevivência do Império português; que no plano interno português tinha crescido a oposição e o descontentamento pelos sacrifícios humanos, económicos e financeiros impostos ao país; que o prestígio e a credibilidade internacional de Amílcar Cabral atingira a sua quota máxima e estava em andamento uma dinâmica que devia conduzir à emergência do Estado soberano da Guiné-Bissau; que as autoridades coloniais, num esquema de guerra antissubversiva, aproveitara-se de alguns traidores que fomentaram a divisão do PAIGC entre guineenses e cabo-verdianos; refere antecedentes como a Operação Mar Verde, em que se procurara liquidar Amílcar Cabral; que Inocêncio Kani era o principal responsável pelo crime de traição.

Este mantra fez o seu percurso útil para liquidar os elementos do complô que os tribunais revolucionários decidiram, fez-se um hábil desvio histórico da fundamentada e multisecular tensão entre guineenses e cabo-verdianos, hoje é argumento de venda para puros nostálgicos, faz deliberadamente esquecer que não se podem entender os acontecimentos de novembro de 1980 e o afastamento da liderança cabo-verdiana na Guiné sem ter em conta a tensão existente em Conacri e mesmo nas bases do PAIGC no interior da Guiné, Pedro Pires nem refere que no dia do assassinato Inocêncio Kani esteve sempre na companhia de Osvaldo Vieira, e que este assistiu à distância ao assassinato do líder – pormenor de pouca importância, claro. Para consolo de nostálgicos e permanente enigma para a história é a destruição de todo o material que se acumulou sobre os julgamentos dos elementos associados ao assassinato. Há explicações que são de farsa, pôr o Momo Touré a liderar uma sedição de centenas de pessoas é por de mais caricato, não tinha nem envergadura nem credibilidade para tal cometimento. E penso que não se tem feito qualquer pressão para ouvir as figuras que participaram nos julgamentos (caso de Joaquim Chissano), que disseram ter lido toda a documentação (caso de Ana Maria Cabral), os testemunhos de quem compareceu em tribunal e não sofreu da pena capital, etc. São de presumir razões fundadas para manter esta pesada barreira de silêncio.

Pedro Pires fala do segundo congresso do PAIGC, da eleição de Aristides Pereira, a líder do PAIGC, e descreve-se o processo da Independência da Guiné-Bissau e tudo quanto aconteceu até ao reconhecimento de Portugal da Guiné-Bissau como Estado independente.

Não se pode desdizer que Pedro Pires não seja um homem de consciência tranquila sobre o seu comportamento político como Primeiro-ministro de Cabo Verde, e ele próprio explica os insultos miseráveis que sobre ele proferiram elementos de oposição. Teria tudo a ganhar em mostrar de corpo inteiro que soubera perder as eleições em 1991, que as calúnias proferidas ficaram por demonstrar, responde aos seus entrevistadores com elevado nível de tolerância, escusava de dizer qual era, no seu entender, a origem do MpD:
“Muitos foram militantes do PAICV. Por outro lado, houve gente de boa-fé entusiasmada com a abertura política que quis uma alternativa ao PAICV. Era um grupo heteróclito. Constituía uma autêntica frente dos contra. Faziam parte desta aliança ex-militantes do PAICV dececionados, os trotskistas, os herdeiros do colonialismo, os despromovidos socialmente que tinham perdido privilégios de classe, funcionários desonestos sancionados, os imediatistas à espera de resultados milagreiros em curto prazo, gente que discordava da Independência, também pessoas de boa-fé que queriam uma mudança do Governo e, ainda, os fiéis que acreditaram nas intrigas veiculadas pelo clero católico, pela rádio e pela imprensa escrita de inspiração católica. Foi mais ou menos isso. Era esse o contexto sociopolítico em que lutou o PAICV, naquela altura, e os adversários contra os quais se tinha batido”.

Comentários completamente escusados, diga-se em abono da verdade. Ao comandante Pedro Pires saem por vezes comentários que não o dignificam. Já aqui repontei com aquela sua tirada de que os Comandos Africanos cobiçavam trazer artigos das bases do PAIGC, eram artigos que eles não tinham à sua disposição no mercado da colónia, escreveu num prefácio do livro O PAIGC Perante o Dilema Cabo-Verdiano (1959-1974), de José Augusto Pereira, Campo da Comunicação, 2015. Enfim, dislates pouco abonatórios para um líder do seu tamanho.


Pedro Pires no serviço militar em Portugal
Pedro Pires na Guiné-Bissau
Entrevista de Pedro Pires a uma equipa da Escola das Ciências Sociais da Fundação Getúlio Vargas, junho de 2019: (https://www.youtube.com/watch?v=A7eXvPIwie8)
Ilha do Fogo, Cabo Verde
Pedro Pires nas cerimónias da Independência da Guiné-Bissau
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Notas do editor

Poste anterior de 11 DE DEZEMBRO DE 2023 > Guiné 61/74 - P24943: Notas de leitura (1648): "Comandante Pedro Pires, Memórias da luta anticolonial em Guiné-Bissau e da construção da República de Cabo Verde - Entrevista a Celso Castro, Thais Blank e Diana Sichel"; FGV Editora, Brasil, 2021 (1) (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 15 DE DEZEMBRO DE 2023 > Guiné 61/74 - P24960: Notas de leitura (1649): O Santuário Perdido: A Força Aérea na Guerra da Guiné, 1961-1974 - Volume II: Perto do abismo até ao impasse (1966-1972), por Matthew M. Hurley e José Augusto Matos, 2023 (3) (Mário Beja Santos)

quinta-feira, 17 de novembro de 2016

Guiné 63/74 - P16729: (In)citações (104): Um texto elucidativo... Onde se fala do Restaurante Bar Pelicano, de Momo Turé, do Tarrafal, da PIDE/DGS, do PAIGC... (Mário Serra de Oliveira)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Serra de Oliveira (ex-1.º Cabo Escriturário, Bissau, 1967/68), com data 12 de Novembro de 2016:

Prezado Carlos:

No decorrer dos anos, toda a gente tem altos na vida... mas, seja em que momento for, quando se recebe uma mensagem como que abaixo vou publicar - deixando aos teus princípios e do blogue, repassar - não há dinheiro no mundo que nos dê tanta saúde e alegria, como ler o dito texto, escrito por alguém que conheci e foi meu companheiro de trabalho n' "O Pelicano".

Mas, deixa-me explicar melhor:

Na sequência de um dialogo sobre os "problemas da Guiné",  eu, por conhecer pessoalmente, alguns dos intervenientes do diálogo, decido opinar dentro dos meus princípios e conhecimentos de causa. Incluso, mencionei Momo Turé - meu braço direito no dito Pelicano. Agora, repara só que... depois de mais de 50 anos (físicos) e cerca de 2 séculos de saudades, me sai esta mensagem, dirigida a 2 dos dialogantes - eu e outro respeitável guineense, vivendo em Paris.

Passo a transcrever...

Um texto elucidativo

"Aos dois interlocutores os meus respeitosos cumprimentos.

Ao Mário, pessoa com quem convivi durante três meses no Bar-Restaurante Pelicano da propriedade do senhor Marques, dono de Grande Hotel em Bissau.

Trabalhei como copeiro à noite (lavador de pratos e copos) e depois garçom no Bar, durante a tarde, ganhando 300$00 escudos guineenses por mês.

Tive o prazer de conviver também, no mesmo espaço, com o Momo Ture, aliás meu primo e vizinho de casas no Pilum de Baixo. Momo Ture foi companheiro da primeira hora de Rafael Barbosa e Amílcar Cabral.

Momo Ture participou da fundação do PAI. Diversas reuniões foram feitas na casa de Momo. Eu era um puto de 8 anos de idade, mas tinha consciência das coisas. Momo costuma nos reunir, pessoas da família,  para explicar as atividades sobre a gestação da política pela independência. Ele nos dizia é para amanhã não ficarem a lés das coisas. Ele perdeu a sua juventude toda na política que veio lhe rendendo prisões e morte. Passou de 7 a 8 anos nas masmorras da minha PIDE em Tarrafal,  Cabo Verde. Após 2 anos de libertado foi se juntar ao PAIGC. Quando foram libertados ele e o Aristides Barbosa, de origem caboverdiano-guineense,  foram os únicos que não assinaram o termo de arrependimento e de integração à bandeira portuguesa do ultramar. Isso está escrito e publicado. Por favor há farta documentação do PAIGC na Fundação Mário Soares, entre cartas, relatórios, atas de reuniões falando sobre a gestação da luta levada a cabo por este Partido, de 1959 até a independência.

Sobre o que problema de MOMO Ture no PAIGC,  só será esclarecido quando o PAIGC é o sucessor da PIDE em Portugal tornarem os arquivos e gravações públicos. Enquanto isso qualquer tentativa de esclarecimento e de discussão sobre a questão serão meras especulações. 

A você,  João Galvão. o meu irmão mais velho,  um forte abraço da Guiné, continuamos apesar de tudo o éramos antes da Luta e continuaremos sê-lo. 

Um abraço guineense também a você, Mário, um brilhante profissional na arte de gastronomia que ouso dizer não conheci um igual. Hoje a minha mulher me "gaba" de ser um bom cozinheiro e respondo a ela… graças a uma pessoa que conheci como o melhor inventor de pratos, o senhor".

Só por isto, vale a pena viver, para relembrar e ser feliz.

Creio que esta mensagem até daria alguma "luz" ao nosso camarada Mário Beja Santos" nas suas pesquisas, nas minhas... já cheguei a uma conclusão que farei constar em "Bissaulónia". Quando sai?... Eh pá, meti-me a fazer uma casa nova de raiz e isso atrasou o projeto do livro.

Deixo a tua consideração o texto acima.
Abraço fraternal
Mário de Oliveira
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Nota do editor

Último poste da série de 28 de setembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16532: (In)citações (102): As outras cartas da guerra... Do Umaru Baldé, da CART 11 e CCAÇ 12, para o Valdemar Queiroz (Parte IV): "Viva Médicas e Médicos Portugueses. Viva Portugal com os Negros Unidos" (sic) (carta de 15 de novembro de 2000)

segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Guiné 63/74 - P9231: Notas de leitura (313): Três Tiros da Pide, de Oleg Ygnatiev (Mário Beja Santos)

1. Mensagem de Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 18 de Novembro de 2011:

Queridos amigos,

Dei-me ao trabalho de reler os diferentes livros do jornalista soviético Oleg Ygnatiev em que ele especula sobre o assassinato de Cabral, numa tentativa de procurar responder às dúvidas do nosso camarada Mário Serra de Oliveira com quem o Momo Turé trabalhou no restaurante O Pelicano, mesmo à beira do Pidjiguiti.

Estou cada vez mais convencido que o Momo deu muito jeito à tese do braço longo da PIDE que ninguém até hoje apresentou provas, continua a conspiração de silêncio sobre a documentação do julgamento, não há uma só prova sobre os autores morais, como ainda recentemente recordou José Pedro Castanheira, autor de uma investigação de referência sobre o assassinato.

O Mário Serra de Oliveira e todos nós vamos esperar não sei quanto tempo até se saber a verdade sobre o assassinato de Cabral.

Um abraço do
Mário


Momo Turé nos livros de Oleg Ygnatiev

Beja Santos

O nosso confrade Mário Serra de Oliveira deu importantes esclarecimentos quanto à presença de Momo Turé em Bissau e a trabalhar no restaurante O Pelicano. Momo Turé, tal como Aristides Barbosa, são nomes recorrentes em toda a obra de Oleg Ygnatiev seja na biografia de Amílcar Cabral ou nos trabalhos que dedicou ao assassinato do líder carismático do PAIGC.

"Três Tiros da PIDE, quem, porquê e como mataram Amílcar Cabral", por Oleg Ygnatiev (Prelo Editora, 1975) foi um livro que teve algum sucesso na época, tanto em Portugal como na Guiné-Bissau. Numa concepção de Guerra Fria tinha todo o sentido incriminar a PIDE/DGS e forjar uma tese sem nenhum suporte documental. Um assassinato concebido por uma repressiva polícia política fazia esquecer o conjunto de executores, deixava no olvido as provas factuais do chamado julgamento de Conacri, decidido por Sekou Touré, sob a forma de amplo jurado internacional e, como é de todos sabido, não existe hoje um só depoimento ou registo das actas desse julgamento.

Como arquitectou o jornalista Oleg Ygnatiev os planos da conspiração? Deu-lhe um nome: operação “Rafael Barbosa”, pareceu-lhe bastante emblemático incriminar o antigo presidente do PAIGC liberto por Spínola em 1969, além de que Barbosa comprovadamente relacionou-se com Momo Turé e Aristides Barbosa, numa entrevista concedida a Leopoldo Amado, no âmbito da investigação que este historiador procedeu à volta da biografia de Aristides Pereira, Rafael Barbosa diz claramente que preparou a fuga destes antigos prisioneiros do Tarrafal conjuntamente com outros elementos.

Ygnatiev congeminou um diário de viagem em que vai atravessando as chamadas zonas libertadas e onde vão sendo referidos os nomes dos incriminados como Momo, Aristides Barbosa, Bacir Turé e Malã Nanko. Momo teria sido referenciado no final do ano de 1961 por um agente da PIDE/DGS em Bissau, mais concretamente no “Grande Hotel”, onde trabalhava como criado de mesa. Teria começado aí o seu recrutamento. Sem nenhum pejo, Ygnatiev fala no diz-se e no consta, logo a seguir a Momo ter sido colocado no Tarrafal: “A certa altura parece que alguém entregou à mulher de Momo um bilhetinho, que conseguiu por caminhos desconhecidos chegar às suas mãos. Várias pessoas se interessaram pela situação da família e mais uma vez ofereceram a sua ajuda à mulher de Momo, mas ela sempre respondia que ele lhe tinha deixado umas economias e que por enquanto tinham o indispensável para viver”.

Dentro deste relato inequivocamente romanceado, em 1969, o então director da PIDE em Bissau, numa reunião, refere que Momo deverá receber 200 contos para a reconstrução da sua casa, tal como lhe fora prometido. Logo após a sua libertação, em 3 de Agosto de 1969, Momo Turé aparece como chefe da sala do restaurante O Pelicano.

O relato de Ygnatiev mistura abusivamente diferentes situações, tece uma descrição mirabolante sobre o massacre de Jolmete, de 20 de Abril de 1970, diz que os oficiais foram baleados por terem oferecido resistência às forças de André Gomes, o que é uma rotunda mentira. O texto é de novo reconduzido para O Pelicano, alguém dá instruções a Momo, são indicados os nomes dos contactos, competirá a Momo e a Aristides Barbosa transcreverem as reuniões de direcção do PAIGC. Dentro deste plano, a PIDE comprometia-se a entregar dinheiro todos os meses à mulher de Momo, enquanto ele partia para Conacri, disfarçado de patriota. Vão adiante surgindo outros nomes como os de Inocêncio Cani e João Tomás, dirigentes punidos e afastados por graves irregularidades. Sem apresentar provas, como sempre, temos João Tomás nomeado como informador da PIDE através de contactos com comerciantes.

E para dar mais sabor ao relato, sem igualmente nunca ilustrar os nomes dos conspiradores atrás referidos, eles são insinuados como os executores da instrução nº 42/71, da Direcção-Geral de Segurança. Numa reunião partidária, Amílcar Cabral tirou de uma pasta 5 folhas de papel, dizendo tratar-se de um programa detalhado de acções subversivas contra o PAIGC, dizendo inequivocamente que dentro desse plano constava a liquidação do secretário-geral Amílcar Cabral e de todos aqueles que não aceitassem uma direcção política genuína de guineenses, referindo-se o nome de Rafael Barbosa como um dos mais influentes para a futura direcção. No final da reunião, os camaradas M e N ter-se-ão aproximado de Amílcar Cabral dizendo que tinham vistoriado os pertences pessoais de Momo, encontraram notas idênticas à da instrução da DGS. Em Bissau, António Fragoso Allas, o director da PIDE, teria ficado furioso com esta troca de informações.

Oleg Ygnatiev vai fazendo surgir outros nomes como os de Saidu Baldé e Mamadu Indjai que em 20 de Abril de 1973 é o responsável pela segurança de Amílcar Cabral. Em Conacri, ao longo de 1972, colaboradores de Cabral continua a insistir na destituição e ou prisão de pessoas como Momo e Aristides Barbosa, mas Amílcar Cabral ia sempre adiando essa decisão à espera de uma regeneração destes dirigentes subversivos e o livro termina com um conjunto de depoimentos sobre o assassinato de Amílcar Cabral e depois a menção à execução dos chefes do complô. Como é evidente, o autor não explica quem chefiava o complô, limita-se a referir nomes de acordo com a tese de que a PIDE preparara um plano para instalar quadros ressabiados junto de Cabral, a missão seria trazê-lo vivo para Bissau e eleger uma direcção fantoche pronta a executar os planos neocolonialistas de Spínola. Não vale a pena insistir que tudo isto é fantasioso, não há um só documento que abone o relato de Ygnatiev. Rafael Barbosa sempre considerou este plano sugerido tanto pela direcção do PAIGC, a partir do assassinato de Cabral, como pelas conjecturas de Ygnatiev como um puro delírio, disse sempre que Momo era um militante dedicado mas que não escondia a sua discordância com as teses da unidade Guiné/Cabo Verde.

Com esta releitura do livro de Ygnatiev penso ter respondido em voz alta a algumas da dúvidas do camarada Mário Serra de Oliveira que nunca esclareceu o Momo Turé em O Pelicano, ali estiveram juntos.
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 16 de Dezembro de 2011 > Guiné 63/74 - P9207: Notas de leitura (312): Arquitectura Sustentável na Guiné-Bissau (Manual de boas práticas) (Mário Beja Santos)

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Guiné 63/74 - P8984: Os nossos Seres, Saberes e Lazeres (34): Palavras de um senhor defunto, um livro de Mário Serra de Oliveira (1): Preâmbulo e Introdução

1. Mensagem do nosso camarada Mário Serra de Oliveira*, ex-1.º Cabo Escriturário, Bissau, 1967/68, com data de 1 de Novembro de 2011:

Olá. Amigos da Tabanca Grande!...
Esperando que os anexos acima possam ser visualizados convenientemente, gostaria de dizer que tentei colocar na página do Blogue mas não consegui.

Solicitei dica de como fazer isso directamente na página mas ainda não recebi.

Assim, para que saibam do que se trata, pois começa com a capa e contra capa do meu livro, seguido de um PREÂMBULO e... uma AUTOBIOGRAFIA CÓMICA... incluída no meu livro e, finalmente, a descrição da receita do batismo do vinho, com um rabinho de diálogo com o meu querido Tenente.

Há toda uma certa circunstância, anterior que deu origem ao batismo bem como o epílogo a seguir ao diálogo,que  passa pelo batismo do arroz - com motivações antecipadas bem como o abotoamento de $$$ por parte do Meu querido T... o qual eu enfrentei para não me ter por lorpa ou parvo... Foi um espectáculo que redundou em eu passar a abotoar-me com o dinheiro que algumas enfermeiras páras pagavam pelas refeições que comiam fora das horas normais de almoço ou jantar, o que eu tinha que estar a controlar.

Muitos outros episódios existem, tal como aquele de um Major Pára me ameaçar... dizendo:
- Ouve lá, oh Cabo... aquela bajuda trabalha para mim e, se eu sei que tu te metes com ela... levas uma porrada - disciplinar, claro - que nunca mais te endireitas!...

Porra... se eu não tinha feito nem tentado fazer nada!!! O que aconteceu foi que... bem melhor é contar desde o principio, noutro momento porque para hoje já chega!...

Um abraço a todos!...


PALAVRAS DE UM SENHOR DEFUNTO

PREÂMBULO DE AGRADECIMENTO

Prezados leitores!...
Antes de mais, permitam-me apresentar os meus muitos e sinceros agradecimentos por decidirem ler estas linhas o que, para mim, já é motivo de imensa satisfação porque este sonho que, creio, talvez fosse melhor expresso em dizer este objectivo foi algo que, realmente sempre tive na minha mente, incluindo o facto de que, pela vida fora, mesmo nos momentos mais difíceis da minha vida – e foram vários - sempre tive a ideia de, pelo menos tentar, escrever um livro ou mais!...

Aqui o estou a tentar fazer!...

Dito isso e, fosse o que fosse que despertou o vosso interesse ou a vossa curiosidade, quem sabe até se motivada pelo título do mesmo livro, faço sinceros votos para que não os defraude, ao mesmo tempo que junto um convite a estarem atentos para o meu próximo que faço planos de iniciar logo que este entre no mercado e cujo título poderá vir a ser O medo dos velhos.

O tema será exatamente isso, em referência à situação das pessoas idosas e desamparadas, quantas e quantas vezes aos empurrões de casa para casa dos filhos – se os tiverem - e, claro, se estes forem casados, também a casa dos genros e noras, o que nem sempre é a situação mais agradável e humana e, várias vezes, motivo de desavenças entre os familiares!...

Ao mesmo tempo estendo o convite para um outro que... em conjunto com o acima referido, está já meio alinhavado - e até quem sabe se não será este o seguinte – baseado em factos da minha experiência em África, - onde vivi cerca de catorze anos e meio e, se o conseguir escrever, tentarei realçar o triste episódio dos fuzilamentos politicos de alguns cidadãos Guineenses com quem, directamente trabalhei, entre os quais um militante do PAIGC, (sigla em referência ao grupo guerrilheiro africano pela luta de libertação da Guiné, até então denominada Guiné Portuguesa) - que tinha sido preso e enviado para o Tarrafal – prisão em Cabo Verd) - de nome Mário Mamadu Turé, mais conhecido como Momo Turé – meu braço direito quando eu era encarregado geral do Restaurante O Pelicano, na cidade de Bissau e que, segundo se constou, foi fuzilado por implicação (?) na morte de Amílcar Cabral – fundador (?) do PAIGC!...

Um outro - também fuzilado - de nome Domingos Demba Djassi, nativo da Guiné e ex-Sargento Fuzileiro, naquele tempo integrado nas Forças Armadas Portuguesas, ao qual, após desmobilização, lhe dei trabalho, passando ele a ser encarregado - ou meu braço direito também - num dos meus restaurantes conhecido como A Tabanca, na mesma cidade de Bissau!...

Este último, na foto seguinte, constou que foi morto por implicação no chamado 18 de Março de 1975 - ou seria noutra conspiração qualquer? - e, segundo zuns-zuns d’então, devido à sua participação da não totalmente exitosa... acção de assalto a Conacri - em [22 de Novembro de] n1970 - levada a cabo sob comando do extraordinário estratega militar, Comandante Alpoim Calvão - cuja resumida descrição é dada mais adiante.

Agora, em referência a este livro e, mais especificamente ao título do mesmo, recomendo que não se assustem com o aspecto tenebroso que o mesmo parece insinuar porque, na verdade, fiz de propósito para que, desta forma, criar um suspense - assim como que quase um compasso de espera - para lhe poder oferecer aquilo que muitas pessoas dizem muitas vezes... e que é... o melhor está para vir!...

Mais adiante, irão ter a oportunidade de confirmar isso mesmo, ao ponto de já começar a imaginá-los e a vê-los com um sorriso nos lábios, progredindo para uma gargalhadazinha baixinha e, talvez, até, uma gargalhada bem forte... o que, segundo dizem, até faz bem à saúde!...

Assim o espero porque, essa é a minha intenção!...

Além disso, há ainda o aspecto de, com o enredo que aplico a cada descrição de cada episódio e pela forma como descrevo os mesmos, creio até ser saudável obrigar a acordar aquela parte do cérebro que não é usada no dia a dia porque, dormir muito não é bom para a saúde de absolutamente ninguém e, muito menos, para a c.c.c. - célula cerebral central - ou, a miolinha!...

Portanto, como poderão verificar, o facto do título do livro aparentar ser, à primeira vista, um tanto ou quanto fúnebre e, como já disse, tenebroso.  tudo tem a ver, no meu ponto de vista intencional, com a minha intencionada intenção de que é possível rir nas mais variadas circunstâncias porque, rir... dá saúde!...

Ah, ah, ah, ah!...

Assim, tente rir porque, quanto mais uma pessoa rir, mais saúde irá tendo e, com isso, poderá ajudar a adiar por uns tempos - que até podem ser anos - o vir a ficar defuntado, ou quase!...
Pense nisso!...

Finalmente, como verificarão na leitura das próximas páginas, eu até me irrito com o nosso amigo do título do livro... mais, até, por uma questão de que, quando me irrito com ele - ou com quem quer que seja, incluindo a minha mulher - quase sempre vou desabafar com o meu amigo Merlot que, por uma questão de equilíbrio físico, procuro que sejam sempre dois, só e somente, afim de evitar ficar coxo!...

Ah, ah,ah,ah!...


Da esquerda para a direita: eu, o autor destas linhas; Demba Djassi... meu empregado – fuzilado pelo PAIGC no regime de Luis Cabral - e um cliente do meu restaurante, na Guiné.


Assim, ao lembrar-me destes tristes factos e destas pessoas com quem diretamente trabalhei, não podendo fazer nada para os reviver, resta-me expressar aqui, um gesto de homenagem para com eles, extensivo a muitos outros que, como eles, foram fuzilados - creio até que, alguns deles, enterrados ainda vivos - por A ou B razões ou por razão nenhuma (?) e, como tal, muitos deles, inocentes. Assim, na falta de outros meios e possibilidades, creio não haver melhor forma – passado tanto tempo – do que tentar afogar o pensamento – já que esquecer não posso – do que fazer um brinde de homenagem à memória dos forçados defuntos!...

Assim, em sua memória e...à saúde dos vivos!...
Para a perna esquerda. Para perna direita.

Muito obrigados pela confiança depositada em mim!...
Divirtam-se!!!


INTRODUÇÃO

Iniciando pelo início, que é por onde tudo deve ser iniciado, começo por fazer uma introdução, sem introduzir absolutamente nada de vulto, a não ser tentar introduzir um esclarecimento bem esclarecido dirigido a ninguém, para que esse ninguém leve à risca - ou a sério – e afine comigo que sou um desafinado, antes de eu me finar por completo!...

Talvez, melhor dizendo... para que ninguém pense que estas linhas são para atingir esse alguém ou quem quer que seja, intencionalmente!... na verdade, o que quero dizer com isto é que, se acaso estas linhas parecem ser dirigidas a algum dos leitores, será por absoluta puríssima pura coincidência, ou muito acidental!...

Garantido!...

De facto, em certa medida, em certos episódios, proponho-me só e somente a refrasear certas palavras lidas outrora, cujo autor desconheço completamente, por desconhecimento absoluto, para que as mesmas não entrem no esquecimento, além de que, tão-pouco tenho alguém à minha volta a exercer influência sobre mim porque, pensando, sei pensar por mim mesmo!...

Assim, quem quer que seja que aparentemente possa parecer ser alvo ou atingido por estas linhas, que o tome pelo lado amável, com sentido de humor porque, nos dias de ontem, de hoje e de amanhã, bem necessário é, levar com um pouco de humor, o que a vida nos oferece diariamente!...

Na verdade, verdadeiramente verdadinha, só é minha intenção tentar contribuir para ajudar a amainar o ambiente, e animar o espírito desanimado do ânimo de cada um de nós, usando um pouco de humor, porque acontece que, no momento, até tenho cá muito pouco!...

Antes de continuar, permitam-me sublinhar que, certas palavras nestas linhas são da minha autoria e certas outras são da autoria de um senhor defunto antes de o ser porque, se já o fosse, nem xiava nem mugia, derivado ao estado em que permanecia e que seria, permanentemente mudo e frio!... E, seguidamente, permitam-me fazer uma advertência com a ideia bem intencionada ou, pelo menos, essa é a minha intenção, sobre o seguinte!...

Se, a certo ponto da leitura destas linhas se sentir perdido ou perdida com o que está a ler... páre, concentre-se, suspire fundo e... continue porque, irá verificar que...

- Nada do que aqui se diga, escrevendo o que se quer dizer... foi, ou é, pensado assim sem mais nem menos ou ao calhar!...

- Tudo o que aqui for escrito tem o seu próprio propósito, propositadamente, mesmo que possa parecer que não faz sentido algum!...

- Às vezes, a ideia até é isso mesmo, não fazer sentido ali... lá naquelas linhas onde estiver essa frase que parece não fazer sentido!...

- Poderá não fazer sentido no local onde estiver inserida essa frase mas, sim, noutro local, mais adiante ou mais atrás!...

– No entanto, poderá haver certas circunstâncias em que, por lapso, ou erro orto-dactilo-gráfico, a coisa não faça mesmo sentido!...

Assim, se isso acontecer, procurem dar o sentido que o dito possível lapso ou erro orto-dactilo-gráfico não deu e, se assim for, desde já apresento as minhas maiores desculpas!... E, ao dizer isto, creio estar a demonstrar a minha incondicional confiança na capacidade raciocinal (?) de todos os leitores e leitoras que... espero, venham a ser muitos!...

Portanto, perante a possibilidade de que se venha a encontrar confuso ou confusa derivado a que, o que está a ler, parece não fazer sentido, irá descobrir mais tarde ou mais cedo, que nada acontece assim... sem mais nem menos ou, por acaso. Irá encontrar a pontinha do rabo - não do seu – mas do
 fio da meada - que o mesmo será dizer, da descrição da estória ou conversa que intenciono aqui descrever, escrevendo-a!...

Ao mesmo tempo, agradeço ainda não pararem de ler, quando se encontrarem perante a redação de algo que possa parecer um devaneio ou, um relato de algo que, aparentemente, poderá não fazer sentido algum porque, na verdade, tudo está estruturado para encaixar peça por peça ou, para melhor dizer, frase por frase!...

Agora, sem argumentar a contradição sobre a intenção de, quando digo, intencionar descrever o que estou mesmo a afirmar que vou tentar escrever, permitam-me um deambulo do que, talvez, se pudesse apelidar de um aperitivo, composto de várias variantes interessantes – no meu ponto de vista - antes de avançar para o Capítulo I, que é em referência e homenagem à figura principal do mesmo e, origem do título deste livro que, como já disse, é o nosso amigo defunto, antes de o ser!... Assim, quem quer que seja o defuntado, que tenha muita saúde e, que a mim não me falte!... Que não me falte (?)... a saúde... porque, o defunto pode faltar sempre e quantas vezes ele quiser!... Por mim, até pode ter o dia e a noite livre e, portanto, até pode ir dar uma volta a ver se acorda!...


Na gravura, alguns visitantes, na 'Nursing Home'  visitando ‘o senhor defunto antes de o ser’ !...
Eu, tinha acabado de sair, um tanto ou quanto irritado com ele, por não me ligar patavina.

Ora o catano do homem!...
Aaaamen!...

(Continua)
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Notas de CV:

- Clicar na imagem da contracapa do livro para a ampliar e permitir a leitura do texto

(*) Vd. poste de 31 de Outubro de 2011 > Guiné 63/74 - P8970: Tabanca Grande (304): Mário Serra de Oliveira, ex-1.º Cabo Amanuense (Bissau, 1967/68)

Vd. último poste da série de 24 de Setembro de 2011 > Guiné 63/74 - P8817: Os Nossos Seres, Saberes e Lazeres (33): Um dia de Verão na Serra de Sintra (Felismina Costa)