terça-feira, 13 de novembro de 2007

Guiné 63/74 - P2263: Álbum das Glórias (34): Fotografias do Américo Estanqueiro na Fundação Mário Soares (Virgínio Briote / Fernando Barata)


Lisboa > Fundação Mário Soares > Folheto da Exposição Fotográfica do Américo Estanqueiro, uma obra que retrata em imagens o que a CCAÇ 2700 passou pelas terras de Dulombi/Galomaro, entre 1970 e 1972.

1. Comentário do co-editor vb:
Esteve lá muita gente, alguns muito conhecidos, outros nem tanto (1): o major Tomé, o historiador Fernando Rosas, o Dias da Cunha, ex-presidente do Sporting Club de Portugal, o Helder de Jesus (o homem das transmissões do QG, que no início dos anos 70 ouvia tudo o que podia, fossem relatos nossos ou do PAIGC), o Teco e o Guedes, ambos da CCAÇ 726 (a que ergueu o aquartelamento de Guileje), donos de um espólio de imagens ainda por mostrar ao público e alguns camaradas da CCAÇ 2700, que comentavam com pormenor uma ou outra foto com o Américo Estanqueiro.

co-editor: vb
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2. Uma pequena amostra da Exposição > Texto do Fernando Barata


Batiam as 12 horas quando largámos da Gare Marítima de Alcântara no Carvalho Araújo
Às 21h30 de de 30 de Abril 1970 fundeámos ao largo de Bissau. A 1 de Maio iniciou-se o transbordo através do navio Rita Maria.


A 10 de Agosto 1970, próximo do Jifim, uma viatura acciona uma mina A/C, a qual provocou a morte, já no Hospital de Bissau, do 1.º Cabo António Carrasqueira e a morte imediata de 4 milícias (urnas destinavam-se aos milícias).
Ainda hoje me recordo, ao aproximarmo-nos do quartel, ser questionado pelo condutor que conduzia a viatura que transportava os corpos, se deveríamos entrar no quartel, tal era o estado em que os milícias se encontravam.


O descanso do guerreiro numa das 44 operações realizadas ao longo daqueles quase 2 anos de actividade, com nomes de código que iriam desde "Menina Rabina" até "Cidade Maravilhosa".
Fernando Barata

Fotos: Arménio Estanqueiro (2007). Direitos reservados (com a devida vénia...)
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Nota de vb:

(1) como oportunamente ontem, duas horas depois ou nem tanto, o Luís Graça retratou no

Guiné 63/74 - P2262: Exibição do filme As Duas Faces da Guerra (1): Castro Verde (16/11) e Coimbra (4/12) (Diana Andringa / Fernando Barata)


Flora Gomes, cineasta guineense, um dos mais conceituadops do cinema africano actual. É co-realizador, com a portuguesa Diana Andringa, membro da nossa Tabanca Grande, do filme-documentário As Duas Faces da Guerra (Portugal/Guiné, 2007)


1. Mensagem da Diana Andringa, de 9 de Novembro último:

Assunto - As Duas Faces da Guerra, em Castro Verde

Não sei se pode interessar algum dos bloguistas, mas... o nosso documentário vai ser exibido dia 16 [de Novembro], às 21H30, no Anfiteatro do Forum Municipal de Castro Verde.

Abraço, Diana

2. Mensagem de L.G., enviada através da tertúlia, no dia de São Martinho:

Malta (alentejana, sobretudo...):

Eis uma boa notícia... Quem puder ir a Castro Verde... [ Fui lá muitas vezes, quando fiz um estudo sobre a Mina da Somincor]...

Mas vamos ver se o filme da Diana / Flora (e que também é um bocado nosso e do IN de ontem, - que raio de nome, IN, tem a razão a Diana, ao pô-lo entre parênteses) chega também a outros sítios do nosso Portugal...

Vou pedir à Diana para nos avisar quando ele passar na RTP, como esperamos que isso venha a acontecer (em breve ?)...

Saudações para toda a Tabanca Grande, em dia de São Martinho. Luís


3. Resposta (ou melhor, pergunta, rápida, do Fernando Barata:

Luigi... E COIMBRA??? (tu, também, cá vieste muitas vezes estudar as noites da Queima...)

Aquele abraço, F. Barata





4. Resposta, quase instantânea da Diana Andringa (cque é a co-realizadora do filme):


Calma! Se arranjarem uma sessão, como fizeram em Castro Verde, leva-se o filme.

Diana

5. Cheque-mate à rainha, por parte do estratego de Coimbra:

Luís: A isto chama-se eficiência!

Documentário: As Duas Faces da GuerraData: 4 de Dezembro - 16H00 (BOLAS!!! os alentejanos de Castro Verde foram mais rápidos que nós)
Local: Auditório da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra
Debate: Diana Andringa, Prof. Dr. José Manuel Pureza, Major-General Pedro Pezarat Correia
Presenças esperadas: Luís Graça, Vírgíno Briote, Carlos Vinhal

Aquele abraço
F. Barata






Luís

A isto chama-se eficiência.

Documentário: "As Duas Faces da Guerra"
Data: 4 de Dezembro - 16H00 (BOLAS!!! os alentejanos de Castro Verde foram mais rápidos que nós)
Local: Auditório da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra
Debate: Diana Andringa, Prof. Dr. José Manuel Pureza, Major-General Pedro Pezarat Correia.
Presenças esperadas: Luís Graça, Vírgíno Briote, Carlos Vinhal

Aquele abraço
F. Barata

Guiné 63/74 - P2261: Vídeos da guerra (5): Nos bastidores da Op Paris Match: as (in)confidências de Marcelo Caetano (Manuel Domingues)

1. Mensagem de Manuel Domingues, ex-Alf Mil, Comandante do Pel Rec Info, CCS/BCAÇ 1856 (Nova Lamego, 1965/67) (1)

Caros tertulianos:

Relativamente ao filme da ORTF e à reportagem do Paris Match (2), posso adiantar o seguinte: Partipei em Setembro e Outubro de 1969 no apoio à equipa da ORTF que realizou o filme e que incluiu Portugal e o Ultramar, com deslocações do Minho a Timor, captando imagens em todas as possessões ultramarinas. Esta equipa englobava cerca de uma dúzia de pessoas, entre as quais uma jornalista do Paris Match e um do Figaro.

O objectivo inicial era recolher material para incluir no programa Point-Contrepoint (tipo Prós e Contras) em que de um lado se afirmava que Portugal era uma potência colonialista, que explorava os povos coloniais que lutavam pela sua libertação. Esta ideia era suportada em reportagens e depoimentos fornecidos pelos movimentos de libertação a que se juntavam alguns opositores do regime, no exílio, entre os quais Manuel Alegre (3).

Do outro pretendia-se refutar esta ideia, afirmando a ideia de que o Ultramar fazia parte integrante de Portugal e mostrando o grau e ritmo de desenvolvimento que se estava a processar, sobretudo em Angola e Moçambique.

A equipa responsável pelo programa, durante as negociações, pôs como condição poder verificar com total liberdade a realidade em todos os territórios, sobretudo na Guiné, Angola e Moçambique, onde se desenvolviam as lutas de libertação.

O Governo Português aceitou, apenas impondo como condição que o elemento que tinha apoiado a equipa nas suas deslocações em Portugal e no Ultramar estivesse presente nos estúdios da ORTF para assistir à montagem do filme, evitando surpresas que já tinham acontecido em programas idênticos nos Estados Unidos onde a ideia de confronto acabou por ser subvertida e resultou num manifesto antiportuguês. Portanto, e em resumo, tive a oportunidade de acompanhar todo o processo.

Assim, no dia da assinatura do Armistício, 11 de Novembro de 1969 [, feriado nacional em França, comemorativo do fim da I Grande Guerra Mundial, 1914-1918], o programa foi para o ar. O grau de imparcialidade, relativo, conferiu-lhe um sucesso na crítica francesa da especialidade e alguma satisfação ao Governo Português de então que pela primeira vez não deu por mal empegue o montante gasto no apoio ao Programa, suportando o custo das viagens e estadia de todos os elementos, durante cerca de um mês.

O próprio Marcello Caetano quis ver a cópia que eu tinha trazido e foi durante a sessão, quando viu a cena da emboscada na Guiné que pulverizou dois dos elementos das NT, pronunciou para mim a esperançosa frase:
- Temos que acabar com esta guerra (*).

O impacto na opinião francesa e o elevado volume de material recolhido nos próprios locais levou os produtores da ORTF a fazerem vários documentários.


Já não disponho do exemplar do Paris Match nem da cópia do filme, mas ainda disponho da reportagem do Fígaro da mesma altura, onde o autor define Spínola como um misto de Goering e de Marquês de Cuevas, reportagem essa que vou tentar digitalizar e que enviarei depois para os nossos tertulianos.

Um abraço cordial do
Manuel Domingues



(*) Vd: Novo Contacto com a Guiné: a esperança marcelista em Uma Campanha na Guiné, do Autor.

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Notas de L.G.:

(1) Vd. posts de:

4 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCXXXVI: A vingança da PIDE (Manuel Domingues)

(...) Não bastava ser bom militar. Era também necessário estar nas boas graças da PIDE. A maior parte dos oficiais milicianos, que não aspirava a ser funcionário público, podia encontrar refúgio na sua condição temporária de militar, mas à saída, a PIDE esperava por ele para acertar contas!" (...).


18 de Julho de 2005 > Guiné 63/74 - CXI: Bibliografia de uma guerra (5)


(..) Manuel Domingues, nascido em Castro Laboreiro, em 1941, frequentou o Curso de Rangers e fez parte do BCAÇ 1856 (1965/67). Como Alferes Miliciano, foi Comandante do Pelotão de Reconhecimento e Informação, tendo desempenhado as funções de oficial de Informações e, durante alguns meses, a de Oficial de Operações.

O BCAÇ 1856 esteve no Leste, Sector L3, com o Comando e CCS sediados em Nova Lamegoe as companhias operacionais em Madina do Boé (CCAÇ 1416, com um destacamento em Béli; em Bajocunda (CCAÇ 1417, com um destacamento em Copá); e em Buruntuma (CCAÇ 1418, com um destacamento em Ponte Caiúm).

É Autor do livro Uma Campanha na Guiné (com estórias e testemunhos de vários camaradas do batalhão) bem como de O Pegureiro e o Lobo – Estórias de Castro Laboreiro (2005).

(2) Vd. posts anteriores:


8 de Novembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2249: Vídeos da guerra (2): Uma das raras cenas de combate, filmadas ao vivo (ORTF, 1969, c. 14 m) (Luís Graça / Virgínio Briote)

8 de Novembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2250: Vídeos da guerra (3): Bastidores da Op Ostra Amarga ou Op Paris Match (Bula, 18Out1969) (Virgínio Briote / Luís Graça)

11 de Novembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2256: Vídeos da guerra (4): Ainda nos bastidores da Operação Paris Match (Torcato Mendonça / Luís Graça / Diana Andringa)


(3) Nota autobiográfica de Manuel Alegre:

(i) Manuel Alegre de Melo Duarte nasceu a 12 de Maio de 1936 em Águeda;

(ii) Estudou Direito na Universidade de Coimbra, onde foi um activo dirigente estudantil;

(iii) Apoiou a candidatura do General Humberto Delgado [em 1958];

(iv) A sua tomada de posição sobre a ditadura e a guerra colonial levam o regime de Salazar a chamá-lo para o serviço militar em 1961, sendo colocado nos Açores, onde tenta uma ocupação da ilha, com Melo Antunes;

(v) Em 1962 é mobilizado para Angola, onde dirige uma tentativa pioneira de revolta militar;

(vi) É preso pela PIDE em Luanda, em 1963, durante 6 meses;

(vii) Na cadeia conhece escritores angolanos como Luandino Vieira, António Jacinto e António Cardoso;

(viii) Colocado com residência fixa em Coimbra, acaba por passar à clandestinidade e sair para o exílio em 1964;

(ix) Passa dez anos exilado em Argel, onde é dirigente da Frente Patriótica de Libertação Nacional (FPLN); aos microfones da emissora A Voz da Liberdade, a sua voz converte-se num símbolo de resistência e liberdade;

(x) Entretanto, os seus dois primeiros livros, Praça da Canção (1965) e O Canto e as Armas (1967) são apreendidos pela censura, mas passam de mão em mão em cópias clandestinas, manuscritas ou dactilografadas;

(xi) Poemas seus, cantados por Zeca Afonso e Adriano Correia de Oliveira, tornam-se emblemáticos da luta pela liberdade;

(xii) Regressa finalmente a Portugal em 2 de Maio de 1974, dias após o 25 de Abril. (...)

segunda-feira, 12 de novembro de 2007

Guiné 63/74 - P2260: Álbum das Glórias (33): Inauguração da exposição de fotografia do Américo Estanqueiro, hoje, na Fundação Mário Soares

Lisboa > Fundação Mário Soares > 12 de Novembro de 2007 > O Américo Estanqueiro, ex-Fur Mil da CCAÇ 2700 (Dulombi, 1970/72) autografando o catálogo da sua exposição para o antigo camarada de armas Joaquim Alves, ex-Fur Mil Enf.

Lisboa > Fundação Mário Soares > 12 de Novembro de 2007 > O fotógrafo Américo Estanqueiro, à esquerda, conversando com o Gomes, ex-Fur Mil Mecânico Auto, da CCS do BCAÇ 2912, sediada em Galomaro (1970/72).

Lisboa > Fundação Mário Soares > 12 de Novembro de 2007 > Camaradas do Américo Estanqueiro da CCAÇ 2700 (Dulombi, 1970/72) : da esquerda para a direita: o Manuel Maria Brunheta (ex-Sold Trms), o Joaquim Alves (ex-Fur Mil Enf), Carlos Gomes (ex-Cap QP, hoje coronel na reforma), o Manuel Ravasco (ex-Alf Mil) e o Gomes (este, já acima referido, ex-Fur Mil Mec Auto da CCS do BCAÇ 2912).
 
Muito falado, por todos estes camaradas e pelo próprio Américo Estanqueiro, foi o nosso amigo Fernando Barata, ex-Alf Mil da companhia (Vive em Coimbra, não tendo podido estar presente neste acontecimento que foi gratificante para todos).

Lisboa > Fundação Mário Soares > 12 de Novembro de 2007 > O nosso co-editor Virgínio Briote em conversa com o Mário Tomé (mais conhecido como o major Tomé, hoje coronel na reforma, e que teve duas comissões na Guiné, a última das quais como capitão, comandante da CCAV 2712 (Olossato e Nhacra, 1970/72), unidade a que pertenceu o nosso querido amigo e camarada Paulo Salgado (ex-Alf Mil). Eu não conhecia o Mário Tomé, pessoalmente. Tive oportunidade de lhe falar do Paulo e do nosso blogue, sobre o qual mostrou muito interesse e prometeu ir visitar.

Por detrás do Virgínio, vê-lhe a sua simpatiquíssima esposa, que é professora de português na Escola Secundária Passos Manuel e que o acompanha sempre nestas actividades... tertulianas. Por isto e por tudo, ela merecia uma foto como devia ser... Mas desta vez o fotógrafo falhou... I'm sorry, lady...


Lisboa > Fundação Mário Soares > 12 de Novembro de 2007 > A nossa amiga Diana Andringa, jornalista e co-realizador do filme As Duas Faces da Guerra (2007), que é, além disso, esposa do Dr. Alfredo Caldeira, responsável, entre outras funções, pelos arquivos da FMS... (A propósito, em conversa com ele, mostrou-se aberto à possibilidade de se realizar outras exposições a partir do espólio fotográfico de alguns membros da nossa tertúlia: falei-lhe em especial do álbum - que considero notável - do Idálio Reis sobre Gandembel / Balana, Abril de 1968/Janeiro de 1969)...

Aproveitei para tirar à Diana uma chapa para a nossa fotogaleria dos amigos e camaradas da Guiné... Há tempos havia-a convidado para fazer parte da nossa Tabanca Grande. Hoje obtive a sua anuência, o que muito me/nos honra... Mas, para ela, também é um prazer passar a ser considerada, de pleno direito, uma "bloguista", leia-se, membro do nosso blogue... A propósito do seu filme, deu-me promessas de boas notícias (que eu ainda não estou autorizado a divulgar)...

Lisboa > Fundação Mário Soares > 12 de Novembro de 2007 > Inauguração da exposição fotográfica do nosso camarada António Estanqueiro > Tendo como pano de fundo, a fotografia-ícone da exposição (a partida, aos trambolhões, do pessoal da CCAÇ 2700, de Bissau até ao Xime, em LDG), vemos no lado esquerdo o nosso amigo e camarada de tertúlia Helder de Sousa e, à direita, o Mário Tomé...

Lisboa > Fundação Mário Soares > 12 de Novembro de 2007 > Na inauguração da exposição fotográfica do Américo Estanqueiro estavam muitas caras conhecidas da nossa vida social e política, a começar pelo ex-Presidente da República Mário Soares, o sempre activo e afável presidente da FMS... Mas também muitas caras femininas, simpáticas... Para além de amigas e familiares do Estanqueiro, registe-se aqui a presença da esposa do Prof Doutor Fernando Rosas, a Raquel Bagulho - que é minha / nossa amiga de longa data (à sua direita, a Maria Alice, minha mulher)... Ao fundo, vêm-se fotos da exposição.

Lisboa > Fundação Mário Soares > 12 de Novembro de 2007 > De novo o Virgínio Briote e o Mário Tomé... (que o Briote terá conhecido ainda como tenente, na Guiné)...

Lisboa > Fundação Mário Soares > 12 de Novembro de 2007 > Um encontro inesperado: o Virgínio Briote com o Teco e o Guedes... Estes dois últimos estiveram em Guileje, na CCAÇ 726, sob o comando do Nuno Rubim... Voltarama agora a colaborar juntos no projecto Guileje... Vd. post de 14 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1173: A fortificação de Guileje (Nuno Rubim, Teco e Guedes, CCAÇ 726) ... O Teco, que é natural de Angola, tem um fabuloso arquivo fotográfico desse tempo (mais de 500 fotos); o Guedes (que depois foi camarada do Briote nos comandos), é especialista em dioramas... O Nuno Rubim tem neles dois grandes amigos e colaboradores.


Comentário de L.G.:

O Américo agradeceu-nos muito o destaque que demos a este evento no nosso blogue. É homem afável e simples. Gostei de o conhecer, embora tivesse sido escasso o tempo de conversa, por razões óbvias.
Ele mora em Queluz. É natural do concelho de Alvaiázere, distrito de Leiria. Nasceu em 1947.

Embarcou para a Guiné no N/M Carvalho Araújo em 24 de Abril de 1970. Ao longo da sua vida militar fez fotografia com objectivos comerciais. Logo no barco, montou um laboratório. E em Dulombi comprou - supremo luxo! - um gerador.
 
O Estanqueiro foi o fotógrafo da companhia. Ainda hoje continua a trabalhar em fotografia, depois de uma vida algo atribulada que o levou inclusive à emigração na Venezuela. Durante o serviço militar, acumulou mais de 6 mil negativos que, infelizmente, foram destruídos.

A sua exposição ficará aberta ao público até ao final do ano. O catálogo com textos de Mário Soares, de Alfredo Caldeira e de José Pessoa, além das fotografias do Américo Estanqueiro, custa 10 €.

Do texto do José Pessoa - A Viagem - destaco o último parágrafo:
Afinal, a viagem só termina quando se arrumam as bagagens e as memórias.


Fotos: © Luís Graça & Camaradas da Guiné (2007). Direitos reservados.
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Guiné 63/74 - P2259: Blogpoesia (7): Nas terras de Darsalam, no Cantanhez, adormeceste, para sempre, como herói, meu querido Sasso (J.L. Mendes Gomes)

Guiné > Região de Tombali > Catió > Álbum fotográfico de Vitor Condeço (ex-Furriel Mil, CCS do BART 1913, Catió 1967/69) > Catió, Quartel > 1968> Foto 36 > "Um Pôr-do-sol visto do edifício do Comando na direcção à Porta de Armas e depósito de géneros".

Foto e legenda: © Vítor Condeço (2007). Direitos reservados.

1. Mensagem do Joaquim Luís Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728, Os Palmeirins (Como, Cachil, Catió, 1964/66) (1), enviada em 7 de Novembro último:


Caríssimo Luís

As bolandas complicadas da vida só hoje me deixaram ver o post de 17 de Julho último em que publicaste o meu Embondeiro do Cachil (2).

As duas palavras que me dedicaste comoveram-me. Pela sinceridade. Obrigado. Por essa razão, ficou por esclarecer, da minha parte, a dúvida que me colocaste. (Sobre se é Embondeiro ou Poilão?) Não foi preciso, porque a explicação apareceu lá, muito clara e fundamentada.

Encontrei, entretanto, um poema que escrevi, quando da morte do nosso camarada alferes Mário Sasso, da minha companhia CCAÇ 728, na operação do Cantanhez. Aqui to deixo para publicares, em sua homenagem, se o entenderes.

O nosso/teu Blogue...continua altamente frutuoso e interessante. Parabéns ao seu mentor e novos colaboradores.

2. Comentário de L.G.:

Mesmo com as "bolandas complicadas da vida" (as bolandas e as bolanhas, acrescento eu), tu conseguistes parar para escrever este terno e fraternal poema a um amigo caído em combate no longínquo Dar es Salam, mata do Cantanhez, Guiné-Bissau, em 5 de Dezembro de 1965, a milhares de quilómetros de Lisboa, Portugal, a norte, onde tu hoje vives, ou da Beira, Moçambique, a sudeste, onde o Mário nasceu...

Só um camarada de guerra consegue escrever, nem lamechices nem sem falso pudor, um poema destes a outro camarada de guerra... Todos nós trouxemos, às costas da nossa memória, os amigos que perdemos lá em baixo... E muitos de nós ainda não conseguiram fazer o luto dessas perdas, vivendo com um contraditório sentimento de culpa a sua tão injusta morte... Porquê ele, e não eu ?...

Joaquim, eu sei que Berlim te chama de vez em quando, mas deixa-me dizer-te que tenho sentido a tua falta no nosso blogue... A tua grandeza de alma, a tua estatura moral e o teu talento literário fazem-nos falta nesta nossa (e tua) Tabanca Grande... Até sempre, Mário, até sempre, Joaquim!

3. Poema > Em memória do Alferes Sasso (3)

por J.L. Mendes Gomes


Estou a ver-te,
no regresso:
Alto, esguio,
óculos escuros.
Tato claro, de corte fino.
Tão vaidoso,
pelas tardinhas de Domingo,
calçada velha acima,
até ao quartel
da velha Évora.
De braço dado,
num corpo só,
com tua moça,
formosa companheira,
boa,
das noitadas do fado,
castiço,
de Lisboa...
de ambos vossa amante.
Que encanto!

Parecieis mesmo
um casal americano,
tranquilo e tão ufano,
pelo meio do casario branco,
do coração alentejano!...

Que alegria!...
Que vontade de viver
de ti transparecia
pela semana inteira,
de olhos presos
à tua amada!...

Eras sempre o primeiro:
nas paradas,
secas, militares
e nos crosses atletas,
sem parar,
pelas estradas ermas,
e sem fim,
de sobreiros tristes,
através dos montes
do Alentejo...

Nos desafios permanentes,
pronto e voluntário,
prós exercícios
mais malucos....
Que pavor!...
da maluqueira militar.

Ora endiabrado trepador
daquele palanque,
alto e estreito,
de cimento...
ora dependurado,
na vertigem alucinante
da corda e da roldana...

Nas caminhadas nocturnas,
por aquele mundo,
de eremitério,
prás emboscadas perdidas,
nas veredas, ao luar,
prós golpes de mão,
temerosos, traiçoeiros,
mesmo a fingir,
tu levavas tão a sério...

Que exemplo vivo,
de vontade louca
de viver
o dia a dia,
tu me deste,
sem saberes!...

Quiseram as sortes
pra ti malvadas,
levar-nos a todos,
p'rá Guiné!...

Que romaria e arraial
havia sempre
à tua beira!...
Com a viola e o acordeão!

Tua voz rouca,
bem timbrada,
a retinir,
os fados todos
de Lisboa,
tão saudosa...
fazia dó!
Encantadora companheira
nas noitadas solitárias,
do Cachil e Catió...

Como lembro
tuas horas de desespero,
que vivias,
tão sincero,
em filosofia permanente,
à procura do sentido
da nossa dor,
e nossa vida, sobre a terra...

Que sentidos
desabafos me fizeste,
nas vésperas
da tua hora derradeira,
tão a sós,
em noitada de cavaqueira,
tão fraterna,
num duelo filosófico
e porfia verdadeira...
olhos presos,
bem abertos,
às belezas de paraíso,
das escravizadas terras africanas
e ao futuro da vida
que tanto amavas!...

Como suspiravas
encontrar
o caminho certo,
iluminado
do viver...

Eis que
no alvorecer duma aurora,
de suave e fresca neblina,
quando o sol
nascia em liberdade,
a oferecer mais um dia
ao mundo
e à desavinda humanidade,

depois duma noite,
sem sentido,
inteirinha
a caminhar,
por entre matas densas
das terras de Dar es Salam... (4)
adormeceste,
para sempre,
como herói...
no regaço
dos teus irmãos,
ali ao pé!...

Nunca mais te esqueceremos!...
Ó eterno amigo,
Ó companheiro
Sempre nosso!...

Até à vista!
Querido Sasso!...


__________________

Notas de L.G.:

(1) Sobre a história da CCAÇ 728, vd. os seguintes posts:

20 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1194: Crónica de um Palmeirim de Catió (Mendes Gomes, CCAÇ 728) (1): Os canários, de caqui amarelo

2 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1236: Crónica de um Palmeirim de Catió (Mendes Gomes, CCAÇ 728) (2): Do Alentejo à África: do meu tenente ao nosso cabo

20 Novembro 2006 > Guiné 63/74 - P1297: Crónica de um Palmeirim de Catió (Mendes Gomes, CCAÇ 728) (3): Do navio Timor ao Quartel de Santa Luzia

1 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1330: Crónica de um Palmeirim de Catió (Mendes Gomes, CCAÇ 728) (4): Bissau-Bolama-Como, dois dias de viagem em LDG

11 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1359: Crónica de um Palmeirim de Catió (Mendes Gomes, CCAÇ 728) (5): Baptismo de fogo a 12 km de Cufar

8 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1411: Crónica de um Palmeirim de Catió (Mendes Gomes, CCAÇ 728) (6): Por fim, o capitão...definitivo

22 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1455: Crónica de um Palmeirim de Catió (Mendes Gomes, CCAÇ 728) (7): O Sr. Brandão, de Ganjolá, aliás, de Arouca, e a Sra. Sexta-Feira

8 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1502: Crónica de um Palmeirim de Catió (Mendes Gomes, CCAÇ 728) (8): Com Bacar Jaló, no Cantanhez, a apanhar com o fogo da Marinha

11 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1582: Crónica de um Palmeirim de Catió (Mendes Gomes, CCAÇ 728) (9): O fascínio africano da terra e das gentes (fotos de Vitor Condeço)

29 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1634: Crónica de um Palmeirim de Catió (Mendes Gomes, CCAÇ 728) (10): A morte do Alferes Mário Sasso no Cantanhez

5 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1646: Crónica de um Palmeirim de Catió (Mendes Gomes, CCAÇ 728) (11): Não foi a mesma Pátria que nos acolheu


(2) Vd. post de 17 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1963: Blogpoesia (1): O embondeiro do Cachil (J. L. Mendes Gomes)

(3) Mário Henriques dos Santos Sasso, Alferes Miliciano, do Exército, morreu em combate na Guine, em 5 de Dezembro de 1965 (Fonte: Liga dos Combatentes > Mortos no Ultramar)

Sobre o nosso camarada, vd. os seguintes posts:

20 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1194: Crónica de um Palmeirim de Catió (Mendes Gomes, CCAÇ 728) (1): Os canários, de caqui amarelo

(...) Este é o modesto contributo de um combatente da Guiné, um canário de caqui amarelo, nos anos 64-66. É a minha perspectiva pessoal e muito restrita. Feita de memória, e por isso, sem pretensões de exactidão histórica.

A primeira parte sai dum texto romanesco, em que quero homenagear a memória do meu camarada alferes Mário Sasso. A segunda é extraída duma rudimentar autobiografia, que eu já tinha escrevinhado para os meus netos. (...)


2 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1236: Crónica de um Palmeirim de Catió (Mendes Gomes, CCAÇ 728) (2): Do Alentejo à África: do meu tenente ao nosso cabo


(...) O Mário Sasso, um moçambicano (da Beira) radicado há uns bons anos, na boémia e no fado alfacinha, de Lisboa, era o comandante do 1º pelotão. Tinha feito um bom curso em Mafra e, por feitio, tinha de ser o melhor em tudo. Brioso, procurava ter uma conduta semelhante à figura.

Quis ingressar nos comandos, mas o coração não lhe aguentaria o esforço.Versátil e sensível, tocava viola e acordeão e cantava o fado castiço, ajudado por uma voz rouca, mas afinada. Era o mais citadino dos quatro [alferes da CCAÇ 728]. (...)


29 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1634: Crónica de um Palmeirim de Catió (Mendes Gomes, CCAÇ 728) (10): A morte do Alferes Mário Sasso no Cantanhez


(...) A CCAÇ 728, aproveitando a maré-cheia, saíu, à noitinha, do cais de Catió a bordo de uma LDM; atravessou o estuário do Cacine e foi deixada, nas primeiras horas da madrugada, algures, em terra firme, do território inimigo.

Todo o cuidado era pouco. Tocou ao meu pelotão seguir à frente, logo depois do destemido grupo indígena do João Bacar Jaló.

Caminhou-se toda a noite; quando o dia começava a querer alvorecer, estávamos a atravessar a zona, crítica, de Dar es Salam [ou Darsalam].

De repente, alguns tiros caíram sobre o pelotão que seguia na cauda da fila, comandado pelo alferes Sasso.

A resposta foi pronta e, depressa, tudo se calou.

À frente, nada se tinha passado.Só quando o dia nasceu e um helicóptero chegou, tivemos conhecimento de que o Mário Sasso tinha sido atingido com um tiro nas costas que lhe vasou o pulmão e coração. A esperança de sobreviver era pouca… e assim foi.
(...)

(4) Ou Darsalam, segundo a carta de Cacine.

Guiné 63/74 - P2258: Agenda Cultural (2): Exposição de fotografias do Américo Estanqueiro, na Fundação Mário Soares, até ao fim do ano

1. Através do Dr. Alfredo Caldeira, recebemos um convite para a inauguração da exposição fotográfica do Américo Estanqueiro e pedido de divulgação da mesma, o que já fizemos através da rede de correio electrónico da nossa tertúlia (cerca de 200 endereços) e através do nosso blogue (que tem uma média semanal de páginas visitadas da ordem das 10 mil) (1):


Caro Luís Graça:

Junto envio o convite para a exposição "Memória da Guerra Colonial - Fotografias de Américo Estanqueiro/CCAÇ 2700", solicitando também a sua divulgação.

Muito obrigado
Alfredo Caldeira.


2. O convite, em formato pdf, diz o seguinte:

O Presidente da Fundação Mário Soares tem a honra de convidar V. Excia. para a inauguração da exposição MEMÓRIA DA GUERRA COLONIAL - FOTOGRAFIAS DE AMÉRICO ESTANQUEIRO - CCAÇ 2700.

12 de Novembro de 2007, 18.30 horas. Sala de Exposições da Fundação Mário Soares, Rua de São Bento, nº 160, Lisboa.

R.S.F.F.
Telef. 213964179/85
Email: fms@fmsoares.pt
Será oferecido um beberete.



3. Comentário do editor L.G.

Não conheço pessoalmente o Américo Estanqueiro mas o Fernando Barata é membro da nossa tertúlia, tendo sido ele o primeiro a falar-nos do Estanqueiro e da sua exposição.

Encontramo-nos mais logo e espero que haja mais membros da nossa Tabanca Grande no evento, para além de mim e do Virgínio Briote. Nomeadamente os da área da Grande Lisboa. O convite é extensivo a toda a nossa tertúlia.

Desejo bom sucesso para mais esta iniciativa cultural da FMS. As minhas calorosas saudações à FMS e aos seus colaboradores, em meu nome e em nome dos muitos camaradas e amigos da Guiné que desde 25 de Abril de 2005 têm generosa e entusiasticamente alimentado o nosso blogue.
Para que a memória da guerra colonial / luta de libertação não se perca irremediavelmente, com o desaparecimento físico de uma geração de combatentes, que foi a nossa e que foi a última do Império...
____________________

Nota dos editores:

(1) Vd. post de 9 de Novembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2253: CCAÇ 2700 (Dulombi, 1970/72): Exposição fotográfica de Américo Estanqueiro, na Fundação Mário Soares (Fernando Barata)

domingo, 11 de novembro de 2007

Guiné 63/74 - P2257: Convívios (34): CCAÇ 763 (Cufar 1965/67) (Mário Fitas)

1. Texto do Mário Fitas, de 2 de Novembro último, relatando-nos o 9º Encontro da CCAÇ 763 (Cufar, 1965/67). O nosso amigo e camarada Mário Fitas foi Fur Mil Op Esp, da CCAÇ 763 (Cufar 1965/66); é autor dos dois romances sobre a guerra da Guiné (1):

A CCAÇ 763, comandada pelo então capitão Costa Campos, foi mobilizada para o CTIG, por nota confidencial nº 6479/LM da 4ª Rep do EME.

Embarcou em Lisboa no N/M Timor em 11 de Fevereiro de 1965 e desembarcou em Bissau a 17 do mesmo mês, ficando instalada no BCAÇ 600, em Santa Luzia, para os procedimentos administrativos e logísticos habituais.
À medida que ia recebendo o material, os grupos de combate foram sendo deslocados para Cufar por lanchas de Fuzileiros Navais, rendendo a CCAV 703.

Vista aérea de Cufar
Em 17 de Março de 1965, já estava colocada, em quadrícula, em Cufar, adida ao BCAÇ 619, onde permaneceu até 10 de Novembro de 1966, data em que foi transferida para Catió para aguardar o embarque de regresso a Lisboa no Niassa.
Na data da chegada a Cufar a Companhia era formada por 5 Oficiais, 17 Sargentos e 144 praças. Acompanhavam a CCAÇ 763, 8 cães de guerra Pastores Alemães.
Os cães de guerra (pastores alemães) na Guiné com a CCaç 763. Uma experiência, da iniciativa do então cap Costa Campos, que não teve seguimento naquele território, tanto quanto sabemos.
Na súmula da actividade que desenvolveu no Sul da Guiné, assumem-se com particular destaque a construção do aquartelamento de Cufar e de todas as suas infra-estruturas.
A CCAÇ 763 levou a cabo 34 operações com apoio aéreo e naval, 17 das quais com contacto com o IN.
Cambança do rio Ganjola, no decurso da Operáão Petardo, em 10 de Junho de 1966
uma abatiz no caminho da CCaç 763. Entre os rostos dos jovens de então, nota-se o Capitão Costa Campos
Nas acções desenvolvidas contra o então IN, a CCaç 763 destruiu os acampamentos de Cufar Nalu, Cabolol (2), Flaque Injã (2) e Caboxanque.
Para além desta actividade constam ainda dos relatórios da CCAÇ 763:
415 patrulhas apeadas, 136 patrulhas-auto, 24 escoltas, 53 emboscadas, 10 golpes de mão, 13 operações de cerco e limpeza, 28 batidas e 3 nomadizações.
Zona de intervenção da CCAÇ 763 e operações efectuadas

De toda esta actividade, foi estimado que a CCAÇ 763 percorreu aproximadamente 16 mil quilómetros a pé, 6 000 de viatura e 1 000 de LDM.
Durante este período a CCaç 763 teve 10 baixas (mortais), sendo 7 em combate e 3 por doença. Sofreu 53 feridos.
Dos relatórios constam ter sido feitos 45 prisioneiros e causado 40 feridos e 107 mortos ao então IN.
Em face da acção desenvolvida, durante a actividade operacional em Cufar, a CCAÇ 763 teve colectivamente 10 referências elogiosas e um louvor do Brigadeiro Comandante Militar.
Individualmente:
-Prémios Governador da Guiné: a 2 Praças e a 3 Sargentos
-Louvores conferidos pelo General Comandante-Chefe das F.A.: a 1 Sargento
- Louvores conferidos pelo Brigadeiro Comandante Militar: a 5 Praças, 6 Sargentos e 4 Oficiais
- Louvores conferidos pelo Comandante de Batalhão: a 16 Praças, 8 Sargentos e 2 Oficiais
- Louvores conferidos pelo Cmdt da Companhia: a 12 praças, 2 Sargentos e 2 Oficiais

9º. Encontro da CCAÇ 763 em 23 de Setembro de 2007-11-02

Almeirim
Restaurante Moinho de Vento

Pelas 11H00 o pessoal começou a chegar e a concentrar-se no Largo em frente ao Restaurante Moinho de Vento.
Veteranos resistentes de tempos mal vividos, reavivando a fraternal vivência

Desnecessário será descrever, a efusão dos abraços, e das velhas bocas, consoante o destinatário. Grato momento de convívio com as fotos da praxe.

E chegou a hora do opíparo almoço e do serviço impecável com que fomos brindados pelo restaurante. Muita conversa animada, relembrando a Guiné e Cufar e quando demos por ela, o nosso escriturário Amadeu, estava a alertar-nos para as horas. Começou, assim, a fase seguinte do evento, com um minuto de silêncio pelos camaradas que já partiram.
De seguida o Fernando Albuquerque leu-nos as mensagens dos camaradas que, não podendo estar presentes, não deixaram de em espírito se associarem ao convívio.
Agradeceu e transmitiu ainda o Amadeu as mensagens de camaradas de outras Companhias que connosco viveram a aventura da Guiné.
Seguiram-se os habituais discursos, os quais foram seguidos da exibição de um DVD, amavelmente cedido pelo Luís Costa Campos, filho do já falecido Coronel Costa Campos, nosso comandante em Cufar.
Presenteados como sempre pela Pastelaria Carrilhão do nosso Belarmino Acúrcio, o bolo deste ano com uma magnifica decoração.
E eram já próximo das 18H00, quando o nosso querido cabo enfermeiro Policarpo Sousa Santos procedeu á partida do magnífico bolo.
E foi novamente momento de saudade, com aquele fraterno abraço e o desejo de novo encontro no próximo ano.
Fotos: © Mário Fitas (2007). Direitos reservados.

2. Discurso do ex-Furriel Miliciano Mário Vicente Fitas Ralheta

Passados que são quarenta anos, é já possível friamente, e consequentemente fora de quaisquer influências sobre a proximidade dos acontecimentos. Fazer hoje algum balanço sério não só sobre a guerra na Guiné, o Vietname Português, bem como à vivência e procedimentos dessa pequena unidade do Exército, que em quadricula na margem direita do Cumbijã, desenvolveu uma actividade operacional de grande exigência no teatro da guerra, a par de um ciclópico esforço físico na construção de todas as infra-estruturas de um aquartelamento com ausência de quaisquer oportunidades de exigências ou desvios, dada a muita actividade para o combate e proximidade de um inimigo, sem interregnos para tréguas de parte a parte.
Se houver curiosidade?!... Poderão ser feitos com toda a clarividência os efeitos de vinte e dois meses vividos pelos homens da CCAÇ 763 no sul das terras da Guiné.
A guerra ali travada, e que tantos outros travaram. Com os seus resultados diferenciados como é óbvio.
Não é este o momento de vitimar ou criar heróis. Há unicamente que deixar vincado o vero testemunho aos aqui presentes e àqueles que precederão esta geração de “Veteranos de Guerra”, espécie em extinção.
Necessário será ir ao Baú, e remexer num passado, agitando memórias e lembranças que talvez ainda nos façam sofrer, e dilacerem as almas, ou espíritos como cada um queira e creia.
Será portanto o testemunho de uma geração que nada reivindicando, em corpo e espírito, se entregou a uma missão histórica, cujos contornos, não foram sufragados. Ao arrepio de uma realidade histórica hipocritamente subtraída.

Tudo isto nos leva a constatar as dívidas a saldar. Reportemos, em primeiro lugar, a massa anónima de combatentes que sem temor, o melhor de si deram em prol da Pátria, para uma causa em que na generalidade não estavam tecnicamente preparados, nem psicologicamente estruturados. Mas o estoicismo dos homens que contribuíram para constituir o esteio aglutinador nessa odisseia deste atribulado conflito se transcenderam e transfiguraram pelo bem cumprir.

Refiro seguidamente a massa imensa de nativos, irmãos de armas, que no mato, sempre na frente, se bateram heroicamente a nosso lado e tão miseravelmente foram à sua sorte abandonados. Como é possível condená-los dessa maneira?
Carlos Quêba, Gibi Baldé, Amadu Baldé, Braima, Amadu, Alfa nan Cabo. Etc. … Etc. … Etc. …. Estes! Conhecemo-los todos nós.
A História muito lhes fica a dever, ao invés da Pátria que os transformou em párias. Podeis todos sentir o orgulho do dever cumprido!
A memória da Guerra continuará viva, pelo menos enquanto um Veterano se mantiver actuante e disponível, para reivindicar o seu contributo!

Ao inimigo que com a CCAÇ 763 se bateu, há que reconhecer o seu inconformismo, estando sempre à altura das circunstâncias. Mantendo como sempre o nosso respeito e admiração pelos que ainda lutam por uma Guiné livre e democrática, honrando o seu povo e tradições. Reconhecemos muitas das carências sofridas e debilidades vividas. Responsáveis seremos por heranças não conseguidas em tempos que aquele pedaço de terra foi responsabilidade nossa.
Embora de responsabilidade limitada. Não tenhamos pejo em assumi-la. Por isso a nossa cooperação deve ser um contributo, para sustentar o desenvolvimento daquela terra maravilhosa. Unida a nós pela língua, pelo passado marcado pelas incidências, mas sempre presente no imaginário de quem um dia a percorreu.

Aos homens da CCAÇ 763 que cumpriram no limite do sacrifício e na maior dádiva exigidas ao ser humano, o abraço fraterno, referência da amizade que sempre nos uniu.
Cabem aqui outras referências, às quais respeitosamente agradeço, a sua participação neste nosso convívio. Ao Luís Costa Campos muito obrigado, por nos trazer aqui com a sua presença a memória do grande militar que nos conduziu no sul da Guiné.
À Sra. Professora, enfermeira e companheira de guerra Maria da Glória (Dª. França) o agradecimento pela doação total, à CCAÇ 763. É meu entendimento, que deve ser considerada como parte integrante desta Companhia.
A todos o fraterno abraço do tamanho do poilão no cruzamento do Cabaceira.

3. Discurso do ex-Alferes Miliciano Jorge Paulos

Caros Amigos

As razões principais que nos levam a estar de novo aqui reunidos são, por um lado, a possibilidade de nos revermos e, por outro, a de recordar a grande aventura que, em conjunto, vivemos na Guiné, quando éramos ainda “meninos e moços”.

Não estamos aqui para festejar a guerra, que era bem melhor que não tivesse acontecido, mas podemos orgulharmo-nos, sem favor, do nosso comportamento.
Todos nós, na altura, tivemos os nossos medos (só os inconscientes é que não os teriam), mas sempre soubemos enfrentá-los e levá-los de vencida.
A Companhia de Caçadores 763 foi um exemplo, muitas vezes citado, de demonstração de coragem e de dignidade de todos os seus componentes, independentemente do posto de cada um.
Entretanto, alguns, já não estão entre nós. No último ano deixou-nos o Meco, figura marcante, símbolo de que mesmo no meio do perigo se pode ser alegre.

Também o alferes Baço, que tanto nos ajudou com os seus obuses, nos faz lembrar, com saudade, a sua espantosa calma, em todas as circunstâncias.

E o nosso Melo? Exemplo ímpar de como se pode comandar com amizade e com o reconhecimento de todos. O Melo, que pertencia ao meu Grupo de Combate, e que não consigo relembrar sem emoção, permitam que vos diga, que se tratava de um Homem que jamais esquecerei. Amigo do amigo, sempre pronto a ajudar os que mais precisavam, várias vezes, em pleno teatro de guerra, o vi arriscar a própria vida, para salvar quem quer que fosse, nas situações mais difíceis.
Heróis são os que, no momento exacto, se disponibilizam, corajosamente, para salvar o seu semelhante. O Melo era um deles!!!

Mas também já não está entre nós o nosso Capitão Costa Campos. Foi, sem dúvida, um grande exemplo de militar, que sempre soube conjugar as suas obrigações profissionais com o tratamento humanizado do pessoal que dirigia.
Corajoso, abnegado, sempre na primeira linha de combate, a Companhia e todos nós, em geral, ficamos a dever, ao “nosso Capitão”, os êxitos que tivemos e, graças à sua capacidade de liderança, ultrapassámos momentos de grande perigo, onde a decisão certa é o mais importante.

Por isso, meus amigos, cada vez que algum de nós resolve deixar-nos, é um pouco de nós próprios que se vai, porque tudo o que foi feito se deve a cada um em particular e à soma de todos nós, em geral.

Uma palavra ao Luís Costa Campos de agradecimento por aqui estar presente e, um sentido muito obrigado à nossa França que, quando connosco esteve em Cufar, nos acarinhou, partilhando, conjuntamente, aquela grande aventura.

Amigos, estou naturalmente feliz por poder estar hoje aqui de novo convosco, e o meu maior desejo é que tal aconteça ainda muitas vezes e, que todos vivam durante muitos anos com saúde e alegria, no seio das vossas famílias.

Obrigado a todos

Viva a CCaç 763!
_______________
Nota do co-editor vb: à atenção dos Camaradas da CCaç 763. Pela época, pela acção que desenvolveram, pelas experiências com os pastores alemães, daqui lançamos o repto para que façam a história da vossa Companhia.
(1) Vd. posts de:
22 de Outubro de 2007 > Guiné 63/74 - P2202: A nossa Tabanca Grande e As Duas Faces da Guerra (8): Voltei a Cufar e a chafurdar nas bolanhas e rios de maré (Mário Fitas)
12 de Agosto de 2007 > Guiné 63/74 - P2043: Bibliografia de uma guerra (23): Putos, Gandulos e Guerra, de Mário Vicente, aliás Mário Fitas (CCAÇ 763, Cufar)
5 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1926: Bibliografia de uma guerra (21): Pami Na Dondo ajuda-nos à reconciliação com a guerrilha (Virgínio Briote / Carlos Vinhal)
2 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1911: Bibliografia de uma guerra (19): Pami Na Dondo, guerrilheira do PAIGC, o último livro de Mário Vicente (A. Marques Lopes)
27 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1893: Notícias de Cadique (Mário Fitas, CCAÇ 763, Cufar, 1965/66)
26 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1884: Tabanca Grande (16): Mário Fitas, ex-Fur Mil da CCAÇ 763 (Cufar, 1965/66)

Guiné 63/74 - P2256: Vídeos da guerra (4): Ainda nos bastidores da Operação Paris Match (Torcato Mendonça / Luís Graça / Diana Andringa)

Guiné > PAIGC > Novembro de 1970 > Um guerrilheiro empunhando uma PPSH (a irritante costureirinha).

Fonte: Nordic Africa Institute (NAI) / Foto: Knut Andreasson (com a devida vénia... e a autorização do NAI)


1. A propósito da tristemente famosa Operação Paris Match (1), o Torcato Mendonça mandou-nos a seguinte mensagem, com data de 8 de Novembro:

Meus Caros: talvez pouca importância tenha, até devido à data – Outubro de 1969 – e este facto parece ter-se ter passado antes: Jornalistas do Paris Match, incluindo uma mulher, estiveram em reportagem na Guiné e acompanharam as NT. Caíram numa emboscada e disseram que o potencial de fogo de ambas as partes era enorme, comparando até com o Vietname... E o armamento empregue, principalmente por nós, era contra determinada Convenção...

Saiu no Paris Match, circulou, mas foi logo apreendido em Bissau. Trazia a reportagem e entrevista, com foto de meia página, do Com-Chefe e o seu monóculo. Na reportagem, por ele dada, o/a Jornalista tecia-lhe comentários nada lisonjeiros. Monóculo, pingalim e a II Guerra ainda tão perto!...

Quem, nessa altura estava em Bissau deve lembrar-se do assunto. Há certamente Paris Match guardados. Se isto se confirmasse, com as devidas autorizações, podia postar-se no Blogue, cada vez a dar mais luta...

E, já agora, circulava perdido ou com o IN, no Leste, um jornalista italiano… Talvez as Info saibam… Enviaram mensagens… Falha-me a memória. Guardei, por demasiada tempo bem lá no fundo, aqueles tempos e hoje tão presentes aos cliques de certas noticias.

Um abraço, Torcato Mendonça
Fundão

2. Em resposta, o editor do blogue, L.G., escreveu-lhe:

Torcato:

Obrigado, sempre oportuno e com uma memória de elefante.

Já agora aproveito para perguntar se alguém terá este número da revista Paris Match, nº 1071, de 15 de Novembro de 1969... Ou se consegue obter uma cópia da reportagem onde se fala da Operação Ostra Amarga (Bula, 18 de Outubro de 1969). Seria ouro sobre azul, depois das coisas que já conseguimos saber a partir de dois filmes: As Duas Faces da Guerra (Diana Andringa/Flora Gomes, 2007) e Guerre en Guiné (ORTF, 1969).

O artigo ou reportagem tem por título, em francês: "Guiné: a estranha guerra dos portugueses"... Pode ser que alguém descubra este número numa biblioteca ou arquivo... Será este número que o Torcato viu em Bissau, já no final da comissão da sua CART 2339 ?

Torcato, ficas mandatado para arranjar uma fotocópia da reportagem dos franceses... Quanto à jornalista francesa, já há dias vi a página dela... Se é a mesma (Geneviève Chaubel ?), continua a ser "une belle femme"...

Deliciosa a estória que o Coronel Sentieiro contou, passada no jantar, à noite, em Bula, com os jornalistas franceses, algumas horas depois da tragédia em que morreram os nossos camaradas, o Capela e o Costa, e que foi o baptismo de fogo dos jornalistas (...).

Um Alfa Bravo a todos. Luís


PS - Referências: Guinée: l'étrange guerre des Portugais. Paris Match, nº 1071, 15.11.69

3. Esclarecimento adicional da Diana Andringa:

Julgo que o Torcato Mendonça se refere à mesma operação.

As pessoas que eu contactei não tinham a revista e, na altura, não consegui contactar a fotógrafa. Depois acabámos por desistir da busca, porque preferimos tratar a Operação Ostra Amarga só com as imagens vídeo e as entrevistas com os participantes militares.

Quanto ao que caíu no colo da senhora, foram croquetes... É extraordinário como, de um dia tão terrível, o cor Sentieiro se recorda da história dos croquetes. Penso que deve ter funcionado como um escape, um momento de descompressão.

Quanto ao lado do "IN", há boas reportagens - francesas, inglesas, italianas, suecas, cubanas. Foi daí que retirámos algumas das imagens.

Um documentário sobre a guerra na Guiné, Labanta Negro, de Piero Nelli, ganhou mesmo um prémio no Festival de Veneza, em 1966.

Abraço,

Diana
________

Nota de L.G.:

(1) Vd. post de 8 de Novembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2250: Vídeos da guerra (3): Bastidores da Op Ostra Amarga ou Op Paris Match (Bula, 18Out1969) (Virgínio Briote / Luís Graça)

Guiné 63/74 - P2255: Convívios (33): No dia de São Martinho, no restaurante Korá, do Turé, no Porto, prova-se... o chabéu de frango (A. Marques Lopes)




Provérbios populares portugueses relativos ao São Martinho, que se comemora a 11 de Novembro, amanhã:

Dia de São Martinho, castanhas e vinho.
Dia de São Martinho, comem-se as castanhas e bebe-se o vinho.
Dia de São Martinho, lume, castanhas e vinho.
Dia de São Martinho, mata o teu porco e bebe o teu vinho.
Dia de São Martinho, prova o teu vinho.
Dia de São Martinho, vai à tua adega e prova o teu vinho.
Em dia de São Martinho, vai à adega, prova o teu vinho e faz um magustinho.
Em S. Martinho tapa o teu portalzinho, ceva o teu porquinho e fura o pipinho.
No dia de São Martinho, mata o porquinho, abre o pipinho, põe-te mal com o teu vizinho.
No dia de São Martinho, mata o porquinho, chega-te ao lume, assa castanhas e bebe o teu vinho.
O Verão de S. Martinho, a vareja de S. Simão e a cheia de Santos, são três coisas que nunca faltam nem faltarão.
Pelo São Martinho, abatoca o pipinho.
Pelo São Martinho, abatoca o teu vinho.
Pelo São Martinho, bebe o bom vinho e deixa a água para o moinho.
Pelo São Martinho, deixa a água para o moinho.
Pelo São Martinho, deixa a água p'ró vinho.
Pelo São Martinho, larga o soitinho.
Pelo São Martinho, lume, castanhas e vinho.
Pelo Sãp Martinho, mata o porco, chega-te ao lume, assa castanhas e bebe o teu vinho.
Pelo São Martinho, mata o porquinho, prova o teu vinho e não te esqueças do teu vizinho.
Pelo São Martinho, mata o teu porco e bebe o teu vinho.
Pelo São Martinho, mata o teu porquinho e semeia o teu cebolinho.
Pelo São Martinho, nem nado, nem no cabacinho.
Pelo São Martinho, prova o teu vinho.
Pelo São Martinho prova o teu vinho; ao cabo de um ano já te não faz dano.
Pelo São Martinho, prova o teu vinho, larga o soito e mata o porquinho.
Pelo São Martinho semeia o teu cebolinho, que o meu já está nascidinho.
Pelo São Martinho, semeia a fava e o linho.


Os nossos camaradas e amigos de Matosinhos e Porto, anteciparam o São Martinho, não mataram o porco (com medo de um golpe de mão da ASAE) nem não foram à adega provar o vinho (novo), mas abancaram ao restaurante do Turé... um preto da Guiné que faz o melhor frango de chabéu do Norte!... Dizem, que eu ainda não provei...

Amigos e camaradas: tomem nota, no vosso roteiro gastronómico, do nome do restaurante do Turé, que fica na Praça do Marquês, para cada forem ao Porto ... Aqui vão, entretanto, para os felizardos que se juntaram (e almoçaram) hoje no Korá, a começar pelo Turé, as nossas melhores saudações, de todos os amigos e camaradas da Guiné (que ainda não são uma Nação como a malta do Porto, mas que já fazem uma Tabanca Grande!)... (LG).

Foto: © A. Marques Lopes (2007). Direitos reservados.

1. Texto do A. Marques Lopes:

Hoje [, sábado, dia 10,] estivemos almoçar no restaurante Korá, do Turé, perto da Praça do
Marquês, no Porto. Foi o bom frango de chabéu!

Vai uma foto. Em cima, da esquerda para a direita: eu (Marques Lopes), João Rocha, Turé, pai do Álvaro Bastos, António Pimentel, David Guimarães. Em baixo, também da esuerda para a direita: Lobo, Xico Allen, Álvaro Bastos.

Estiveram também o José Teixeira e mulher, que tiveram de sair antes da fotografia, e a mulher do Álvaro Bastos, que não quis ficar nela... porque era tudo gente da Guiné (brincadeira, claro). Mas apareceu um puto na segunda fotografia e o Pimentel achou que não devia ficar com um bocado da cabeça a menos...

A. Marques Lopes

sábado, 10 de novembro de 2007

Guiné 63/74 - P2254: Estórias avulsas (10): 8 de Dezembro de 1968 - Dia da Mãe (Albino Silva)

Albino Silva,
ex-Soldado Maqueiro,
CCS/BCAÇ 2845
(Teixeira Pinto,
Jolmete,
Olossato,
Bissorã,
1968/70)


Estórias avulsas (10) > 8 de Dezembro de 1968. Dia muito especial, pois era o Dia da Mãe

por Albino Silva (1)


Como sempre, os dias começavam bem cedo para o pessoal do Serviço de Saúde, com a assistência aos doentes internados que tinham que tomar medicamentos em horas diferentes conforme os casos.

Era o dia 8 de Dezembro, Dia da Mãe que começou bem lindo sem cacimbo e com um sol brilhante que nos fez andar por baixo dos mangueiros, procurando sombra devido ao calor que se fazia sentir.

Foto 1> Teixeira Pinto> Fortim no Centro da Vila

Sem consultas e sem serviços nesse dia, decidi sair para o exterior do Quartel, Vila de Teixeira Pinto, mas dessa vez fui só.

Na rua encontrei-me com gente conhecida, quer militares quer civis.

Ao meio-dia fui almoçar à Tabanca do Viriato, restaurante de um amigo libanês, sito na Avenida, bem junto da Igreja, onde também fiz uma visita, já que era o Dia da Mãe.


Foto 2> Teixeira Pinto> Largo no Centro da Vila

Depois de almoçar e conversar com aquele amigo, saí passeando pela avenida até ao Fortim na Rotunda e entrei em algumas casas comerciais. No Caravela da Saudade bebi umas bazucas para refrescar e matar a sede, pois o churrasco que tinha comido estava bastante picante, o piri-piri da Guiné não era para brincadeiras.

Com o tempo a passar e antes que se fizesse noite, dei uma volta pela tabanca, pois tinha uma mezinha para levar à lavadeira que tinha o seu filho doente e, como me tinha arranjado bom marisco (camarão e ostras), eu senti-me na obrigação de a ajudar, só isso.


Foto 3> Teixeira Pinto> Avenida


Estava gostando do dia que estava a passar, até porque conversei bastante com os civis e colhi assim ideias diferentes das que imaginava daquele povo.
Entretanto encontrei camaradas que também passeavam pela avenida e devido ao calor que fazia, retardamos a ida para o Quartel e fomos todos beber mais umas bazucas.

Eram já 21h30 quando decidi ir embora, porque às 22h00 tinha que dar medicação a alguns dos internados.

Assim, quando entrei na avenida que me levava ao Quartel e já depois de ter passado o Fortim, no Centro de Teixeira Pinto, surge um grande tiroteio que me fez correr de árvore em árvore em direcção ao aquartelamento, eram já 21h45.

Um pequeno grupo IN, armado de LGF e armas automáticas ligeiras, assaltou e saqueou uma casa comercial, a mesma onde eu tinha estado, a Caravela da Saudade, causando 3 mortos e 4 feridos na população.
As NT que guarneciam o Fortim na Rotunda, reagiram à acção do IN, que ripostou, causando um ferido ligeiro à nossa tropa, que eu próprio viria a socorrer já na Enfermaria.

Era o Dia da Mãe e a minha segunda saída do Quartel em passeio, mas outra vez marcada, desta feita com este caso. Tive sorte pois o IN andou por onde eu tinha já andado ou até estaria junto de mim, quando bebi aquelas cervejas durante a tarde.

Foi caso para eu dizer : - Obrigado Mãe por me teres ajudado.

Albino Silva >

Fotos e texto: © Albino Silva (2007). Direitos reservados.

________________

Nota do co-editor Carl.os Vinhal:

(1) Vd. post anterior de 3 de Novembro de 2007> Guiné 63/74 - P2236: Estórias avulsas (9): Um soldado que não queria sair do quartel (Albino Silva)

sexta-feira, 9 de novembro de 2007

Guiné 63/74 - P2253: Agenda Cultural (1): Exposição fotográfica de Américo Estanqueiro, na Fundação Mário Soares (Fernando Barata)

Guiné > Rio Geba > 1970 > Soldados, G3, malas, tudo a monte, como era de uso. A viagem da CCAÇ 2700 de Bissau para o Xime, ao longo do rio Geba, pelas 6 da manhã do dia 5 de Maio de 1970. A LDG é a célebre Montante que participou na Operação Mar Verde, invasão de Conacri, a 22 de Novembro de 1970, sob o comando de Alpoim Galvão). Depois seguir-se-ia a viagem, por terra, em camiões, militares e civis, rumo a Dulombi.

Esta foto é um bom aperitivo para a exposição de 12 Novembro. Está de parabéns o Américo Estanqueiro.

Legenda do Fernando Barata.


1. Mensagem de Fernando Barata (ex-Alf Mil da CCAÇ 2700, Dulombi, 1970/72) a alertar-nos para o acontecimento.

Caríssimos Luís, Vinhal e Briote:

Imaginam o que me vai na alma. No próximo dia 12 de Novembro, pelas 18h30, é inaugurada na Sala de Exposições da Fundação Mário Soares , à Rua de S. Bento, 170, em Lisboa, uma exposição fotográfica sob o título Memórias da Guerra Colonial: CCAÇ 2700, da autoria de Américo Estanqueiro (ex-furriel da nossa Companhia).

Atendendo à proximidade da data pedia-vos a divulgação do evento o mais rápido possível. A ti, Luís, bem como ao Briote, como estão em Lisboa, "exijo" a vossa presença.

Aquele abraço do
Fernando Barata.


2. Comentário adicional do F.B.:

Só agora nos foi comunicado que a Exposição decorrerá até 31 de Dezembro de 2007. Por favor adiciona este elemento à divulgação (fornecido pelo Dr. Caldeira, marido da Diana Andringa).

As fotos incidem fundamentalmente sobre a ambiência dulombiana e em particular retratam momentos e homens da CCAÇ 2700 (1).



A Exposição é do Américo Estanqueiro, ex-furriel da nossa Companhia, pertencente ao 4.º Pelotão

(1). Era de tal maneira amante da fotografia que comprou um gerador a expensas suas para poder revelar os negativos. Só a meio da comissão nós fomos bafejados com um gerador que trabalhava entre as 7 da noite e as 5 da manhã.

Como deves imaginar, os que viviam no abrigo dele eram uns senhores. Por não termos energia eléctrica, recordo-me que os frigoríficos trabalhavam a petróleo o que cientificamente era para mim um mistério.

Obrigado pela vosso envolvimento na divulgação do evento.
F. Barata


3. Do catálogo da exposição:

Ao evocar aqui a memória da guerra colonial – a memória concreta que esta exposição apresenta – estamos a “revisitar” esses tempos e, segundo espero, a retirar as lições de tais acontecimentos e dos sofrimentos que a guerra provocou em todos nós. Mas também a olhar para o futuro de amizade e cooperação que hoje nos aproxima tanto desses povos irmãos, agora independentes. Daí, também, os esforços que a Fundação Mário Soares tem desenvolvido na preservação e divulgação da Memória histórica de Portugal e dos países da CPLP, com a certeza de que o que nos une é um instrumento essencial do progresso dos nossos países.


4. Comentário co-editor vb:

Lá nos encontraremos, Caro Fernando.

A CCAÇ 2700 está de parabéns. Pela sensibilidade do Américo Estanqueiro em caçar os estados de alma dos nossos soldados e pela tua habilidade e memória em as ilustrar.
__________

Nota de vb:

(1) Vd. posts de:

22 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1541: História da CCAÇ 2700 (Dulombi, 1970/72) (Fernando Barata) (1): Introdução: a 'nossa Guiné'

26 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1550: História da CCAÇ 2700 (Dulombi, 1970/72) (Fernando Barata) (2): A nossa gente

15 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1595: História da CCAÇ 2700 (Dulombi, 1970/72) (Fernando Barata) (3): minas, tornados, emboscadas, flagelações e acção... psicossocial

11 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1651: História da CCAÇ 2700 (Dulombi, 1970/72) (Fernando Barata) (4): Historietas

30 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1796: História da CCAÇ 2700 (Dulombi, 1970/72) (Fernando Barata) (5): A(s) alegria(s) do(s) reencontro(s)

Guiné 63/74 - P2252: Antropologia (1): A guerrilha invisível ou o Poder da Invisibilidade (Virgínio Briote / Wilson Trajano Filho)

1. Texto de Virgínio Briote, co-editor:


- Corta as pontas das balas com o esmeril ou com um alicate e vais ver se os turras não caem como tordos…
- Mas eu acertei-lhe, o gajo até se dobrou! E não caiu!

Quem de nós não ouviu conversas destas, contadas por gente tão diferente, ao longo de anos e anos até se perfazerem 12 de guerra?

Tal como entre nós, histórias simples passaram a ser contadas e arredondadas pelos que se seguiram, sempre e sempre acrescentadas em mais um e mais um ponto, até se tornarem autênticas lendas, e de que alguns dos nossos foram protagonistas, também os nossos Inimigos de então as cultivavam, e tal como as nossas façanhas passaram a lendas com sabor africano.

Quem não se lembra da anedota do Vexa e Sexa, aquela do Informo Vexa que sigo na mecha. Quando a ouvi pela primeira vez, aí por meados de 65, no Bento (aonde havia de ser...), essa história ter-se-à passado com um então Cap Rosas da CCAÇ 762 (que me perdoem o Cmdt da CCaç 762 e o Cap Rosas se o caso não se lhes aplica), um episódio, aliás, com mais uns acrescentos que, sendo hilariantes, para o caso nada acrescentam.

E tantas vezes deve ter sido contada que passou a lenda. Uns anos depois, à mesa de um café, ouvi-a da boca de um capitão miliciano (daqueles que já eram uns senhores, que a tropa, à falta de quadros profissionais, arrebanhava à má-fila), em que o dito capitão se vangloriava de ser o autor dessa mensagem.

(…) ouvi muitas vezes estórias que versavam sobre os poderes especiais que tinham certos líderes nacionalistas e combatentes na luta pela libertação nacional. Dentre esses poderes, o que mais chamou a minha atenção foi a capacidade que os heróis da pátria tinham de ficar invisíveis em situações de contato armado com as forças portuguesas. (…)

2. Wilson Trajano Filho, antropólogo brasileiro, fala da Guiné, dos tempos que lá passou entre 1987/88 e em 1992. Publicou em 1994, na Série Antropologia, um trabalho sobre O poder da invisibilidade.

O autor fala das estórias que se ouviam sobre a capacidade de certos guerrilheiros ficarem invisíveis aos olhos das nossas tropas. De lendas que corriam entre a sociedade crioula durante a luta pela independência e que perduraram até hoje.

(…) No entanto, passados vinte anos da independência do país, essas histórias continuam a circular em Bissau e em outras cidades da Guiné, indicando que elas permanecem portadoras de significação para aqueles que as contam e as ouvem. (…)

É uma obra sobre um assunto, algo enigmático, tal como a Guiné o foi para muitos de nós, jovens de vinte e poucos. Permanecemos cerca de dois anos num território, muitas vezes sem nos apercebermos de que as gentes com quem convivíamos tinham usos e costumes, acumulados em séculos de migrações, com culturas que nós, europeus, de tão estranhas, não queríamos saber nem tão pouco dar conta.

O Autor justifica o porquê do seu interesse pelo assunto da invisibilidade, cultivado pelas gentes africanas:

(…) A motivação para este trabalho surgiu a partir de uma conversa informal que teve lugar na madrugada de 31 de Maio de 1988. Eu estava hospedado em uma grande casa construída no centro de Bissau, ainda na época colonial. O proprietário da residência me instalara em um barracão no fundo do terreno, de modo que pudesse organizar minhas actividades sem atrapalhar a rotina da casa.

Mamadi trabalhava para meu anfitrião como vigia nocturno. Como me via quase sempre de luz acesa, trabalhando até tarde, ele gostava de chegar à minha janela para uma pequena conversa e um cigarro. Ele tinha então 25 anos e havia nascido no interior, em uma tabanca perto de Bafatá. Veio para Bissau em 1969 acompanhando a mãe e seus irmãos, um pouco depois da morte do pai durante um bombardeio pela aviação portuguesa de uma tabanca onde estava de visita.

Naquele dia, conversamos sobre o tempo da guerra de libertação e sobre a morte de seu pai. (…)

Segundo ele, no tempo da guerra alguns comandantes da guerrilha se destacaram por terem habilidades especiais. Em situação de contato armado com as forças portuguesas, essas pessoas tornavam-se praticamente imortais.
As balas do inimigo disparadas contra eles não os alcançavam ou não perfuravam seus corpos. Outras vezes, as armas dos tugas simplesmente não disparavam.

Mas o maior de todos os poderes era a capacidade que esses guerrilheiros pela libertação da pátria tinham de ficar invisíveis. Mamadi nunca me deu muitos detalhes sobre a origem dessas habilidades. De modo vago, falou de alguns casos em que elas eram obtidas através da realização de cerimónias para os Iran (espíritos) de algumas etnias ou de algumas localidades.

Porém foi muito específico sobre as situações em que eram utilizados e sobre quem os utilizava. Os poderes místicos eram postos em acção em situações de combate contra os portugueses, no mato e, em geral, quando os nacionalistas estavam em franca inferioridade em armas e homens.(…)

Trajano Filho, em nota de rodapé na página 3, conta a história que um santomense lhe contou em 1991, a propósito do mesmo tema, passada com Amílcar Cabral em Cabo Verde.

(…) Segundo a história, o governador militar daquelas ilhas resolveu dar um baile. Na presença das autoridades militares portuguesas, em pleno salão de dança, surgiu de repente Cabral. Convidou a esposa do governador para dançar em meio à surpresa geral. Quando este se refez da surpresa, gritou pelos soldados, mas antes que estes chegassem Cabral desapareceu como havia aparecido. (…)
Foi muito falada até passar a lenda a história de Agostinho Sá, comandante do PAIGC, passada no Como (Komo).

(…) Após perder dois homens em uma escaramuça com as tropas portuguesas, o comandante Agostinho Sá organizou uma pequena coluna formada pelos melhores combatentes de seu grupo e tomou o rumo do acampamento português na ilha, que ficava instalado em uma clareira entre a praia e a floresta.

A coluna parou no limiar da mata, a cerca de quarenta metros do armazém onde estavam instalados os portugueses. Ali, o comandante planejou o ataque. De modo a poupar as vidas de seus companheiros, pois já haviam sofrido baixas na escaramuça anterior, ele decidiu agir sozinho.

Se houvesse mortes, que fosse somente a sua. Portanto, ordenou a seus homens que só disparassem depois de ouvirem algum barulho vindo do armazém. Então, de metralhadora presa às costas e com uma granada quase pronta para explodir em cada mão, Agostinho Sá se dirigiu para o armazém. O que se seguiu é narrado por Azevedo e Rodrigues (1) :
“De repente, para o espanto de todos, Agostinho se torna invisível. É verdade, todos juram. Caminha vagarosamente entre os soldados que estão deitados sobre o arroz…Os companheiros de Agostinho se amedrontam, os tugas olham várias vezes para onde ele está. E não reagem. Não esboçam nenhum movimento, não fazem uma única pergunta.
(…)

O certo é que Agostinho atravessa o pátio entre os soldados. Invisível para eles. Segue sem pressa, passos de cansaço tuga depois de horas de violência. Rosto sério, granadas apertadas nas mãos suadas. Decide: se for descoberto basta um gesto mínimo. E elas explodem.

Entra pela porta dos fundos. Dá passos indecisos na obscuridade repentina, os olhos adaptam-se ligeiros. Está numa peça transformada em alojamento pelos portugueses. Não precisa olhar para saber que há muitos deles…Alguns observam desinteressados, sem nenhuma reacção… (…)

Agostinho caminha até à porta que liga o alojamento improvisado ao bar do armazém. Se esticar o braço pode quase tocar nos tugas meio bêbados em redor do balcão, pesados de tanto álcool…

Em pé, na porta entre as duas peças. Morde o pino de segurança da primeira granada. Simultaneamente, num movimento enérgico de dedos, arranca o pino da que leva na mão direita. Atira as duas ao mesmo tempo. Elas rolam pelo chão do armazém, uma no bar, outra no alojamento.

O guerrilheiro vê – olhos assustados que cruzam com os seus, dando-se conta, confusamente, de que ocorre algo estranho. Alguma coisa que não estava prevista nos manuais militares nem nos planos traçados no quartel-general de Bissau. (…)

Não se lembra exactamente o que aconteceu. Se correu, se voou. Sabe que caiu entre os soldados que dormiam na rua. Os companheiros viram, as granadas explodiram dois segundos depois…” (1977: 100-101)

E continua, Wilson Trajano:

Ele correu em direção ao mato enquanto seus companheiros atiravam e arremessavam granadas contra os soldados que estavam do lado de fora do armazém.

Desesperados, os portugueses que ainda não haviam sido feridos fugiram em debandada rumo à praia, muitos deles caindo sob o pesado fogo guerrilheiro. A coluna só cessou fogo quando o ruído das turbinas dos jatos portugueses começou a se fazer ouvir mais forte do que o matraquear das armas automáticas.

Do lado português houve mais de dez mortos e sessenta feridos. Uma parede do armazém ruiu com a explosão; o telhado foi despedaçado e jogado ao longe. Muitos animais mortos. Do lado dos nacionalistas, nem uma perda, nem um ferido.

É com o espírito de desvendar o mistério do misteryu, de compreender o sentido mais radical das estórias de Mamadi e da narrativa de Azevedo e Rodrigues e de alcançar o significado da invisibilidade que passo à análise (2).
(...)
__________

Nota de vb:

(1) AZEVEDO, L. e RODRIGUES, M.P..1977 – Diário da Libertação (A Guiné-Bissau da Nova África). S. Paulo: Versus

Guiné 63/74 - P2251: Operação Macaréu à Vista - Parte II (Beja Santos) (8): Cartas que levam saudade(s) das terras e das gentes do Cuor


Guiné > Zona leste > Sector L1 > Regulado do Cuor > Missirá > Março de 1970 > Era pós-Beja Santos > Esquartejamento de uma peça de caça grossa (um antílope, segundo me parece) caçado na zona de acção do Pel Caç Nat 54 (que em Novembro de 1969 tinha vindo render o Pel Caç Nat 52, comandado pelo Alf Mil Beja Santos, e tranferido para Bambadinca). Na foto vê-se o comandante do Pel CaÇ Nat 54, o Alf Mil Alves Correia, referido no texto a seguir. Meses mais tarde, o Pel Caç Nat 54 será substituído pelo Pel Caç Nat 63, do Alf Mil Cabral. (LG).

Guiné > Zona leste > Sector L1 (Bambadinca)> Regulado do Cuor > Missirá > Março de 1970> Era pós-Beja Santos > O Humberto Reis, em reforço, com o 2º Gr Comb da CCAÇ 12 (Bambadinca), do destacamento de Missirá, posa para a fotografia com um troféu de caça a seus pés: na ocasião um antílope, apanhado pelos homens do Pel Caç Nat 54 ou algum caçador local. O destacamento de Missirá ficava a norte do Sector L1, já em terras de ninguém. A sul ficava o destacamento de mílicia e a tabanca em autodefesa de Finete, na margem direita do Rio Geba, frente a Bambadinca... No texto a seguir - parte das memórias de Beja Santos nas terras dos Soncó -, o autor começa a despedir-se (e a fazer o luto pela perda) destas míticas paragens e das suas gentes que o marcaram indelevelmente para toda a vida... Pode, em boa verdade, falar-se, a partir de meados de Outubro de 1969, de uma era pós-Beja Santos... (LG).

Fotos: © Humberto Reis (2006). Direitos reservados.


Texto enviado em 19 de Setembro último pelo Beja Santos (ex-alf mil, comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70).


Luis, espero que estejas de boa saúde e a mergulhar no ano lectivo. Para a semana tenho que entregar o livro "Consumo, logo existo" e não sei como vai ser. Ainda por cima, para a semana vou escrever sobre a emboscada e a mina anti-carro em Canturé. Recomeço as aulas no mestrado de Tecnologia e Segurança Alimentar, no Monte da Caparica. Tenho saudades de almoçar contigo e vou desafiar-te. Os livros seguem pelo correio, como habitualmente. Faz os milagres do costume, escolhendo boas ilustrações. Um abraço do Mário.


Operação Macaréu à Vista - Parte II (8) > Memorabilia do Cuor
por Beja Santos


Cartas de um militar de além-mar em África para superiores ali perto e para a namorada em Portugal


(i) Carta para Jovelino Corte Real, comandante do BCAÇ 2852

Meu comandante,

Avizinhando-se a saída do Pel Caç Nat 52 de Missirá para Bambadinca, considero importante deixar-lhe uma “memória” sobre a situação do Cuor, no sentido de o manter habilitado para as decisões que entender dever tomar com o meu sucessor.

Primeiro, a influência do inimigo não decresceu nos últimos quinze meses: os abastecimentos junto dos Nhabijões, Mero e Santa Helena processam-se com regularidade, são vitais para Madina/Belel, a despeito das emboscadas e patrulhamentos que no passado impuseram respeito, não vejo declínio, a astúcia e a necessidade sobrepõem-se ao temor que possar ter de nós.

Percorremos todo o território do regulado, com excepção da área vizinha entre Quebá Jilâ e Madina e podemos confirmar que a norte, acima do rio Passa em confluência com o rio Gambiel, as tropas do PAIGC movem-se à vontade e controlam as populações que lavram as bolanhas. Não exagero dizendo que o inimigo lavra e colhe as suas produções a menos de sete quilómetros em linha recta de Missirá.

É facto que o inimigo nunca emboscou as nossas tropas, não roubou populações que cultivam a bolanha de Finete e reduziu a sua capacidade em flagelar seriamente Missirá. Não embosca pela simples razão que dispõe de informações quanto à forma como nos movemos diariamente até Mato de Cão: nunca percorremos o mesmo itinerário, de dia ou de noite. Dispõe igualmente de informações que mantivemos uma presença efectiva nos patrulhamentos. Podem atacar Missirá ou Finete mas dispomos, por enquanto, de uma boa capacidade de resposta. Estou em crer que em Julho se aperceberam que é preciso trazer muito material e um grande contingente para fazer estragos ou desmoralizar.

Segundo, continuo a considerar que a fixação de populações não se deve circunscrever a Missirá e Finete. Peço-lhe que repense em repovoar Canturé, há populações em Badora e no Cossé prontas a regressar desde que se faça um quartel, haja milícias e armamento. Canturé repovoada garantiria o afastamento das gentes de Madina de Mero e Santa Helena, dificultaria a circulação das colunas de abastecimentos à volta do Geba. O comandante de Bafatá não contestou os meus argumentos, só que foi seu entendimento que os Nhabijões eram a prioridade das prioridades.

Terceiro, perdemos a capacidade ofensiva a partir do momento em que nos retiraram duas secções da milícia de Missirá, mantendo-se a obrigação do patrulhamento diário a Mato de Cão e a emboscada junto do nosso aquartelamento. Não posso envolver a população civil no abastecimento de águas, nem nos reforços nem nas colunas a Finete. Resultado, estamos atados de pés e mãos, não se pode patrulhar e deixar o quartel entregue aos militares doentes e aos civis. Continuo a defender que Missirá precisa de um pelotão de milícias, um pelotão de caçadores nativos e uma ajuda persistente de Bambadinca seja nos patrulhamentos ofensivos seja nas idas a Mato de Cão.

Quarto, o aquartelamento de Missirá possui presentemente um bom dispositivo defensivo, faltam dois abrigos sólidos, os outros são resistentes, só precisam de manutenção. No essencial está tudo desmatado à volta, o arame farpado foi renovado e está sólido. A escola funciona, as idas periódicas ao médico alteraram muito o quadro de doenças que conheci quando aqui cheguei. O relacionamento com o régulo é excelente, não há quaisquer perturbações de maior na convivência entre militares e civis. No entanto, conviria melhorar as condições de vida das populações, sou adepto de se encontrar uma verba para pagar as obras de arranjo e desmatação feitas por civis, sobretudo na região de Gã Gémeos até Canturé e na estrada do Geba, entre Gambana e Mato Madeira. Trata-se de segurança militar e, claro está, segurança para os civis.

Estou inteiramente à sua disposição, como me compete, para o informar de tudo o que julgar importante para melhorar a sua informação sobre o Cuor. Os meus cumprimentos.

Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > 1970 > Vista aérea do aquartelamento (e de parte da povoação, à esquerda), tirada no sentido noroeste-sudeste. Em primeiro plano, a pista de aviação, o perímetro em L de arame farpado, o campo de futebol, a antena das transmissões...Ao fundo, do lado direito, frente à grande bolanha de Bambadinca, o edifício do comando em U...

Foto: © Humberto Reis (2006). Direitos reservados


(ii) Carta para o Major Ângelo da Cunha Ribeiro, 2º comandante do BCAÇ 2852 (2)

Meu comandante,

Deve ser do seu conhecimento qual a situação logística que vou legar ao [meu substituto, o Alf Mil, ] Alves Correia. Noutra carta, com data de hoje, informei o nosso comandante dos aspectos militares que não devem ser silenciados. Entregarei ao meu sucessor os diferentes livros com o material à carga, as folhas de pagamentos dos militares de Missirá e Finete, bem como as duas secções destacadas em Cansamange.

Todas as requisições de material de engenharia estão em ordem. As duas viaturas carecem de substituição, estão envelhecidas, permanentemente empanadas, vivemos um calvário nesta época das chuvas. O gerador eléctrico continua aí em Bambadinca, só poderá aqui chegar por duas vias: ser transportado para o Xime e levado numa LDM ou LDG até perto de Mato de Cão ou entre Saliquinhé e São Belchior, tenho pedido insistentemente, nunca obtive resposta; ou fabrica-se uma jangada robusta que o consiga colocar na bolanha de Finete, mas até hoje não conseguimos.

Os abastecimentos em munições estão hoje facilitados com os dois novos paióis, o mesmo se passa com os paióis de combustíveis. O mais grave de tudo tem sido o abastecimento de arroz para os civis o que nos obriga a colunas infindáveis. Não proponho nenhuma solução, pois os civis não têm dinheiro e nós não podemos oferecer arroz em permanência.

O serviço de justiça está actualizado, saímos daqui com todas as diligências obrigatórias efectuadas até ao momento. Não lhe quero esconder que há graves problemas em Finete para resolver: Bacari Soncó devia ser nomeado comandante e escolhidos três sargentos; o armamento é deficiente e continuo a pensar que o inimigo não tem sido mais demolidor porque a população balanta local é enorme e não lhes convém acirrar os ânimos quando precisam de cambar o rio um pouco acima do quartel e até Boa Esperança. Importaria resolver o problema do professor de Finete, oferecer um balneário à população civil e remodelar o conjunto de bidões do chuveiro dos milícias.

Agradeço-lhe muito toda a compreensão que tem tido com os nossos problemas e jamais esquecerei a expressão de Tigre de Missirá que usa comigo. Receba o meu reconhecimento.

(iii) Carta para David Payne Pereira, médico do batalhão

Meu caríssimo David,

Mil anos que vivesse e não esqueceria a profunda dívida que tenho para contigo, tanto pelo bem com que me tratas, como pelo conforto que tens trazido às gentes do Cuor. Não há memória de um médico de batalhão visitar com tanta assiduidade os quartéis do mato, dar consultas seis dias por semana e ver dezenas de doentes todos os dias.

Em breve vou viver aí ao pé de ti mas quero deixar escrito um comovido muito obrigado. Deus te pague o que tens feito pela saúde desta minha gente. Aqui fica a minha admiração e o meu reconhecimento.

(iv) Carta para Herberto Sampaio, oficial de operações

Meu major,

Permita-me que junte algumas considerações sobre a evolução do nosso trabalho no regulado do Cuor. São tudo coisas que conhece perfeitamente, mas prefiro deixar tudo escrito, como se fosse um balanço de todas as minhas preocupações à volta dos pontos mais sensíveis com que o Alves Correia se irá dentro em pouco confrontar.

Antes de mais, independentemente dos militares doentes, é já milagre irmos todos os dias a Mato de Cão e fazermos a emboscada nocturna. Chegamos a sair de Missirá com onze militares válidos e quinze a vinte civis armados para nos reforçarmos em Finete e então seguirmos para Mato de Cão. O Pel Caç Nat 54 terá a sua vida muito dificultada se não se encontrar uma solução de trazer mais milícias para Missirá.

Diz o povo “rei morto, rei posto” e bem gostaria que o meu sucessor tivesse outros meios que eu aqui não encontrei, sobretudo nos últimos meses. Bom seria igualmente que se encontrasse uma solução para as idas a Mato de Cão. Quando aqui cheguei, em Agosto do ano passado, era frequente irmos em média quatro a cinco vezes por semana a Mato de Cão, o que dava possibilidade de conjugar patrulhamentos, vigilâncias e emboscadas. Agora, como desde há largos meses, vamos lá praticamente todos os dias. Quando o quartel ardeu em Março deste ano centrámos toda a energia no seu reaparecimento e nas obrigações da segurança de Mato de Cão. Fomos perdendo gente em Missirá e o meu major criou a obrigação de uma emboscada nocturna perto de Missirá. Nasceu um problema novo: deixámos o mato todo entregue às gentes de Madina.

Peço-vos que revejam esta situação, as próprias populações civis estão inquietas com a presença assídua do inimigo perto de nós, flagelando-nos, sabendo-nos impotentes. É por isso que eu gostaria que o Alves Correia pudesse dispor de outros meios e até vir a poder contar comigo em patrulhamentos nesta região. É este o meu veemente pedido, que submeto à sua consideração.


(v) Para a Cristina Allen

Meu adorado amor,

Desculpa o meu silêncio, é tudo cansaço, a azáfama dos preparativos da partida, conferências de material de tudo o que possas imaginar, desde fronhas e lençóis, passando por pratos e panelas até metralhadoras e víveres armazenados. O meu estado de saúde também está abalado, ainda não me recompus psicologicamente do colapso nervoso do Casanova. O Pires ajuda-me imenso, tem-se revelado um colaborador surpreendente, enquanto um vai a Mato de Cão o outro põe a escrita em dia.

Ainda não se sabe quando terá lugar a nossa transferência para Bambadinca, mas será em breve. Tu perguntas-me na última carta o que vou fazer em Bambadinca e se lá vou ficar até ao fim da comissão. Segundo o comando, vou ficar na intervenção, expressão que quer dizer que posso ir buscar correio, montar seguranças à volta do quartel, emboscar, entrar em operações, fazer colunas, colaborar nos reordenamentos, tudo é possível. Já me disseram que vou para a ponte do rio Udunduma, é uma posição defensiva perto de Bambadinca, uma ponte com uns abrigos horríveis, um sítio sem o mínimo de condições para estar, um quartel que pode ser pulverizado se for bem flagelado.

Mas nada sei sobre o futuro. Não te zangues com o que te vou dizer: sinto imensa tristeza por partir de Missirá. Aqui ainda éramos de algum modo senhores da situação, havia uma relação a construir com as populações, vivíamos juntos, partilhávamos tudo juntos, a começar pelas inquietações e as ameaças constantes.

Em Bambadinca, viverei num quartel a cumprir escalas de serviço. Não sei explicar-te, foi em Missirá que a minha vida mudou, fascina-me toda esta beleza, os permanentes desafios para melhorar o bem estar de militares e civis. Compreendo os soldados, eles têm trinta e seis meses de Missirá, Bambadinca é a miragem do descanso. É escusado dizer-lhes que vão ainda trabalhar mais, depois será tarde, é assim que se aprende.

Amanhã, 15 de Outubro [de 1969], vou a Bafatá de novo tratar dos documentos de que te falei. Se os entregarem amanhã, seguirão logo pelo correio. Não para de aqui chegar correio cheio de fúrias, acusações e até insinuações. Não tenho energia para responder, sinto que perdi capacidade para ter os reflexos prontos, prefiro não responder a ninguém. Estou magoado, concentro-me na música e nos livros.

Li uma comédia assombrosa, “O Ente Querido”, por Evelyn Waugh. Tradução perfeita do Jorge Sena e ilustrações do João Abel Manta, que tu conheces do Diário de Lisboa. É uma sátira violenta no mundo anglo-americano de Hollywood, em que os não competitivos se suicidam ou são atirados para a valeta. O herói, Dennis Barlow, é um poeta que ganha a vida a incinerar animais, ao lado de embalsamadores de seres humanos. No Repouso dos Peregrinos e nos Prados Sussurrantes o que conta é o artifício e a tecnologia: maquilhagem, música ambiente, o automatismo das condolências. Dennis apaixona-se por Aimée, envia-lhe poemas clássicos como se fossem da sua autoria. O Sr. Joyboy, um perito em caracterização funerária, parece ser mais bem sucedido no coração de Aimée. Tudo acaba numa tragédia em tom chocarreiro, em que nos divertimos com o terror da morte. Porque aqui os mortos estão sempre mascarados de vivos, aqui quem ganha sempre é a tecnologia, que resolve todos os problemas da perda da eternidade.

Mas li mais, li os “Poemas Completos” do Manuel da Fonseca [, 1911-1993], um presente do meu padrinho. Gosto muito da prosa dele, o modo sério com que ele ultrapassa as soluções piegas do neo-realismo, e nos faz vibrar com as terras do Alentejo, as charnecas, as navalhas dos malteses, a vida tristonha dos funcionários camarários. Um dos poemas eu já o conhecia de o ter ouvido declamado pela Maria Barroso, com a sua vigorosa expressão dramática, “Estradas”. Começa assim:

Não era noite nem dia.
Eram campos, campos, campos
abertos num sonho quieto.
Eram cabeços redondos
de estevas adormecidas.
E barrancos entre encostas
cheias de azul e silêncio.
Silêncio que se derrama
pela terra escalavrada
e chega no horizonte
suando nuvens de sangue.
Era a hora do poente.
Quase noite e quase dia.

Não achas isto uma perfeição, com este toque de simplicidade? Este livro e o de Evelyn Waugh vão para ti, deixo-os amanhã no correio de Bafatá.

Não esqueço o nosso futuro, os nossos projectos, não te esqueças do que representas para mim, a força que me dás para eu resistir a este turbilhão. Prometo agora escrever mais, parece que estou a sair do desânimo, sinto-me a renascer. Beijos, mil beijos, para quem acaba de fazer exames e nutre por mim a maior ternura do mundo.

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Notas de L.G.:

(1) Vd. post de 26 de Outubro de 2007 > Guiné 63/74 - P2218: Operação Macaréu à Vista - Parte II (Beja Santos) (7): Afundem a armada de Madina

(2) Carinhosamente conhecido, na caserna, como o Major Eléctrico