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quarta-feira, 24 de janeiro de 2024

Guiné 61/74 - P25106: Historiografia da presença portuguesa em África (406): Um documento assombroso: "Viagem à Guiné Portugueza", por Costa Oliveira (3) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 12 de Junho de 2023:

Queridos amigos,
Confesso que me rendo a este espantoso espírito de observação do Tenente Costa Oliveira, certo e seguro ele faria diários dos itinerários, dos acidentes, das emoções que a natureza lhe provocava; não se existe um outro testemunho ao vivo de tal valia como o dele quanto à guerra do Forreá, veremos adiante que ele estava bem informado sobre todas estas vicissitudes; é igualmente um diário histórico, não encontrei até agora ninguém que tenha descrito a demarcação de fronteiras, com especial ênfase no sul, como ele; e mostra-se profundamente crítico pela incúria em que deixámos a Senegâmbia portuguesa, tecerá comentários ácidos à decisão de termos ofertado em bandeja o Casamansa à França, se havia ponto, depois de Cacheu e Bissau, onde a nossa presença tinha algum relevo era em Ziguinchor. É um observador contumaz: a natureza das tabancas, a importância do Corubal e do Geba, não esconde o seu entusiasmo com as belezas guineenses e não deixa de lastimar como a colónia está num prático abandono. E que o leitor se prepare, o tenente Costa Oliveira ainda tem muito por contar.

Um abraço do
Mário



Um documento assombroso: "Viagem à Guiné Portugueza", por Costa Oliveira (3)

Mário Beja Santos

O Boletim da Sociedade de Geografia de Lisboa, 8.ª série, números 11 e 12, 1888-1889, acolhem um documento de grande valor histórico intitulado “Viagem à Guiné Portugueza”, o seu autor é E. J. da Costa Oliveira, Oficial da Armada Real, comissário do governo para a delimitação das possessões franco-portuguesas da costa ocidental de África. Fez-se a viagem de Bolama até ao Sul, o Tenente Costa Oliveira não esconde o seu deslumbramento com tanta beleza natural e vai perseguir com as suas ricas observações que permitem ao leitor de hoje perceber o que era a vida no Sul não só da Guiné portuguesa como da Guiné francesa.

Estamos no início de março de 1888, a comissão luso-francesa tem permissão de marcar as fronteiras, visitou o rio Cogon, depois disso levantou-se o acampamento e abalaram para Kumataly, uma povoação importante e fortificada. Observa o tenente da Armada Real:
“As fortificações do gentio na Guiné são extremamente curiosas. As habitações ou cubatas são dispostas circularmente. Em torno delas constroem uma espécie de muralhas com altos e grossos troncos de árvores das espécies mais resistentes, pau-carvão, pau-ferro, sibes, etc. e a dois metros pouco mais ou menos de distância pela parte de fora uma segunda estacaria de troncos mais delgados e menos humildes, mas coberta de ramos de plantas espinhosas. Grossos portões de madeira fecham estas tabancas, e os caminhos que dão serventia ao interior da praça são tão complicados e cheios de óbices que se um estranho atrevido ousar entrar por algum deles, sem perfeito conhecimento daqueles labirintos, jamais sairá do espaço compreendido entre as duas paliçadas, por mais esforços que faça.”

Relata a passagem por uma povoação destruída e incendiada pelos Biafadas. É o momento propício para o autor tecer observações sobre gente importante da região:
“Já que falámos dos Biafadas ou Biafares, vem talvez a propósito dizer o que sabemos acerca de Mahmad-Jolá, o chefe de uma tribo que tanto concorreu para o abandono das feitorias do rio Grande. Conta-se que em certa ocasião, Mudi-Yaiá, fazendo guerra aos Biafadas, aprisionara bastante gente, e entre elas uma criança dos seus nove aos dez anos, viva, inteligente, simpática.
Mudi-Yaiá afeiçoou-se a esta criança, e levou-a para a sua companhia, dando-lhe mais tarde um lugar importante nos seus exércitos. Anos depois, esta criança, já um homem feito, quando entrava em qualquer conflito gentílico, tinha sempre o ensejo de se distinguir, já pelo seu valor pessoal, já pela perícia com que dirigia as suas hostes; e Mudi-Yaiá, satisfeitíssimo com o seu pupilo, enchia-o de presentes e até de mimos.
Um dia os Biafadas atacaram os Fulas. Fizeram-se grandes combates, arrasaram-se muitas tabancas e fizeram numerosos prisioneiros de parte a parte. A sorte desta vez foi favorável aos fulas, e Mahmad-Jolá havia-se distinguido nos recontes em que entrara. Mudi-Yaiá, exultante de alegria, elogia-o publicamente, e conta-se que nessa ocasião solene lhe dissera:
- Bateste-te como um valente, é pena que sejas um Biafada!
Mahmad-Jolá ouviu a sua triste história e a dos seus, silencioso e com as lágrimas a marejar-lhe os olhos, foi, dizem, nessa ocasião, que concebeu o arrojado plano de fujir e apresentar-se ao régulo dos Biafadas, seu legítimo rei e senhor!
Apresentou-se ao chefe dos Biafadas e ofereceu-lhe a sua perícia na arte da guerra, jurando morrer ou exterminar a maldita raça Fula!”


O que importa saber é que Mahmad-Jolá passou a partir de então a atacar feitorias do rio Grande, com o fim exclusivo de roubar e até matar.

Costa Oliveira vai agora descrever o itinerário para Damdum, e dirá adiante que nesta povoação ainda lá estava a comissão francesa, emprestou-se dinheiro Monsieur Brosselard para contratar alguns carregadores para a sua viagem de regresso a Buba. E de novo este espantoso espírito observador do oficial da Armada vem ao de cima:
“De Chequeúel para Mahmed-Djimi o aspeto do país começa a modificar-se. Já tivemos que subir um monte de 160 metros de altura acima do planalto em que caminhávamos, monte conhecido com o nome de Deballara. Do cume deste monte percebem-se os rios Cogon e Kolibá. Pegadas de elefantes e grandes antílopes abundam nestas paragens. A água é magnífica e a temperatura média menos elevada 21ºC. Nas margens das ribeiras abundam árvores, e nas colinas e planícies o pau-carvão, o pau-ferro, o pau-sangue, o bambu e o algodoeiro-silvestre. Os seus habitantes são todos, ou quase todos, escravos de Mudi-Yaiá, e aproveitam sempre as ocasiões favoráveis para fugirem ao jugo daquele poderoso tirano. No caminho encontrámos depois algumas destas desgraçadas famílias, que se dirigiam também para as bandas de Contabane.”

Abasteceram-se em Damdum de mantimentos a troco de contas de coral, missanga e dinheiro. No dia 15, estiveram a determinar as posições geográficas do Cogon e no dia seguinte o Kolibá. Agora um aspeto curioso que ele escreve:
“Corubal, Kolibá, Kokoli e Koli são diferentes nomes do mesmo rio, dados nas diversas zonas por onde corre. É sempre um grande rio de 200 ou 300 metros de largura. Passa por Kadé, e dizem nascer nas altas montanhas do Futa-Djalon; é fundo, navegável muitas milhas pelo sertão dentro e despenha-se de 4 metros de altura próximo de Consinto (não será Cusselinta?).
De Mahmed-Djimi para o Kolibá, observa o oficial, não há vereda trilhada pelo pé do homem, caminha-se através do mato que, facto notável, pode considerar-se divido em três zonas distintas, atenta a natureza da vegetação que nelas predomina, sendo a primeira de gramíneas, a segunda de bambus e a terceira uma floresta virgem cheia de plantas espinhosas, nas quais rasgámos as carnes e deixámos pedaços de fato!”


Não menos interessante é a observação que ele faz sobre o rio Geba:
“Para mim é ponto de fé que o futuro da Senegâmbia portuguesa está ligado a este rio. Geba e Damdum são pontos estratégicos e importantes do Sertão e, se fossem convenientemente guarnecidos e defendidos, assim como Sambel-Nhantá, S. Belchior e mais alguns no Corubal, o comércio, à sombra desta proteção havia de desenvolver-se rapidamente e Bissau poderia ser, num futuro não muito remoto, o empório daquela rica e extensa região.”

Julga importante dar-nos uma outra informação: Mamadu Paté, irmão de Bacari Guidali, mandado assassinar em 1886 por Mudi-Yaiá, domina todo o território ente Geba e Damdum e não consente que os Fulas de Yaiá, seu inimigo, viagem neste seu território. E aproveita para tecer outra consideração: “Se nós tivéssemos a habilidade de promover a paz entre aqueles dois potentados, e conseguíssemos estabelecer um posto militar em Damdum, o comércio que por ali passa não poderia derivar-se para Geba, principalmente no tempo seco?”

E volta a tecer considerações sobre a presença portuguesa, propõe pontos a fortificar: Farim, Geba, Buba, Damdum, Bolor, Bissau e a colónia do rio Grande de Bolola, e pontos intermédios tais como S. Belchior, Sambel-Nhatá, no rio Geba, e Gampará, no Cacheu. Às duas horas da tarde do dia 18 abalava a comissão portuguesa de Damdum. “Na vanguarda da extrema linha de carregadores, levada por um cabo de caçadores, tremulava a bandeira nacional, respeitada por todos e testemunha insuspeita de que nunca se praticara um ato indigno!”


Carta da Guiné Portuguesa, século XIX, Arquivo Histórico-Ultramarino
Carta da província da Guiné, 1912
Carta da colónia da Guiné, 1933
Antiga Sede do Banco Nacional Ultramarino em Bolama, posterior Hotel do Turismo, hoje completamente desaparecido
Atual edifício do Centro de Formação Pesqueira de Bolama. Imagem retirada do blogue Alma do Viajante, com a devida vénia
Imagem do antigo quartel de Bolama, retirada do blogue Alma do Viajante, com a devida vénia

(continua)
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Notas do editor:

Post anterior de 17 DE JANEIRO DE 2024 > Guiné 61/74 - P25080: Historiografia da presença portuguesa em África (404): Um documento assombroso: "Viagem à Guiné Portugueza", por Costa Oliveira (2) (Mário Beja Santos)

Último post da série de 22 DE JANEIRO DE 2024 > Guiné 61/74 - P25098: Historiografia da presença portuguesa em África (405): voyeurismo, exotismo, sexismo e racismo na exposição colonial do Porto de 1934: uma reportagem do jornalista de "O Comércio do Porto", Hugo Rocha (1907-1993), publicada no "Boletim da Sociedade Luso-Africana do Rio de Janeiro"

quarta-feira, 20 de dezembro de 2023

Guiné 61/74 - P24978: Capas da Gazeta das Colónias (1924-1926) (6): Moçambique: monumento aos heróis de Magul (8 de setembro de 1895)... Guiné: o rio Grande a que aportaram as caravelas portuguesas em 1446 não era o Casamança mas o Geba: nele foi observado o fenómeno do macaréu

 


"Moçambique - Monumento de Magul.  Comemorando o combate de 8 de setembro de 1895, no qual com Mousinho de Albuquerque, tomaram parte, entre outros oficiais, os srs, General Freire de Andrade e Paiva Couceiro"

(Cortesia de Hemeroteca Digital de Lisboa)
 

Detalhe: "À memória dos soldados portugueses aqui mortos pela Pátria, 
em 8 de setembro de 1895"



Diretor: Oliveira Tavares; editor: Joaquim Araújo; propriedade: Empresa de Publicidade Colonial, Lda. 


1. Lá descobrimos mais um pequeno artigo sobre a Guiné: da autoria do eng. agr. Armando Cortesão,  foi publicado no nº 14, de 27 de novembro de 1924, da "Gazeta das Colónias" (será nomeado no ano seguinte Agente Geral das Colónias), e diretor do boletim da Agència Greal das Colónias). 

Com os conhecimentos de cartografia, mostra-nos que o rio a que as caravelas portugueses chegaram em 1446, sob o comando de Fernão de Vilarinho  e Estêvão Afonso foi o rio Geba, e não o Casamança, a que os cronistas da época chamavamo Rio Grande, e onde observaram o fenómeno do macaréu...






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Nota do editor:

Último poste da série > 18 de dezembro de  2023 > Guiné 61/74 - P24969: Capas da Gazeta das Colónias (1924-1926) (5): Angola, Companhia do Amboim: a roça "Ajuda e Amparo"... E propaganda da Guiné, por Armando Cortesão: "Ainda há 10 anos Bissau era um pequeno povoado, cercado por uma muralha e ai do europeu que dela se atrevesse a afastar-se umas centenas de metros"...

sexta-feira, 19 de maio de 2023

Guiné 61/74 - P24326: Imagens das nossas vidas: CART 3494 (1971/74) (Jorge Araújo / Luciano Jesus) - Parte II: De Bolama ao cais do Xime em LDG


Vista aérea da geografia do Xime e do perímetro do aquartelamento a vermelho


“O Xime, em cinemascope, do meu tempo” – António Vaz (1936-2015), Cmdt da CART 1746 (1968/69) – In: P9741, de 13.Abr.2012, com a devida vénia.



BART 2917 (Bambnadina, 25.05.1970-27.03.1972)          


BART 3873 (Bambadinca, 29.12.1971-04.04.1974)



IMAGENS DAS NOSSAS VIDAS: CART 3494 (1971-1974) - Parte II:  DE BOLAMA AO CAIS DO XIME EM LDG

Continuação do Poste 24191(03.04.2023) (*)


1. – INTRODUÇÃO

Do álbum do nosso camarada Luciano de Jesus, que foi organizando ao longo dos mais de vinte e sete meses de permanência no CTIG, e que, generosamente, fez questão de me oferecer uma cópia para partilha no Blogue, seleccionámos mais uma dezena de imagens para enquadrar a narrativa desta parte dois.

Enquanto a Parte I (*)  percorre o itinerário náutico desde Lisboa a Bissau e, depois, a estadia na Ilha de Bolama, para, no CIM se concluir o processo de instrução global para a “guerra de guerrilha”, denominado de IAO,  esta Parte II corresponde ao itinerário efectuado a bordo de uma LDG, em 27 de Janeiro de 1972, 5.ª feira, desde Bolama até ao Xime, local reservado à CART 3494 para cumprir a sua missão operacional.

Para além do contingente da CART 3494 participaram também, nesta viagem de “cruzeiro no Geba”, as restantes unidades do BART 3873, comandado pelo Cor Art António Tiago Martins (1919-1992), cuja CCS e Comando tinham como destino Bambadinca (a sede), a CART 3492, o Xitole, e a CART 3493, Mansambo.

Recordamos que a Unidade Mobilizadora do contingente do BART 3873 foi o Regimento de Artilharia Pesada n.º 2 (RAP 2) da Serra do Pilar, em Vila Nova de Gaia, com o objectivo de render na, então, Província da Guiné, o BART 2917 e as subunidades: CART 2714, CART 2715 e CART 2716, aquarteladas em Mansambo, no Xime e no Xitole, respectivamente, também elas formadas na mesma U. M., por estar a atingir o termo da sua comissão de serviço.

A publicação da mobilização do BART 3873 foi publicada em 04 de Novembro de 1971, através da Nota Circular n.º 4496/PM – Processo 18/3873 da 1.ª Repartição do Estado Maior do Exército.


2. – FOTOGALERIA

Foto 1 > 27Jan72 > O contingente do BART 3873 no interior da LDG a caminho do cais do Xime

Foto 2 > 27Jan72 > Vista da margem direita do Geba (território do Enxalé)

Foto 3 > Aproximação de LDG ao cais do Xime (margem esquerda do Geba)

Foto 4 > LDG 104 no cais do Xime (margem esquerda do Geba)

Foto 5 > Desembarque de “piras” no cais do Xime

Foto 6 > Panorâmica do cais do Xime (vista do quartel)

Foto 7 > Recepção a um contingente de “piras” no cais do Xime

Foto 8 > Recepção a um contingente de “piras” no cais do Xime

Foto 9 > Recepção a um contingente de “piras” no cais do Xime 

Fotos (e legendas): © Luciano Jesus (2023). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

Continua… 

Terminamos,  agradecendo a atenção dispensada.

Com um forte abraço de amizade e votos de muita Saúde.

Jorge Araújo e Luciano de Jesus

19ABR2023
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Nota do editor:

(*) Vd. poste de 3 de abril de 2023 > Guiné 61/74 - P24191 Imgens das nossas vidas: CART 3494 (1971/74) (Jorge Araújo / Luciano Jesus) - Parte I: De Lisboa a Bolama

sexta-feira, 10 de março de 2023

Guiné 61/74 - P24134: As nossas geografias emocionais (1): Bafatá - Parte I: Fotos de Humberto Reis (ex-fur mil op esp, CCAÇ 12, Contuboel e Bambadinca, 1969/71): viagem de 1966


Guiné-Bissau > Região de Bafatá > 1996 > Ponte sobre o rio Geba na estrada Bafatá-Geba.


Guiné-Bissau > Bafatá > 1996: Em primeiro plano, a piscina local, aberta a civis e militares, no tempo da guerra... Tinha o nome "Piscina Guerra Ribeiro", tendo mudado depois da independência (Não se consegue ler muito bem o  nome que lhe foi dada posteriormente, talvez em 19882, mas tudo indica, amplaindo a imagem,  que seja  "Corca Só", um comandante do PAIGC e antigo futebolista de Mansoa, que atuou, no setor de Bafatá / Zona leste durante a guerra colonial, e na região do Oio; terá morrido em combate em 8out1972.)


Guiné-Bissau > Bafatá > 1996: Em primeiro plano, a piscina de Bafatá (ex-piscina Guerra Ribeiro, que foi administrador da circunscrição /concelho de Bafatá, nos anos 60, e era natural de Bragança; no tempo de Spínola, era já intendente; a piscina, dizia-se, tinha sido construída pelos militares de uma unidade aqui estacionada).

Do lado esquerdo, em segundo plano, a Casa Gouveia, que pertencia ao grupo CUF e que, no nosso tempo, era o principal bazar da cidade, tendo florescido com o patacão (dinheiro) da tropa e da guerra e do negócio da "mancarra". Vê-se, ao fundo, a estrada que conduz à saída para Nova Lamego (Gabu) e Bambadinca. Do lado direito pode observar-se as traseiras do mercado.


Guiné-Bissau > Bafatá > 1996 > O antigo restaurante "A Transmontana".... Desta vez o Reis teve azar: a velha "Transmonanta" onde muitas vezes matámos a malvada, estava fechada, as janelas já entaipadas com tijolos...


Guiné-Bissau > Bafatá > 1996: "À porta do célebre café das Libanesas, filhas da D. Rosa. Sou amigo pessoal do filho, ex-ten cor  paraquedista, que mora cá, em Portugal, em Linda A Velha, e também amigo de infância de um dos genros dela que mora aqui em Lisboa, e com o qual, por acaso, já tenho tido relações profissionais".... [Sabemos que o nosso antigo camarada de armas, Danif, ex-alf mil, BCP 12, 1972/74, voltou à sua terra natal, onde se estabeleceu como empresário (LG)]


Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Capé > 1996: "Clube de Caça do Capé, próximo de Bafatá, vendo-se em primeiro plano a piscina, que tinha um tratamento de águas impecável, como qualquer bom hotel. Em segundo plano a Palhota grande comportava a Recepção, Sala de Estar e Sala de Jantar. As pessoas que lá estavam hospedadas eram um grupo de 8 portugueses que tinham ido no mesmo avião que eu, para fazer lá uma semana de caça".

Fotos gentilmente cedidas pelo engenheiro técnico Humberto Reis, um dos históricos do nosso blogue, nosso colaborador permanente,  "cartógrafo-mor",  ex-fur mil op esp,  CAÇ 12, unidade de intervenção ao serviço do Sector L1 / Zona Leste, com sede em Bambadinca (1969/71). Voltou à Guiné-Bissau, em viagens de negócios e turismo de saudade em março de 1996.

Fotos (e legendas): © Humberto Reis (2006). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné.]

1. Esta série é dedicada à(s) "Memória(s) dos lugares"... Logo no princípio do nosso blogue, tínhamos, na badana (ou coluna estática) do lado esquerdo uma listagem (com links)  de lugares por onde passámos, documentados com fotografias e infografias... Ia já em 24 topónimos, mas faltavam muitos mais...

Bafatá (Região de Bafatá)
Bambadinca (Região de Bafatá)
Banjara / Cantacunda (Região de Bafatá)
Barro (Região do Cacheu)
Bigene (Região do Cacheu)
Binta (Região do Cacheu)
Bissau (Região Autónoma de Bissau)
Bissorã (Região do Oio)
Brá (Comandos) (Região Autónoma de Bissau)
Buba, Chamarra, Mampatá (Região de Quínara)
Cansissé (Região de Gabu)
Como (Ilha do) (Região de Quínara)
Empada (Região de Quínara)
Fá Mandinga (Região de Bafatá)
Geba (Região de Bafatá)
Guidaje (Região de Cacheu)
Guileje (Região de Tombali)
Mansambo (Região de Bafatá)
Missirá, Cuor (região de Bafatá)
Nova Lamego (Região de Gabu)
Quebo (Aldeia Formosa) (Região de Tomboli)
Saltinho (Região de Bafatá)
Xime (Região de Bafatá)
Xitole (Região de Bafatá)
 

2. As imagens estavam alojadas na minha página pessoal, Saúde e Trabalho - Luís Graça, no servidor da ENSP/NOVA. Foi descontinuada, em 2022, com o redesenho da página oficial da instituição.  Estou agora a recuperá-la através das capturas feitas pelo Arquivo.pt, bem como dos ficheiros originais. É uma tarefa morosa e ingrata...

E vou aproveitar para refrescar e atualizar os nossos álbuns fotográficos, por topónimos da Guiné (se não todos, pelo menos os principais). Afinal, trata-se de não perder as nossas "geografias emocionais". Muitas das fotos que vamos publicando estão dispersas. São de diferentes autores e anos... É agora a altura de as tentar reunir. 

Vamos começar por Bafatá, um topónimo que tem nada menos que 390 referências no nosso blogue. Ir à procura de fotos nestes 390 postes é obra...Vamos fazer uma seleção por amostragem, tendo também em conta a qualidade das imagens...  Ou vamos publicando fotos por autores e anos... 

Bafatá deve ter sido das localidades mais fotografadas da Guiné do "nosso tempo", a par de Bissau... Eram, aliás, as duas únicas cidades existentes. Humberto Reis foi um dos grandes fotógrafos de Bafatá. Tem as melhores fotos áreas da região... Outro foi o Fernando Gouveia, que lá viveu dois anos, entre 1968 e 1970, casado com a Regina Gouveia,  e lá voltou em viagem de saudade há uns largos anos atrás... É o nosso melhor cicerone da cidade, infelizmente há muito em decadência... Em 2009 também foi visitada (e fotografada)  por João Graça... O Patrício Ribeiro também poisa por lá, nas suas andanças pelo país, em trabalho... Temos outros amigos e camaradas cujos álbuns também  nos  merecem uma visita ou revisita: Jaime Machado, Manuel Mata, Arlindo T. Roda,  David Guimarães,  Virgílio Teixeira, etc. (cito de cor). Para já  ficamos com o  Humberto Reis... E esperemos que estas memórias, sob  a forma fotográfica, depertem outras memórias e nos tragam, ao blogue, novos amigos e camaradas da Guiné.

quarta-feira, 13 de julho de 2022

Guiné 61/74 - P23428: Historiografia da presença portuguesa em África (325): A circunscrição de Geba, em 1914, relatório de Vasco Calvet de Magalhães (2) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 12 de Outubro de 2021:

Queridos amigos,
Há algo de intrigante na publicação de uma tipografia do Porto, em 1916, de um relatório elaborado para o governador em Bolama em 1914. Aceita-se que o governador tenho autorizado a sua divulgação pública, ou mesmo o ministro, mas o retrato esboçado por Vasco Calvet de Magalhães tem para ali verdades duras como punhos, aquele terço da Guiné tem algum comércio e pouco mais, faltam infraestruturas, o Geba e o Corubal carecem de obras, considera os régulos uns sanguessugas, para quem põe em dúvida o rasto de violência que assola as etnias basta ler o que ele escreve sobre massacres e extermínios, ódios étnicos viscerais que depois alguns historiadores vêm escandalosamente atribuir a insurreições contra a presença colonial, ali, naquele terço da Guiné, de fresca data, quase oferecido de bandeja pela Convenção Luso-Francesa de 1886 as lutas tribais revelaram-se como o acontecimento mais tenebroso do século, pode mesmo dizer-se que o povo afável que hoje conhecemos tem na sua génese um quadro de violência que paradoxalmente conheceu em versão com a crescente administração portuguesa e com as vicissitudes das lutas pela independência.

Um abraço do
Mário


A circunscrição de Geba, em 1914, relatório de Vasco Calvet de Magalhães (2)

Mário Beja Santos

Com impressão na tipografia Progresso, Porto, 1916, o Administrador da Circunscrição de Geba fazia o seu relatório, seguramente encaminhado para Bolama, terá recebido autorização para edição própria. É um documento de grande importância, como o leitor ajuizará. Permite, em primeiro lugar, apercebermo-nos como mudam os critérios de organização do território, e neste caso é surpreendente a Circunscrição Civil de Geba, tinha uma área aproximada de 13 mil quilómetros quadrados, cerca de um terço do território da colónia, limitada a Norte e a Oeste pela linha de fronteira do marco 58º ao 95º, pelos limites Sul e Leste das regiões de Pateá, Colá e Oio, e limite a Oeste a região do Cuor; ao Sul e Leste o rio Corubal desde a sua confluência com o Geba até ao território do Corubal e a linha de separação deste território do de Badora e Cossé e linha de fronteira do marco 24º ao 58º, e o rio que a separa da região Norte do Forreá. Cerca de 19 regulados, desde Cabu até Mansomine. Impossível não ficarmos impressionados com a extensão desta circunscrição.

O mínimo que se pode dizer é que Calvet de Magalhães conhecia a fundo muitos dos problemas deste terço de território da Guiné onde a presença portuguesa era ténue. Já se escreveu que ele alerta o Governador para a escassez de recursos humanos, para os problemas inerentes ao crescimento de Bafatá que carecia de melhores meios de policiamento, é profundamente crítico quanto ao modelo de instrução, denuncia a exploração dos autóctones pelos comerciantes, onde preponderavam os sírio-libaneses, propõe um novo modelo de imposto substituindo a palhota pela capitação, é também profundamente cético quanto às modalidades de recrutamento do pessoal local, e diz mesmo: “Fui o primeiro funcionário encarregado de fazer um recrutamento nesta região. Até então, o governo só aqui recorria quando precisava do auxílio dos indígenas. Em 1909 embarcou o primeiro contingente de Fulas e Mandingas. A maioria fugiu de Bolama, em primeiro lugar porque não simpatizava com a vida militar e depois porque, em geral, eram maltratados. Esta pobre gente vai mais pela palavra do que pela pancada”. E recorda ao Governador que os recrutados fogem para território francês, não vê conveniência nenhuma em voltar a fazer recrutamento nestes moldes.

Passam-lhe pelo território os dois principais rios da Guiné, ao tempo o transporte percorria à navegabilidade do Geba e em parte à do Corubal. Alerta para o rio Geba estar a assorear-se constantemente e explica como e porquê: “Os locais onde os baixos aparecem numa determinada época, em virtude do lodo e das areias, arrastados pela corrente violenta das águas, mudam constantemente. Assim, uma embarcação é colhida de surpresa, quando navega, porque o rumo que seguiu a última vez tem de ser mudado em sentido contrário, porque a corrente em dias apenas, muda os bancos de lado e areia de uma para outra margem. Entre Ganjarra e Geba há um baixo de pedra e cascalho que na maré baixa não tem mais de 40 centímetros! Estou convencido de que cortadas algumas das curvas do rio Geba, tais como a de Ganjarra e a de Cuor, as correntes das águas, correndo a direito, escorreriam o leito do rio aprofundando-o mais e faria as viagens muito mais económicas e rápidas”. Vaticina igualmente que o rio Cocoli (o Corubal) se se destruíssem as rochas a montante do Xitole seria num curto período um dos rios de maior navegação porque para o comércio se desenvolver nestas regiões falta-lhe apenas a via de comunicação. Refere que anda no ar a ideia de construir um caminho-de-ferro do Xime a Kadé e manifesta o seu regozijo: “As margens da linha férrea transformar-se-ão em vastos campos de amendoim onde os Fulas virão de preferência estabelecer as suas lavras deste produto”.

Vive permanentemente inquieto com a construção das estradas e diz mesmo: “Como é que ocupando nós a Guiné há tantos séculos, ainda não se pensou na construção de uma estrada que ligue o litoral com as povoações mais importantes do interior?”. Espraia-se a descrever as culturas indígenas e releva a ingenuidade comercial destes: “Acontece que os indígenas quando colhem estes produtos, os vendem todos, como acontece com a mancarra, não tendo a previdência de guardarem a quantidade necessária para a futura sementeira. Quando procedem à sementeira, vão ter com os negociantes e compram-lhe o produto que lhes venderam pelo triplo do preço que estes deram por ele!”.

Gosta de mostrar trabalho, põe mesmo a imagem no seu relatório da construção de uma ponte sobre o rio Colufi com 152 metros de comprimento e 7,5 metros de altura que veio permitir a comunicação entre vários regulados com Bafatá; enumera melhoramentos em pontes e mercados e dá-se ao cuidado de apresentar um projeto de regulamento de venda e porte de armas. Não resiste a falar sobre o mosaico étnico da região, a sua origem e história, etnografia, costumes, etc. A história recente das lutas étnicas é tema que lhe interessa muito, faz uma descrição das guerras do Forreá entre Fulas e Beafadas e também a insurreição dos Mandingas que não se conformavam com a imposição dos novos régulos Fulas no Forreá. Narra também que os Mandingas se envolveram contra os Beafadas e que os Futa-Fulas do Futa-Djalon auxiliaram os Mandingas pois desejavam exterminar os Fulas-Forros, só que estes massacravam os Mandingas nas emboscadas. E veio também à baila a revolta de Mólo, pai de Mussá Mólo, Bambarã, ele declarou guerra de extermínio aos Mandingas, foi conquistando regulados onde ia colocando à frente Fulas. Moló submeteu também os Beafadas. E Calvet de Magalhães diz que o seu túmulo é venerado pelos Fulas-Pretos (Fulas cativos). O seu filho Mussá Mólo teve que fugir para a Gâmbia depois de ter praticado uma série de prepotências e infâmias em território português e francês. Gosta de nos contar curiosidades, como esta: “Todos os Fulas-Pretos ou Fulas-Cativos da região de Geba guardam respeito aos Fulas-Forros. Têm consciência da sua verdadeira origem! Todas os Fulas-Pretos da região são descendentes de Mandingas, Beafadas e Soninqués”. O Administrador de Geba diz claramente que considera o régulo um flagelo para o indígena, um sanguessuga.

Caminhando para o final da obra, apresenta um apontamento sobre a língua Fula, deita um olhar atento sobre as indústrias indígenas recordando que existem em toda a circunscrição dispersos tecelões que, com o próprio algodão que os indígenas cultivam, tecem panos de uma única cor ou com vários desenhos. “Estes indígenas, se lhes fossem fornecidos teares modernos e se lhes corrigissem defeitos, tornar-se-iam verdadeiros artistas”. Espraia-se pela fauna e pela flora, dá-nos conta dos diferentes tipos de macacos, da existência do chimpanzé, do leão pequeno, do leopardo pequeno, do pangolim, hipopótamos e raros elefantes, enumera as aves de rapina, os galináceos, os palmípedes, os lagartos, jiboias e cobras e todo o tipo de peixe.

Não deixa de ser curioso apresentar-nos em anexo a lista estabelecimentos existentes na circunscrição civil de Geba. Destaca em Bafatá: Companhia Francesa da África Ocidental; Companhia Francesa do Comércio Africano; Nouvelle Société Commerciale Africaine (antiga Casa Soler); Rudolf Titzck e Comandita; Companhia Franco-Escocesa; E. Salagua e Companhia; Aimé Grenier e Companhia; Osório Pereira Tavares; João Teixeira e José Fernandes, para além de 20 estabelecimentos de sírio-libaneses. Em Bambadinca estavam estabelecidos Francisco Monteiro e Leão Ledo Pontes; no Xime, Rudolf Titzck e Comandita e Domingues Marques Vieira; em Geba destacavam-se os seguintes estabelecimentos: Hans Schwartz, E. Salagua e Companhia, Rudolf Titzck e Comandita, Augusto Fernandes e Paulo dos Reis Pires.

Este relatório de 1914 é uma peça fundamental para entender a presença portuguesa num terço da colónia nesse ano em que eclodiu a I Guerra Mundial.

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Nota do editor

Último poste da série de 6 de julho de 2022 > Guiné 61/74 - P23413: Historiografia da presença portuguesa em África (324): A circunscrição de Geba, em 1914, relatório de Vasco Calvet de Magalhães (1) (Mário Beja Santos)

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2022

Guiné 61/74 - P23029: Notas de leitura (1423): “Pequenos Grandes Navios na Guiné” nos Anais do Clube Militar Naval, número de Janeiro/Março de 1998 (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 23 de Abril de 2019:

Queridos amigos,
É facto que já existe bastante literatura sobre a presença da Marinha no teatro de operações da Guiné. O Vice-Almirante Lopes Carvalheira esboça um quadro rigoroso, em termos históricos, acerca da intervenção da Armada na fiscalização e intervenção que era efetivada pelos Destacamentos de Fuzileiros Especiais. Atenda-se ao desenvolvimento que dá à Operação Tridente, a maior operação em que intervém a Marinha na Guiné, a guerra dos rios e as vicissitudes por que passou a gloriosa LDM 302.
Um belo resumo a ter em conta.

Um abraço do
Mário



Pequenos grandes navios na guerra da Guiné

Beja Santos

O Vice-Almirante José Alberto Lopes Carvalheira escreveu um muito bem elaborado artigo intitulado “Pequenos Grandes Navios na Guiné” nos Anais do Clube Militar Naval, número de janeiro/março de 1998. É um documento sobre a presença da Armada nos rios da Guiné, ilustrado pelos meios envolvidos. Começa por mencionar que na fase de prevenção de conflitos a ocorrer em África foi possível fazer chegar à Guiné em 19 de maio de 1961 as primeiras unidades navais: duas Lanchas de Fiscalização Pequenas (LFPs) e duas Lanchas de Desembarque Pequenas (LDPs). 

A partir dessa data outras unidades foram sucessivamente chegando, atingindo a Esquadrilha de Lanchas o seu número máximo em setembro de 1969, com 8 LFPs, 14 LDMs-F (Lanchas de Desembarque Médias) para fiscalização, 9 LDMs-L (para transporte logístico) e 8 LDPs, perfazendo um total de 39 unidades, houve depois o abate, ainda em 1969, de duas LDMs.

A Marinha atuava na fiscalização e na intervenção, mas também apoiando para reabastecimento de toda a espécie e para escoamento de produtos económicos.

No que toca à fiscalização dos rios, havia missões no rio Cacheu, nos rios Cacine, Cobado e Cumbijã, no rio Geba com apoio à navegação de e para Bambadinca; havia ainda a fiscalização de Bolama, rio Grande de Buba, havendo de ter em conta um Destacamento de Fuzileiros sediado em Bissau e outro em Bolama; por fim a fiscalização do rio Mansoa em permanência efetuada pelo Destacamento de Fuzileiros sediado em Bissau. E escreve:

“Este dispositivo de fiscalização foi ao longo dos anos sofrendo os necessários ajustamentos, de modo a criar o maior dissuasor possível para fazer face às linhas de ação do inimigo. Assim, a partir de 1967, dentro do novo conceito de contra-penetração então estabelecido foi formado, ao norte do rio Cacheu, com base em Bigene, o Comando Operacional n.º 3 (COP 3). A este Comando que também foi comandado por um oficial da Marinha, além das forças terrestres, chegaram a estar atribuídos, em permanência, três destacamentos de fuzileiros para intervenção na zona. Com os fuzileiros instalados em Ganturé, em aquartelamento para o efeito construído pela Marinha, tornou-se possível a estes atuarem com grande eficácia por meio de patrulhas e emboscadas em botes de borracha em colaboração com as unidades navais da TG3, igualmente atribuídas ao COP 3 para fiscalização da extensa zona do rio Cacheu, ao mesmo tempo que permitia a sua utilização no apoio direto às operações deste Comando Operacional”.

Este dispositivo naval manteve-se praticamente até ao final da guerra, impôs-se como um travão às tentativas de infiltração do PAIGC no Norte da Província. A partir de 1967, no Sul da Província, os rios Cacine, Cobade e Cumbijã deixaram de ter fiscalização permanente. Nesta altura, no rio Grande de Buba foi montado dispositivo idêntico ao do rio Cacheu. Em 1970, retomou-se o dispositivo de contra-penetração do rio Mansoa, interrompido em 1967. Ainda em 1970, no rio Cacheu, mais junto à sua foz, montou-se igual dispositivo com destacamento de fuzileiros sediados na vila de Cacheu. 

“Em 1971, após o ataque levado a efeito com mísseis sobre Bissau em 9 de junho, retomou-se a fiscalização contínua do rio Geba, a montante de Bissau, até ao Geba estreito, complementando a patrulha noturna ao porto de Bissau e seus acessos que se mantinha desde 1963”

Passemos agora da fiscalização para a intervenção. Era normalmente efetuada pelos Destacamentos de Fuzileiros Especiais que tinham como tarefa base a fiscalização que desempenhavam em permanência, sempre que não eram chamados a intervir em operações.

Quanto à sua atuação, destaca-se a Operação Tridente. O autor menciona a missão e organização operacional para se poder avaliar a sua envergadura naquela que foi a maior operação de sempre da Marinha na Guiné, detalha a missão, as unidades navais em presença, as forças de intervenção e o seu comando, o apoio logístico e a execução, concluindo nestes termos: 

“Não pode deixar-se de salientar que foi muito honrosa a atuação dos cerca de mil e quinhentos homens das nossas forças navais, terrestres e aéreas empenhados nesta operação que, no terreno em combate, sofreram oito mortos e trinta e três feridos, sendo alguns com gravidade”.

Quanto às vias de comunicação, o autor refere o armamento do PAIGC utilizado nos frequentes ataques das margens dos rios, o que confere importância ao capítulo seguinte, a guerra dos rios, pondo acento tónico nos reabastecimentos, no transporte operacional e rendição das nossas forças, bem como no transporte de pessoas e bens. 

“Teve a Marinha com todas as suas unidades navais, mais particularmente com as destinadas aos transportes logísticos (LDGs Alfange, Montante e Bombarda e LDMs), permanente, intenso, discreto, mas importantíssimo trabalho. Desde junho de 1963, quando se verificou que ao risco dos ataques das margens se juntava o risco da fuga de embarcações para a República da Guiné, quer por ação exclusiva do inimigo, quer por iniciativa conivente das próprias tripulações das embarcações civis, o Comando da Defesa Marítima da Guiné decidiu-se pela organização dos seguintes comboios, o que se manteve até final, com periodicidade mensal, embora com ligeiras alterações de execução.

Comboio de Bedanda... Bissau – Bedanda – Bissau
Comboio de Catió... Bissau – Catió – Bissau
Comboio de Farim... Bissau – Farim – Bissau
Comboio de Bissum... Bissum no rio Armada

Para outras povoações, tais como Cacine e Gadamael, as embarcações a proteger seguiam em companhia até à foz do rio Cumbijã, juntamente com o comboio de Bedanda, seguindo depois pelo Canal do Melo para Cacine e Gadamael Porto, com escolta embarcada e escoltadas por uma unidade naval para o efeito. O mesmo acontecia para Buba, Bambadinca, Encheia e Teixeira Pinto, apenas com as embarcações civis com escolta embarcada e, irregularmente, protegidas por navios escolta"
.

O artigo do Vice-Almirante Lopes Carvalheira conta a história da LDM 302, a lancha que, ao longo dos anos, mais duramente sofreu as consequências da guerra dos rios da Guiné, abstemo-nos de mais pormenores, já aqui se contou as vicissitudes que sofreu, inclusive foi referida a esplêndida banda-desenhada que lhe consagrou António Vassalo.[1]


A LDM 302, imagem retirada do blogue reservanaval, com a devida vénia.
A LDM 307, imagem retirada do blogue reservanaval, com a devida vénia.
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Notas do editor

[1] - Vd. poste de 14 DE AGOSTO DE 2015 > Guiné 63/74 - P15003: Notas de leitura (747): “A Epopeia da LDM 302”, por A. Vassalo, em BD, Edições Culturais da Marinha, 2011 (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 21 DE FEVEREIRO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23013: Notas de leitura (1422): “Descolonizações, Reler Amílcar Cabral, Césaire e Du Bois no séc. XXI”, é coordenadora Manuela Ribeiro Sanches; Edições 70, 2019 (Mário Beja Santos)

terça-feira, 10 de agosto de 2021

Guiné 61/74 - P22447: Efemérides (351): Ainda e sempre o naufrágio no rio Geba, em 10/8/1972, em que perdemos três camaradas (Jorge Araújo, ex-Fur Mil Op Esp / Ranger, CART 3494 / BART 3873, Xime e Mansambo, 1972/1974; agora em férias prolongadas nas "Arábias")


 

Foto (e legenda): © Jorge Araújo (2014). Todos os direitos reservados. (Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné).





1. Mensagem enviada hoje, às 9h09, pelo nosso coeditor Jorge Araújo  (ex-Fur Mil Op Esp / Ranger, CART 3494, Xime e Mansambo, 1972/1974), e agora de férias prolongadas nas "Arábias" 


 

Caros Camaradas,

Os meus Bons Dias desde as «Arábias».

Faz hoje quarenta e nove anos (1972.08.10-2021.08.10) que vários elementos do contingente militar da CART 3494, a terceira unidade de quadrícula do BART 3873, tiveram de “mergulhar”, sem o desejarem, nas águas revoltas, escuras e lodosas do Rio Geba, na região do Xime/Bambadinca (Sector L1), 
onde, por efeito da falta de bom senso mesclado com alguma improvisação, perderam a vida três jovens milicianos, naquele que ficou gravado como o «Naufrágio do Geba».

Ao recuperar esta horrenda efeméride que a todos marcou, naturalmente mais aos que viveram e sobreviveram à experiência, quero prestar a minha sentida homenagem aos que pereceram naquele acidente náutico: 

José Maria da Silva Sousa
Manuel Salgado Antunes
Abraão Moreira Rosa.

Para compreender a trágica ocorrência devem-se ler os postes:

Com um abraço de amizade e muita saúde,
Jorge Araújo

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Nota do editor:

Último poste da série > 1 de agosto de 2021 > Guiné 61/74 - P22421: Efemérides (350): Fez 55 anos, em 30/7/1966, que parti para o CTIG, no T/T Uíge, para ir formar em Bolama o Pel Caç Nat 54... Estive depois em Mansabá, Enxalé, Missirá, Porto Gole, Ilha das Cobras e Ilha das Galinhas (José António Viegas, fur mil art, 30/7/1966 - 22/9/1968)

sexta-feira, 7 de maio de 2021

Guiné 61/74 - P22178: 17º aniversário do nosso blogue (6): homenagem às "nossas lavadeiras" (Valdemar Queiroz / Cândido Cunha)


Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Contuboel >  Rio Geba  > 1969 > Uma belíssima foto de uma lavadeira, em contraluz. O Valdemar Queroz atribuiu os créditos fotográficos ao seu "irmão siamês"  Cândido Cunha.

Foto (e legenda): © Cândido Cunha / Valdemar Queiroz (2021). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar. Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Espinho > Silvalde > Fevereiro de 1969 > CART 2479 / CART 11 > IAO, Instrução de Aperfeiçoamento Operacional > Uma "foto histórica" um "ninho" de lacraus, designação do pessoal da futura CART 11 (Contuboel, Nova Lamego, Piche) > O Cândido Cunha é o nº 3... Os restantes (cujas cabeças são visíveis); o Ferreira (vaguemestre) (10), o Abílio Pinto (11), o Manuel Macias (6), Pechincha (que era de operações especiais) (7) e o Abílio Duarte (5).
 
Foto (e legenda): © Valdemar Queiroz (2014). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar. Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Mensagem de Valdemar Queiroz [ex-fur mil, CART 2479 / CART 11, Contuboel, Nova Lamego, Canquelifá, Paunca, Guiro Iero Bocari, 1969/70]
 
Date: quinta, 6/05/2021 à(s) 15:41
Subject: Homenagem às "nossas lavadeiras"
 
Luís, como tens passado? Agora é aguentar até tratar do problema,  bem diferente do que seria numa comissão (#) em Bambadinca/Xime que serviu de tarimba para enfrentar dificuldades. 

Como homenagem às "nossas lavadeiras" anexo uma fotografia, uma das extraordinárias fotografias do nosso blogue, duma lavadeira em plena laboração na "lavandaria do Geba", em Contuboel.

Esta bela fotografia que faz parte do meu álbum, julgo ser de autoria do Cândido Cunha, fur mil da minha CART 11, tirada à silhueta da bajuda em movimento, que com melhor máquina apanharia os pingos da roupa e poderia muito bem ser uma obra de arte fotográfica.

Tratava-se duma das primeiras visitas à "lavandaria" para ver as bajudas a lavar roupa, não seria propriamente só ver a lavar roupa, aproveitando para uns mirones  às  belas bajudas fulas em topless.

Ó  por cá (1969/70) ainda o topless na praia era proibido ou nem sequer pensado, só começando a aparecer nas praias do sudoeste alentejano com as belas loirinhas alemãs ou holandesas. Essas não se importavam de fotos dos embasbacados mirones católicos que até para não serem mal educadas vestiam uma t-shirt e pediam uma cópia como recordação. 

Tal como por cá acabaram negócios em pequenas localidades (p.ex. Vendas Novas, Mafra) devido aos Quarteis de preparação de tropa p'ra guerra, também  nas tabancas da Guiné acabou o negócio das lavadeiras.

Com ironia... como o vinho matar a fome a milhões de portugueses, é uma chatice acabar com o negócio da guerra. 

Abraço e força com isso
Valdemar Queiroz

(#) Também utilizado como 'comissão de serviço', mas fique bem claro não se tratar de percentagem cobrada sobre um serviço prestado.
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