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sábado, 4 de setembro de 2010

Guiné 63/74 - P6931: Estórias do Juvenal Amado (30): Quando o passado vem ao nosso encontro



1. Mensagem de Juvenal Amado (ex-1.º Cabo Condutor da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1972/74), com data de 24 de Agosto de 2010:

Caros Luis, Carlos, Virgínio, Magalhães e restante Tabanca grande
Uma pequena estória que traz à luz a verdade sobre o sr. Regala, que aquí já foi falado por diversas.

Um abraço
Juvanal Amado



Estórias do Juvenal Amado (30)

Quando o passado vem ao nosso encontro em forma de abraço é uma experiência única

Assim aconteceu há dias quando me encontrei com o meu camarada do 3972, que foi meu comandante de pelotão.
O ex-Alferes Amadeu foi evacuado com hepatite aos vinte e um meses de comissão.

Alf Mil Luís Amadeu

Lembrei-me dele logo. Recordei o momento da sua evacuação e contei-lhe que tinha corrido o boato da sua morte felizmente mentira.
Falamos de Galomaro, dos nossos camaradas, dos lugares e acontecimentos que nos marcaram com é natural.
Veio à conversa o sr. Regala e sobre isso ele enviou-me posteriormente a estória, que segue em anexo tal como a mandou.

Um abraço a todos os tabanqueiros.
Juvenal Amado


O sr. Regala I

Juvenal:
Como sei que gostas de contar estórias, certamente também gostas de as ler. Aqui vai uma que se passou comigo. Começa em Galomaro e termina em Lisboa alguns anos depois em meados da década de 80.

Da esquerda para a direita: Fur Mil Claudino, 2.º Srgt Silva e Alf Mil Amadeu

Poucas vezes estive na esplanada do Sr. Regala. Talvez duas ou três. Mas lembro-me que uma vez, penso que a convite dele, estive com outros camaradas a comer um frango a cafreal e a beber umas Super Bocks.

O Sr. Regala estava sentado ao meu lado. Enquanto saboreava uma tíbia do frango, vejo passar à minha frente um rapaz talvez com 14 ou 15 anos impecavelmente vestido com umas calças pretas e uma engomada camisa branca. Acompanhei com o olhar a sua deslocação até ao balcão e a sua saída por uma porta que ficava por trás. A minha observação não passou despercebida ao Sr. Regala, que me disse de seguida:

- É o meu sobrinho. Está cá a passar as férias. Vive em Bissau com a minha… (já não me lembro)

Pensei em que altura do ano estávamos e não creio que fossem férias escolares. Mas decididamente não quis saturar mais os meus neurónios e resolvi atacar outra tíbia do animal.

Passados cerca de 15 anos, estava eu a trabalhar na EDP em Lisboa quando fui informado que vinha estagiar para o meu departamento alguém dos PALOP durante uma semana.

Como tinha uma secretária livre no meu gabinete disse que podia ficar directamente comigo que eu o apoiaria no que ele necessitasse.

Apareceu-me então o indivíduo novo de raça negra que era guineense.

Conversamos sobre o seu curso de engenharia tirado na Bulgária. Procurei saber pormenores do curso, matérias, programas e sinceramente pareceu-me bastante fraco o curso de engenharia, mas certamente suficiente para a Guiné. Como até conhecia aquele ambiente, sabia o que lhe poderia fazer alguma falta e prontifiquei-me a mandar tirar umas cópias de alguns projectos-tipo e outra documentação que o pudesse ajudar. Qualquer dos casos iria ficar uma semana comigo.

Resolvi então dizer-lhe que já tinha estado na Guiné durante a tropa. Ao que ele me perguntou.

- Onde?
- Em Galomaro.
- Então conheceu o Sr. Regala.
- Sim.
- Era o meu tio.

Ainda não refeito do que estava a ouvir. Como o mundo é pequeno. Indaguei mais.

- Houve uma vez que eu vi lá um jovem com umas calças pretas e uma camisa branca e o Sr. Regala disse-me que era o seu sobrinho.

Resposta pronta do rapaz.

- Era eu.

Então já refeito do acontecimento, devo ter olhado para ele com uma cara de inquiridor e sem mais, disse-me:

- É que o meu tio era um alto quadro do PAIGC, e depois da independência arranjou maneira de eu ir estudar para o estrangeiro.

No dia seguinte tinha um monte de fotocópias para lhe entregar conforme estava combinado. Mas ele não apareceu naquele dia nem apareceu mais.

Caro Juvenal, gostava de te ver a escrever outras histórias que não fossem sobre a Guiné. Acredita, acho que tens muito talento.

Um Abraço,
Luís Amadeu


O sr. Regala II

O sr Regala era homem de certa idade, baixinho e de origem cabo-verdiana.

Tinha se não estou em erro duas camionetas, com elas para além fazer transportes e comércio entre várias povoações na Zona Leste, era frequentemente contratado para fazer colunas de abastecimentos integrado nas colunas de Galomaro.

Dizia-se que nas colunas em que ele participava podíamos estar descansados, tal era as boas relações que entre ele e a guerrilha existiam. Facto que não me custa acreditar.

Assim falei muitas boas horas com ele onde era fácil adivinhar, que comércio era uma coisa, ideais quanto ao futuro da Guiné era outra.

Também tinha um posto de venda em que vendia umas “bazucas” bem fresquinhas, servia uns bifes com batatas fritas e ovo a cavalo, bem ao jeito de “bitoque” que era uma delícia.

Bem quero isto dizer que este pequeno posto fazia parte do imensa cantina, que era formada à volta dos soldados por toda a Guiné.

Uma terra com agricultura de subsistência, sem industria, sem bens minerais, era pois à volta dos soldados que a economia fervilhava.
Lavadeiras, vendedoras de mancarra, de caju e frutas várias, todas se juntavam perto do arame.

Nas aldeias também comprávamos umas galinhas e a carne para o quartel, também era adquirida por nós a fornecedores junto dos Homens Grandes.

Ao vinho de palma e aguardente de cana, juntavam-se vendedoras de prazer nas ruelas das tabancas, que também dividiam embora por breves momentos o leito os favores e o patacão, que custava essa também transacção.

Em Bafatá lá estavam os restaurantes portugueses e libaneses, a escola de condução, que o artesanato, que bonito era o de filigrana de prata, que os nossos furriéis e alferes mais endinheirados mandavam fazer de encomenda. Não esquecer os vendedores ambulantes que normalmente nada sabiam de português.

Éramos por assim dizer o motivo e fonte de subsistência em todas áreas daquela terra.

Quero eu dizer com isto tudo que o que para lá levamos, trouxemos mais a saudade que tende a crescer.

Comecei por falar no Regala.
Se calhar se comesse hoje o tal bife, diria que não era nada de especial e naquele tempo longe de casa, qualquer coisa nos satisfazia desde que saíssemos da ração de combate ou do rancho, que era servido no Restaurante da Morte Lenta e outros locais com “gerência” parecida.

Mas o que eu não daria por voltar lá, sentar-me e comer para ver se era verdade ou não.

Um abraço
Juvenal Amado
__________

Notas de CV:

(*) Vd. poste de 27 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 – P6798: O mundo é pequeno e o nosso blogue... é grande (25): Fátima Amado, filha do nosso camarada João Amado, encontra no nosso Blogue notícias sobre a morte de seu pai (Juvenal Amado / Carlos Vinhal)

Vd. último poste da série de 11 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6716: Estórias do Juvenal Amado (29): Depois do meu regresso, ou o homem que num certo dia teve três mães

quinta-feira, 17 de julho de 2008

Guiné 63/74 - P3067: Estórias do Juvenal Amado (12): O longo abraço (Juvenal Amado)



Juvenal Amado
Ex-1.º Cabo Condutor
CCS/BCAÇ 3872
Galomaro
1972/74



1. No dia 12 de Julho de 2008, recebemos esta mensagem do nosso camarada Juvenal Amado

Caros Carlos, Virgilio e Luis Graça e toda a Tabanca

Esta estória acaba por ser a história de um camarada nosso, mas acima de tudo serve para prestar homenagem a um homem bom, que em dada altura ajudou outro sem esperar qualquer beneficio. Antes pelo o contrário o ter ignorado a questão, podia ter-lhe trazido alguns problemas.

Tenho lido a série dos nossos regressos. Não li todos mas já alguns entre eles os relatos do Carlos e do Virgilio. Gostei muito. Nem eu me lembrava do que senti também quando regressei.
Possivelmente também escreverei sobre isso, mas ainda estou . Ainda não consigo regressar.

Um abraço para todos
Juvenal Amado






Caderneta Militar do Filipe



2. O longo abraço
Tem cuidado, deixa essas conversas para a Metrópole. O africano veio fazer queixa de ti.

Por Juvenal Amado

Naquele momento sentiu desabar sobre ele uma infinidade de sensações. Umas de revolta por ser tão ingénuo, outras de espanto por alguém que sendo também um oprimido, tinha feito queixa dele.

O Alferes Mota era o Comandante do Pelotão das Transmissões e por conseguinte o Oficial Superior do nosso camarada. Estava de Oficial de Dia, tinha recebido a denúncia. Após ter-lhe feito a recomendação, dirigiu-se para messe.

Meio atarantado, o Rádiomontador Filipe dirigiu-se para o seu abrigo cheio de medo e pensando:
– Desta vez não me safo - criticar o regime na nossa situação, pode ser considerado traição.

Tudo se tinha passado no Regala (*), pequena loja de utilidades que também servia uns bitoques com um tempero africano, que era de comer e chorar por mais.

O Filipe, como de costume, tinha algum prazer em iniciar as discussões. Dessa vez não foi diferente e a forma como se estava a ministrar o ensino da língua portuguesa, às crianças da Guiné, era para ele motivo de crítica. O individuo de cor chegou-se à mesa ninguém sabe bem como. Cada um pensou que ele era amigo do outro e ninguém fez reservas. Entrou na conversa sobre a escola e o ensino que estava a ser administrado nas escolas primárias.

O Filipe entusiasmou-se com a conversa e sem se aperceber de inicio, com a retirada estratégica da conversa que os companheiros de mesa fizeram, soltou tudo que pensava e quanto mais os outros se retraíam, mais ele avançava.

Mais alguns mas... da parte do negro (possivelmente professor) o Filipe, subia o nível as criticas ao Estado e à guerra, aliás assunto que já lhe tinha causado alguns dissabores e apertos. (**)

O africano levantou-se e dirigiu-se na direcção da Porta de Armas, que ficava talvez a quinhentos metros.

O Filipe que tinha caído em sí e desconfiado, seguiu até o ver entrar no Quartel.
Ficou com o coração apertado, mal disse o seu feitio de ser pouco cuidadoso com quem falava, pois ele sabia como as opiniões politicas contra o regime eram tratadas.
Mas ele era assim, quando via ou ouvia algo que lhe desagradasse, tomava partido e como era costume, raramente alguém compreendia as suas razões.

Entretanto, algum tempo depois vai para Bolama, em gozo de férias. Naquele tempo cometia-se toda casta de imprudências, desde beber por copos possivelmente mal lavados, comer marisco de proveniência duvidosa, enfim petiscos porque férias são férias.

As férias foram óptimas naquele ambiente paradisíaco e exótico.
Já perto do regresso a Galomaro, adoece e é já doente que chega ao destacamento. Está todo amarelo, é urgentemente evacuado para o Hospital Militar de Bissau. Está com hepatite e corre perigo de vida.

E é lá que está, quando o Alferes Mota chega, também ele doente com hepatite. O Filipe vai vê-lo através da porta envidraçada da enfermaria dos infecto-contagiosos. É numa dessas espreitadelas que vê o enfermeiro junto à cama, com o nosso camarada já morto.

Dois dias após a sua chegada, morre o alferes Mota (***), com os parâmetros das análises mais baixas do que as do Filipe.
A morte passou por ali e fez a sua escolha.

O Filipe esteve internado 32 dias em Bissau, antes de ser evacuado para o Hospital Militar da Estrela em Lisboa, onde esteve 173 dias.

Conhecendo eu o Filipe, o seu romantismo revolucionário, não o deve ter deixado calado por onde passou. Resultado cartas, fotos e objectos, que ao tempo foram considerados suspeitos vá-se lá saber porquê, tudo desapareceu entre Galomaro, Hospital de Bissau e Estrela .

A PIDE também visitou a casa da mãe no Porto, quando ele por sorte estava em Lisboa. A seguir, o 25 Abril veio pôr fim aos delitos de opinião, que as gerações mais novas nem sonham o que era, talvez por nossa culpa.

O Filipe faz um sentido agradecimento à memória do Alferes Mota, por o ter ajudado naquela noite, quando ele regressava do Regala. Eu também lhe agradeço, pois pequenos gestos como o que praticou, ajudaram a anular a suspeita, as escutas e a delação, que eram uma constante nas nossas vidas.

Brancos ou pretos, a PIDE não escolhia cores e o braço era longo.
Obrigado Alferes Mota.

Algumas notas:
(*) - O senhor Regala era um individuo de origem caboverdiana, que para além de proprietário do café, também faziam colunas de reabastecimento connosco. Homem bem falante e lúcido, quanto aos problemas da sua terra. Dizia-se que tinha relações privilegiadas com a guerrilha e por isso, coluna onde ele fosse nunca era atacada. Galomaro também beneficiava dessa protecção, o que veio provar-se ser mentira, uma vez que fomos violentamente atacados.

(**) - Em dada altura que o Filipe, assistiu à saída de camaradas para os postos avançados e patrulha nocturna, desatou a fazer barulho e a protestar contra o facto. O barulho chegou aos ouvidos do Comandante, que mandou averiguar o que se passava. Dessa vez o anjo protector chamou-se Dr. Pereira Coelho, que abraçando-o, disse-lhe ao ouvido que se fingisse bêbado e assim o salvou.
Por vezes O Filipe, era mal compreendido e se não vejamos o episódio das bajudas; Ao fim da tarde, os soldados iam ter com as lavadeiras, que se acercavam do destacamento. Eram momentos em que os soldados, davam por vezes largas a alguma falta de respeito para com as lavadeiras. Alguns por graça e para as ouvir dizer de uma enfiada só, todos os palavrões que conheciam em português e no seu dialecto. Apalpavam-nas e diziam-lhe que não lhes pagavam, por elas lhes terem partido os botões todos, ao lavarem as camisas como hábito, batendo com as ditas em pedras pois sabão, era coisa que não entrava nos seus apetrechos.
Tínhamos chegado a Galomaro, quando o Filipe se insurgiu contra uma dessas cenas, que verdade se diga não eram muito dignificantes, pois algumas bajudas eram muito novas. Resultado foi ele se envolver em briga, com um dos participantes dessa tertúlia, indo parar ao chão com o estalo que recebeu.

(***) - O Alferes Mota era um oficial miliciano, antigo seminarista, bastante culto, muito correcto para com os seus subordinados.
Morreu se não estou em erro no dia 26 de Novembro de 1972 com hepatite e não com paludismo como escrevi na minha estória O Ultimo Natal em Galomaro.

PS: Esta estória resulta da correspondência que tenho mantido com o Filipe há já algum tempo.

Juvenal Amado
09.07.08

Foto 1 > O Filipe com a lavadeira

Foto 2 > O Filipe com o Esofe que se juntou à Resistência

Foto 3 > O Filipe em Galomaro

Foto 4 > O Filipe na esplanada do Regala com dois camaradas do STM e Centro de Operações

Foto 5 > O Filipe no HM 241 de Bissau

Fotos © Juvenal Amado(2008). Direitos reservados.

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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 14 de Junho de 2008 > Guiné 63/74 - P2938: Estórias do Juvenal Amado (11): Galomaro, Bambadinca, Cancolim e Gabu (Juvenal Amado)

domingo, 25 de junho de 2017

Guiné 61/74 - P17509: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (43): o coronel médico, meu bisavô, Francisco Augusto Regalla (Aveiro, 1871 - Mindelo, 1937): pedido de utilização de foto da fortaleza da Amura de cuja guarnição ele fez parte em 1915 (Ricardo Moreira Regalla Dias-Pinto, Cascais)


Capa do livro de Ricardo Regalla Dias-Pinto, em preparação. Cortesia do autor



1. Mensagem do nosso leitor Ricardo Moreira Regalla Dias-Pinto

Data: 17 de maio de 2017 às 22:37
Assunto: Fotografia

Exmo. Senhor
Prof. Luís Graça

Estou a escrever um livro sobre a minha família.

O meu bisavô Francisco Augusto Regalla, combateu em 1915 na Coluna de Operações em Bissau pelo que gostava muito de pedir autorização para colocar uma vossa fotografia, mais propriamente a nº 3 da Fortaleza de Amura de cuja guarnição o meu bisavô fez parte durante algum tempo.

Naturalmente que, caso autorizem, terei o maior prazer em nomear o vosso blogue nos agradecimentos do referido livro que terá o título:

Família Regalla: A Hora da Verdade!

Agradeço desde já o tempo por vós dispensado aguardando com confiança a breve resposta.


Melhores e mais respeitosos cumprimentos,

Ricardo Moreira Regalla Dias-Pinto



 Guiné > Bissau >Fortaleza da Amura > Entrada do lado sul (frente ao porto e ao rio Geba).  Foto (º 3)  de Manuel Caldeira Coelho (ex-fur mil trms, CCAÇ 1589 / BCAÇ 1894, Nova Lamego e Madina do Boé, 1966/68)

Foto ( e legenda): © Manuel Coelho (2011). Todos os direitos reservados. (Edição:  Blogue Luís Graça &  Camaradas da Guiné)


2. Resposta do nosso editor, em 22 do corrente:

Ricardo:

Em primeiro lugar, obrigado pelo seu contacto.

Em segundo lugar, parabéns pelo seu projeto: todos temos o "dever de memória", e no seu caso acho lindo que esteja a escrever a história de vida do seu bisavô Francisco Augusto Regalla.

Será que é o coronel médico Francisco Augusto Regalla, nascido em 1871, em Aveiro, e falecido em 1937, no Mindelo ? Pai de Agnelo Augusto Regalla; Mário Augusto Monteiro Regalla; Armanda Monteiro Regalla; Crizanta Monteiro Regalla e Hélia Regalla ?

Alguns dos meus camaradas (e eu próprio) passaram por Galomaro, estiveram em Galomaro ou fizeram operações no regulado do Cossé. Boa parte dos meus soldados africanos (da CCAÇ 12) eram oriundos do Cossé (, outros de Badora).

Em 1969/71, esse seu bisavô já não era vivo. Em todo o caso, nessa altura, havia um comerciante, casado e com família, que dava pelo nome de Regala (ou Regalla)...Seria mais provavelmente seu avô ou um dos seus tios-avôs... Não me lembro do nome próprio, só do apelido de família. Tinha em Galomaro um café e restaurante muito frequentado pelo tropa portuguesa, e em geral com agrado...Naturalmente, não se livrava da suspeita de simpatia pelo PAIGC...

Vou pô-lo em contacto com alguns dos meus camaradas que conheceram pessoalmente esses seus parentes, o sr. Regala e a família de Galomaro...

Quanto ao pedido que me faz, não tenho qualquer objeção, pelo contrário, em satisfazê-lo. Pode usar a foto, com indicação da fonte (autor e blogue)... Mas tenho dúvidas quanto à foto em causa... Será esta a foto nº 3 (Fortaleza da Amura, Bissau, entrada do lado sul, frente ao porto e ao rio Geba) ?

Se sim, os créditos fotográficos são de Manuel Coelho, a quem vou dar conhecimento do seu pedido. Gostaria que ele também lhe desse o seu OK, como autor da foto.

Para já é tudo, embora eu gostasse de saber, muito sumariamente, a razão de ser do título do seu livro: "Família Regalla: A Hora da Verdade!"...E, se nos der autorização, gostaríamos de divulgar também, no nosso blogue, o seu pedido. Haverá com certeza mais camaradas nossos que conheceram o sr. Regala (ou Regalla) de Galomaro e que podem até ter fotos dele (ou com ele) que disponibilizem, digitalizadas, para o seu projeto.

Disponha sempre,

Boa saúde, bom trabalho. Luís Graça

3. Mensagem do Ricardo Regalla Pinto-Dias na sua página do Facebook, de 22/12/2016, sobre o livro que está a escrever com a história da família:

Este é já mais do que um desejo, é uma realidade que surgirá a público no ano de 2017.

Será o livro que contará a história da minha família e o seu contributo para a sociedade portuguesa desde o ano de 1670!

Família essencialmemte de médicos e militares mas também de alguns homens de direito que, por junto, maravcaram aqui e ali a vida de portuguieses e até mesmo de Portugal.

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sábado, 9 de agosto de 2008

Guiné 63/74 - P3124: O Nosso Livro de Visitas (23): Vasco Joaquim, 1.º Cabo Escriturário da CCS/BCAÇ 2912 (Juvenal Amado/Carlos Vinhal)

1. Mensagem de Juvenal Amado com data de 1 de Agosto de 2008:

Caros camaradas Carlos Luis Virgilio e restante Tabanca.
Recebi este e-mail deste camarada que me deixou muito feliz, como é de prever.

Ele pede-me contactos de malta do BCAÇ 2912, eu penso que nada melhor que o blogue para os encontrar.

Um abraço para todos
Juvenal Amado


2. Mensagem de Vasco Joaquim de 31 Julho de 2008, dirigida a Juvenal Amado e reenviada por este nosso camarada ao Blogue:

Caro amigo Amado,
Permite que te trate por tú, pois fomos companheiros de armas, ou antes... tive o privilégio de ser substituído por alguém que preencheu uma vaga no mato, para que eu regressase à Metrópole. Pois bem, certamente que contactámos naquele espaço de tempo em que a CCS do 3872 rendeu a CCS do 2912 sita em Galomaro, já lá vão 36 anos.

Eu era na altura o 1.º Cabo Escriturário, Vasco de Jesus Joaquim com o NM 08190469, fazendo parte do BCAÇ 2912, formado em Abrantes (RI2), IAO em Santa Margarida e embarcado para a Guiné em 24 de Abril de 1970, no célebre "iate" CARVALHO ARAÚJO.

Ao analisar a tua corrida pelos locais que percorreste pelas terras da Guiné, dos quais a maioria conheço, agradeço o facto de me teres recordado através das fotos os locais por onde passei, tantas e tantas horas de solidão e saudade (pois na altura já era casado).
Reconheci o Restaurante Morte Lenta, os abrigos, a metralhadora destruída que infelizmente estava ao meu cuidado (embora fosse Amanuense), o morteiro 81 onde também tive instrução, o "Estádio", onde tantas caneladas apanhei, pois jogava pelos Sapadores.
A Cantina, onde tantas "81 e 60" emborcava... enfim o local que me servia de trabalho, pois era eu que fazia a Ordem de Serviço do Batalhão. Bons tempos.

Tristezas? Algumas.
Mortos em emboscada nas Duas Fontes (1) às 3 da madrugada, o Mecânico Auto Laranjina, o Sapador Barreto, o homem do rádio, Oliveira, e mais dois camaradas adidos, o Bolinhas e o Monteiro, bem como o meu amigo Milícia, Iderissa Candé.


Enfim... recordações que só são avaliadas por aqueles que palmilharam por aqueles locais.

Quanto aos castigos, eu também tive alguns (56 reforços à "benfica") e não sei quantas patrulhas nocturnas - e tudo por faltar às formaturas da refeição - e o capitão que era alentejano - que não me gramava, aplicava-me logo o "código ", só que quanto aos "reforços" fazia alguns porque o camarada Escriturário que fazia a Escala retirava alguns, pois dormiamos no mesmo abrigo.

Gostei de ver a foto do Filipe com a lavadeira, que também "era a minha", suponho que era fula ou balanta e que se chamava Binta?... não tenho a certeza... mas que me levava 50 pesos por mês lembro-me muito bem.

Quanto ao "Regala", conheci-o bem. Até lhe dediquei uns versos numa prosa que fiz do qual me recordo este:

Junto da nossa unidade
O Regala bem regalado
Pois não tem piedade
De tão caro vender ao soldado

A foto do Filipe com Esofe está boa. Gostei. Eu também tenho com ele, pois ele era funcionário do Regala e servia no bar/restaurante que eles tinham lá em baixo ao fundo.

Pois meu amigo, daqui a uns tempitos já cá não anda ninguém, daqueles que deram o coiro em terras desconhecidas para nós, mas que tivemos orgulho em cumprir a nossa missão.

Eu pelo meu lado, já estou reformado, traballhei na CP, como Chefe de Estação durante 32 anos, findos os quais me reformei aos 55 anos (já lá vão quase 5). Resido em Ovar onde trabalhei imensos anos, embora a minha naturalidade seja perto de Lamego.

Pronto meu amigo e camarada, obrigado por teres despertado em mim um pouco daquilo que eu já julgava ter esquecido, mas que num instante recordei com saudade, ao ponto de dizer aos meus filhos já casados:

-Olha por aqui andei eu.

Bem hajas e obrigado.
Um grande abraço e manda notícias.
PS. Se souberes de algum endereço da CCS do BCAÇ 2912, agradeço.



3. Mensagem enviada ao Vasco Joaquim em 8 de Agosto de 2008, com conhecimento a Juvenal Amado:

Caro Vasco Joaquim
O nosso camarada Juvenal Amado, elemento activo do nosso Blogue para o qual ficas desde já convidado a aderir, reenviou-nos a tua mensagem.

Sobre a CCS do BCAÇ 2912, à qual pertencias, não temos nada, mas temos alguns tertulianos das outras Companhias do teu Batalhão. Por exemplo o Fernando Barata da 2700, Tony Tavares e Manuel Melo da 2701.

No nosso Blogue podes encontrar muito sobre o teu Batalhão, basta escreveres na janela de pesquisa bcaç 2912 e aparecerá muita coisa para leres.

Entretanto fui à Página do nosso camarada Jorge Santos e no seu Ponto de Encontro encontrei camaradas teus a pedir contactos. São eles:

da CCAÇ 2699 - Adelino Fernandes (*)
da 2700 - Timóteo (*)
da 2701 - Manuel Melo, Tony Tavares e Lourenço (*)

Ficamos à espera de notícias tuas sobre os contactos que possas vir a concretizar.

Um abraço do camarada
Carlos Vinhal
Co-editor do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné

(*) - Retirados, na edição, os números de telefone e endereços
_____________

Notas de CV:

(1) - Vd. poste de 12 de Fevereiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2529: PAIGC: Emboscada a forças do BCAÇ 2912, na estrada Galomaro-Bangacia (Duas Fontes), em 1 de Outubro de 1970 (Luís Graça)

(2) - Vd. postes sobre BCAÇ 2912 de:

4 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1494: Tertúlia: Apresenta-se o ex-Alf Mil Fernando Barata, CCAÇ 2700 / BCAÇ 2912

22 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1541: História da CCAÇ 2700 (Dulombi, 1970/72) (Fernando Barata) (1): Introdução: a 'nossa Guiné'

26 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1550: História da CCAÇ 2700 (Dulombi, 1970/72) (Fernando Barata) (2): A nossa gente

15 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1595: História da CCAÇ 2700 (Dulombi, 1970/72) (Fernando Barata) (3): minas, tornados, emboscadas, flagelações e acção... psicossocial

11 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1651: História da CCAÇ 2700 (Dulombi, 1970/72) (Fernando Barata) (4): Historietas

30 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1795: Convívios (12): 16.º Encontro da CCAÇ 2700 / BCAÇ 2912 (Dulombi, 1970/72), Braga, 10 de Junho de 2007 (Fernando Barata)

Guiné 63/74 - P1796: História da CCAÇ 2700 (Dulombi, 1970/72) (Fernando Barata) (5): A(s) alegria(s) do(s) reencontro(s)

12 de Novembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2260: Álbum das Glórias (33): Inauguração da exposição de fotografia do Américo Estanqueiro, hoje, na Fundação Mário Soares

10 de Abril de 2008 > Guiné 63/74 - P2743: Convívios (50): Convívio da CCAÇ 2700/BCAÇ 2912, em Fátima, no dia 26 de Abril de 2008 (Fernando Barata)

quinta-feira, 17 de maio de 2012

Guiné 63/74 - P9913: Estórias avulsas (59): Uma ida à lenha que ia estragando o almoço (Manuel Carvalho Passos)

1. Texto e fotos do nosso camarada Manuel Carvalho Passos* (ex-Soldado do Pel Rec / CCS / BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/73), chegado até nós através do nosso camarada Juvenal Amado:


UMA IDA À LENHA QUE NOS IA ESTRAGANDO O ALMOÇO

Camaradas, são já passados alguns meses após a minha apresentação à Tabanca Grande.
Resolvi relatar um acontecimento e assim contribuir com esta memória para o grande colectivo que é o nosso Blogue.

Em Galomaro passei alguns bons momentos de amizade, camaradagem e também alguns dos piores da minha vida. Mas hoje vou falar dos bons.

Ao ver uma foto da malta que ia à lenha, lembrei-me de uma das muitas peripécias por que lá passei. O Furriel Castro mandou chamar alguns elementos do meu pelotão onde pontuavam o Silva dos Carvalhos e o Ferreira, rapaz de Viseu com quase 2 metros de altura.

Ora eu tinha recebido 1000 pesos de uma tia que estava na África do Sul, sim porque aqui na Metrópole não era fácil alguém me mandar assim mil palhaços. O tempo já era de vacas magras!!

Esposa e neta do senhor Regala

Quando me vi com esse dinheiro todo, tratei de convidar os dois para almoçar no Regala. Não me lembro se foi frango ou bife com batata frita, mas verdade é que a D. Maria Regala cozinhava como ninguém. O almoço foi bem regado com um vinho branco muito fresquinho, para aliviar o calor do piri-piri e rematámos com um o dois whisky cada um, pois nunca nos fazíamos rogados e o treino era muito.

Mas a coisa não ficou por aí e quando nos foram chamar para o trabalho, já nós estávamos de barriga encostada ao balcão da cantina, com uma bazuca de litro bem fresquinha. Chega o Sertã e diz-nos que o Furriel Castro andava à nossa procura e que estivéssemos à porta de armas dentro de dez minutos, coisa que não entrava nos nossos planos naquele momento.

O Ferreira escondeu-se na padaria, e eu e o Silva fomos para o posto junto do qual os hélis poisavam. Instruímos o Sertã para dizer que não nos viu.

Como não nos podíamos tornar invisíveis, o Lopes que também estava escalado, foi dizer ao furriel que se nós não fossemos ele também não ia. Andaram à nossa procura, mas não deram connosco e assim tiveram que ir sem nós.

O Lopes não se livrou de ir, com os resultados que se verão.

Vimos a coluna a sair e voltamos para a cantina acabar com a cerveja, quando somos surpreendidos pelo furriel. Passou-nos um raspanete de todo o tamanho. Contamos-lhe o que tinha acontecido e onde nos escondemos, ele muito pronto e com ar de gozo diz-nos: “para a próxima levais uma porrada se não me convidarem para do almoço”.

Só que o Lopes ficou tão bravo, que andou uns dias a perguntar ao furriel se ele tinha participado de nós e claro o furriel disse que sim, mas que o Comandante ia pôr a participação no lixo, porque o Passos tinha uma cunha e estava recomendado. Na verdade a cunha era uma realidade, a ponto de me terem oferecido o lugar na cantina de Galomaro e assim ser retirado do serviço no mato.

Quando chegamos Galomaro o Comandante mandou-me chamar, fez-me a proposta para a cantina e disse-me que não podia fazer melhor. Eu recusei o lugar pois preferia estar no pelotão, com os meus amigos mesmo tendo que ir para o mato.

Nunca me arrependi e só tive que assinar uma carta onde ele escreveria ao Comandante do Tribunal Militar de Bissau a dar conta pois era a pessoa que por mim intercedera.

Esta é assim uma pequena estória na minha passagem por Galomaro. Podia ter passado melhor, poderia não ter visto o vi, mas hoje teria alguma dificuldade em encarar os meus antigos camaradas de armas, se naquela altura tenho escolhido a segurança da cantina.

Coluna para o Saltinho > Capitão Rolin Duarte, Cabo Ferreira, Silvestre e Márcio

A partir da esquerda: Silva, Passos, Ivo e Ferreira

Do lado esquerdo: Passos, Ferreira Silvestre, Sertã e Caramba. Do lado direito: Félix, Furriel Santos, Castro e Sacristão

Fotos (e legendas): Juvenal Amado © Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2012). Todos os direitos reservados

Um abraço a todos
Manuel Passos
Pel Rec 3872
Galomaro
____________

Notas de CV:

(*) Vd. poste de 9 de Setembro de 2010 > Guiné 63/74 - P6958: Algumas fotos de camaradas do BCAÇ 3872 (Manuel Carvalho Passos)

Vd. último poste da série de 24 de Abril de 2012 > Guiné 63/74 - P9792: Estórias avulsas (58): Fotos de Bedanda (Luís Gonçalves Vaz/Mário de Azevedo)

terça-feira, 29 de outubro de 2013

Guiné 63/74 - P12217: O Spínola que eu conheci (30): Em Nova Lamego, no destacamento da FAP, com o saudoso piloto Cap Rodrigues (Vitor Oliveira, ex-1º cabo melec, BA 12, Bissalanca, 1967/69)



Guiné > Algures > s/d (c. 1969) > O alf mil pil heli Al III Jorge Félix (BA 12, Bissalanca, 1968/70) e o Spínola (Com-Chefe e Governador Geral, CTIG, 1968/73)... O Jorge Félix terá sido um dos pilotos de heli, com quem o gen Spínola mais terá gostado de voar...  Releia-se  aqui um história bem humorada do Jorge Félix que um dia se lembrou "bombardear" Galomato (ou melhor, a "obsequiar" a esposa do comerciante Regala...),  com os ananases que deveriam chegar à mesa de Spínola  (*) ...


(...) Junto uma foto do Caco, com a minha pessoa nos comandos do Heli Al III, podendo ver-se no banco uma arca [, azul,] que variadas vezes o Cap Almeida Bruno [, o ajudante de campo,] transportava, e que continha alimentação para o nosso Chefe.

Segue uma mensagem que recebi, [em 14 do corrente, no Facebook,] do José Ramos, piloto que já foi falado no nosso Blog e que julgo também devem conhecer:
"Está bonito o filme, parabéns. Sempre que me lembro de ti, não posso esquecer um bombardeamento de ananases em Galomaro que ficaram a faltar na mesa do Spinola. Um abração".

O Ramos recorda-me que um dia, no regresso a Bissau levando uns ananases que deveriam chegar à mesa do Spínola, eu resolvi, numa passagem por Galomaro, "oferecê-los" à D. Maria, esposa do comerciante Regala, num estacionário "perfeito", dando liberdade ao mecânico para atirar um a um os "ananases".

Mais tarde informaram-me que a loja esteve uma semana semi-fechada para limpar o pó que o heli levantou e foi parar dentro da casa. Dos ananases nada se aproveitou, nem a D Maria os saboreou, nem o Gen Spinola os recebeu algum dia. (...) (*)


Foto: © Jorge Félix (2010). Todos os direitos reservados

1. Mensagem do Vitor Oliveira, enviada hoje:


Assunto: O grande Spínola

Estávamos em Nova Lamego, e eis que um dia,  perto da hora de almoço,  aparecem dois hellis em que vinha o General Spínola e o piloto era o falecido Cap Rodrigues, que nos pediu para abastecermos os helis enquanto eles almoçavam porque o iam voar novamente e que ligássemos para a messe de sargentos do exército para nos trazerem o almoço.

Assim foi, tínhamos um telefone no posto de rádio em que o radiotelegrafista da Força Aérea era o Pires. Resposta:
Os doutores,  se quiserem,  venham cá abaixo comer!

Eu disse logo:
Não vamos lá,  isto vai dar caldeirada.

Isto porque a maioria dos sargentos do exército não aceitava que fossemos os primeiros a ser servidos e, mais,  ao jantar nós íamos comer à civil e eles não.

Assim foi,  não fomos almoçar. Eis que chega o Cap Rodrigues,  juntamente com Cap Almeida Bruno e atrás vinha o Spinola com um major e o tenente coronel. Um era o 2º comandante e o outro  o 1º do quartel. Fui logo falar com o Cap Rodrigues e disse-lhe que não tínhamos almoçado. Eis que o Spinola apercebeu-se que havia merda, como se costuma dizer. e chama o Almeida Bruno e ele diz-lhe o que se passou. ele vira-se para o major e o tenente Coronel e diz-lhes para mandar o oficial e o sargento da messe para São Domingos,  era onde havia mais combates . O major e o tenente coronel só diziam:
Ó Sr. Governador,  pedimos desculpa!.. 

E o Spínola dizia:
─  Isto não pode acontecer,  os rapazes estão fartos de trabalhar! 

O abastecimento era feito com bombas manuais, a tirar de bidões de 200 litros. Depois mandaram buscar sandes e cervejas, e assim foi o nosso almoço. A partir desta cena, quando entrávamos na messe, o sargento punha logo os faxinas a servir-nos

Vitor Oliveira (Pichas)

1º Cabo Melec
(BA 12, Bissalanca.1967/69) (**)

_________________

Notas do editor:

(*) 16 de abril de 2010 >  Guiné 63/74 - P6164: O Spínola que eu conheci (13): Os ananases que não chegaram à mesa do Palácio do Governador-Geral (Jorge Félix)

(**) Último poste da série > 7 de fevereiro de  2013 > Guiné 63/74 - P11068: O Spínola que eu conheci (29): Depoimento de Jaime Antunes, ex-fur mil, CART 11 / CCAÇ 11 (Paunca, 1970/72)

sexta-feira, 16 de abril de 2010

Guiné 63/74 - P6164: O Spínola que eu conheci (13): Os ananases que não chegaram à mesa do Palácio do Governador-Geral (Jorge Félix)


Guiné > Algures > O Alf Mil Pil Heli Al III (BA 12, Bissalanca, 1968/70) e o Spínola (Com-Chefe e Governador Geral, CTIG, 1968/73)
Foto: © Jorge Félix (2010). Direitos reservados

1. Mensagem do Jorge Félix, com data de hoje

Assunto: Aniversário meu e do Spinola

Caro Luís Graça,

Não sei como te agradecer os momentos que vivi com as mensagens que recebi nos dia dos meus anos, algumas de "gente" que eu nem conheço.

Como sabes, era nesse dia 11 de Abril que também comemorava o Gen António  de Spinola [n. em Estremoz, em 1910, de pais madeirenses, e do lado do pai,  aspirante de finanças, de ascendência italiana].

Tem aparecido histórias e saíram vários livros a recordá-lo (*). A minha especialidade não é a escrita, ou não ando com paciência para grandes relatos, mas não podia passar este momento sem homenagear o homem que tanto admirei.

Junto uma foto do Caco, com a minha pessoa nos comandos do Heli Al III, podendo ver-se no banco  uma arca que variadas vezes o Cap Almeida Bruno [, o ajudante de campo,]  transportava, e que continha alimentação para o nosso Chefe.

Segue uma mensagem que recebi, [em 14 do corrente, no Facebook,] do José Ramos, piloto que já foi falado no nosso Blog e que julgo também devem conhecer:
Está bonito o filme, parabéns. Sempre que me lembro de ti, não posso esquecer um bombardeamento de ananases em Galomaro que ficaram a faltar na mesa do Spinola.
Um abração

O Ramos recorda-me que um dia, no regresso a Bissau levando uns ananases que deveriam chegar à mesa do Spínola, eu resolvi, numa passagem por Galomaro, "oferecê-los" à D. Maria, esposa do comerciante Regala, num estacionário "perfeito", dando liberdade ao mecânico para atirar um a um os "ananases".

Mais tarde informaram-me que a loja esteve uma semana semi-fechada para limpar o pó que o heli levantou e foi parar dentro da casa. Dos ananases nada se aproveitou, nem a D Maria os saboreou, nem o Gen Spinola os recebeu algum dia.

Foi o Ramos que ma recordou, se achares que vale a pena contar, "posta-a".
Abraço
Jorge Félix


2. Comentário de L.G.:

Jorge, ainda não te agradeci, pessoalmente o magnífico vídeo (mais um!) com que brindaste a comemoração do nosso blogue, que também vai fazer aninhos (seis!) no dia 23 de Abril próximo. O teu trabalho, que me sensibilizou, já teve perto de 800 visualizações no You Tube.

O Carlos Vinhal já  fez os devidos agradecimentos. Mas também me fica bem reforçar aquilo que tenho escrito sobre ti e os trabalhos audiovisuais... Tu és o nosso mago,  dás o tal  toque de magia às imagens que publicamos no nosso blogue (e às outras, do teu arquivo). Uma imagem pode valer mais do que mil palavras, mas tu ascrescenta-lhes  vida, ritmo, emoção, poesia...
 
Obrigado também, meu glorioso maluco das máquinas voadoras,  pela tua deliciosa história dos ananases (ou não seriam abacaxis, variedade guineense do ananás ?) que não chegaram à mesa do Bispo (alcunha por que era também conhecido o Spínola, em linguagem cifrada)...  As deliciosas maluqueiras que um homem (não) faz aos vinte anos para chamar a atenção de uma mulher... E, a propósito,  o Regala não te apresentou a conta dos estragos no estaminé ?  LG

______________

Nota de L.G.:

(*) Vd. último poste da série > 15 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6160: O Spínola que eu conheci (12): Missirá, Dezembro de 1970, vésperas de Natal: Quando Sexa, o Caco, ia perdendo o dito... (Jorge Cabral)

terça-feira, 14 de setembro de 2010

Guiné 63/74 - P6984: (Ex)citações (97): Tinha 22 anos e ainda sonhava... quando levei o prisioneiro Malan Mané a jantar comigo no café do Sr. Regala, em Galomaro (Jorge Félix, ex-Alf Mil Pil Heli AL III, BA 12, Bissalanca, 1968/70)

1. Mensagem, com data de 12 do corrente,  de Jorge Félix [, foto à esquerda, retirada com a devida vénia da sua conta no Facebook]

Assunto - Malan Mané, P6953 (*)

Caro Luís:

Na linha profilática que o teu/nosso Blogue tem prestado aos ex-combatentes da Guiné, e porque sou visado no P6953 e comentários associados a ele, gostaria de destacar o seguinte:

As frases,  "há gente que nunca mais faz dezassete anos"  e "pode acontecer que tenhas visto tudo isso em outra circunstância ou pode acontecer que haja outro Malan Mané", não têm sentido algum, mas eu entendo-as.

Aceita, Salvador Nogueira, que, não sendo importante, fui eu que transportei o Malan da Zops para Galomaro. (Um privilégio que não era para todos.. como se pode ler no cabeçalho do mesmo poste).

Acredita, Salvador, que estamos a falar do mesmo. Acredita que o que escreveu o "poeta",  foi dito por Malan, num jantar que o Comandante dos Páras permitiu que tivesse no "café do Sr Regala", no dia em que vocês o apanharam. Outras coisas foram faladas entre mim e Malan, que nunca irias acreditar. Pouco se falou de guerra. (**)

Claro que a autorização para Malan Mané ir jantar comigo e a conversa que daí decorreu não pode estar no relatório a que te referes, no PS da tua última nota  (PS - podes consultar o relatório da op e podes falar com o Sarg Sofio que toda a gente conhece em Constância - servia-te de passeio e matavas saudades da área,  uma vez que não já há nem BA3, nem RCP, nem gente que te conheça, nem nada) .

Como deves concordar (?!), não dá para perder tempo com a tua sugestão.

Não me "zanguei" com as tuas "tiradas". Já estou velho mas conservo o "romantismo" que transportava naqueles tempos. Posto isto, dou por terminado o diferendo que as histórias do Malam Mané criaram, e por tal não voltarei a responder por mais simpático ou violento que venhas a ser.

Caro Luís , se não fui explícito, não publiques. Vou pôr o meu nome, não para ser mais conhecido, mas para o associar ao texto.

Abraço
Jorge Félix
_______________


Notas de L.G.:


(*) Vd.poste de 8 de Setembro de 2010 > Guiné 63/74 - P6953: Estórias avulsas (94): A captura do incaracterístico guerrilheiro Malan Mané, no decurso da Op Nada Consta (Salvador Nogueira)

(...) [ Comentário de Jorge Félix, 9 Set 2010]

"Para publicar havia de ser a minha narrativa da captura do Malan Mané - mais circunstanciada!, lembras-te do croquis que te enviei? - mas só se alguém aparecesse de novo a divagar sobre o assunto de longe e a sonhar alto. Houve até um poeta que descrevia o piloto a soprar a mata com o rotor do héli e a gritar para avisar a tropa - azar, era eu... e li. E agora?- de que havia uns gajos emboscados... Há gente que nunca mais faz dezassete anos" (...)

Li e não percebi!!! (Ou melhor, parece que sei o que querem...!)

Sou o Félix, o ex-piloto que também viu o Malan Mané com o RPG2 que não quis disparar.

O mesmo que "poeticamente" aterrou o héli junto do Malan.

O mesmo que viu o Malan ser apanhado à mão.

O Félix que transportou o Malan para Galomaro.

O mesmo, Félix, que levou o Malan à casa do Sr Regala a jantar, como prenda de não ter disparado.

O mesmo que escutou Malan explicar, no mesmo "restaurante", que não disparou pois teve medo de ser visto porque o "rotor soprava a mata".

Na altura teria 22 anos, e ainda sonhava.


Hoje, passados estes anos, todos ter que ler o que li, ou não entendi nada, o que será possivel, resultado dos 63 que já carrego, ou..., meus caros Amigos, ía apagar tudo pois estava a passar para o terreno em que ía ser indelicado. Vou ficar por aqui.

Vai ficar o que está escrito, talvez o autor do poste, que não sei quem é, possa ler . Quero lhe dizer que felizmente estou tratado de todas as feridas da guerra (penso que sim). De outra maneira, ao ler o que escreveu, "tudo é mentira sobre a captura de Malam excepto o que eu sei", poderia pôr em causa as minhas capacidades mentais.

Isto de escrever umas merdas, e terminar com uma tirada inteligente, tem muito que se lhe diga.

Caro companheiro de luta, já todos fizemos os 17 há muitos anos. Acredito que muitos queriam continuar naquele tempo, pois naquele tempo continuam a viver, com a sua verdade una e imortal.


Sem mais, abraço a todos.

Jorge Félix

ex-alf piloto aviador

Guiné 68/69/70


(...) [ Resposta de SNogueira, 10 Set 2010]

Caro Félix, pode acontecer que tenhas visto tudo isso em outra circunstância ou pode acontecer que haja outro Malan Mané.

Asseguro-te que a captura, vista do chão e a curta distância, foi feita como descrevi - o guerrilheiro levantou-se com as mãos no ar e nunca mais tocou na arma; não me lembro da sua evacuação mas fica seguro de que lhe confiscámos o RPG2.

Também não imagino o que ele possa ter dito a quem o interpelou depois de evacuado mas fica seguro de que a informação que deu no local foi escassa e em pouco alterou o nosso planeamento - era um homem muito simples e nós, a minha tropa, não éramos propensos a grandes divagações...

SNogueira

(...) [Novo comentário de SNogueira, 10 Set 2010]

(PS - podes consultar o relatório da op e podes falar com o Sarg Sofio que toda a gente conhece em Constância - servia-te de passeio e matavas saudades da área uma vez que não já há nem BA3, nem RCP, nem gente que te conheça, nem nada... Lamento este desencontro de memórias e de opiniões)

(**) Vd. postes de:

7 de Setembro de 2010 > Guiné 63/74 - P6948: A minha CCAÇ 12 (6): Agosto de 1969: As desventuras de Malan Mané e de Mamadu Indjai... (Luís Graça)

26 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2683: Estórias de Dulombi (Rui Felício, CCAÇ 2405) (9): O Jorge Félix e o Prisioneiro

(...) Depois de vários anos sem notícias do Jorge Félix, tive a felicidade de o reencontrar há dias através de e-mail que ele me enviou. Soube do meu endereço, por meio do teu blogue que tem lido...

Relembrou-me uma história curiosa que se passou em Galomaro numa operação militar em que ele esteve envolvido e da qual resultou um prisioneiro do PAIGC que pernoitou na sede da CCAÇ 2405. (...)

O JORGE FELIX E O PRISIONEIRO (Ou a psicossocial no seu melhor... )
por Rui Felício


(...) (i) PREÂMBULO


(...) O episódio que vou contar poderia ter resultado em catástrofe, como mais adiante se compreenderá, mas o que permanece na memória, é de facto a situação picaresca que, passado o perigo, a seguir se desenvolveu.

Antes do relato dos factos, é importante dar a conhecer a personalidade do Jorge Félix. Sem ela, esta história não teria o sal e a pimenta que a maneira de ser dele lhe conferem.

(ii) A PERSONALIDADE DO JORGE FÉLIX

O Jorge Félix, a quem ainda hoje me ligam laços de grande amizade, foi piloto de helicópteros da Força Aérea em Bissau nos anos de 1968 a 1970.

Para além do seu elevado profissionalismo, capacidade técnica e conhecimento do território, que o tornaram, na opinião generalizada, como um dos melhores, senão o melhor piloto de helicópteros que terão passado pela guerra da Guiné, reunia e ainda reúne, invulgares qualidades difíceis de encontrar todas concentradas numa mesma pessoa.

Aquelas que mais apreciei foram e ainda são, apesar dos anos passados, um apurado sentido de humor, uma jovial e permanente boa disposição que alastrava a quantos o rodeavam, um permanente lenço de seda colorido em volta do pescoço que era a sua imagem de marca e uma aptidão especial para rapidamente aprender a dominar as técnicas das mais variadas especialidades.

Refiro-me ao domínio da fotografia e da imagem, da música e, sobretudo, dos corações femininos! Dizem que destroçou vários na sua passagem por Bissau, Bafatá, Galomaro e sei lá quantas mais terras da Guiné...

(iii) A OPERAÇÃO MILITAR

Mas vamos à história de cuja parte final fui testemunha. A parte inicial foi-me descrita pelo próprio Jorge Felix e confirmada pelos paraquedistas intervenientes.

Num certo dia de Agosto de 1969, o Jorge Félix transportou no seu helicóptero um grupo de pára-quedistas que iam fazer um assalto, a uma base do PAIGC, identificada pelos serviços de informações militares da Guiné, como estando localizada no [subsector de Mansambo, Sector L1, Zona Leste].

Ao procurar local para a aterragem perto do objectivo, em plena mata, o Jorge Felix foi descendo o helicóptero e, a uns 5 metros do chão, a deslocação de ar, provocada pelo movimento das pás do aparelho, afastou uma série de ramos de arbustos deixando a descoberto um guerrilheiro do PAIGC que ali se havia emboscado.

O homem estava armado com um [ RPG2,], e a granada colocada, apontando para o helicóptero, o que naturalmente deixou em pânico o piloto e os tripulantes. Na verdade, se o gatilho tivesse sido premido, era o destruição do helicóptero e de algumas vidas, senão todas, daqueles que o tripulavam.

O Jorge Félix que foi quem primeiro avistou o guerrilheiro, gritou aos pára-quedistas que de imediato saltaram do Heli e aprisionaram o homem sem necessidade de dispararem um único tiro, desarmando-o acto contínuo.

Pelos vistos, o susto e a surpresa dele foram tão grandes, ao avistar inesperadamente o helicóptero sobre a sua cabeça, que lhe devem ter paralisado os movimentos e o raciocínio... para sorte dos militares que enchiam o aparelho...

(iv) O REGRESSO A GALOMARO

Mas vamos à história de cuja parte final fui testemunha. (...) [Para saber o resto, clicar aqui]

[ Revisão / fixação de texto / título: L.G.]

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Guiné 63/74 - P7748: A guerra vista de Bafatá (Fernando Gouveia) (59): Na Kontra Ka Kontra: 23.º episódio




1. Vigésimo terceiro episódio da estória Na Kontra Ka Kontra, de Fernando Gouveia (ex-Alf Mil Rec e Inf, Bafatá, 1968/70), enviado em mensagem do dia 8 de Fevereiro de 2011:


NA KONTRA
KA KONTRA


23º EPISÓDIO

Nos dias seguintes o Alferes continua a fazer os patrulhamentos diários à volta da tabanca, cada vez mais longe. O não aparecimento de vestígios do inimigo é um bom presságio para o casamento. Durante os percursos vai sempre pensando como resolver os problemas que daí podiam resultar. Decide que no próprio dia reforçará as sentinelas metidas na mata. Morança tinha a sua, que chegava perfeitamente. É preciso arranjar uma cama para colocar ao lado da sua onde se deitará a Asmau… para dormir. Com toda a certeza ela trará a sua. Passa-lhe pela cabeça a ideia de continuar com a mesma lavadeira, que além de lavar a sua roupa lavaria também a da sua princesa, pois princesas não lavam roupa. Rapidamente chega à conclusão que seria uma péssima ideia colocar a Asmau sem nada que fazer. A própria deverá querer, à boa maneira africana, tratar da roupa do seu homem.

Tudo parece que se está a resolver de forma simples para o nosso Alferes. Está a esquecer-se dum “pequeno pormenor” que só detectará depois do dia do casamento.

1969. Princípios de Julho. Dia marcado para o casamento. O Alferes não deixou de dormir um pouco em sobressalto, como qualquer outro noivo. Com a noiva possivelmente ter-se-ia passado o mesmo.

Levanta-se, “enfia” uns calções e as botas militares que, juntamente com o ar ensonado lhe conferem um aspecto nada próprio de um noivo. É sua intenção ir direito à fonte tomar o seu primeiro banho. Ao sair da morança começa a achar que já não deve ser assim tão cedo pois há muito pessoal por ali, o que não era habitual. Também nota que o pessoal africano, sobretudo as mulheres, estão vestidas com panos mais garridos. Cheira a carne assada. Cai em si, havia festa na tabanca. Ia haver casamento, o seu. Tão rapidamente toma banho, como se veste a preceito. Enverga pela primeira vez a “sabadora” encomendada aos milícias que tinham ido fazer compras ao “Regala” em Galomaro. Também pela primeira vez se apercebe da frescura que aquela roupa proporciona, contrariamente às vestes europeias.

Depois do café não pôde deixar de deambular pela tabanca recebendo e retribuindo cumprimentos. Está algo emocionado por se sentir integrado naquela comunidade. Não deixou de passar pela morança do Adramane. A Asmau era o seu objectivo mas ela não apareceu ou não quis aparecer, o que não incomodou o Alferes pois já sabe que é francamente correspondido.

Fora da morança vê o que lhe parece ser o seu recheio posto a arejar. Estará ali tudo que se pode ter numa casa africana: Muitas meias cabaças, tachos, panelas, uma arca aberta com roupas e panos, aparentemente a tomar ar, algumas garrafas com bebidas, mais panos, um gorro de lã, vários embrulhos.

O gorro que deram de prenda ao Alferes.

Está o Alferes a contemplar aquele estandarete quando um dos seus homens se lhe dirige:

- “Manga” de prendas, meu Alferes.

Só aí é que ele compreendeu a situação. Eram as prendas para o casal que, como é costume, se expõem à porta da morança da noiva para todo o pessoal ver.

Conversa com um, conversa com outro, depressa se aproxima a hora do almoço melhorado, que irá ser precedido da cerimónia propriamente dita, o casamento. Em Madina Xaquili, tabanca pequena, não há mesquita nem “imami” cabe pois ao Chefe de Tabanca, Adramane, muçulmano convicto, realizar a cerimónia. Quando todo o pessoal, excepto as sentinelas, se reúne ao pé da sua morança dá início à cerimónia, palavras não compreensíveis para os europeus não muçulmanos. Depois de ter lido umas passagens do Corão, porventura semelhantes às de um casamento católico, vira-se para o casal, à sua frente, e declara-os casados.

Todos foram desejar felicidades ao casal e o pessoal africano vai-se dispersando em grupos entoando cantares nas línguas das suas etnias, totalmente incompreensíveis para o Alferes e o seu pessoal metropolitano. A alegria era muita e sincera.

A seguir todo o pessoal vai comer e beber. Há duas mesas cheias de perfeitas iguarias, para aquele fim de mundo. A da noiva, junto da morança dos pais e a do noivo, a mesma onde comia todos os dias. Em ambas há de tudo à fartura: Cabrito assado, arroz branco, “siga” de galinha com óleo de palma, caldo de mancarra, diversos bolos à base de mancarra, de confecção local e, pasme-se, há dois bolos perfeitamente europeus, de aspecto e sabor, um de laranja e outro de chocolate. É uma surpresa do João. Tinha mandado comprar no comerciante “Regala” em Galomaro dois bolos enlatados que depois de se retirarem da lata parecem acabados de fazer.

Foi bebedeira para uns, festa para todos, excepto para o milícia Samba que, depois de comer se retirou. O Samba sempre tinha gostado da Asmau só que ainda não tinha conseguido o dinheiro suficiente para dar ao pai dela. Felicidade de uns, infelicidade de outros.

O nosso Alferes, embora já esteja liberto do acordo com o Adramane, ainda não se sente muito à vontade com a, agora, sua mulher. De qualquer modo conversaram mais, chegam a abraçar-se, beijam-se.

Está a chegar a noite. Os dois vão comer mais alguma coisa e antes de se recolherem são avisados que precisam da sua presença no “bentem”. O Braima, músico da tabanca, queria dedicar e oferecer ao Alferes uma composição musical. Não faz da música e do canto a sua profissão, ou seja não se considerando “jideu” não ganha a vida à custa de loas dedicadas a “homens grandes” importantes, que vaidosamente lhes pagam. O momento é inesquecível para o nosso Alferes que, comovido às lágrimas, muito agradece. Não tarda que, finalmente, o Alferes leve a Asmau para a sua morança.

Fim deste episódio
Até ao próximo camaradas.
(Fernando Gouveia)
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de Guiné 63/74 - P7743: A guerra vista de Bafatá (Fernando Gouveia) (58): Na Kontra Ka Kontra: 22.º episódio

sábado, 31 de agosto de 2013

Guiné 63/74 - P11996: Blogpoesia (353): Pôr-do-sol (Juvenal Amado)

1. Em mensagem do dia 28 de Agosto de 2013, o nosso camarada Juvenal Amado (ex-1.º Cabo Condutor da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74), enviou-nos este poema e as fotos que se publicam


Pôr-do-Sol

A vida escorreu-nos pelos dedos
Numa sucessão de momentos únicos
Observámos a água dos rios
Idealizámos pontes entre margens
Desaguámos em mares
Ouvimos o vento
Reprimimos lamentos
Contámos estrelas
Descobrimos odores
Criámos novos passados
Outras pessoas habitam em nós
A guerra é um sítio estranho
Porque teimamos em revivê-la,
Nunca se regressa de lá.
Nesse tempo o que fomos
O que fizemos
O que lamentamos
O que éramos e que não fomos
O que esperámos
Quem esperou por nós
Neste Verão quase Outono da vida
Os olhos cansados
Insónia de todos os excessos
Relógios que somam tempo
Tempo que soma calendários
Porque esperámos demasiado
Passámos em barco contra a corrente
Extasiados e encandeados pelos pôr-do-sol
Sentamo-nos,
E ficamos à espera do tempo que nunca virá.
É que esse tempo não existe.






Fotos: © Alf Mil Vasconcelos

Os periquitos: Sertã, Ivo, Passos, Leo, Canário e Amado, a caminho do Regala
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Nota do editor

Último poste da série de 14 DE AGOSTO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11938: Blogpoesia (352): Três poemas recentes de J. L. Mendes Gomes: A minha bicicleta; O meu netinho Tomás; Contemplação da noite...

terça-feira, 19 de março de 2013

Guiné 63/74 - P11279: Estórias do Juvenal Amado (47): Aquelas postas de bacalhau eram ouro

Galomaro > Porta de Armas

1. Mensagem do nosso camarada Juvenal Amado (ex-1.º Cabo Condutor da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74), com data de 15 de Março de 2013:

Caros Luis, Carlos, Magalhães e restante Tabanca Grande
Gostava que fosse mais uma estória despretenciosa e que ela não carregasse o sentimento de perca que neste momento é praticamente impossível ignorar.
Mas isto também serve para honrar os amigos e para preencher o vazio que ficou. Por outras palavras fazemos o luto necessário ao nosso equilíbrio.
Juvenal Amado


ESTÓRIAS DO JUVENAL AMADO

47 - AQUELAS POSTAS DE BACALHAU ERAM OURO

O Caramba* tinha recebido da terra uma encomenda. Enganaram-se os que pensaram que era uma coisa especial, que era o tesouro gastronómico alentejano. Na verdade a encomenda resumia-se a umas quantas postas de bacalhau salgado e seco, como era tradição cá na terra, na vez de liofilizado como o recebíamos lá.
Aquilo para o Caramba era ouro puro e tratou de o guardar com mil cuidados, começou logo a magicar como o iria fazer, sim porque aquilo não era um manjar qualquer, tinha que ter honras de iguaria fina.

Por mim achava que umas postas de bacalhau não mereciam tanta deferência, mas o Caramba era um homem que gostava das coisas da terra, que cultivava a sua ruralidade e que fazia questão de não esconder as suas origens. Contava ele que ainda moço ia com o pai para o negócio da compra e venda de fruta, com um naco de pão, umas azeitonas britadas, um dente de alho e uma posta de bacalhau demolhada, que depois passava pelas brasas feitas num intervalo do seu labor.

Eu, oriundo de operariado urbano que nem quintal tinha, apreciava quando ele falava da sopa de beldroegas, do licor de poejo, dos coentros, do gaspacho, as caldeiradas de peixe da barragem, da sopa de cação, enfim, coisas que eu não conhecia mas que quando regressei tive oportunidade de saborear nas inúmeras vezes que com ele privei. Ele chegava a trazer do Alentejo as ervas aromáticas e mais os necessários, para fazermos os petiscos em minha casa na Boavista de Alcobaça, para onde eu fui viver depois de casar. Visitava-me então amiúde quando vinha carregar fruta da região que depois transportava para os mercados do baixo Alentejo e Algarve.

Mas voltemos ao “fiel amigo” que o pai lhe tinha mandado.

O destino do manjar foi uma p……. de bacalhau que ele preparou dentro de uma das terrinas de aço inox quem eram usadas no refeitório.
Era o que se podia chamar uma grande tachada.

Nessa noite a partir das oito horas da noite, ele, eu e Aljustrel estávamos de reforço à porta de armas no primeiro de cinco, que tínhamos apanhado por castigo e foi mesmo ali que fizemos as honras ao dito.

Está claro que não comemos sozinhos, alguns camaradas que regressavam do Regala bem com um ou dois furriéis a troco de um rodada de cerveja, também se associaram na terrina. Mais tarde até o Santos que estava preso, ajudou a acabar com ela e de caminho ficou de reforço connosco até de manhã.

O Santos na sua qualidade de preso, todo dia enfiando num pequeno cubículo no abrigo STM, onde mal cabia uma pequena mesa e dois beliches, não lhe custou nada ficar de reforço por nós que bem bebidos não nos aguentávamos com os olhos abertos. Quando começou a raiar o dia chamou-nos e foi-se enfiar na sua cela, onde se preparou para apanhar mais um dia naquilo que poderia chamar-se “frigideira”, tal era o calor dentro daquelas quatro paredes.

O Santos por esperteza era soldado básico. Natural de Grijó, passava o dia às ordens do tenente Raposo, nem arma tinha distribuída. Não me lembro do que ele fez mas sei que levou uma porrada com prisão agravada pelo Comando-Chefe, passando assim duas vezes pelo encarceramento. Está claro que quem estava de serviço à porta de armas à noite lhe abria a porta para ele vir para o fresco, e por vezes, quando era levado à casa de banho passava pela cantina para beber uma bem fresca. Tudo isto nas barbas do nosso comandante e mais oficiais do quadro, de onde podia haver problemas. Dos milicianos nós não tínhamos medo neste caso.

Fica aqui mais um apontamento onde as figuras centrais foram o nosso camarada João Caramba e o Santos dois amigos que já nos deixaram.

Voltando à figura do Caramba, uma das minhas passagens por sua casa, estava ele de convalescença de uma intervenção cirúrgica e por isso já com muitos dos problemas que a partir de certa altura o foram afligindo. Brincamos com a velhice que se ia apoderando de nós e à minha pergunta de como estava, respondeu-me, com um ar maroto, apontando para a televisão onde se passava uma cena de amor entre uma bonita mulher e um homem, assim com alguma filosofia e fino humor:
- Ora vamos indo não fazendo nada e para aqui estamos vendo o que outros estão fazendo

Dito isto, fez com a boca um trajeto trocista para que não houvesse duvidas, ao que se estava a referir.

Um abraço
Juvenal Amado

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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 10 DE MARÇO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11227: In Memoriam (144): João António Branquinho Caramba, ex-1.º Cabo TRMS da CCS/BCAÇ 3872 (Galomaro, 1971/74)

Vd. último poste da série de 5 DE MARÇO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11196: Estórias do Juvenal Amado (46): Este gajo não tem uma cunha, tem um barrote

sexta-feira, 22 de dezembro de 2023

Guiné 61/74 - P24988: No céu não há disto... Comes & bebes: sugestões dos 'vagomestres' da Tabanca Grande (43): Arroz de moiras com grelos ("Chef" Alice)


Marco de Canveses > Paredes de Viadores > Candoz  > Quinta de Candoz > 21 de dezembro de 2023 >  O arroz de moiras com grelos,à moda da "Chef" Alice...

Foto (e legenda): © Luís Graça (2023). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. A tropa e a guerra roubaram-nos pelo menos dois, três ou quatro Natais nas nossas vidas... Por isso, que os nossos leitores nos perdoem estas recordações profanas em tempo tão sagrado como esta quadra festiva em que comemoramos o nascimento, em Belém,  do deus feito homem dos cristãos... Há dois mil anos... Em que tanto a terra do Menino Jesus como a dos nossos antepassados lusitanos eram uma colónia ou província do Império Romano... (Na verdade, a gente não sabe o que eles comiam nem que língua falavam, herdámos e adaptámos a língua dos colonialistas romanos.)

 Mas eu pergunto-me também: será que os habitantes da cidade galaico-romana de  Tongóbriga, no Freixo, Marco de Cansveses, a escassos quilómetros da nossa Quinta de Candoz, já conheciam esta delícia da gastronomia da nossa terra, que é o arroz de moiras com grelos ? 

A resposta é não: ainda o arroz, oriundo do Extremo Oriente, não tinha chegado à Lusitània... Nem muito menos as moiras (e os mouros)...

O termo "moira" é usado aqui, na região duriense (ou do Baixo Douro) para designar uma "chouriça feita de sangue fresco e  carne de porco, temperos e vinho tinto verde"... Indispensável no cozido à portuguesa e, com mais razão, no arroz de moiras com grelos ou arroz de grelos com moiras (depende das quantidades)..Há mutas receitas na Net. É um prato típico aqui na nossa regiáo, Marco de Canaveses e Baião. Ceme-swe todo o ano, e agora é que sabe bem com o frio de rachar.

2. Em Tormes, que fica em Santa Cruz do Douro, Baião, também aqui perto de Candoz, ao alcance de um tiro de obus 10.5,  nem o Jacinto nem o seu criador, o Eça de Queiroz, alguma vez terão provado o "arroz de moiras com grelos"... 

Ou talvez, sim,  o Eça era um "gourmet"... Se tivesse comido, em vez das favas, teria feito o elogio do divinal arroz de moiras com grelos... Recorde-se aqui a antológica descrição (ou uma parte dela) da primeira refeição, no solar de Tormes,  do princípe Jacinto e do seu amigo Zé Fernandes em "A Cidade e as Serras":

(...) Uma formidável moça, de enormes peitos que lhe tremiam dentro das ramagens do lenço cruzado, ainda suada e  esbraseada  do calor da lareira, entrou esmagando o soalho, com uma terrina a fumegar. E o Melchior, que seguia erguendo a infusa do vinho, esperava que Suas Incelências lhe perdoassem porque faltara tempo para o caldinho apurar (...).

[Jacinto], desconfiado, provou o caldo, que era de galinha e rescendia. (...) Tornou a sorver uma colherada mais cheia, mais considerada. E sorriu, com espanto: 
-
−  Está bom!

Estava precioso: tinha fígado e tinha moela: o seu perfume enternecia: três vezes, fervorosamente, ataquei aquele caldo.

 − Também lá volto!   −  exclamava Jacinto com uma convicção imensa.   − É que estou com uma fome... Santo Deus! Há anos que não sinto esta fome.

Foi ele que rapou avaramente a sopeira. E já espreitava a porta, esperando a portadora dos pitéus, a rija rapariga de peitos trementes, que enfim surgiu, mais esbraseada, abalando o sobrado - e pousou sobre a mesa uma travessa a transbordar de arroz com favas. Que desconsolo! Jacinto, em Paris, sempre abominara favas!... Tentou todavia uma garfada tímida - e de novo aqueles seus olhos, que o pessimismo enevoara, luziram, procurando os meus. Outra larga garfada, concentrada, com uma lentidão de frade que se regala. Depois um brado:

 - Ótimo!... Ah, destas favas, sim! Oh que fava! Que delícia! 

E por esta santa gula louvava a serra, a arte perfeita das mulheres palreiras que em baixo remexiam as panelas, o Melchior que presidia ao bródio...

- Deste arroz com fava nem em Paris, Melchior amigo! 

O homem óptimo sorria, inteiramente desanuviado: 

- Pois é cá a comidinha dos rapaz da quinta! E cada pratada, que até Suas Incelências se riam... Mas agora, aqui, o Sr. D. Jacinto, também vai engordar e enrijar!

O bom caseiro sinceramente cria que, perdido nesses remotos Parises, o senhor de Tormes, longe da fartura de Tormes, padecia fome e mingava... E o meu Príncipe, na verdade, parecia saciar uma velhíssima fome e uma longa saudade da abundância, rompendo assim, a cada travessa, em louvores mais copiosos.  (...)

In: Excertos de: Queiroz, Eça de -  A Cidade e as Serras". Livros do Brasil, 2016, pp. 153/153 (Obras de Eça de Queiro, 8) (Fixação do tcxto e notas de Helena Cidade Moura).

quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

Guiné 63/74 - P12470: Inquérito online: ocupação dos tempos livres no mato... A decorrer até à véspera de Natal... Os primeiros depoimentos: J.F. Santos Ribeiro, Francisco Palma, Xico Allen, João Martins



Guiné > Zona leste > Setor L1 > Bambadinca > CCAÇ 12 (1969/71) > Foto nº 56 > Nos dias de folga (, às vezes horas...), a malta fazia questão de se desfardar e vestir "à civil"... Mesmo que fosse para ir beber um copo, fora do arame farpado, na tasca do Zé Maria... Era uma questão psicológica e uma forma de esquecer a guerra, por um dia ou por umas horas... Na foto, o Arlindo Roda, à civil, junto à casa do chefe de posto, dirigindo-se muito provavelmente à tabanca, fora do arame farpado... Foto do álbum de Arlindo T. Roda, ex-fur mil da CCAÇ 12 (1969/71).

Foto: © Arlindo T. Roda (2010). Todos os direitos reservados. [Edição e legenda: L.G.]


A. Mensagem enviada ontem, às 21h30, pelo correio interno da Tabanca Grande, com algumas modificações:
Camaradas:

Assunto - Sondagem: O que é que a malta fazia, nos 'tempos livres'

O blogue é curioso... Ou melhor: o blogue quer ajudar-nos a (re)arrumar as nossas memórias de há 40/50 anos... Ora cá está um tema, a ocupação dos tempos livres,  que dá para todos participarem... No meio da atividade operacional e daqueles longos 21, 22 e mais meses de 'comissão de serviço', havia alguns tempos livres, de dia ou de noite... Ou não havia ?

Bom, a pergunta é: como é que a malta 'matava o tempo' ?... Por tempos livres deve entender-se o as horas e os dias que sobravam depois de cumpridas  as  obrigações militares inerentes à nossa condição de combatentes (fazer quartos sentinela, rondas, saídas, emboscadas, colunas, operações...). O que no mato, no interior do TO da Guiné, era relativo; dormia-se sempre com a G3 à cabeceira...

A pergunta é dirigida mais diretamente a quem vivia num aquartelamento ou destacamento no mato... No caso da malta que estava em Bissau, havia mais alternativas... de diversão e lazer (que não vamos, por agora, incluir na nossa última sondagem de 2013).

Até ás 11h do dia 24 do corrente, podem responder (votando...) DIRETAMENTE, no nosso blogue, na COLUNA DO LADO ESQUERDO, AO ALTO, a mais esta  sondagem do nosso blogue... Há 20 hipóteses de resposta. São admissíveis múltiplas respostas desde que não contraditórias.

Obrigado. Um alfabravo natalício e fraterno, Luís Graça, editor.

PS - Podem também escrever pequenos textos para o blogue e mandar juntamente fotos... Os editores agradecem.

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SONDAGEM: NO QUE DIZ RESPEITO À OCUPAÇÃO DOS 'TEMPOS LIVRES', NO(S) AQUARTELAMENTO(S) ONDE ESTIVE, LEMBRO-ME QUE... (PODES DAR MAIS DO QUE UMA RESPOSTA)


1. Havia uma pequena biblioteca com livros

2. Eu lia jornais/revistas com alguma regularidade

3. Eu lia livros com alguma regularidade

4. Não tinha tempo para ler

5. Não tinha disposição para ler

6. Não tinha nada para ler

7. Levei livros para a Guiné

8. Assinava revistas/jornais

9. De preferência ouvia música

10. De preferência jogava à bola

11. De preferência jogava às cartas

12. De preferência ia à pesca ou caça

13. De preferência convivia com os meus amigos

14. De preferência convivia com a população da tabanca

15. De preferência petiscava e/ou bebia uns copos

16. De preferência dormia (por ex., a sesta)

17. Tinha um diário onde escrevia

18. Lia e escrevia cartas e aerogramas

19. Fazia trabalho comunitário (escola, saúde, igreja...)

20. Não sei / não me lembro

B. Alguns comentários ou respostas recebidos ontem, à noite:


José Fernando dos Santos Ribeiro [ou J. F. Santos Ribeiro[ex-1º Cabo de Transmissões na CCS do BCAÇ 2912, Galomaro, 1970/72]

Eu (e a grande maioria), quando não estava de Serviço (Transmissões), ou íamos até ao Regala (tabanca de comes-e-bebes, dum Cabo-Verdiano), ou arranjavámos maneira de ir na Coluna a Bafatá (+/- 35 Km., por picada), ou íamos até às Tabancas fazer "psico" (sic.).

Estou a falar do período de 1970/1972, no Leste da Guiné, em Galomaro/Cossé. BCAÇ 2912/CCS. 

Um abraço a todos. D´Jarama, Inté.


Francisco Palma [ex-sold condutor auto, 
CCAV 2748/BCAV 2922, Canquelifá, 1970/72] 
O que eu respondi:

(2) Eu lia jornais/revistas com alguma regularidade;

(3) Eu lia livros com alguma regularidade;

(9) De preferência ouvia música;

(10) De preferência jogava à bola;

(11) De preferência jogava às cartas;

(13) 13. De preferência convivia com os meus amigos;

(14) De preferência convivia com a população da tabanca;

(15) De preferência petiscava e/ou bebia uns copos;

(18) Lia e escrevia cartas e aerogramas;


Xico Allen [ex-1.º cabo at inf, CCAÇ 3566, Os Metralhas, Empada, 1972/74]


Com alguns meses de estadia, me enviaram alguns livros escolares. Ainda recebi explicações de matemática mas não era facil ir ao liceu em Bissau fazer exames.

Ajudaram a passar o tempo...

Abraço, Xico.

João José de Lima Alves Martins [ou João Martins

[ex-alf mil art,  BAC1, Bissum, Piche, Bedanda, Gadamael e Guileje, 1967/69 ]


Para mim, para o meu bem estar psicológico, para ultrapassar o "stress" permanente que vivia e me obrigava a estar sempre preparado para responder a um ataque do inimigo, e para compreender a natureza daquela guerra que fomos forçados e chamados a enfrentar, tornou-se da maior importância compreender o que pensavam e sentiam as diversas populações com as quais tive o privilégio de contactar, e foram muitas. 

Por isso, todo o tempo disponível em que me afastava das bocas de fogo, era dedicado a um contacto mais próximo com as populações. Daí, as muitas fotografias que lhes tirei. Aliás, teria sido capaz de me oferecer para servir o meu País, no Ultramar, porque considerava fundamental esse conhecimento para poder falar, com conhecimento de causa, desse tema que tão discutido era no areópago das Nações Unidas, e era tema geral de confronto de ideias no nosso país. 

Compreendo os meus camaradas que se refugiaram em Paris, aliás, também me invadiu o desejo de me ir embora tal era a acção psicológica desenvolvida no COM [Curso de Oficiais Milicianos] de Mafra, mas não posso compreender que não sejam considerados de desertores, e, ainda menos, poderei aceitar como bons portugueses todos os que, de algum modo, andaram conluiados com a CIA e o KGB. 

Tendo conhecido o pensamento de centenas de africanos, cheguei à conclusão, tal como Amílcar Cabral (,que cheguei a elogiar quando prestei declarações "sobre quais eram as minhas impressões do teatro de operações da Guiné"), que a guerra que enfrentámos não se restringia a africanos contra europeus, mas, somente, a africanos contra um regime opressor, situação muito bem aproveitada pelas grandes potências da altura que trataram de infiltrar no nosso país, e até, nas forças armadas, quem aceitasse colocar-se ao seu serviço. 

Ora, os regimes são passageiros e circunstanciais, as nações é que, regra geral, perduram. É óbvio, que a nossa já não é o que era, e,"pelo andar da carruagem", nem vaticino onde vai parar...