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segunda-feira, 6 de fevereiro de 2023

Guiné 61/74 - P24041: Notas de leitura (1550): Uma safra de leituras, sábado na Feira da Ladra, em tempos de pandemia (1) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 25 de Maio de 2020:

Queridos amigos,
Tony Tcheka é nome proeminente da poesia guineense e aqui se deixa referência à sua comunicação num encontro de escritores de língua portuguesa, realizado em Luanda em 2015 sobre o tema da relação de escritores com as cidades, Tony Tcheka privilegiou discretear sobre a evolução das temáticas poéticas pós-independência, onde a criança e a mulher sobressaem, a primeira por constituir a dor constante da infância humilhada, a fase patente do subdesenvolvimento e da humilhação; a segunda, decorre do facto de a mulher se ocupar de todos os misteres, deita mão a tudo, produz, curva-se na bolanha, prepara o arroz para a família, na cidade deita mão a tudo, e a literatura guineense espelha muito bem a sua dor física e psicológica. Bem gostei de voltar à Feira da Ladra depois do intenso jejum pandémico, trouxe outras leituras de que vos vou dar conta, um antigo combatente de Olhão que veio matar saudades à Guiné, e o relatório produzido por um think tank, o Bow Group, muito próximo do Partido Conservador britânico, elaborado em 1961, em que se diz claramente que não há qualquer solução militar para o império colonial português.

Um abraço do
Mário



Uma safra de leituras, sábado na Feira da Ladra, em tempos de pandemia (1)

Mário Beja Santos

Foi sábado de sol, o polícia a vigiar o cumprimento das normas, quem queria folhear e comprar alfarrábios usava obrigatoriamente máscara e luvas. Confesso que tinha saudades, eram meses sem visitas, compreensivelmente, ali me senti bem e entusiasmado, na fase de desconfinamento. A primeira surpresa foi o livrinho Literatura e Lusofonia 2015, desse encontro de escritores de Língua Portuguesa havia nomes sonantes como Pepetela, Manuel Rui e Tony Tcheka, poeta guineense que muito admiro. A UCCLA – União das Cidades Capitais de Língua Portuguesa tem privilegiado estes encontros, o de 2015 foi em Luanda, a temática era a relação dos escritores com as cidades, a forma como as encaram e em que medida elas os inspiram. Como o nosso blogue, por definição está orientado para tudo quanto é Guiné, vamos dar a palavra a Tony Tcheka que discreteou sobre a criança, a mulher e a cidade na literatura guineense – Meninos da Terra Vermelha, alusão à cor da laterite.

Começou a sua intervenção com o poema Chamo-me Menino!, assim:
“Sou a criança pobre/ de uma rua sem nome/ num bairro escuro/ de covas fundas/ em gargantas/ fatalmente magras, carentes de pão/ e sem muita ambição/ Sou filho da miséria/ escancarada/ enteado da vida/ entreaberta/ Vivo na periferia/ passo no tempo/ com trejeitos d’homem/ Chamo-me Menino!/ Dou passas desde os cinco/ tenho doze chuvas/ uma cara operária/ sobre um corpo fininho/ cinco anos/ Sofro de raquitismo/ por comer com os olhos/ enquanto na garganta/ destilam bolas de saliva/ Meu peito nicotizado/ é mortalha e tantam/ arde e inflama/ como a chama! – Chamo-me Menino!”.

Tony Tcheka alude a jovens da geração que nos anos 1960, vivendo na cidade de Bissau, ia registando episódios diversos, apontamentos que inevitavelmente se prendiam com o sistema social e político. Iniciado o chamado processo de reconstrução nacional, Mário Pinto de Andrade deu acalento à publicação de muitos desses textos com o nome de Mantenhas para Quem Luta, antologia poética com 48 textos escritos em português, 1977. No ano seguinte seria editada uma segunda coletânea, a diversidade temática extravasava o colonialismo, a escravatura, a exaltação da liberdade e a esperança num futuro melhor. A investigador Filomena Embaló escreveu a propósito: “A questão de identidade não é apresentada como um fator de oposição entre o indivíduo e a sociedade na qual este evolui. Ela é analisada como um conflito pessoal do indivíduo, que consciente do seu desfasamento cultural em relação à sociedade de origem procura identificar-se com as suas raízes, da qual foi afastado pela assimilação colonial”.

É neste contexto que aparecem a criança e a mulher, a par da terra libertada. Como Tony Tcheka escreve: “Criança trabalhadora, menino de rua, portador de deficiência, enfim, a realidade vigente que mais não é que o reflexo do seu próprio atraso de desenvolvimento, o que também coloca a infância à margem da saúde e da própria escola”. E cita vários poemas onde realçam os “meninus de kriason”, crianças entregues a supostos cuidados de famílias urbanas remediadas, com o fito de aprenderem a ser gente e a ter uma vida melhor. "São levadas para a cidade com o fito de aprenderem a vida. Entre o enunciado e a verdade ressalta a dimensão verdadeira da criança maltratada, a criança escravizada. Chegados à cidade ou noutros centros urbanos, na casa dos senhores, são confinados a um trabalho árduo e sem limites. São os primeiros a erguer-se, ainda antes dos raios de sol vencerem a madrugada, seguindo os caminhos das fontes para encher baldes e baldes de água e apanhar lenha para fazer crepitar o fogareiro e preparar o ‘matabicho’ dos senhores da casa e familiares. Nunca vão à escola e se falham nalguma labuta são severamente punidos. Há muitos deles, quando tudo se torna insuportável, só lhes resta a fuga para a rua, onde alimentam o batalhão dos Meninos da Rua".

Refere o autor que trinta anos depois, em 2010, foi lançada em Lisboa uma nova antologia juvenil da Guiné-Bissau, assinada por 23 jovens com poemas em português e kiriol. E o que se verifica? Que persistem os meninos de ontem e de hoje na poesia guineense, povoam espaços criativos, de igual modo também se regista a presença feminina. E Tony Tcheka questiona o que é a cidade dos meninos. “Sacudida ciclicamente por crises políticas e militares violentas, ela resiste e disponibiliza-se como palco das lides literárias que acontecem nos centros culturais nas embaixadas de países amigos”.
E o poeta continua:
“Quando os tempos são duros, trazendo lascas e bagos de dor, outras penas perscrutam a cidade dos meninos, atingido pelo macaréu da maldade, e os canhões orquestram valsas fúnebres que sentenciam a desertificação compulsiva da cidade (…) Durante mais de uma década, esta cidade de meninos não parou de ser fustigada e castigada por lâminas desembainhadas, amputando mentes, lascando corpos, suprimindo vidas”.

Falando de 2014, ano de eleição de José Maria Vaz, com todas as expetativas de reconciliação nacional, o poeta Tony Tcheka destaca o alívio que as promessas de paz trouxeram ao país, relembra que as garças e pelicanos fizeram a viagem de regresso ao seu habitat, que muitos pássaros voltaram a cantar o fim da madrugada, como se estivessem a anunciar um novo tempo de uma esperança resgatada. O mesmo poeta que exalta o sofrimento da criança também não esquece que a mulher surge como a fiel depositária dos valores e referências da idiossincrasia guineense. É camponesa, é pescadora, é mestre, professora. E deste modo termina a comunicação de Tony Tcheka:
“Nem sempre ser mulher é sinónimo de satisfação, ante adversidades de vária ordem instala-se a revolta que desagua na escrita de uma poeta: obrigado por esta dor/ por este desespero/ essa voz gigante/ ecoando em mim/ … / obrigada por este momento de angústia/ por esta raiva de ser mulher/ esta luz/ obrigado por este silêncio/ meu refúgio…/. Mas é também pelo verso de Odete Semedo que se percebe uma abordagem inovadora sintonizada com o género: … sou o rio que corre/ tropeçando em pedras e velas/ para chegar ao seu destino/ não sou mulher nem homem/ … apenas um pedaço deste chão.
Tanto tratadas, no entanto, são poucas as vozes femininas no universo literário guineense. Destacam-se: Odete Semedo; Saliatu Costa; Domingas Samy; Filomena Embaló; Teresa Montenegro; Eunice Borges; Mariana Ribeiro; Auzenda Nogueira; Filomena Correia; Gina Có; Irina Ramos e Rira Ié. Contudo, no segundo volume da antologia poética guineense, Traços no Tempo, participam já nove poetisas”
.

É este o registo que Tony Tcheka faz de crianças e mulheres na lírica guineense pós-independência. O outro documento que encontrei na Feira da Ladra intitula-se Retrato(s), o seu autor João Peres, edição do Núcleo de Olhão da Liga dos Combatentes, é uma lindíssima romagem de saudade que iremos ver a seguir.

(continua)

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Nota do editor

Último poste da série de 3 DE FEVEREIRO DE 2023 > Guiné 61/74 - P24034: Notas de leitura (1549): "O Santuário Perdido: A Força Aérea na Guerra da Guiné, 1961-1974 - Volume I: Eclosão e Escalada (1961-1966)", por Matthew M. Hurley e José Augusto Matos, 2022 (15) (Mário Beja Santos)

terça-feira, 19 de dezembro de 2017

Guiné 61/74 - P18105: Manuscrito(s) (Luís Graça) (134): As nossas comidinhas... guineenses, "manga di sabi"


Guiné-Bisssau > Região de Tombali > Sector de Bedanda > Cananima > Simpósio Internacional de Guileje (Bissua, 1-7 de março de 2008  > 2 de Março de 2008 >  O famoso óleo de palma do Cantanhez. A sua cor vermelha intensa deve-se às características da variedade do chabéu (termo científico, Elaeis guineenses), que é rico em caroteno.




Guiné-Bisssau > Região de Tombali > Sector de Bedanda > Cananima > Simpósio Internacional de Guileje (Bissua, 1-7 de março de 2008  > 2 de Março de 2008 >

A simpatiquíssima Cadidjatu Candé, da comissão organizadora do Simpósio Internacional de Guileje e colaborada da ONG AD - Acção para o Desenvolvimento, servindo um fabuloso arroz com filetes de peixe do rio Cacine e óleo de palma local, que tem fama de ser o mais saboroso do país, devido à qualidade da matéria-prima e às técnicas e condições de produção (artesanal). Na imagem, um diplomata português, o nº 2 da Embaixada Portuguesa, que integrava a nossa caravana (e cujo nome, por lapso, não registei, lapso de que peço desculpa).

Um dos pratos que foi servido no almoço de domingo, aos participantes do Simpósio Internacional de Guileje, foi peixe de chabéu, do Rio Cacine, do melhor que comi em África... Durante a guerra colonial, na zona leste, em Bambadinca, só conheci conhecíamos o desgraçado peixe da bolanha que sabia  a lodo....

Fotos (e legendas): © Luís Graça (2008). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís  Graça & Camaradas da Guiné] (*)


1. A propósita da nota de leitura que o Mário Beja Santos fez do livro  "Tera Sabi: receitas da gastronomia tradicional guineense",  2ª ed., 2013 (**)


Mário: o teu amor àquela terra e àquela gente, a "nossa" terra, a "nossa" gente,  passa também pelas comidinhas... Acho que estamos todos hoje a (re)descobrir as cores, os sabores, os ingredientes e as receitas da culinária guineense... Tal como no Alentejo, a pobreza pode ser (e é) criativa... na cozinha!... Veja-se as "sopas dos ganhões" a irem á "mesa dos chefs", sendo já hoje verdadeiros produtos "gourmet"...

Quando lá estive (... quando lá estivemos) na Guiné, estupidamente o meu, nosso, prato favorito era... o "bife com batatas fritas e ovo a cavalo"!... Fazíamos 60 km (ida e volta) para o ir comer à "Transmontana", em Bafatá, à civil"!... Nio intervalo da guerra...

Ainda comi algumas vezes o "frango de chabéu" da dona Auá Seidi, mulher do Fernando Rendeiro, as ostras ao natural (em Bissau) e os lagostins do Geba (no Zé Maria, em Bambadinca)...Alguma caça, alguma fruta... e pouco mais.

Com os meus 23/24 anos, não tinha nem estômago nem muito menos sensibilidade cultural, nem "mundo" em matéria gastronómica... para apreciar as iguarias guineenses... Muito menos tinha a indispensável "paz de espírito"...

Voltei lá em 2008, e aí comecei a experimentar algumas coisas, boas, que me deliciaram, como o peixe do rio Cacine... Mas, por causa do pãnico das diarreias, mal toquei no pitchipatche (canja ou sopa de ostra) em Bissau, na casa do Pepito...

Parabéns pela tua recensão, parabéns ao Tony Tcheka pelo texto introdutório... Vou ver se encontro o livrinho nas "lojas do comércio"...Porque nas nossas livrarias nem pensar... Muito menos nas grandes superfícies (FNAC, etc.)... Nem na Net, há referência a esta 2ª edição... (A não ser, claro, está no nosso blogue e naqueles blogues que nos seguem, e já são bastantes...). (***)


2. Tony Tcheka é o pseudónimo literário de António Soares Lopes Júnior, nascido em Bissau, em  21 de dezembro de 1951.  É já uma das referências maiores da poesia guineense pós-independência.

Vive em Portugal, é (ou foi)  jornalista.  E vai, portanto, fazer, depois de amanhã  66 anos. Partimos mantenhas com ele... e convidamos os nossos leitores a conhecer 10  dos seus poemas, disponíveis aqui. Gosto particularmente de:

Batucada na noite
Povo adormecido
Concerto de 'Djunta mon'
Zé da Tugalândia
Mulher da Guiné
Lusa língua

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Notas do editor:

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017

Guiné 61/74 - P17045: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (40): O jornalismo e a guerra colonial: contactos precisam-se de pessoas (civis ou militares) que tenham trabalhado na imprensa da Guiné portuguesa: O Arauto, Notícias da Guiné, A Voz da Guiné... (Sílvia Torres, ex-oficial da FAP, doutoranda)


Capa do livro "O jornalismo português e a guerra colonial" (Lisboa, Guerra & Paz Editores, 2016). Organização de Sílvia Torres. Foto de capa do Facebook da autora (com a devida vénia...)


1. Mensagem da nossa leitora, ex-militar da FAP, e filha de antigo combatente da guerra colonial Slvia Torres:

Data: 6 de fevereiro de 2017 às 10:40
Assunto: Imprensa - Guiné Portuguesa

Caros senhores,

Para efeitos académicos (estou a fazer o Doutoramento em Ciências de Comunicação, na FCSH /UNL), necessito de entrevistar pessoas que tenham trabalhado na imprensa da Guiné Portuguesa - O Arauto, Notícias da Guiné e/ou Voz da Guiné - durante a Guerra do Ultramar.

Será que me podem ceder alguns contactos?

Até agora, só consegui falar com Agostinho Azevedo e ]

Desde já, muito obrigada pela vossa atenção.

Cumprimentos.
Sílvia Torres


2. Sílvia [Manuela Marques] Torres > CV abreviado:

(i)  nasceu em Mogofores, Anadia, em 1982, filha de um antigo combatente da guerra colonial;

(ii) licenciada em Jornalismo e Comunicação pela Escola Superior de Educação do Instituto
Politécnico de Portalegre;

(iii) mestre em Jornalismo pela Faculdade de Ciências  Sociais e Humanas da Universidade
NOVA de Lisboa (FCSH / UNL);

(iv) jornalista, entre 2005 e 2007, do "Diário de Coimbra"; tendo colaborado também no "Jornal da Bairrada" (o mesmo onde escreveu o nosso camarada., anigo e escritor, Armor Pires Mota, em meados dos anos 60);

(v) oficial da Força Aérea Portuguesa (FAP), em regime do contrato, de  outubro de 2007 a abril de 2014, 

(vi) enquanto militar, foi locutora da Rádio Lajes e exerceu também funções  na área da Comunicação no Departamento de Informação e Marketing, no Centro de Recrutamento da Força Aérea.

(vii) entre Agosto de 2012 e agosto de 2013,  cumpriu uma missão de Cooperação Técnico-Militar em Timor-Leste:  deu formação em Língua portuguesa  a militares das FALINTIL, Forças de Defesa de Timor-Leste, e  a funcionários civis  da Secretaria de Estado da Defesa da República  Democrática de Timor-Leste;

(viii) autora de “O jornalismo português e a guerra colonial” (2016)


(ix) atualmente é aluna de  Doutoramento em Ciências da Comunicação na FCSH / UNL.


3. Comentário do editor:

Sílvia, obrigado pelo seu contacto... Vamos tentar ajudá-la, com a generosidade e a solidariedade que são o timbre da nossa Tabanca Grande. Para mais, tratando-se da filha de um camarada nosso, combatente da guerra colonial... Costumamos dizer: Os filhos dos nossos camaradas, nossos filhos são...

Para já temos, na nossa comunidade virtual, a Tabanca Grande, um camarada que trabalhou, em Bissau, no pós 25 de abril, no jornal "Voz da Guiné"... Sob a direção do capitão Duran Clemente, do MFA da Guiné, esteve integrado na equipa que fez a transferência do jornal para as novas autoridades guineenses... e tem alguns exemplares das últimas edições (**)

Trata-se do Benvindo Gonçalves, ex-fur mil trms.. Mandámos-lhe, por mail, os seus contactos.

Temos  algumas referências, dispersas, sobre a imprensa da Guiné do nosso tempo, em especial sobre o "O Arauto" (que se pubicou, como diário, de 1950 até 1968) e sobre  a  "Voz da Guiné" (1972-1974): ambos foram que era dirigido pelo padre franciscano José Maria da Cruz Amaral (1910-1993).

O que poucos sabem (ou sabiam...) é que este padre franciscano, que passou quase 4 décadas em África (em Moçambique e depois na Guiné), foi também o diretor de "O Arauto", até 1968, altura em que terá sido  "extinto" pelo general Arnaldo Schulz, "em represália contra a linha editorial do Arauto, que procurou denunciar a anarquia militar e civil do seu governo da província" (, facto que precisa de ser comprovado por fontes independentes; na realidade, "O Arauto" foi sempre um jornal alinhado política e ideologicamente com as autoridades do Estado Novo).

Spínola, por sua vez, convidou-o, em 1972,  para director do novo jornal "Voz da Guiné" (, não confundir com "A Voz da Guiné", com vida efémera em 1922),  transformado entretanto em jornal oficial (ou oficioso) da província...
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Notas do editor:

(*) Último poste da série > 6 de dezembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16807: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (39): pedido de ajuda para tese de doutoramento em Antropologia, pelo ISCTE-IUL, sob o tema do uso de álcool e drogas na guerra colonial (Vasco Gil Calado)

(**) Vd. poste de 1 de junho de 2010 > Guiné 63/74 - P6514: (Ex)citações (78): Como fui colocado no jornal Voz da Guiné (Benvindo Gonçalves, ex-Fur Mil Trms, CART 6250, Mampatá, 1974)

(...) Em 1974, fui mobilizado em rendição individual, como Furriel de Transmissões, para a Cart 6250, sita em Mampatá, e, hoje, envio-vos alguns dados sobre essa minha breve passagem, por esta Companhia e pelas terras da Guiné.

Com o advento da Revolução de Abril ou dos Cravos, a negociação de Paz e o fim da guerra com as Colónias, começou a desmobilização e o regresso a casa, sendo a Companhia onde estava integrado uma das primeiras a regressar, não me incluindo nesse lote, pois devido à minha situação seria deslocado para outro lado, substituindo colegas mais velhos em permanência.

A Cart 6250 saiu de Mampatá por via marítima, pois, além do pequeno aeródromo de terra batida existente em Aldeia Formosa, esta era a alternativa que nos restava, já que não havia estradas que nos ligassem a Bissau. Essa saída deu-se recorrendo a uma LDG (Lancha de Desembarque Grande), demorando bastante tempo, pois a navegação tinha que ser feita tendo em atenção as marés, pelo que passámos uma noite no caminho dormindo ao luar aguardando a subida da maré para podermos prosseguir a viagem.

Quando chegámos a Bissau, rumámos para o Ilondé, de onde a CART 6250 regressou à Metrópole, tendo-me eu apresentado no Quartel Geral de Adidos para nova colocação.

Não satisfeito com a situação, e com a ajuda e intervenção de alguns amigos um pouco influentes, consegui contornar o problema e fui colocado no jornal “Voz da Guiné”, fazendo o meu tempo de tropa como se na vida civil se estivesse, pois não era obrigatório andar fardado. (...)

(...) Como revisor de redacção, ajudei a proceder à transferência de propriedade do jornal de Portugal para a Guiné, e ainda guardo, como prova de passagem por esse serviço, um exemplar de cada um dos últimos jornais impressos sobre a administração Portuguesa antes e depois da independência.

Igualmente guardo com muito carinho, um outro exemplar do jornal com o nome de “Libertação“, já impresso sobre o controlo do PAIGC, no pós Independência da Guiné-Bissau, aí sim, já mesmo o chamado “órgão informativo do PAIGC", reflectindo para a sociedade e a população em geral, os pensamentos, ideias, ideais e reflexões sobre a guerra da Independência nas ex-colónias e noutros países de pensamento e cariz político nitidamente na linha dita comunista. (...)

(...) Foi um processo pacífico de transferência de papelada, fotografias, máquinas e demais material ligado à impressão do jornal, incluindo as instalações e veículos, culminando assim de forma ordeira, sem contestações, nem provocações, a nossa presença naquele serviço.

Procurámos sempre manter-nos fiéis a uma linha de conduta e orientação programada e fiscalizada pelo seu director, pessoa afável, educada e de bom trato,  sempre pronto a ajudar e nada militarizado, mesmo anti-regime.

Acaso do destino, esse Director era um dos capitães de Abril, conhecido como capitão Duran Clemente, que veio a protagonizar mais tarde a voz da revolta na tomada da Televisão em Portugal quando do 25 de Novembro de 1974.

Com a sua ajuda, terminei a minha curta passagem por terras da Guiné, tendo regressado a Lisboa por via aérea na noite do famigerado 28 de Setembro de 1974. (...)

sexta-feira, 13 de janeiro de 2017

Guiné 61/74 - P16953: Notas de leitura (919): "Noites de Insónia na Terra Adormecida", por Tony Tcheka (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 4 de Novembro de 2015:

Queridos amigos,
Trata-se do primeiro livro individual de poesia de Tony Tcheka editado pelo INEP - Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa, 1996. De seu nome próprio António Soares Lopes Júnior, exerceu funções em lugares prestigiados da comunicação e foi presidente da Associação de Jornalistas da Guiné-Bissau. É indubitavelmente um dos poetas mais completos da sua geração: lírico, denunciador e crítico de um país à deriva que nem respeitou os seus combatentes vitoriosos, contemplando, sofredor, a criança subnutrida e sem esperança, é um dos poetas mais surpreendentes da lusofonia, uma voz que afirma que a literatura guineense está viva. Pena é que nenhum editor português se abalance a publicar poesia de tão elevada qualidade.

Um abraço do
Mário


Noites de insónia na terra adormecida, por Tony Tcheka

Beja Santos

Em “Da Guiné Portuguesa à Guiné-Bissau: Um Roteiro”, Fronteira do Caos, 2014, houve a preocupação de dar uma sinopse da literatura da Guiné-Bissau e intitulámo-la “Uma literatura de alentos e desalentos, uma tumultuosa viagem à procura da identidade”. Na génese, Amílcar Cabral e Vasco Cabral revelaram uma poesia de inconfundível matriz portuguesa. No pós-independência impuseram-se outros nomes: Hélder Proença, Agnelo Regalla, António Soares Lopes Júnior ou Tony Tcheka, José Carlos Schwartz, entre outros, exaltadores da luta e dos sonhos, portadores da ingenuidade dos amanhãs que cantam, dececionados com a multiplicidade dos desastres. O leitor tem à sua mercê uma sinopse da tese de doutoramento de Moema Parente Augel com a epígrafe “O desafio do escombro”, aí encontrará de forma caleidoscópica as grandes manifestações desta poesia tantas vezes eivada de crioulidade:
https://books.google.pt/books?id=TkP6NAsbQskC&pg=PA15&lpg=PA15&dq=moema+parente+augel+desafio+do+escombro&source=bl&ots=d5SZnGl7iR&sig=_j73LPrVp34Vh98t8BksextcXKk&hl=pt-PT&sa=X&ved=0CB4Q6AEwAGoVChMIqs7zyJL3yAIVy4kaCh0-LwEj#v=onepage&q=moema%20parente%20augel%20desafio%20do%20escombro&f=false

A mesma Moema Parente Augel apresenta este livro de Tony Tcheka, adiantando o seguinte:
é um escritor com maturidade literária onde transparece, pela forma e pela linguagem, uma grande criatividade e inesperada ousadia na expressão poética; são versos de amor em que o poeta lança mão do crioulo mais próximo dos sentimentos do coração, dirigindo-se ao seu amor na linguagem, universal dos namorados; os temas sociais são igualmente preponderantes, nomeiam-se os males sociais e podemos apercebermo-nos quanto aos motivos da inquietação poética, ele vai anotando os diferentes indícios de dificuldades económicas do povo guineense; e trata-se igualmente de uma grande natividade poética onde se fala guinéu: lalas e bolanhas, tabanca e morança, arrozais, palmeiras, mangueiros e poilões, tambores, o korá e os djidius. E a estudiosa conclui: “Um Tony Tcheka multifacetado, emocionado pela sorte das crianças e dos sofredores, denunciando as injustiças sociais e a hipocrisia. É uma poesia brava, a lírica de Tony Tcheka”.

Vejamos as suas lembranças familiares em “Carta ao pai amigo”:
Que saudades pai/Que nostalgia e dor/lembrar-te/Como o tempo não passa/sem ti/Que saudade trago/do calor do teu olhar/amigo/penetrando em mim/envolvendo/acariciando/as minhas traquinices/Que saudade do som melódico/do teu violão… /Fecho os olhos/e vejo os teus dedos/calcando as cordas do velho banjo/que estremecia/no “monte cara”/dos teus braços/São acordes/que ainda hoje, sublimam o meu canto/Ainda trago comigo a melodia/das tuas palavras de Homem das Ilhas/vertical e frondoso/como o poilão/desta Guiné/que tanto amaste/e fizeste tua… /Ah! Mas como o tempo não passa sem ti/E como senti tua partida/lá longe… /para além do sonho/onde o sono se eterniza.

Tony Tcheka não é alheio aos amanhãs que cantam, e em 1973 a sua melodia fala pelas trombetas do futuro, no poema “Guiné”:
De longe/entre as sete colinas/vejo-te/mulher grande/sofredora/e meiga/Imagino-te/suave/como quem diz amor/balbuciando temor/Sinto-te sombra minha/protegendo as minhas ibéricas noites/Esta ausência demorada/faz-me ver o Geba/subindo sobre o Tejo/Imagino-te/mulher-mãe/gente adulta/renascendo como companheira do mundo novo.

Em 1993, a lírica revela amargura no seu poema “Povo adormecido”:
Há chuvas/que o meu povo não canta/há chuvas/que o meu povo não ri/Perdeu a alma/na parede alta do macaréu/Fala calado/e canta magoado/Vinga-se no tambor/na palma e no caju/mas o ritmo não sai/Dobra-se sob o sikó/como o guerreiro vergado/cala o sofrimento no peito/O meu povo/chora no canto/canta no choro/e fala na garganta do bombolon/Grei silêncio/quebrado/nas gargalhadas de Kussilintra/em quedas de água/moldando pedras/esfriando corpos/esculpidos/no corpo do bissilão.

Não poucas vezes Tony Tcheka enuncia com exaltação os guerreiros que acabaram sentindo-se traídos, deram a vida pela independência e a independência não lhes trouxe nada de novo. Como no poema “Batucada na noite”, refere a cidade que não dorme, com corpos inflamados que se saracoteiam, indiferentes à triste condição em que se encontra o país. É uma poesia, tal como refere Moema Parente Augel, carregada de lágrimas, de desilusão, tanta amargura que se estende, aliás, a toda a África sofredora. O poeta também reage, e convida a sua companheira a cantarem a nova madrugada, em que as crianças deixarão de ter a barriga grande de fome, e embriaga-se nos grandes sonhos dos dias da luta armada, assim tecendo o futuro:
vem, Companheira/vamos a Komo rebuscar a força/para não desfalecermos depois da/caminhada/vamos a Komo beber na fonte/onde bebeu a última gota/o primeiro guerrilheiro sem-nome que/caiu… 

A última coletânea de poemas do livro dá pelo nome de “Canto menino”, canta-se a vida que se estampa no sorriso aberto das crianças que têm o pranto a fome, são filhos da miséria, e aí o poeta socorre-se da universalidade no poema “Chamo-me menino”:
Sou a criança pobre/de uma rua sem nome/de um bairro escuro/de covas fundas/em garganta/fatalmente magra/carente de pão/e sem muita ambição/Sou filho da miséria/escancarada/enteado da vida/entreaberta/Sofro de raquitismo/por comer com os olhos/enquanto na garganta/destilam bolas de saliva.

E, mais adiante, dá-nos num magnífico poema intitulado “Mininu di kriason” a imagem do abandono e da deriva da criança e do país:
Nunca teve berço/já sobreviveu um terço/da vida que não tem/Ei-lo nos becos da cidade/esquivando-se ao cassetete/ou livrando-se lesto ao tabefe/factura de mil traquinices/Ziguezagueia pelos cantos/enquanto aguardo/uma tigela de cuntango/que se não aparece/é na cabaça da Tia Mandjendja/o banquete que apetece/E depois a corrida/mais uma esquivadela/Djondjon – mininu di kriason/não tem criação.

Um grande poeta que devia ter as portas abertas em toda a lusofonia.
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Nota do editor

Último poste da série de 9 de janeiro de 2017 > Guiné 61/74 - P16935: Notas de leitura (918): O tráfico de escravos nos rios de Guiné e ilhas de Cabo Verde (1810-1850), por António Carreira (Mário Beja Santos)

sexta-feira, 25 de setembro de 2015

Guiné 63/74 -P15155: Agenda cultural (426): "Desesperança no chão de medo e dor": novo llivro com meia centena de poemas recentes do escritor e jornalista guineense Tony Tcheka (n. Bissau, 1951)... Sessão de lançamento, hoje, 6ª feira, às 17h00, na Mala Posta, Odivelas (metro Sr. Roubado)... Apoio da RDP - África






Nota biográfica:



Tony Tcheka (António Soares Lopes Júnior):

(i) natural de Bissau, onde nasceu a 21 de Dezembro de 1951;

(ii)  foi um dos fundadores da União Nacional de Artistas e Escritores, da Guiné-Bissau;

(iii)  e é hoje considerado um nome de referência da literatura guineense;

(iv) tem  trabalhos em várias antologias, publicadas na Guiné-Bissau, Portugal, França, Brasil e Alemanha;

(v) também jornalista, António Soares Lopes Júnior foi redator e mais tarde diretor da RDN-Rádio Nacional da Guiné-Bissau;

(vi) foi chefe da redação e diretor do Jornal Nô Pintcha; nessa qualidade criou Bantabá, um suplemento cultural e literário;

(vii) como correspondente e analista, trabalhou com a BBC, Voz da América, Voz da Alemanha, Tanjug e, em Portugal, com o Público, a antiga agência noticiosa ANOP, RTP-África e TSF


Fonte (texto e foto): Cortesia de estudo-K > 3/10/09 > Tony Tcheka 

quarta-feira, 15 de julho de 2009

Guiné 63/74 – P4687: Agenda Cultural (21): Djumbai Storias di Mindjeris, 19 de Julho, no Anteneu Comercial de Lisboa (Instituto Marquês Valle Flor)


C O N V I T E

Camaradas Tertulianos,

Trazemos ao vosso conhecimento mais um amável e gracioso convite que nos fois endereçado pela Casa da Guiné, em Coimbra, e que, desde já, muito agradecemos, em nome do Luís Graça e de todos os Camaradas desta grande tertúlia bloguística da Guiné.

Promovido pelo IMVF - Instituto Marquês Valle Flor, que é o principal parceiro português da AD - Acção para o Desenvolvimento, uma ONG guineense com quem o nosso blogue tem mantido desde finais de 2005 uma estreita cooperação (por ex., no apoio a projectos relacionados com a preserção e divulgação das memórias da guerra colonial / luta de libertação na Região de Tombali, e em especial em Guileje).

Este evento vai decorrer no próximo dia 19 de Julho, pelas 15h30, no Salão Nobre do Ateneu Comercial de Lisboa e é composto, por um vídeo (“Fala di Mindjeris”) e um álbum de retratos (“Storias di Mindjeris”).

Estes produtos culturais "resultam de entrevistas realizadas a mulheres guineenses entre Dezembro de 2008 e Maio de 2009, em Bissau, nas Ilhas Bijagós e na região da Grande Lisboa. Contam histórias de migração, de separação e de reencontro. São retratos de mulheres de cultura e experiência diversas com histórias de valência, de sobrevivência e de esperança, histórias de vida de mulheres guineenses"...

Esta é uma iniciativa do Projecto “Rostos Invisíveis”, uma parceria entre o IMVF e o Núcleo de Estudos para a Paz do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra (NEP/CES).

O evento conta ainda com a presença do Jornalista e Poeta Guineense Tony Tcheka, cujos poemas enriquecem o Álbum de Retratos.

A entrada é livre.

O Ateneu Comercial de Lisboa, situa-se em:
Rua Portas de Sto Antão, nº 110
Lisboa
(Próximo do Coliseu dos Recreios)

Telefone do IMVF: 213 256 310
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Nota de M.R.:

(*) Vd. poste anterior, desta série em:

sexta-feira, 28 de setembro de 2007

Guiné 63/74 - P2140: Tabanca Grande (35): Notícias do Tony Tavares (CCAÇ 2701) e do António Batista (CCAÇ 3490) (Ayala Botto)

1. Mensagem do Ayala Botto, membro da nossa tertúlia, que esteve na Guiné (1970/73), tendo sido comandante da CCAÇ 6, em Bedanda, e depois ajudante de campo do General Spínola (1):


Caro amigo
Aqui vão 2 notícias que, creio, interessam a todos:

- O Tavares, o tal militar da CCAÇ 2701 que esteve no Saltinho de 1970 a 72 e que actualmente vive na República Checa, veio a Portugal para, juntamente com a mulher de nacionalidade checa, estar presente na reunião da sua Unidade (2). É bonito!

- Já estão a ser feitas diligências, juntamente com o Carlos Clemente (cor.), para se poder actualizar a caderneta militar do António Silva Batista, o tal morto-vivo natural de Moreira, Concelho da Maia (3).

Um abraço
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Nota dos editores:

(1) Vd. post de 6 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1407: Tertúlia: apresenta-se o Coronel de Cavalaria Carlos Ayala Botto, ajudante de campo do General Spínola

(2) Vd. posts de:

25 de Setembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2132: Convívios (30): CCAÇ 2701, Saltinho, 1970/72 (Paulo Santiago)

20 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1974: Tugas da diáspora (1): Tony Tavares (CCAÇ 2701, Saltinho, 1970/72): De Zlin, República Checa, com amor

(3) Vd. post de 30 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P2011: Vamos ajudar o António Batista, ex-Soldado da CCAÇ 3490/BART 3872 (Júlio César / Paulo Santiago / Álvaro Basto / Carlos Vinhal)