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terça-feira, 7 de novembro de 2023

Guiné 61/74 - P24827: Manuscrito(s) (Luís Graça) (240): Zé do Telhado (Penafiel, 1816 - Angola, Malanje, 1875): um caso de "banditismo social"? Entre o mito e a realidade - Parte VII

 

Fotograma nº 1 > "De herói a vilão", eis a história do Zé do Telhado, aqui, sargento patuleia, recebendo  a mais alta condecoração do país, a Torre e Espada, das mãos do general Sá da Bandeira, a quem salvou a vida, em combate, na Guerra da Patuleia (out 1846 / jun 1847), que se seguiu à Revolta da Maria da Fonte.

Fotograma nº 2 >  O fantasioso (no filme) assalto à Casa do Carrapatelo, Marco de Canaveses, sita nas faldas da serrra de Montedeiras e na margem direita do rio Douro, a escassos quilómetros na nossa casa em Candoz.


Fotograma nº 3 >    Um destacamento dos Granadeiros da Rainha, em perseguição, mal sucedida,  do Zé do Telhado e do seu bando, em 1852

Fotograna nº 4 >  Um filme "romântico" mas também um "western à portuguesa" onde há de tudo:  amor, perdição, ciúme, traição, nobreza, camaradagem, ação, coragem, assaltos, tiroteiro, loucas correrias a cavalo, duelo,  morte... Foi uma época, a da consolidação da monarquia constitucional, nas décadas de 20, 30, 40 e 50 do séc. XIX, violenta, pautada por sucessivos episódios de guerra civil (as chamadas "lutas liberais": dos liberais contra os absolutistas, dos liberais entre si)... Calcula-se que mais de 20 mil portugueses tenham morrido às mãos de portugueses... Estamos muito longe, portanto, do país de "brandos costumes" dos nossos contos de fadas e príncipes encantados...


Fotograma nº 5 > O "duelo de morte" com o José Pequeno, o "vilão da história", que traiu o bando, e aquem,  diz o Camilo, o Zé do Telhado,  cortou a língua com uma tesoura depois de morto. 

Mas o "ajuste de contas final" entre os dois teria sido na Lixa, e não na serra, como  vemos no filme de 1945 que, de resto, é considerado um "remake" do filme mudo, de 1929, realizado por Rino Lupo, com exteriores filmados no Solar de Beirós, São Pedro do Sul; o guião, por sua vez, tem como fonte  o livro de Eduardo Noronha (1859-1948), "José do Telhado: Romance Baseado sobre Factos Históricos" (1923)(As cenas do exterior deste primeiro filme, o de 1929, foram rodadas em diversos sítios por onde andou o "nosso herói": Amarante, Vila Meã, Lixa, Marco de Canaveses, Felgueiras, Serra do Marão, Sobreira em Caíde de Rei, Lousada, e na casa onde nasceu José do Telhado, em Recesinhos, no lugar do Telhado, Penafiel. Fonte:  Penafiel, Terra Nossa).

Fotogramas do filme "José do Telhado" (1945).  disponível no You Tube, na conta "MusaLusa". 

Uma das raras fotos da época (pormenor) do Zé do Telhado, de seu nome de batismo José Teixeira da Silva (c. 1816-1875), aqui com o seu irmão Joaquim Telhado, também ele bandoleiro, à sua direita. 

Fonte:   Manuel Vieira de Aguiar, "Descrição Histórica, Corográfica e Folclórica de Marco de Canaveses" (Porto: Esc Tip Oficina de S. José. 1947, 439 pp).   , 1947,  pág. 273. (Foto extraída do livro de Sousa Costa, " Grandes dramas judiciários: tribunais portuguees", Porto, O Primeiro de Janeiro, 1944)



Contracapa do livro de Camilo Castelo Branco, “Memórias do Cárcere”, II  Vol,  8ª ed. Lisboa, Parceria A. M. Pereira, Lda, 1966, (1ª ed., Porto, 1862) (Coleçáo "Obras de Camilo Castelo Branco,  Edição Popular, 54")


1. Comentários de alguns dos nossos leitores sobre estes escritos do editor Luís Graça com referência ao Zé do Telhado, cujo "fantasma" ainda paira pelos vales do Sousa e do Támega e pelas serras à volta (Montemuro, Marão, Montedeiras...) (*)


(i) Francisco Baptista:

Amigo Luís Graça, já poucos escrevem, poucos comentam. Estamos todos a ficar com as pilhas gastas. Tu és dos poucos que continuas a dar grandes provas de vitalidade.

Gostei de saber por ti do Zé Telhado, de quem pouco sabia, como a maioria dos portugueses, sabem o nome e a fama de bandoleiro, que roubava aos ricos e dava aos pobres. Nem sabia que sobre ele já tantos escritores tinham escrito.

É natural que ele também te motivasse a ti pois além do mais era de perto de Candoz a outra terra que tu amas mais. Gostei de ler e espero por mais capitulos. Estou a pensar comprar também " As Memórias do Cárcere", de Camilo.

Obrigado. Grande abraço

22 de outubro de 2023 às 19:15 


(ii) Fernando Ribeiro:

Estou um pouco como o camarada Francisco Baptista. No Porto, o Zé do Telhado é uma referência vaga, de uma espécie de Robin dos Bosques à portuguesa, que passou pela Cadeia da Relação da cidade antes de ser deportado para Angola. Só se fala nele quando se visita a cadeia (atual Centro Português de Fotografia) e se espreita a cela onde Camilo Castelo Branco viu o Rio Douro aos quadradinhos. Nessa ocasião fala-se de Ana Plácido, como não podia deixar de ser, e por arrastamento fala-se do Zé do Telhado também.

O encontro entre Camilo Castelo Branco e o Zé do Telhado na cadeia não terá sido o primeiro que eles tiveram. Muito tempo antes, o próprio Camilo foi assaltado pelo Zé do Telhado, numa ocasião em que viajava de diligência entre Vila Real e o Porto! O próprio Camilo fala no assalto num dos seus incontáveis livros (não me recordo de qual) e chama patife, facínora, ou outros nomes equivalentes, ao seu assaltante. Mal sabia ele que iria encontrar-se de novo com o antigo salteador na cadeia e que iria refazer a imagem que tinha feito dele.

Durante a minha comissão militar em Angola nunca ouvi falar do Zé do Telhado, nem uma só vez. Inclusivamente, no meu grupo de combate havia dois militares negros naturais de Malanje e nunca os ouvi fazer qualquer referência a ele. Já os brancos de Angola admiravam outras personagens, que não o Zé do Telhado; admiravam Paulo Dias de Novais, Salvador Correia de Sá, Silva Porto, Norton de Matos, etc.

23 de outubro de 2023 às 02:02

(iii) José Teixeira;

O Zé do Telhado tinha bem demarcada a sua zona de atuação. Do Marco de Canavezes a Vila Real até Cete, Paredes, sobretudo na orla da estrada real. A conhecida estrada Porto a Vila Real com uma variante para a Régua. Era a estrada por onde passavam os grandes comerciantes do Vinho Fino, vulgo, Vinho do Porto. 

A minha avó falava muito do Zé do Telhado, dado que o meu visavô foi contemporâneo dele. O Lugar da Árvore em Caíde, um entroncamento de estradas,  era um dos sítios onde ela costumava fazer as emboscadas. Recordo-me de em criança passar por lá várias vezes a caminho de Vila Meã. Havia sempre uma história contada pela minha avó sobre o meliante. A admiração que os mais velhos tinham pelo Zé do Telhado ia assim passando para os mais novos. Para a minha avó o Sr. José do Telhado tinha sido um grande homem. Ele roubava aos ricos para dar aos pobres e havia sempre mais uma história para contar.

20 de setembro de 2023 às 22:42 

(iv) Valdemar Queiroz:

Quanto ao apelido/alcunha "do Telhado", há três versões.

A mais conhecida é a de ser um salteador que entrava pelo telhado, outra que a casa do pai era a única com telhado de telhas em vez de colmo como as outras e a que parece mais lógica era de ser natural do aldeia/lugar de Telhado e assim ser conhecido quando foi viver para os lados de Lousada.

Antes de ser assaltante era castrador de animais e já lhe chamavam o Zé do Telhado.

No filme "Zé do Telhado", com Vergílio Teixeira, há uma cena em que ele, numa taberna, aperta a mão a outro bandidolas provocando-lhe dores.

Foi uma grande treta, o outro bandidolas era Juvenal Araújo que eu conheci, já dentro dos cinquenta anos, mas quando fez o filme era um matulão que ganhava apostas por rasgar uma lista telefónica fechada, o que deixaria o Vergílio Teixeira com as falanginhas e falangetas partidas.

15 de setembro de 2023 às 14:49

(v) Luís Graça:

O mito do país dos brandos costumes é uma invenção do salazarismo: "antes de nós o dilúvio, depois de nós o caos"... Não é por acaso que o séc. XIX era pura e simplesmente ignorado na escola (e na universidade, pouco ou nada investigado pelos historiadores)...

O que é que a gente sabia sobre o século em que a liberdade e a justiça passaram a ser também uma bandeira, pela qual muitos portugueses se bateram e morreram?!... Afinal, o século em que passámos a ter uma constituição, se consolidou a monarquia constitutucional, se derem passos importantes no processo de "modernização", se aboliu a escravatura e a pena de morte...

13 de outubro de 2023 às 12:37

Em 1945 fizeram um "western" à portuguesa em que o nosso Zé do Telhado (interpretado pelo galã Virgílio Teixeira) é um perfeito oficial e cavalheiro. (Só dei uma rápida vista de olhos ao filme disponivel no You Tube, parte dos exteriores terão sido rodados na nossa serra de Montedeiras.)

O filme está disponível aqui, na conta : https://www.youtube.com/watch?v=i_6MmOOrDh4

O cinema também serve para falsificar ou reinventar  ou reescrever a história... (O filme de 1945 não pretende ser  "uma biografia, mas  uma obra livremente inspirada na vida do célebre salteador"...)




Cartaz do filme "José do Telhado" (1945), a preto e branco, 98 minutos: produzido e realizado por Armando de Mirando, e contracebado por Virgílio Teixeira e Adelina Campos, nos dois principais papéis. Os exteriores foram filmados em Vouzela, em 1945. O filme foi estreado no Porto (Coliseu, em 15/12/1945), e emLisboa (Polteama, 16/1/1946). Fonte: Cinept / UBI (com a devida vénia...)



2. Vamos reproduzir mais alguns excertos das "Memórias do Cárcere" (1ª edição, 1862), em que o Camilo Castelo Branco traça um retrato-robô, lisonjeiro, quase hagiográfico, sobre o seu  companheiro de infortúnio (mas também precioso "guarda-costas" ...), nos calabouços do Tribunal da Relação do Porto, retrato esse que de algum modo ficou, acriticamemte, para a posteridade, criando-se assim o mito do "Robin dos Bosques português"... Afinal, também temos direito a ter um... A tradição popular, outros escritores, menores,  o cinema e a televisão (veja-se a série da RTP, "João Semana")  têm contribuido para reforçar o mito do "banditismo social"..  (Convém lembrar que Camilo não era historiógrafo, era um ficcionista, um "folhetinista", que escrevia muito, em pouco tempo, e em função do seu "nicho de mercado", que era uma clientela urbana ou urbanizada, letrada, que lia jornais,  "folhetins" e alguns livros,  com poder de compra, em suma, a pequena e a média burguesia liberal socialmente em ascensão.)

Os excertos aqui reproduzidos são os da 8ª edição (Camilo Castelo Branco, “Memórias do Cárcere”, II  Vol,  8ª ed. Lisboa, Parceria A. M. Pereira, Lda, 1966)

(...) “Este nosso Portugal é um país em que nem pode ser-se salteador de fama, de estrondo, de feroz sublimidade! Tudo aqui é pequeno: nem os ladrões chegam à craveira dos ladrões dos outros países! Todas as vocações morrem de garrote, quando as manifestam e apontam a extraordinários destinos (...) (pág. 83)

(…) "Na noite de 22 de Maio [de 1852] (**) deu José do Telhado batalha campal à tropa no local denominado Eira dos Mouros [freguesia de Santa Cristina de Figueiró, concelho de Amarante, distrito do Porto] (**)

O destacamento de infantaria 2  (***) conseguira capturar dois salteadores e descera com eles a uma estalagem,  para descansar. Aí o surpreendeu a horda com o chefe montado em fogosa égua. Chegou ele ao terreiro da estalagem, e exclamou: "Carregai com quartosn (****),  rapazes, que está aqui José do Telhado." 

Saiu fora a tropa, e empenhou-se um tiroteio,  que rematou pela retirada do destacamento. O chefes sustentou sempre a vanguarda da avançada, fazendo fogo de pistola e clavina. 

Estavam os dois saltadores prisioneiros na cavalariça da estalagem: um fugira logo que rompeu o fogo, o outro ficara na impossibilidade de erguer-se sobre as pernas cortadas de balas.

− Vem!   − disse o capitão ao salteador ferido.

− Não posso; matem-me que eu estou sem pernas.

− Faz o ato de contrição  − retrucou o chefe.

 O ferido resmuneou o acto de contrição ,  e a estalajadeira verteu lágrimas piedosas. 

José dos do Telhado  estirou-a com uma bofetada, e  desfechou contra o peito do camarada, dizendo;

− Acabaram-se-te os teus trabalhos,  e os meus  estão em  começo. Adeus!    

O cadáver não podia responder a este saudoso vale do seu chefe. (pp. 95/96)


(…) Noutra noite, cercou-lhe a  tropa a casa, estando ele no primeiro sono. Despertou-o  a mulher, e ajudou-o a vestir muito de seu vagar. Caminhou para uma porta transversal, e retrocedeu a ir buscar o  relógio esquecido, e a dar ordens ao criado para lhe conduzir de madrugada o cavalo a designado sítio. Abriu uma janela,  e disse para os soldados:

− Que tal está a noite, rapazes ? 

Retirou da janela, e  abriu a pequena porta, que defrontava com uma cortinha para a qual relevava saltar por cima de um quinchoso.  Aí estavam postados três soldados. José Teixeira aperrou a clavina  de  dois canos, e disse: 

− Agachem-se, que quero saltar.  Os dois primeiros que se moverem, passo por cima deles mortos. 

Os soldados agacharam se, e ele saltou.  Já de dentro da cortinha, atirou dois pintos (*****) aos soldados, e e disse-lhes:

−  Tomai lá para matar o bicho à saúde do José do Telhado.

E foi seu caminho pacífica e detidamente como se andasse espreitando a toupeira no seu meloal.  Teria ele tempo de palmilhar um oitavo de légua, quando lhe deram uma descarga. (...) (pág. 97)

(...)  José Teixeira folgava de entremeter incidentes cómicos nas suas assaltadas. A uma dama de Carrapatelo dera ele um beijo de despedida, e à mulher do senhor Camelo perguntara de que lhe servia o dinheiro, se não podia comprar uma cara mais nova e menos feia

O senhor Bernardo José Machado, muito conhecido comerciante  do Porto, ia um dia para Cerva [Ribeira de Pena, no Alto Tâmega] , sua terra natal , e alcançara,  a distância curta do Torrão, um cavaleiro bem posto no seu corpulento cavalo, e acamardou-se com ele na jornada. Falavam vários assuntos, e caiu a propósito os perigos de jornadear por tais sítios infestados pelo terrível  Zé do Telhado. 

O cavaleiro mostrou-se também horrorizado pela hipótese de o encontrarem,  e ouviu da bocado  senhor Machado a história dos flagicídios do célebre bandoleiro.  Apearam  numa estalagem, e jantaram o mais lautamente que podia ser.  O cavaleiro mudara de estrada.  e despediu-se do senhor Machado, que lhe ofereceu os seus préstimos. Pediu o comerciante a conta à estalajadeira,  e soube que o outro sujeito pagara a despesa. Perguntou o viajante, quem era aquele cavalheiro, e a mulher respondeu que era o José do Telhado. 

É bem de ver que o senhor Machado, em vista do panegírico com que o brindara,  não foi muito a seguro de o topar adiante com outra cara, ocasionando lhe um facto novo para realçar a história. (...) (pág. 99),


(...) O libelo cerra a meda dos crimes do José do Telhado om a tentativa de evasão para reino estrangeiro sem passaporte. 

A morte de José, denominado o pequeno, por antifrase, não vem incluída na acusação.

José Pequeno era agigantadado de estatura, e  o mais cruel da malta, comandada por José do Telhado.

Custava muito ao chefe refrear-lhe o instinto sanguinário; mas com melindre o fazia,  porque o parceiro era o único de quem  ele se receava em luta de braço a braço.

Andava José Pequeno cogitando no expediente mais azado a livrar-se de perseguições,  e tentou-o o demónio a atraiçoar os companheiros. Foi a malta surpreendida, estando  ausente o denunciante. Comandava a força o destemido Adriano José de Carvalho e Melo, Administrador do Marco de Canaveses. 

Carregou tão brava a polícia sobre a chusma dos ladrões,  que lhes foi remédio a fuga. Aí recebei José Teixeira uma bala nas costas a qual, segundo ele diz, o fizera saltar dez passos avante contra sua vontade. A bala  produziu-lhe  na coluna vertebral um choque elétrico meramente. 

Ao outro dia, José Teixeira teve de evidência que seu companheiro o denunciara.  Ao anoitecer foi à Lixa [concelho de Felgueiras]  onde pernoitava o traidor, entrou-lhe em casa,  e disse-lhe:

− Não te quero matar â traição; previne-te  como quiseres, que um nós há de morrer aqui.

− Ou ambos!  − disse o José Pequeno, lançando mão da faca.

−  Ou isso ! −  redarguiu o José do Telhado,  sacando de uma tesoura. E acrescentou:

−  Hei de  cortar-te com ela a língua. 

A primeira arremetida que se fizeram, apagaram a luz da vela,  e arcaram peito a peito. Revolveram-se na escuridade um quarto de hora, rugindo alternadamente injúrias e pragas ferozes. 

José Teixeira já tinha um braço rasgado; mas José Pequeno expedira o último rugido pela fenda que a tesoura lhe abria na garganta. O chefe ergueu o joelho sobre o peito do cadáver, quando  os dois gumes da tesoura se encontraram ao través da língua que o denunciara. 

O homicida aparecer na Lixa ao outro, e disse a multidão parada à porta do morto:

− Se não sabem quem matou este traidor, aqui o têm.

 E passou adiante. obrigando o cavalo a garbosa upas. 

Coisa é digna de reparo, que o ministério público não desse querela contra o assassino. Bem pensada a irregularidade, dá de si que a moral pública, representada pela polícia criminal e administrativa, propôs um voto de gratidão ao matador do formidável celerado da Lixa. (...) (pp. 100-102)

In: Camilo Castelo Branco, “Memórias do Cárcere”, II  Vol,  8ª ed. Lisboa, Parceria A. M. Pereira, Lda, 1966, (1ª ed., Porto, 1862) (Coleçáo "Obras de Camilo Castelo Branco,  Edição Popular, 54")~

(Seleção / revisão e fixação de texto / negritos / parênteses retos: LG)

Este obra está disponível em formato pdf, no sítio da Imprensa Nacional- Casa da Moeda, Lisboa, 2020, 232 pp, edição de Ivo Castro e Raquel Oliveira,  distribuição gratuita. (Segue a 2ª edição, revista pelo autor, Porto, 1864.)

https://imprensanacional.pt/wp-content/uploads/2022/03/Memorias-do-Carcere.pdf?btn=red

__________


(**) Vd. José Manuel de Castro - José do Telhado- Vida e aventura, a realidade. a tradição popular. Ed. autor, 1980, 193 pp., il. (Tipografia Guerra, Viseu).

(***) Vd. Wikipedia: Na época(1852) era conhecido por Regimento de Granadeiros da Rainha, unidade de elite criada em 1842, responsável pela guarda pessoal da Rainha D. Maria II; em 1855, o regimento adopta a actual designação de RI2 - Regimento de Infantaria 2, com sede em Lisboa. Quando Camilo escreveu as "Memórias do Cárcere" já era RI 2,

(****) O "quarto" era um equena bala de chumbo, de forma angular.

(*******) Na época o "pinto" valia cerca de 480 réis. Também era conhecido como "cruzado novo".

quarta-feira, 25 de janeiro de 2023

Guiné 61/ 74 - P24011: Recortes de imprensa (125): Partida para o CTIG das CCAÇ 2381, 2382 e 2383, em 30 de abril de 1968 (Jornal do Regimento de Infantaria n.º 2, Abrantes, nº 30, maio de 1968) (José Manuel Samouco, ex-fur mil, CCAÇ 2381, "Os Maiorais", 1968/70)


Abrantes > RI 2 (Regimento de Infantaria n.º 2) > 30 de abril de 1968 > Despedida das CCAÇ 2381, 2382 e 2383, a caminho do CTIG





Notícia de 1.ª página do jornal do RI 2, n.º 30, maio de 1968 > Partida das CCAÇ 2381, 2382 e 2383 para o CTIG. Estiveram a frequentar a CIE e o IAO. Cerimónias presididas pelo cor Roldão, com missa na Parada de Honra. (O Comandante Militar do RI 2 na altura seria o cor art José Ventura Roldão?)


Fotos (e legendas): © José Manuel Samouco (2023). Todos os direitos reservados.

 [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

1. Documentos que nos foram enviados hoje pelo José Manuel Samouco, ex-fur mil, CCAÇ 2381, Os Maiorais (Buba, Aldeia Formosa, Mampatá e Empada , 1968/70).





Temos referências a estas três companhias: CCAÇ 2381 (184), CCAÇ 2382 (53), CCAÇ 2383 (3). 

Além do Samouco, temos mais cinco camaradas da CCAÇ 2381 inscritos na Tabanca Gande: José Teixeira, José Belo,  Arménio Estorninho, Eduardo Moutinho Santos, Raul Rolo Brás... Têm sido os três primeiros camaradas os mais ativos como colaboradores do blogue. 

Destaque para o emblema, a divisa e a figura do "Zé do Olho Vivo",  da CCAÇ 2382, que, imaginem!, é da autoria do seu comandante,  o ex-cap mil Carlos Nery, que fez tábua rasa da heráldica militar... Divisa: "Por estradas nunca picadas, Por picadas nunca estradas"...Um achado de humor pouco castrense...

Da CCAÇ 2382 (Bula, Buba, Aldeia Formosa, Contabane, Mampatá e Chamarra, 1968/70), temos o José Manuel Cancela, o Carlos Nery, o Manuel Traquina e o Alberto Sousa e Silva.


Da CCAÇ 2383 (Cabuca, 1968/70) temos apenas um camarada, o ex-1º cabo apontador arm pes inf Armando Gomes.

Oxalá apareçam mais, está em curso a campanha de angariação de novos membros da Tabanca Grande: queremos atingir os 900 no fim do ano, o que é um objetivo temerário... E precisamos de fotos e estórias... como de pão para a boca (este blogue é glutão, temos de publicar no mínimo 3 postes por dia, 90 por mês...).
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Nota do editor:

Último poste da série > 3 de novembro de 2022 > Guiné 61/74 - P23760: Recortes de imprensa (124): Homenagem a Fernando Cepa e inauguração de obras de requalificação do Pavilhão Gimnodesportivo de Mar, com a devida vénia aos jornais; Farol de Esposende e Correio do Minho

terça-feira, 29 de novembro de 2022

Guiné 61/74 - P23827: "Um Olhar Retrospectivo", autobiografia de Adolfo Cruz, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 2796. Excerto da pág. 407 à 483 - Parte III - Abrantes e Santa Margarida; três dias de detenção e, o Rosa e o Cunha


1. Continuação da publicação de um excerto do livro "Um Olhar Retrospectivo", de Adolfo Cruz (ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 2796 - Gadamael e Quinhamel, 1970/72), parte que diz respeito à sua vida militar.


III - abrantes e santa margarida…

Chegado ao RI 2 (regimento de infantaria), Abrantes, apresento-me ao oficial de dia, um tenente, que logo reage:
- Mas…, de onde vem?! Leiria?!... Então, em Leiria anda fardado dessa maneira?!’
- Não, propriamente, mas o calor...
- Olhe, fica registada a sua apresentação, mas eu não o vi! Deixe-me cá ver a que companhia pertence... Pois é, a 2796 formou e já saiu daqui há muitos dias, rumo ao campo militar de Santa Margarida, para o IAO...

Agradeci e parti para Santa Margarida, onde me esperava a Companhia de Caçadores Independente 2796.

Chegado, ainda passei um certo tempo até encontrar o local onde a companhia estava instalada, uma vez que o campo militar é bastante grande e ‘abriga’ muitas companhias, das diversas armas.
Apresentei-me ao comandante, o tenente Assunção e Silva e restantes companheiros de missão, após o que me informaram que ficaria integrado no 4º grupo de combate.

Na altura, o efectivo da companhia ainda não estava completo, pois ainda faltavam alguns elementos, graduados, 1ºs cabos e soldados, segundo informação, que iriam ter connosco à Guiné, em rendição individual.
Na altura, recordo-me dos graduados que já se tinham apresentado, Ponte, comandante do 1º grupo de combate, Manso, comandante do 2º grupo, Campinho, comandante do 3º grupo, e Rodrigues, comandante do 4º grupo, 1º sargento Moreira e 2º sargento Baptista, furriéis Magalhães, Ferreira, Neves, Amaral, Fernandes, Rosa, Cunha, Chaves, Silva, Oliveira, Coelho, Fabrício, Anjos.
Mais tarde, já em missão, na Guiné, para complemento do efectivo, por falhas ao embarque, casos do Rosa e Cunha, ou por baixas, recebemos o Tristão, o Esteves, o Pereira, o Queiroz, o Guimarães, o Vilas Boas e o Matias.

Normalmente, o IAO, instrução de aperfeiçoamento operacional, era feito em mês e meio, mas o nosso levaria três meses, pelas nossas contas.
Tudo foi correndo dentro do estabelecido e normal, com os fins-de-semana na Figueira da Foz ou em Lisboa, com saída do campo militar à quinta-feira, final da tarde, e regresso segunda-feira, às oito da manhã.
Nos intervalos das operações, aproveitei para experimentar vários tipos de viaturas militares, como o Jeep Willys, os Unimog 411 e 404, a Mercedes, a Berliet.
Descubro um amigo de cavalaria, de Coimbra, que me dá a oportunidade de experimentar um M47, o tradicional tanque de guerra, complicado de manobrar, primeiro, pelo reduzido espaço do habitáculo do condutor, depois, pelos instrumentos de manobra que requerem concentração e prática.


três dias de detenção!

E já estava um pouco saturado e cansado daquele cenário, apesar de enorme, em dimensão, mas que se tornava um pouco claustrofóbico!
A vontade irresistível de sair dali, nem que fosse por uns momentos, tomou conta dos meus sentidos e levou-me a pegar num Unimog 411 e partir por aí fora.
Comigo, foi um enfermeiro de uma outra companhia que eu tinha conhecido nas Caldas da Rainha.
Partimos do campo militar cerca das nove da noite e, depois de quilómetros e quilómetros de maluquices, regressámos ao campo militar, pelas seis da manhã.
Antes de lá chegarmos, perdemo-nos um pouco, tendo ido dar a uma herdade, aguardando que alguém aparecesse, pois o ladrar dos cães acordaria qualquer um, num raio alargado.
Acendem-se luzes e aparece um senhor, em roupão, a quem perguntámos como chegar ao campo militar.
Olha para nós, com ar de reprovação, e diz-nos para irmos sempre em frente, até chegarmos às traseiras da capela.
Mais tarde, viemos a saber que se tratava de um coronel de cavalaria do campo militar, já com uns anos a viver ali.

Quando chegámos ao campo militar, só tive tempo de estacionar o Unimog e ir às instalações preparar-me para a formatura, pois tínhamos mais um treino militar.
O sargento Moreira chama-me, a pedido do tenente Fernando Assunção e Silva, nosso comandante de companhia, que me diz terem dado como desviado aquele Unimog, sem outra explicação, e lamenta ter de me punir pelo acto, tanto mais que não tinha carta de condução militar.
Respondi que tinha toda a razão e direito de me punir.
Acrescentou que seria para exemplo da companhia.
E, assim, levei três dias de detenção, correspondendo ao período do fim-de-semana, coisa a que já estava habituado, de certa forma, de experiências anteriores...
Mas esta punição já não podia ser apagada por ninguém, como foram as anteriores, pelo sargento-ajudante de Leiria, como lhe contei.

E confirmei isto, trinta e cinco anos mais tarde, quando tratei do meu processo para o estatuto de pensionista, em que era necessário apresentar a caderneta militar.
Fui aos serviços do exército, na Av de Berna e em Chelas, onde me disseram que não podiam dar-me a caderneta, pois tinha levado o mesmo caminho de algumas outras...
Perguntei o que queriam dizer com aquilo e acabaram por dizer-me que todas as que estavam um pouco ‘sujas’ foram destruídas, para bem dos seus proprietários...
Claro que entendi...
Mas deram-me um papel com o resumo do meu currículo militar, que ainda guardo, e lá constam os tais três dias de detenção, de Santa Margarida, ‘porrada’ que já ninguém pôde ‘limpar’...

Passar o fim de semana, em serviços, dentro do campo militar, era uma tortura.
Depois de todos terem saído, peguei nas minhas coisinhas e ala para a Figueira da Foz, final da tarde de quinta-feira.
Sábado, final da manhã, telefonei para o campo militar e falei com um elemento do meu grupo que logo me diz que as coisas não estavam bem - anda tudo ‘à porrada’ nos refeitórios - o que deu origem a queixas ao responsável pelos refeitórios e messes.
Eu pedi-lhe para falar com os nossos e tentar controlar a coisa, pois só poderia regressar na segunda de manhã.

Na segunda feira, o tenente Assunção e Silva pergunta-me:
- Então, Cruz, correu tudo bem?
- Sim, tudo bem!
- Tem a certeza?...
- Sim, tudo controlado!

Ele já sabia que eu me tinha pirado... Mas, que castigo pior do que ir para a Guiné?...
- Realmente, o Adolfo parece que nasceu para infringir regras...

Pois, uma espécie de instinto a atirar para o lado errado...
Entretanto, recebo um aerograma do meu irmão, ainda em Moçambique, que me fala em qualquer coisa relacionada com uma Guiomar, um conhecimento das suas férias à Metrópole, cerca de um ano antes, pedindo-me que, se ela aparecesse a querer aproximar-se, eu tratasse do assunto, como entendesse.
Mas ninguém apareceu nem ouvi nada que se relacionasse com o assunto, pensando que tudo estaria resolvido, sem que necessitasse da minha intervenção.
Se algo acontecesse, eu não estaria na Figueira da Foz, pois estava de partida para a Guiné.
E achei melhor nem falar em nada aos meus pais e irmã.
No entanto, isto seria o inicio de mais um problema...


o rosa e o cunha...

Dentro deste cenário do Campo Militar de Santa Margarida, alguns graduados eram notados com uma forte cumplicidade: o Rosa, o Cunha, o Neves, o Cruz (nomes de guerra).
Neste contexto, não é difícil imaginar que algo poderia acontecer, com prejuízo para a companhia, claro.
E, quem estivesse bem atento, reparava no temperamento e postura particulares daqueles graduados, além do facto de que o Cruz tinha sido punido pelo tenente Assunção e Silva.
Melhor dizendo, poderiam pensar na eventualidade daqueles graduados faltarem ao embarque para a Guiné, o que piorava a situação da companhia, que estava desfalcada de alguns elementos, esperado aparecerem em rendição individual.
E a suspeição deu sinais, pelas conversas entre o tenente Assunção e Silva e o alferes Ponte, comandante do 1º grupo.

"Pois, Adolfo, era mais um caso a juntar aos muitos que aconteciam, desde o início da guerra do ultramar - dar o salto para o estrangeiro..."

Entretanto, recebo mais uma boa notícia: nasceu a minha primita Filipa, a segunda filha da minha prima Lena, e a alegria aumentou e abraçou a família, restando-me esperar a oportunidade de uma visita para conhecer e dar as boas vindas à Filipa.

Finais de Outubro e dão-nos umas massas para comprarmos algumas roupas específicas, antes do embarque, o que faríamos no Casão Militar, Lisboa, o tal local já muito bem conhecido do Daniel...

Dia vinte e sete, vou à Figueira da Foz e fico para o dia seguinte, dia do aniversário da minha mãe.
Com beijos apertados, dou os parabéns à minha mãe e despeço-me, sem conseguir dizer mais nada...

(Continua)

____________

Nota do editor

Poste anterior de 27 de Novembro de 2022 > Guiné 61/74 - P23821: "Um Olhar Retrospectivo", autobiografia de Adolfo Cruz, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 2796. Excerto da pág. 407 à 483 - Parte II - Tavira e Leiria

quarta-feira, 11 de abril de 2018

Guiné 61/74 - P18512: CCAÇ 1586, "Os Jacarés" (Piche, Ponte Caium, Nova Lamego, Beli, Madina do Boé, Bajocunda, Copá e Canjadude (1966-1968): Subsídios para a reconstituição da sua história (Jorge Araújo) - Parte I





Guiné > Bissau> Cais > 9 de Maio de 1968 > Preparativos para o regresso à metrópole da CCAÇ 1586 a bordo do T/T Niassa (fotos gentilmente cedidas pelo camarada ex-fur trms Aurélio Dinis, da mesma unidade).


Jorge [Alves] Araújo, ex-Fur Mil Op Esp/Ranger, CART 3494 

(Xime-Mansambo, 1972/1974); coeditor do blogue desde março de 2018; 
criador da série "D(o) outro lado do combate"




Companhia de Caçadores 1586, "Os Jacarés"  (Piche, Ponte Caium, Nova Lamego, Beli, Madina do Boé, Balocunda, Copá e Canjadude ((1966-1968):  Subsídios para a reconstituição da sua história - Parte I



1. INTRODUÇÃO

Com algum atraso, mas ainda a tempo de cumprir com os objectivos de partida, o presente trabalho surge na sequência da publicação no blogue de dois postes: o P18149 e o P18158, ambos em memória do Alferes QPAugusto Manuel Casimiro Gamboa [, foto à esquerda, cortesia da Academia Militar[, pertencente à CCAÇ 1586 (1966/1968), e da referência à emboscada que o vitimou, em 14 de dezembro de 1967, na estrada entre Canjadude e Nova Lamego.

Ele é também, por um lado, um modesto contributo escrito (subsídio) visando ajudar na reconstituição da História desta Unidade (a possível) e, por outro, a concretização da promessa feita em comentário ao segundo texto, uma vez que, de acordo a informação dada pelo nosso colaborador permanente José Martins, especialista em Arquivo Histórico Militar do Exército (Guerra do Ultramar), "no volume 7.º da CECA [Comissão para o Estudo das Campanhas de África], consta que [da CCAÇ 1586] não existe História da Unidade".

Não estando expressas as razões da ausência documental da sua História no AHM, não é difícil presumir como uma forte possibilidade, , quiçá a mais provável, que ela teve como principal causa a divisão física e logística permanente dos seus efectivos e as responsabilidades que lhes foram atribuídas em cada um dos locais onde esteve instalada, num total de oito, como se indica em título e como se assinala no mapa abaixo.

Para além desta probabilidade (suspeita), que naturalmente não podemos comprovar, uma outra variável poderá ter influenciado também a sua não transcrição para o papel, na justa medida em que estamos perante um colectivo militar metropolitano que muito sofreu ao longo dos vinte e um meses da sua comissão (de agosto de 1966 a  maio de 1968), fazendo fé nos factos que conseguimos apurar, entre eles os seus mortos e feridos.

Será que foram estas as principais causas?

Ainda assim, admitimos a hipótese de terem existido outras razões/causas para além das que acima presumimos. Mas só o saberemos, em definitivo, se algum elemento da CCAÇ 1586 tiver a resposta certa a esta questão. Vamos esperar que tal aconteça ou que no aprofundamento deste projecto de investigação possamos chegar lá.

Porém, perante a caracterização sumária do quadro supra, compreende-se (compreendo) perfeitamente as dificuldades em se estruturar/organizar as suas memórias, pois foram, certamente, muitos os factos e ocorrências que mereceriam ficar gravadas como testemunhos históricos da sua presença na região do Gabu, situada a Leste do território da Guiné, e que não foi possível centralizá-las ou juntá-las, passando-as a escrito, devido à dispersão dos seus efectivos nas diferentes frentes das muitas missões.

Lamentamos que assim tenha sido.

Porque não fazemos parte desse colectivo de camaradas (ex-combatentes), estes sim fiéis depositários das suas memórias durante aquele período ultramarino, enquanto principais personagens fazedores da sua história, esta narrativa não podia deixar de não ser corolário da consulta realizada a diferentes fontes de informação, escrita e oral, onde cada referência encontrada e relato obtido dos directamente envolvidos, se considerou relevante para a concretização do objectivo geral, ou seja, o início de um processo de reconstituição da História da CCAÇ 1586.

Dessa análise global e da sua triangulação, como metodologia da investigação, procurou-se caminhar na busca do que considerámos fidedigno, idóneo, exacto ou válido, enquanto sinónimos do mesmo valor, deixando à reflexão de cada leitor o que se pode considerar, inquestionavelmente, genuíno ou, pelo contrário, uma trapalhice (propaganda), uma vez que circulámos por ambos os lados do combate.

Em função do já pesquisado e dos resultados obtidos, decidimos dividir o trabalho em diferentes partes, sendo esta a primeira, onde se divulgam aspectos relacionados com a sua mobilização, locais das principais actividades operacionais e quadro das baixas em combate.


2. MOBILIZAÇÃO E LOCAIS DAS MISSÕES NO CTIG


Mobilizada no Regimento de Infantaria n.º 2 [RI 2] , em Abrantes, a Companhia de Caçadores 1586 [CCAÇ 1586] embarcou no Cais da Rocha, em Lisboa, a 30 de julho de 1966, sábado, zarpando rumo a Bissau a bordo do N/M Uíge, numa altura em que a cronologia da guerra registava já três anos e meio.

Aí desembarcou a 4 de agosto, 5.ª feira, sendo destacada para o sector do Batalhão de Caçadores 1856 [BCAÇ 1856], assumindo a 8 do mesmo mês a responsabilidade do subsector de Piche, substituindo dois pelotões da Companhia de Caçadores 1567 [CCAÇ 1567], e guarnecendo o destacamento da Ponte do Rio Caium com um pelotão, até 21 de setembro de 1966.

A partir desta data assumiu, também, funções de unidade de intervenção na zona de Nova Lamego, reforçando diversas localidades, entre elas:

(i)  Nova Lamego, de 10 de outubro de 1966 até princípios de dezembro desse ano;

(ii) Béli, de 25 de janeiro a 15 de abril de 1967;

(iii)  e Madina do Boé, de 10 de fevereiro a 1 de maio de 1967.


A 6 de abril de 1967 foi rendida no subsector de Piche, assumindo o subsector de Bajocunda no dia seguinte [7abr1967], rendendo a Companhia de Caçadores 1417 [CCAÇ 1417] e guarnecendo Copá com um pelotão, mantendo-se integrada no dispositivo de manobra do Batalhão de Caçadores 1933 [BCAÇ 1933] e posteriormente do Batalhão de Caçadores 2835 [BCAÇ 2835].

Entre 28 de outubro e 4 de dezembro de 1967, integrou, com um pelotão, o sector temporário de Canjadude.

Foi rendida no subsector de Bajocunda a 27 de abril de 1968 pela Companhia de Caçadores 1683 [CCAÇ 1683], embarcando em Bissau, de regresso à metrópole, a 9 de maio de 1968, 5.ª feira, a bordo do N/M Niassa, com a chegada a Lisboa a acontecer a 15 de maio, 4.ª feira, ou seja, seis dias depois [adap. do P3797, José Martins, ex-Fur Trms CCAÇ 5 (1968/1970), nosso colaborador permanente].


 3. MAPA DOS LOCAIS ONDE A CCAÇ 1586 DESEMPENHOU AS SUAS DIFERENTES ACTIVIDADES OPERACIONAIS


No mapa abaixo, sinalizadas no interior de elipses, encontram-se os locais onde a CCAÇ 1586 desempenhou as suas diferentes actividades operacionais.


Infografia: Jorge Araújo (2018)



4. QUADRO DE BAIXAS DURANTE A COMISSÃO


No âmbito da pesquisa realizada, foram identificadas e agrupadas por datas as baixas contabilizadas pela CCAÇ 1586 durante a sua comissão, cujo quadro se apresenta de imediato.

A organização do quadro, segundo esta metodologia, corresponde à ordem da descrição dos factos conhecidos sobre cada causa ou ocorrência, e que daremos conta ao longo das próximas narrativas.


Infografia: Jorge Araújo (2018)

Sitografia consultada:

https://blogueforanadaevaotres.blogspot.pt/

http://www.apvg.pt/

http://ultramar.terreweb.biz/ (com a devida vénia)

(Continua)
______________

Obrigado pela atenção.
Com forte abraço de amizade,
Jorge Araújo.
16JAN2018.

PS - Este é o primeiro dos textos que estavam em atraso, o da CCAÇ 1586, na medida em que me comprometi a dar uma ajuda na reconstituição da sua HU, que não existe. Entretanto, fui convidado para participar no seu Convívio Anual que se realiza em Abrantes, a 19 de maio de 2018. Já lhes pedi um cartaz para fazer a sua divulgação na «Tabanca».

segunda-feira, 19 de fevereiro de 2018

Guiné 61/74 - P18332: A cidade ou vila que eu mais amei ou odiei, no meu tempo de tropa, antes de ser mobilizado para o CTIG (31): Abrantes, sede do antigo RI 2 - Regimento de Infantaria 2, mais tarde Escola Prática de Cavalaria (2006) e hoje Regimento de Apoio Militar de Emergência



Abrantes > O antigo RI 2 - Regimento de Infantaria 2 >  Hoje  Regimento de Apoio Militar de Emergência


Abrantes > O antigo RI 2 - Regimento de Infantaria 2 >  Já foi Escola Prática de Cavalaria (2006)

Fotos: © Manuel Traquina (2018). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Abrantes > RI 2 -  Regimento de Infantaria 2 > 1970 > A unidade mobilizadora de muitos batalhões que passaram pelo TO da Guiné como foi o caso  do BCAÇ 2852 (Bambadinca, 1968/70)... Durante a guerra do ultramar, o RI2 incorporou, treina e mobilizou um total de 52.000 homens para os diverso Teatros de Operações. Mais concretamente, foi a unidade mobilizadora de  63 batalhões, 30 companhias independentes e 82 pelotões de apoio.

Na foto, em primeiro plano, o nosso camarada Otacílio Luz Henriques, a caminho da "peluda"...

Foto: © Otacílio Luz Henriques (2013). Todos os direitos reservados.   [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Abrantes > RI 2 -  Regimento de Infantaria 2 > 1969 > Vista aérea.

 Foto: Unidades do Exército Português > Regimento de Infantaria nº 2  (página  de Nuno Chaves, em construção) (com a devida vénia...)


1. Mensagem do nosso camarada Manuel Traquina, deixada ontem na página do Facebok da Tabanca Grande:


Para aqueles que passaram pelo Regimento de Infantaria de Abrantes vão estas fotos.

O RI2, como em tempos o conhecemos, e por onde passaram largos milhares de militares, agora virou RAME - Regimento de Apoio Militar de Emergência. 

Com um número de militares muito reduzido em relação aos tempos de guerra, foi já também Escola Prática de Cavalaria [, em 2006].

2. Comentário do editor LG:

No seu livro, "Os tempos de guerra: de Abrantes à Guiné" [Edições Palha de Abrantes, 2009), o Manuel Traquina tem um pequeno capítulo dedicado ao RI 2. unidade que mobilizou a sua companhia, a CCAÇ 2382...E dai partiram para a Guiné... O Manuel Traquina "jogava em casa", já que era natural do concelho (, Souto, a 20 km da sede)...

Sobre a sua terra diz o seguinte:

"Curioso é que ainda hoje a cidade de Abrantes seja lembrada por muitos que por aqui passaram e, também, por alguns que aqui arranjaram madrinha de guerra, namorada e noiva... casaram e por aqui ficaram" (p. 31).

Meu caro Manuel, a minha companhia, a CCAÇ 2590 (mais tarde, CCAÇ 12) foi mobilizada pelo RI 2. Aliás, éramos meia dúzia de gatos pingados (graduados e especialistas, uma meia centena). Formámos companhia, tirámos a Escola Preparatória de Quadros e fizemos a IAO (Instrução de Aperfeiçoamento Operacional, também "à pedrada", como vocês,  no Campo Militar de Santa Margarida (CMSM), que ficava no concelho vizinho de Constança... A cerimónia de despedida foi junto à capela do CMSM, E dali fomos diretamente, de comboio (, tenho a ideia que de noite, quase como "clandestinos"...) para o Cais da Rocha Conde de Óbidos. Embarcámos no T/T Niassa em 24 de maio de 1969...

Da tua terra, Abrantes, não tenho memórias, desse tempo. Ou varreram-se-me as memórias, de todo.. Posso dizer que passei por Abrantes como cão por vinha vindimada... com os (des)acordes da fanfarra do RI 2 muito ao longe...


3. Recorde-se que o Manuel Traquina (ex-Fur Mil Mec Auto, da CCAÇ 2382, Buba, 1968/70) vive em Abrantes [, foto atual, acima]. Aliás,  nasceu no Souto, Abrantes, em 1945. 

Frequentou o Curso de Sargento Milicianos (CSM), nas Caldas da Rainha, no 1º trimestre de 1967. Em 30 de Março, dava início à especialidade de Mecânico Auto, na Escola Prática de Serviço e Material (EPSM), em Sacavém. Fez ainda estágio no Centro de Instrução de Condutores Auto nº 3 (CICA3) em Elvas. Em finais de Agosto, é transferido para o Depósito Geral de Material de Guerra (DGMG), em Beirolas. Quinze dias depois, a 13 de setembro, é mobilizado para a Guiné. A 19 de fevereiro de 1968, apresenta-se no RI 2, em Abrantes, a fim de integrar a CCAÇ 2382. Passados dois meses e meio, a 1 de Maio de 1968, parte no Niassa, com destino a Bissau, aonde desembarca a 6.

Na Guiné, passou pelos seguintes aquartelamentos: Brá, Bula, Aldeia Formosa e Bula. Regressa a Portugal em Abril de 1970, no mesmo T/T Niassa.

Depois da ‘peluda’, trabalhou em Angola, no Serviço de Emprego. Regressa Portugal, em 1975, na sequência do processo de descolonização. Em Abrantes, foi técnico de emprego, do Centro de Emprego local. Está actualmente aposentado do Instituto de Emprego e Formação Profissional (IEFO). Tem página no Facebook > Manuel Batista Traquina.

Publicou "Os Tempo de Guerra, De Abrantes à Guiné”,  Edição Palha de Abrantes, 2009. E, mais recentemente,. em 2017, na Chiado Editora, "Angola que eu conheci: de Abrantes a Luanda"

(*) Último poste da série > 27 de abril de 2017 > Guiné 63/74 - P17290: A cidade ou vila que eu mais amei ou odiei, no meu tempo de tropa, antes de ser mobilizado para o CTIG (30): Tavira, CISMI, onde há 48 anos frequentei o 1.º Ciclo do Curso de Sargentos Milicianos (António Tavares)

Vd. também 28 de janeiro de 2014 > Guiné 63/74 - P12649: A cidade ou vila que eu mais amei ou odiei, no meu tempo de tropa, antes de ser mobilizado para o CTIG (14): As localidades por onde passei, sofri e amei - Conclusão (Veríssimo Ferreira)

(...) Até que um dia me transmitem:
- Vais para Abrantes.

Bati o pé e disse:
- Não vou... Não vou... Não vou... 

E fui.

Em Abrantes, estava mais perto de casa [, Ponte de Sor], o que me agradou.

Lá se foi passando o tempo e coube-me ajudar o Oficial instrutor, ensinando novos militares. Por que alguns de nós, os recentes cabo-milicianos, estávamos já a ser mobilizados, fui-me preparando. Contudo, tal mobilização só veio a acontecer, quando já houvera prestado 20 meses de tropa.

Entretanto em Abril de 1965 e "por equivalência a seis meses consecutivos em Unidade Operacional, condição a que satisfaz para promoção ao posto imediato (sic)" , fui promovido a Senhor Furriel-Miliciano. Estava então em Tomar a preparar outros jovens, que afinal acabaram por ser os que fazendo parte da Companhia de Caçadores 1422, embarcaram comigo para a Guiné, em 18 de Agosto. (...)

quarta-feira, 23 de abril de 2008

Guiné 63/74 - P2791: Álbum das Glórias (46): O distintivo da CCAÇ 2382, 1968/70 (Manuel Baptista Traquina).

A Guiné /Os Tempos de Guerra

1968/70

Companhia de Caçadores 2382

O Distintivo da Companhia




Este era o distintivo da Companhia. Continha na parte central, a figura de um militar com aspecto de veterano de guerra, já com o camuflado e botas um pouco danificados, e a sua inseparável G3.

Na mão direita segura aquilo a que chamávamos a “pica”, que não era mais que uma vareta de aço afiada e que servia como o nome indica para picar o terreno susceptível de ocultar uma mina. Na extremidade da referida "pica" encontra-se uma pequena caixa que representa uma mina anti-carro.
Sendo a CCaç 2382 uma Companhia Independente, nos quatro ângulos do distintivo encontram-se as iniciais dos comandos a que pertenceu: o primeiro é o Regimento de Infantaria 2 de Abrantes onde a companhia se formou e foi mobilizada; o segundo é o COSAF Comando Operacional de Aldeia Formosa; o terceiro, Batalhão de Caçadores 2834 ao qual a companhia esteva adida e o quarto, o COP4 (Comando Operacional nº4, sedeado em Buba).
As duas inscrições laterais poderão levantar algumas interrogações: “Por Estradas Nunca Picadas”. Esta pequena frase diz-nos que a companhia andou por locais até ali ainda não pesquisados; “Por Picadas Nunca Estradas” aqui pretende-se dizer o que foi uma realidade, que os militares andaram pelo mato por caminhos que nunca foram estradas.
Mas voltando à figura central, àquele a que chamámos “o Zé do olho vivo”, por ser uma figura mais ou menos engraçada, valeu-nos na Guiné o título da Companhia dos Palhaços.
Manuel Batista Traquina
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Adaptação do texto da responsabilidade de vb.