terça-feira, 13 de maio de 2008

Guiné 63/74 - P2840: Efemérides (7): Morrer em Guidaje...Mama Sumé, camarada Comando José Raimundo (Amílcar Mendes, 38ª CCmds)



Guiné > Região do Cacheu > Gr Comb da 38ª Companhia de Comandos > Dia de Natal: 25 de Dezembro de 1972. Subindo o Rio Caboiana, afluente do Cacheu, em LDM... O soldado comando Raimundo está assinalado com um círculo, a verde. Foto: © Amilcar Mendes (2006). Direitos reservados.

1. Mensagem do Amílcar Mendes, recebida hoje:

Assunto - Um trágico aniversário

Amigo Luís Graça, se me for possível gostaria aqui de recordar que passam hoje, dia 13 de Maio (que coincidência!) 35 anos sobre os trágicos acontecimentos de Guidaje e prestar aqui uma sentida homenagem a todos quanto combateram e cairam em Guidaje, mas em especial relembrar o meu camarada Coamndo José Luís Inácio Raimundo que morreu neste dia num ataque, nas valas de Guidaje (1).

Amigo Zé, apenas para te dizer: Até quando Deus queira! Mama Sumé!

Amílcar Mendes, 38ª CCmds

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Nota dos editores:

(1) Vd. poste de 30 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1223: Soldado Comando Raimundo, natural da Chamusca, morto em Guidaje: Presente! (A. Mendes, 38ª CCmds)

Vd. ainda:

22 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1199: A vida de um comando (A. Mendes, 38ª CCmds) (1): Sete anos de serviço

22 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1200: A vida de um comando (A. Mendes, 38ª CCmds) (2): Um dia de Natal na mata de Caboiana-Churo )

22 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1201: A vida de um comando (A. Mendes, 38ª CCmds) (3): De Farim a Guidaje: a picada do inferno (I parte)

23 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1203: A vida de um comando (A. Mendes, 38ª CCmds) (4): De Farim a Guidaje: a picada do inferno (II Parte)

23 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1205: A vida de um comando (A. Mendes, 38ª CCmds) (5): uma noite, nas valas de Guidaje

24 de Outubro de 006 > Guiné 63/74 - P1210: A vida de um comando (A. Mendes, 38ª CCmds) (6): Guidaje ? Nunca mais!...

Guiné 73/74 - P2839: Ainda os Comandos fuzilados a seguir à independência (I): O Justo Nascimento e os outros (Carlos B. Silva / Virgínio Briote)



Foto das ossadas de militares fuzilados na Guiné. Com a devida vénia ao autor, não identificado.

1. Mensagem de Carlos Silva, de 10 de Maio

Questão de justiça

Sobre o ex-Tenente Comando: JUSTO ORLANDO LOPES DOS REIS NASCIMENTO:

Venho por este meio lembrar (que) muito lamentavelmente o seu nome não consta na lista dos ex-Comandos Africanos, oficiais, que deram a sua vida pela pátria portuguesa desde a juventude. Igual a tantos outros, foi ferido em Tite, ao lado do então falecido, João Bacar Djaló e foi ao funeral do mesmo, engessado.

Foi Comandante da CCS do Batalhão dos Comandos Africanos, depois de suspender as actividades operacionais. Era muito conhecido para que o seu nome não conste na lista dos oficiais Comandos Africanos, no site, juntamente com os seus camaradas de Armas e que juntos combateram do mesmo lado.

Daí que, julgo, só fica bem e a bem da verdade fazer esta justiça e correcção em acrescentar o seu nome, como aos de Adriano Sisseco, Jamanca, António J.Gomes, Vieira e tantos outros.

Mais informo que ele também participou na célebre Operação Mar Verde, isto diz tudo.

Pela verdade e justiça e por sua alma e pelos filhos.

Obrigado pela atenção

Carlos B. da Silva
ex-Fur Mil CCAÇ 18,
Quebo 73
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2. Caro camarada Carlos B. da Silva,

Sobre os Comandos fuzilados na Guiné podes consultar os artigos relacionados, no nosso blogue (*).

Aproveitamos para juntar a relação dos nomes que constam da lista elaborada pelo Cor Manuel Amaro Bernardo (em Guerra, Paz e Fuzilamentos dos Guerreiros), a quem agradecemos todo o trabalho de recolha de informação sobre este caso que ainda nos dói.

vb
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Relação dos Comandos do BCA, fuzilados na Guiné (Provisória)

Nome, Posto, Companhia, Local, Data




Luís Assaul, Sold 2ª CC, (?), 1986



Fodé Baio, 1º Srg 1ª CC, Mansoa, (?)



Braima Baldé, Alf 1ª CC, Bambadinca, 1975



Dabo Baldé, Fur 2ª CC, Portogole (regressado de Dakar), (?)



Malan Baldé, Alf 3ª CC, Cumeré, (?)



Samba Baldé, Fur 1ª CC, Cumeré, (?)



Silvério Samba Baldé, Fur 2ª CC, Bambadinca, (?)



Armando Carolino Barbosa, Ten 2ª CC, Bambadinca, 25 Mar 1975



Braima Bari, Fur 2ª CC, Cumeré, (?)



Mamadú Saliú Bari, Alf 2ª CC, Cumeré, 1977



Américo Lamine Camará, Fur 2ª CC, Cumeré, 1975



Braima Camará, Fur, Gr Vingadores, Bissau, 1975



Bubacar Camará, Fur 3ª CC, Cumeré, (?)



Granque Camará, Sold 3ª CC, Bissau, 1979



Mussa Camará, Fur 1ª CC, (?), 1975



Quecumba Camará, 1º Srg 2ª CC, Mansoa (fuzilamento público), (?)






Tomás Camará (foto de Julho ? de 1966, op Atraca, corredor de Canja, Ingoré), Ten 1ª CC, Cumeré, 1975

Alfa Candé, Fur 2ª CC, Mansoa, 1975



Aruna Candé, 1º Srg 2ª CC, Cuntima, (?)



Aliu Sada Candé, Alf 2ª CC, Bambadinca, (?)



António Samba Juma Djaló, Alf 1ª CC, Bambadinca, 1975


Bacar Djassi (foto de Set? 1965, Gr Diabólicos), Ten 3ª CC, Cumeré, (?)



Bailo Djau, Alf 2ª CC, Cumeré, 1986



Alfa Embaló, Fur 2ª CC/Gr Vingadores, Cumeré, 1975



Fodé Embaló, 1º Srg 1ª CC, Bambadinca, (?)



Sijali Embaló, Fur 1ª CC, Cumeré, (?)



Anastácio Moreira Ferreira, Fur BCmds, Canchungo, Set 1974



Augusto Filipe, 2º Srg 1ª CC, Cumeré, (?)



Francisco Alenquer Imbadé, Fur 3ª CC, (?), (?)



Cube Jaló, Sold 3ª CC, Bissau, 1979








Mamadú Jaló (foto de Set? 1965, Gr Diabólicos), 1º Srg 2ª CC/ Gr Vingadores, Bafatá , (?)



Mário Bubacar Jaló, Fur 3ª CC, Portogole/Farim ? (regressado de Dakar), (?)


Abdulai Queta Jamanca (na foto, em Brá, Set 1965, Gr Diabólicos), Ten 1ª CC, Bambadinca, 1975


Carlos Bubacar Jau, Alf 2ª CC, Cumeré





Justo Orlando Nascimento Lopes (na foto de Set 1965, Gr Vampiros)Ten 1ª CC, Canjambari, Set 1974)


Manga Mané, Fur 1ª CC, Zinguinchor, Dez 1975


António Mendonça, Fur 2ª CC, Portogole (regressado de Dakar) (?)


Belente Mepe, Fur (preso em 19 Nov 1974), (?), (?)


Marcelino Moreira, Alf 2ª CC, Mansoa, 1975


Marcelino Pereira, Alf 2ª CC, Cumeré, (?)


Col Quessange, 1º Srg 3ª CC, Mansoa (fuzilamento público) (?)


José Aliú Queta, 1º Srg 2ª CC, Mansoa, (?)


Tumane Queta, Sold BCmds, Cumeré, 1975 (?)


Amarante Saja, Fur 3ª CC, Cumeré, (?)


Zacarias Saiegh, Cap 1ª CC, Portogole, 18 Dez 1978


Carlos D. Facene Samá, 2º Srg 2ª CC, Portogole, (?)


Demba Cham Seca, Alf 1ª CC, Bambadinca, 25 Mar 1975


Adriano Sisseco (na foto, em Bissalanca, Dez ? 1965, Gr Vampiros), Cap 2ª CC, Portogole, 18 Dez 1978

Braima Turé, Fur Gr Vingadores, Cumeré?, 1975?


João Uloma, Alf 1ª CC, Canjambari, (?)


António Vasconcelos, Alf 3ª CC, Bafatá, Dez 1975


Cicri Marques Vieira, Ten 2ª CC, Portogole, 18 Dez 1978

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Notas de vb:

1. Texto e imagens da responsabilidade de vb.

2. Informações recolhidas do livro Guerra, Paz e Fuzilamentos dos Guerreiros, de Manuel Amaro Bernardo, Ed. Prefácio, 2007.

3. Há informações (ainda não totalmente confirmadas) de mais nomes de militares Cmds fuzilados.

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(*) Artigos relacionados em

14 de Abril de 2008 > Guiné 63/74 - P2760: Notas de leitura (8): Guerra, Paz e Fuzilamentos dos Guerreiros... ou a guerra que não estava perdida (A.Graça de Abreu)

2 de Abril de 2008 >
Guiné 63/74 - P2713: Notas de leitura (7): Guerra, Paz e Fuzilamentos dos Guerreiros: Resposta a um Combatente (M. Amaro Bernardo)

2 de Abril de 2008 >
Guiné 63/74 - P2711: Notas de leitura (6): Guerra, Paz e Fuzilamentos dos Guerreiros, de M. Amaro Bernardo (Mário Fitas)

31 de Março de 2008 >
Guiné 63/74 - P2706: Notas de leitura (5): Guerra, Paz e Fuzilamentos dos Guerreiros, de Manuel Amaro Bernardo (Mário Beja Santos)

30 de Novembro de 2007 >
Guiné 63/74 - P2318: Notas de leitura (4): Na apresentação de Guerra, Paz e Fuzilamento dos Guerreiros: Guiné 1970/80 (Virgínio Briote)

28 de Novembro de 2007 >
Guiné 63/74 - P2308: Notas de leitura (3): Guerra, Paz e Fuzilamento dos Guerreiros: Guiné, de Manuel Amaro Bernardo (Jorge Santos)

19 de Junho de 2006 >
Guiné 63/74 - P886: Terceiro e último grupo de ex-combatentes fuzilados (João Parreira)

31 de Maio de 2006 >
Guiné 63/74 - DCCCXXII: Mais ex-combatentes fuzilados a seguir à independência (João Parreira)

27 de Maio de 2006 >
Guiné 63/74 - DCCCVI: O colaboracionismo sempre teve uma paga (6) (João Parreira)

23 de Maio de 2006 >
Guiné 63/74 - DCCLXXXIV: Lista dos comandos africanos (1ª, 2ª e 3ª CCmds) executados pelo PAIGC (João Parreira)

6 de Março de 2006 >
Guiné 63/74 - DCIX: Salazar Saliú Queta, degolado pelos homens do PAIGC em Canjadude (José Martins)

Guiné 73/74 - P2838: A guerra estava militarmente perdida ? (3): Sabia-se em Lisboa o que representaria a entrada em cena dos MiG (Beja Santos)

Um exemplar do caça MiG 15, de origem soviética. Em 22 de Novembro de 1970, um dos objectivos da Op Mar Verde, era a destrição dos MiG 15 e MiG 17 estacionados no aeroporto de Conacri. Era uma ameaça real para a nossa Força Aérea e para os nossos aquartelamentos no sul da Guiné ? A siga MiG quer dizer, em russo, Gabinete de projectos aeronáuticos da URSS, que se especializou no desenho e construção de aviões de caça e de intercepção. Mikoyan e Gurevich são os apelidos dos seus dois primeiros engenheiros-chefes. O MiG 15, monolugar, com uma máxima de 1076 km/hora, tornou-se célebre durante a guerra da Coreia. O MiG 17 combateu na guerra do Vietname... O MiG 19 já era supersónico... Fonte: Wikipedia (Foto: copyleft).


1. Mensagem de Beja Santos, dirigida ao Antóno Graça de Abreu, com conhecimento aos nossos editores:

Meu prezado António Graça Abreu e prezados tertulianos:

Enviaste ao Luís Graça, enquanto eu estava de férias, uma apreciação a uma recensão que fiz a um dos livros mais tragicómicos que me foi dado a ler nos últimos anos, acerca dos fuzilamentos dos Comandos guineenses. Aí teceste considerações de elevado teor crítico ao conteúdo da minha recensão, chegando a referir que eu tinha feito declarações infelizes.

Por razões da vida profissional e que também se prendem com a conclusão do segundo volume [do meu Diário da Guiné, 1969/70], não pude responder ao azedume do teu mail. Serei breve. Por favor, estuda. Estuda o que escreveram Marcello Caetano, Spínola e Costa Gomes. Estuda os livros dos diplomatas que de 1972 a 1974 procuraram comprar armamento em Washington, Londres, Bona e Paris.

Quando um Presidente do Conselho propõe em plena sessão do Conselho Superior de Defesa Nacional, em 1973, que a maior parte do território da Guiné não é defensável, na actual conjuntura, a retirada estratégica para os territórios da península de Bissau, que guerra não está perdida?

Quando, nesse mesmo ano de 1973, o general Spínola depois dos acontecimentos relacionados com a chegada dos mísseis terra-ar e com a tentativa bem sucedida do PAIGC em atacar quartéis na Zona Norte com foguetões refere ao ministro do Ultramar que é indispensável armamento compatível sob pena de se entrar em colapso militar, qual a situação risonha de que dispunham as Forças Armadas, quando foi respondido que não havia armamento compatível?

Quando o Chefe do Estado-Maior das Forças Armadas, general Costa Gomes, que se opôs à tese drástica do abandono da maior parte dos aquartelamentos, sugere superiormente a retirada de um conjunto de quartéis das Zonas Leste e Norte, que atmosfera de vitória, com que entusiasmo era possível combater?

Tudo isto está documentado, é público, é acessível a quem quiser ir às livrarias. O que ainda falta saber são duas coisas: a primeira, tem a ver com a documentação de chancelaria entre o Governo, as embaixadas e os representantes pessoais que dirigiram missões para adquirir armamento, essa documentação só estará disponível dentro de décadas; a missão secreta, em Londres, em Janeiro de 1974, entre representantes de Marcello Caetano e uma delegação do PAIGC continua por desvendar, por ambas as partes.

As guerras não se ganham nem se perdem quando as forças em contenda têm equilíbrio no que pensam e na força de que dispõem. Qualquer história da civilização explica como um avanço tecnológico pode levar à derrota de uma das forças em presença. A armada turca era muitíssimo mais forte que a frota de Afonso de Albuquerque. Só que este tinha as bombardas e a frota inexpugnável dos turcos foi desbaratada à entrada do Mar Vermelho. O mesmo se sabia em Lisboa do que representaria a entrada em cena dos MiG, era uma questão de meses (2).

Se subsistirem dúvidas sobre os livros que aqui refiro, posso levá-los para Monte Real. Aceita os melhores cumprimentos do

Mário Beja Santos.
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Nota dos editores:

(1) Vd. poste de 30 de Abril de 2008 >
Guiné 63/74 - P2803: A guerra estava militarmente perdida ? (2): Não, não estava, nós é que estávamos fartos da guerra (António Graça de Abreu)

(2) Já em 22 de Novembro de 1970, aquando da temerária invasão de Conacri, um dos grandes objectivos era a destruição da frota de MiG 15 e MiG 17, de origem soviética, que constituíam uma potencial ameaça às NT no CTIG. O PAIGC nunca teve aeronaves, ao que parece. Mas o regime de Sékou Touré, um dos aliado da União Soviética em África, poderia decidir em quakquer altura pô-los ao serviço do PAIGC... Felizmente, para nós, que nunca o fez. Também, ao que parece, nunca teve pilotos devidamente treinados. É possível que os MiG de Conacri não passassem, na época, de um tigre de papel... No entanto, a não-destruição dos MiG terá levado o comandante Alpoím Galvão a alterar os planos e a regressar à base, de imediato, depois de conseguida a libertação dos prisioneiros portugueses, a destruição das lanchas do PAIGC e de outros objectivos menores.

Vd. Fórum Armada: Fórum Não-Oficial da Marinha de Guerra Portuguesa > Operação Mar Verd- 2ª Parte- A decisão e a preparação
(...) "Mas em Lisboa surgiram dúvidas quanto à validade da operação, nomeadamente da parte do Ministro do Ultramar, Joaquim da Silva Cunha. Ao mesmo tempo, em Bissau, Spínola e Calvão mudavam de planos quanto à operação. Alpoim Calvão propôs que já que se fazia um incursão a Conakry, se devia aproveitar a ocasião para libertar os militares portugueses feitos prisioneiros pelo PAIGC (cerca de vinte) e que eram mantidos na cidade. Spínola concordou e os planos para a operação foram sendo feitos.

"No entanto, começaram a ser equacionados outros objectivos. Se para a Marinha existiam as lanchas Komar e P6, para a Força Aérea existiam os caças MiG-15 e MiG-17 da Guiné-Conakry que, se pilotados por soviéticos devidamente treinados (como acontecia frequentemente em países aliados da URSS) poderiam tirar partido das limitações da Força Aérea Portuguesa, cujos Fiat G-91 não estavam vocacionados para o combate aéreo. Destruir os MiG da mesma forma como se destruiriam as lanchas eliminaria esta ameaça à supremacia aérea portuguesa" (...).

Vd. Fórum Armada: Fórum Não-Oficial da Marinha de Guerra Portuguesa > Operação Mar Verde > 3ª Parte - A operação
(...) "A esta mesma hora é comunicado desde as equipas em terra que, segundo os soldados feitos prisioneiros, os Mig foram enviados para o aeródromo de Labé no dia 20, devido a uma remodelação ministerial. Uma falha da intelligence.

"Este é um grave revés para a operação já que a segurança das forças será seriamente comprometida pela possível entrada em acção dos MiG. As únicas armas anti-aéreas disponíveis são os canhões Bofors de 40mm que equipam as lanchas. Num espaço aéreo limitado como é o caso, com 10 canhões até há razoáveis hipóteses de atingir os aviões, mas os navios são alvos fáceis para um ataque aéreo. Alpoim Calvão dá ainda ordem à equipa SIERRA para destruir a pista antes de retirar, mas já não têm o morteiro e as minas de fragmentação para o poder fazer. A equipa reembarca na Hidra pelas 04h15.

"Falhada a destruição dos MiG, subsistia ainda a esperança de se encontrar Sékou Touré" (...).

Guiné 63/74 - P2837: Aqueles que nem no caixão regressaram (6): O infeliz António da Purificação Marques, morto no Cantanhez (Mário Fitas)


Guiné-Bissau > Bissau > Cemitério Municipal > Talhão Militar Central > Abril de 2006 > Monumento que celebra os soldados portugueses, mortos nas diversas campanhas de pacificação da Guiné, desde a Campa do Geba (1890) à Campanha do Cuor (1907/08), passando pelas Campamhas do Oio e Bissorã (1913), onde se destacou o Capitão Diabo, Teixeira Pinto. Neste cemitério (que tem três talhões, reservados aos combatentes portugueses mortos em campanha), repousam os restos mortais do Sold António da Purificação Marques, morto no início do ano de 1966, em combate, em Darsalame, no Cantanhez. Campa nº 33.


Fotos: © Hugo Costa (2006). Direitos reservados.

1. Mensagem do Mário Fitas, com data de 6 de Maio de 2008, comentando o poste P2811 (1):

Transcrição de o meu livro Putos, Gandulos e Guerra, publicado em 2000 (2):


"XIIO - Mamadu de Férias no Hospital Militar

"Natal de 1965, Natal de guerra em descanso. Hoje é dia de tréguas. Passagem de Ano de 1965/1966. Novas tréguas, mas os nossos obuses flagelam Cabolol, Cobumba e Caboxanque, para desejo de Bom Ano. Será mais manobra de diversão do que outra coisa. Pressente-se que algo está para acontecer.


"Há uma semana que o P2V5 sobrevoa o Cantanhez e descarrega toneladas de bombas. É um festival pirotécnico extraordinário. O nosso avião lança balões iluminantes, e as antiaéreas do PAIGC, com balas tracejantes, ajudam a abrilhantar a festa. Em Cufar o pessoal assiste aos rebentamentos que, apesar da distância, estremecem os abrigos. Deve ser cada ameixa! Vamos ver os efeitos? E fomos mesmo!...Mal pensávamos nós que aquilo sobrava para a Companhia e muitos outros.

"A três de Janeiro do ano da graça de Deus de 1966, é lançada uma ofensiva sobre o Cantanhez. Dois destacamentos de Fuzileiros, uma companhia de Pára-quedistas e quatro companhias do Exército. A Companhia [, a CCAÇ 763,] como não podia deixar de ser lá estava no rol da SAFARI. Objectivo: dar combate ao inimigo na região de Darsalame e Cafal onde se encontra a base principal IN da zona Sul."

Se a memória não me falha, a CCAÇ 1423 aparece na retaguarda do grupo do PAIGC, que retinha a CCAÇ 763 a Norte da bolanha de Darsalame. Vendo-se entre dois fogos , o grupo do PAIGC fugiu ao combate. O infeliz António da Purificação Marques é atingido por uma bala perdida em pleno coração. Ao anoitecer, o Fur Mamadu é evacuado de lancha para Catió e na manhã seguinte para o HM onde é operado de urgência a duas hérnias inguinais em estrangulamento.

Era assim a guerra!... E foi assim junto à margem do Cumbijã, o fim da vida do jovem de Povolide, Viseu, onde deveria repousar eternamente. Bissau não é terra dele! Nem há rosas como as que crescem em Viseu. Que Pátria ingrata, Rapaz!

Para toda a Tabanca, o abraço de sempre do tamanho do Cumbijã,


Mário Fitas

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Notas dos editores:

(1) Vd. 5 de Maio de 2008 >
Guiné 63/74 - P2811: Lista dos militares portugueses metropolitanos mortos e enterrados em cemitérios locais (3): De 1966 a 1967 (A. Marques Lopes)

(2) Vd. poste de 5 de Maio de 2008 >
Guiné 63/74 - P2811: Lista dos militares portugueses metropolitanos mortos e enterrados em cemitérios locais (3): De 1966 a 1967 (A. Marques Lopes)

Nome: António da Purificação Marques,
Posto: 1.º Cabo
Unidade: CCaç 1423
Data da morte: 03.01.66
Local da morte: Darsalame
Causa da morte: Ferimentos em combate
Naturalidade: Povolide, Viseu
Local de sepultura: Cemitério de Bissau, Campa 33, Guiné.

segunda-feira, 12 de maio de 2008

Guiné 63/74 - P2836: Aqueles que nem no caixão regressaram (5): Alguns casos da minha unidade, a CART 1690 (Geba, 1967/68) (A. Marques Lopes)

Guiné > Zona Leste > Agrupamento de Bafatá > Subsector de Geba > CART 1690 (1967/68) > Destacamento de Cantacunda > O jovem Alf Mil A. Marques Lopes... Este destacamento da CART1690 ficava a cerca de 40 kms da sede da companhia, perto da base que o PAIGC tinha em Samba Culo (na margem sul do rio Camjambari).




Na noite de 10 e 11 de Abril de 1968, o destacamento de Catacunda foi atacado e assaltado por tropas do PAIGC, com a cumplicidade de elementos da milícia e da população locais. Desta acção - uma das mais espectaculares do PAIGC no CTIG, no decursso da guerra colonial - resultaram 11 prisioneiros e 1 morto. Os prisioneiros foram levados para Conacri. Um, pelo menos, ficou por lá, morto devido a doença, em 20.12.68: Luís dos Santos Marques, Soldado. Era natural da Serra Verde, Aguiar da Beira. Os restantes foram depois liberdados em 22 de Novembro de 1970, na sequência da Op Mar Verde.

Fotos: © A. Marques Lopes (2007). Direitos reservados.


1. Mensagem do A. Marques Lopes, ex- Alf Mil At Inf(Hoje Cor DFA, reformado), CART 1690 (Geba) / CCAÇ 3 (Barro) . Vive em Matosinhos.

A Mensagem, de 9 de Maio último, é dirigida ao Benito Neves, com conhecimento aos editores:

Caro amigo: Pode haver razões para o José Henriques Mateus (1) não aparecer:

1 - Ponho a hipótese de uma falha minha na elaboração da lista de Os que nem no caixão regressaram (2). É um livro grosso [, o da CECA, com os mortos em campanha na Guiné,] e eu andei à pesca dos que estavam nessa situação, foi um trabalho moroso e de muita atenção, algum ou alguns podem ter sido passados.

2 - No caso concreto desse camarada, pode ter sucedido que, na altura da elaboração do livro da CECA sobre os mortos na Guiné, a situação dele não estivesse ainda oficialmente determinada.

Muitos casos, aliás, estarão dependentes desta última condição. Alguns mal. E dou-te o exemplo de alguns casos da primeira companhia onde estive, a CART 1690:

- o soldado Armindo Correia Paulino foi dado como "retido pelo IN" em 19DEZ68, mas há quem diga que ele foi morto em combate, e também não apareceu entre os libertados aquando do ataque a Conakry;

- o soldado António Domingos Gomes foi dado como desaparecido em campanha em 21AGO67, mas eu vi-o morto nesse dia;

- o alferes Fernando da Costa Fernandes foi dado como desaparecido em campanha em 19DEZ67, mas há quem o tenha visto morto nesse dia;

- o soldado Agostinho Francisco Câmara também foi dado como desaparecido em campanha em 16OUT67, mas também há quem o tenha visto ser abatido.


O António Batista da Silva, o nosso camarada da Maia, a quem chamamos o morto-vivo do Quirafo (dado como morto pelas NT, em Abril de 1972, feito prisioneiro pelo PAIGC e por fim libertado já em Agosto ou Setembro de 1974)...

O Batista foi vítima, entretanto, da máquina burocrática do Exército Português, num processo digno do génio do Kafka, ao tentar recuperar a dua identidade e a sua dignidade, por que o obrigam a fazer o ónus da prova de estar vivo, de ter estado estado na Guiné do serviço da Pátria, de ter sido feito prisioneiro, de ter sido libertado e recambiado para a terra... Um pesadelo!

E há o caso do nosso conhecido "morto-vivo", o Batista, que ainda agora anda a tentar demonstrar que, afinal, está vivo...

Abraço
A. Marques Lopes
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Notas dos editores:

(1) Vd. poste de 9 de Maio de 2008 >
Guiné 63/74 - P2821: Aqueles que nem no caixão regressaram (2): O caso do José Henriques Mateus, da CCAV 1484, natural da Lourinhã (Benito Neves)

(2) Vs. poste de 5 de Maio de 2008 >
Guiné 63/74 - P2811: Lista dos militares portugueses metropolitanos mortos e enterrados em cemitérios locais (3): De 1966 a 1967 (A. Marques Lopes)

(3) Vd. o último poste sobre o nosso camarada a quem, na brincadeira, chamamaos o morto-vivo do Quirafo

domingo, 11 de maio de 2008

Guiné 63/74 - P2835: Ser solidário (10): A AOFA (Associação dos Oficiais das Forças Armadas) apoia a ADFA (A. Marques Lopes)


Primeira página do Jornal ELO - Maio de 2008 (, disponível em formato pdf)
Cortesia da ADFA (2008)

A Associação dos Deficientes das Forças Armadas (ADFA), fruto da tomada de consciência, por parte dos deficientes militares, do seu direito à dignidade, à reabilitação e à participação activa na comunidade, foi criada em 14 de Maio de 1974.
Os mais de 15 mil associados efectivos são cidadãos que se deficientaram durante a prestação do serviço militar, nomeadamente na guerra colonial que se desenrolou no período de 1961 a 1974 nas três frentes, Angola, Moçambique e Guiné-Bissau, assim como aqueles que, à data da morte do militar ou do deficiente, dele dependiam directa e economicamente. (...)




do site da
ADFA
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Associação dos Deficientes das FA


Mensagem do A. Marques Lopes, de 11 de Maio:

Para os que são DFA, dou-vos conhecimento de um comunicado da AOFA (Associação dos Oficiais das Forças Armadas).

A. Marques Lopes
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Caros camaradas,

Na sequência do desconhecimento de qualquer resposta concreta por parte do M. Defesa Nacional relativamente às questões que a AOFA colocou com carácter de urgência a S. Ex.ª. o MDN em 27FEV08, analisadas em Reunião ocorrida em 24 de Março de 2008 com o Gabinete e diversos departamentos do MDN e decorridos mais de dois meses, tendo-se verificado a continuada degradação das condições de Assistência na Doença dos Militares e das suas famílias, apesar da informação recebida do Gabinete do MDN de que os assuntos colocados estão a receber a atenção e o tratamento adequado, pretendendo o MDN fornecer, em tempo, uma resposta global melhorando o funcionamento da ADM;

Comungando das preocupações, em muitos casos coincidentes, dos Deficientes das Forças Armadas, designadamente no que se refere à degradação das condições da ADM, com especial relevo no que respeita a um universo (parcialmente comum) que importa considerar em absoluto e ao qual todos os militares em geral estão potencialmente sujeitos no futuro;

Constituindo um dever cívico fazer respeitar os compromissos políticos assumidos, o Estatuto da Condição Militar e os serviços prestado à Pátria;

A direcção da AOFA decidiu prestar solidariedade activa à ADFA e participar na Manifestação promovida pela ADFA, através de uma delegação dos corpos sociais e difundir a participação junto dos seus sócios.

Concentração em 14MAIO08 pelas 14h30 junto ao HMP na Estrela, seguindo-se o deslocamento para a Assembleia da República.

Com cordiais cumprimentos,

Alpedrinha Pires, Presidente da AOFA

__________


adaptação do texto da responsabilidade de vb.

Guiné 63/74 - P2834: Ser solidário (9): Sementes para a população de Cabedu, Cantanhez, Região de Tombali (Zé Carioca)

Guiné-Bissau > Região de Tombali > Cantanhez > Sector de Bedanda > Cabedu > Simpósio Internacional de Guileje > 1 de Março de 2008 > O Zé Carioca, um dos Gringos de Guileje, também esteve aqui, emocionado e solidário, na inauguração da rede de distribuição de água potável à população.

Fotos: © José António Carioca (2008). Direitos reservados.

1. Mensagem do José António Carioca José Carioca, ex-Fur Mil Trms e Cripto, CCAÇ 3477, Gringos de Guileje, Guileje (1971/72) (1), com data de 8 de Maio:

Caro Luís

Li aqui no blogue o que o José Teixeira escreveu sobre a inauguração daquele chafariz que foi inaugurado num povoado perto de Cabedu (2). Também eu estive nessa inauguração, como podes ver na foto que anexo e em que estou a festejar com essa gente.

Quando a Mulher Grande da população, depois dos discursos, fez o pedido das sementes, que era de alfaces e tomates, eu fiquei extremamente sensibilizado, vieram-me as lágrimas aos olhos e disse ao Pepito:
- Eu ofereço as sementes para esta gente.

O Pepito logo na altura fez questão de me apresentar à população presente e os informar de que eu ia fazer essa oferta. Presentemente já tenho sementes para enviar e o Pepito disse-me para não enviar, porque a altura de semear é depois das chuvas. Então quando ele cá vier, vou-lhas entregar em mão.

Entretanto também tenho andado a fazer um pedido para a ajuda de comprar sementes mas só quando o Pepito cá estiver é que saberei que tipo de sementes se adaptam ao solo e clima da Guiné.

No projecto de intercâmbio cultural de que te falei, também faz parte um dia em que o meu grupo [de teatro], junto com o de Bissau [, os Fidalgos,] vamos plantar árvores. Já tenho quem me as forneça mas isto de enviar [para a Guiné] não é facil. Mais uma vez vai ser o Pepito quando cá estiver que nos vai dar essa informação sobre o tipo de árvores [de fruto] que lá se dão melhor.

Já agora dirijo-me ao José Teixeira para que nos juntemos para organizar este e outros tipos de ajudas. Se houver uma mobilização e organização concentradas e coordenadas dos nossos esforlos, a coisa tem mais possibilidades de ter êxito e de se fazer outros projectos.

Segue também uma foto que mostra a alegria daquela gente que tão bem nos recebeu.

Um abraço

José Carioca

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Notas de L.G:

(1) Vd. poste de 6 de Maio de 2008 > Guiné 63/74 - P2815: Tabanca Grande (67): Os Gringos de Guileje: Abílio Delgado, Zé Carioca e Sérgio Sousa (CCAÇ 3477, Nov 1971/ Dez 1972)

(2) Vd. poste de 7 de Maio de 2008 de Guiné 63/74 - P2816: Simpósio de Guileje: Notas Soltas (José Teixeira) (5): Água, fonte de vida para as gentes de Cabedu

Guiné 63/74: P2833: Op Gavião (Belel, 4-6 de Abril de 1968) (Armando Fernandes, Pel Rec CCS / BART 1904, Bissau e Bambadinca, 1966/68)
















Cópias das páginas 43, 44 e 45 da História da Unidade: Batalhão de Artilharia nº 1904, 1966/68. Relatório da Op Gavião, iniciada em 4 de Abril de 1968: com a duração de três dias, e destinada a executar um golpe de mão contra o acampamento do Enxalé, do PAIGC, na mata de Belel, teve a participação da CART 2338, a 4 Gr Comb, mais o Pel Caç Nat 52 (Destacamento A), bem como da CART 2339, a 4 Gr Comb, mais o Pel Caç Nat 53 (Destacamento B). Foi comandada pelo 2º Comandante do BART 1904.


Documento digitalizado: © Armando Fernandes (2008). Direitos reservadas

1. Mensagem de Armando Fernandes, com data de 8 de Maio:

Professor Luís Graça:

Chamo-me Armando Fernandes, fui Alf Mil Cav, comandei o Pel Rec do BART 1904 que esteve sedeado em Bambadinca, de Janeiro a Setembro de 1968. Durante todo o ano de 1967 o Batalhão esteve sedeado em Santa Luzia, Bissau, onde rendeu, em Janeiro de 67, o BCAÇ 1876.

Entrei ontem, pela 1ª vez, no seu blogue e chamou-me a atenção o nome de uma operação referido em P2817 (1), Operação Gavião.

Sobre essa operação consta da história do BART 1904, pags.43/45 (edição não canónica em meu poder) que o Fur Mil Zacarias Saiegh nela participou,o que está em desacordo com uma resposta do Doutor Beja Santos registada em P2817. Parece, também, que relativamente à entrada em Belel há discrepância ente o registado na história do BART e o afirmado no mesmo post. Onde estará a verdade?

Em anexo envio cópia das páginas que referi.

Apresento os meus cumprimentos

Armando Fernandes

2. Comentário de L.G.:

Obrigado, camarada Armando. É-nos muito útil essa informação. Vou dar conhecimento aos camaradas que têm escrito sobre a Op Gavião. A nós interessa-nos a verdade e só a verdade... Em muitos casos, há discrepâncias factuais entre os nossos relatórios de operações e os depoimentos pessoais. É normal.

O Mário Beja Santos , que comandou o Pel Caç Nat 52 (a partir de Agosto de 1968), não poderia obviamente ter participado nesta Operação Gavião (Abril de 1968). Socorre-se da memória dos seus antigos soldados, alguns dos quais felizmente ainda estão vivos e vivem em Portugal.

O ex-Alf Mil Torcato Mendonça e o ex-Fur Mil Carlos Marques dos Santos, da CART 2339 (Mansambo, 1968/69), esses, sim, participaram nessa Op, e estão aqui entre nós... Também vou ler, com atenção, os documentos que tiveste a gentileza de nos mandar.

Ficas, desde já, convidado a ingressar na nossa tertúlia ou Tabanca Grande. No caso de aceitares, julgo que serias o primeiro do teu batalhão (que eu já não conheci: cheguei a Bambadinca no dia 2 de Junho de 1969...). Um Alfa Bravo. Luís Graça

PS - Já agora, uma curiosidadade: foi no teu tempo que houve grave acidente em Bambadinca, originando o incêndio do paiol ? Alguém me contou essa história, julgo até que foi um camarada teu, alferes, que encontrei há uns três anos ou mais anos, na casa de uma amiga, numa festa... Infelizmente, não fiquei com o contacto dele... Mas falámos muito de Bambadinca.

Há aqui um hiato nas nossas memórias sobre Bambadinca: falta-nos saber coisas do teu batalhão e dos anteriores (por ex., BCAÇ 1888, que estava em Bambadinca em 1966)... Seguramente nos pode ajudar a colmatar essa lacuna... 

A malta de Bambadinca de 1968/71 (BCAÇ 2852 e unidades adidas) tem por hábito encontrar-se todos os anos. Deves conhecer malta da CCS do BCAÇ 2852. O Comandante do Pel Rec Info era o Alf Mil João Alfredo T. Rocha... Deste batalhão faziam parte as CCAÇ 2404, 2405 e 2406... Eu pertenci à CCAÇ 12, africana, no período que vai de junho de 1969 a marçod e 1971.

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Nota de L. G.:

(1) Vd. poste de 7 de Maio de 2008 > Guiné 63/74 - P2817: Blogoterapia (51): O Alentejo do Casadinho e do Cascalheira, o Tura Baldé, a Op Gavião... (Torcato Mendonça / Beja Santos)

(...) "(iii) Tempos depois a Operação Gavião, em Abril de 1968. Participaram a companhia do Enxalé (capitão Pires, Zagalo Matos e outros), a tua companhia [, a CART 2339,] e os Pel Caç Nat 52 e 53. Inicialmente, estava destinado a ser uma operação de 5 dias, ficou-se em menos de três. Vocês saíram do Enxalé, numa lala perto de Madina, Tura Baldé, um milícia de Demba Taco, ao beber água numa fonte encontrou-se com um soldado do PAIGC que lhe deu um tiro, desacasos da fortuna. Na operação Gavião, o guia era Quebá Soncó, o filho primogénito do régulo Malã, que foi atingido por um tiro numa rótula, foi-lhe amputada a perna.

"Não ia o Saiegh mas os furriéis Vaz, Altino e Monteiro (o Saiegh chegou em finais de Maio de 1968, o alferes Azevedo já estava em Bissau, eu só cheguei em 4 de Agosto). Falas em que "partiram" Madina, Belel e Sinchã Camisa, para Queta Baldé e Cherno Suane, não foi bem assim. Com o tiroteio para tentar liquidar o executor de Tura Baldé, Madina esvaziou-se, o que vocês encontraram foi milho, roupas, esteiras, pilões e coisas parecidas. Para os meus informadores, não havia rasto de gente ferida ou morta.

"Quanto a Belel, a única vez que se lá entrou pelas picadas e com tropa do Exército foi no Tigre Vadio, em finais de Março de 1970 (3). Podes perguntar ao Luís Graça como tivemos sorte e como foi muito doloroso. Despeço-me com a esperança de te ver em Monte Real, tenho um projecto para debater contigo, para aproveitarmos as tuas belíssimas fotografias. E vê lá se acabas com essa conversa mórbida em que andas a dizer que não se recomenda que não estejas vivo, precisamos do teu azedume, da tua indignação, da tua heterodoxia.

"Um abração de estima, Mário" (...).

sábado, 10 de maio de 2008

Guiné 63/74 - P2832: III Encontro Nacional da Nossa Tertúlia (5): Novidades (J. Mexia Alves/C.Vinhal)

Imagem do Google, enviada pelo nosso camarada Álvaro Basto.

© 2008 Tele Atlas
Image © 2008 DigitalGlobe


Mapa com a localização da Quinta do Paúl, em Ortigosa, Monte Real, Concelho de Leiria.




O nosso anfitrião: Joaquim Mexia Alves

Caros Camaradas e amigos Tertulianos:

Últimas notícias do nosso III Encontro Nacional, a levar a efeito no dia 17 de Maio de 2008, no Restaurante Salon da Quinta do Paúl, em Ortigosa, Monte Real .


1. A lista dos inscritos (74) até ao momento é a seguinte:

Álvaro Basto e Fernanda (Matosinhos)
António Báia e Celeste (Lisboa)
António Batista (Matosinhos)
António Graça de Abreu (Cascais)
António José Pereira da Costa e Isabel (Mem Martins)
António Manuel Sucena Rodrigues e Rosa Maria (Oliveira do Bairro)
António Pimentel (Porto)
António Santos e Graciela (Loures)
António Silva e Albina (Matosinhos)
Artur Manuel Soares (Figueira da Foz)
Carlos Esteves Vinhal e Dina (Matosinhos)
Carlos Marques Santos e Teresa (Coimbra)
Carlos Santos (Coimbra)
Carlos Silva e Maria Germana (Lisboa)
David Guimarães e Lígia Maria (Espinho)
Delfim Rodrigues (Coimbra)
Fernando Calado (Lisboa)
Fernando Franco e Margarida (Lisboa)
Fernando Roque (Lisboa)
Francisco Varela (Lisboa)
Henrique Matos (Olhão)
Idálio Reis (Cantanhede)
Inácio Silva e Amélia (Almada)
Jaime Machado e Maria de Fátima (Matosinhos)
João Rocha (Matosinhos)
Joaquim Mexia Alves (Monte Real)
Jorge Cabral (Lisboa)
Jorge Picado (Ílhavo)
José Armando Almeida e Teresa (Albergaria-a-Velha)
José Casimiro Carvalho (Maia)
José do Nascimento Lázaro (Seia)
José Luís Vacas de Carvalho (Lisboa)
José Manuel Lopes e Luísa (Douro)
José Martins e Maria Manuela (Odivelas)
José Teixeira (Matosinhos)
José Zeferino (Loures)
Leopoldo Amado (Porto)
Luís Graça e Maria Alice (Lisboa)
Mário Beja Santos (Lisboa)
Mário Fitas e Maria Helena (Estoril)
Martins Julião (Vouzela)
Maurício Esparteiro (Almada)
Paulo Santiago e Teresa (Águeda)
Raúl Albino (Vila Nogueira de Azeitão)
Rui Alexandrino Ferreira (Viseu)
Silvério Lobo e Maria Deolinda (Matosinhos)
Vasco Ferreira e Margarida (V.N. de Gaia)
Victor Alves (Santarém)
Virgínio Briote e Maria Irene (Cascais)
Vitor Junqueira (Pombal)
Xico e Zélia Neno (V.N. de Gaia)

Já devem ter reparado que vamos ter connosco o nosso camarada António Batista. Para os menos avisados, trata-se no nosso camarada dado como morto na emboscada do Quirafo em 17 de Abril de 1972, que afinal tinha sido feito prisioneiro. Após a sua libertação pôde visitar e depositar um ramo de flores na sua própria campa.


2. Informamos a quem quiser pernoitar, que a Pensão Santa Rita está a praticar o preço especial de 42,50€ por quarto.


3. De novo apresentamos a ementa

Almoço

Entradas
Quarteto de Frutas Laminadas com Presunto
Espetadinha de Morcela e Chouriço
Pãezinhos Regionais/Manteiga
Broa/Azeitonas

Sopa

Carne
Assado de Novilho c/ puré de batatinhas, e Legumes

Sobremesas
Doces Tradicionais
Frutas Laminadas

Vinhos Regionais
Aguas/Refrigerantes

Café

Preço do almoço por pessoa 19,50€


Buffet/Lanche

Caldo verde
Bifanas no Pão
Franguinhos churrasco
Pataniscas de Bacalhau/Rissóis/Chamussas
Queijo/Fiambre/Presunto
Saladas Variadas
Doces de Colher
Frutas Naturais
Febras Churrasco
Lentriscas
Morcela Grelhada
Bebidas

Preço do lanche por pessoa 9,50€

Total final por pessoa 29,00€


4. Para os interessados, o nosso anfitrião, Joaquim Mexia Alves dá as informações necessárias para que possamos todos chegar a tempo e horas, sem nos perdermos.

Aqueles que morarem perto poderão associar-se e fazer a chamada vaquinha, ficando assim mais em conta a despesa de deslocação e ao mesmo tempo preserva-se o ambiente um pouco mais.

Itinerários para o Restaurante Salon / Quinta do Paúl
Para quem vem do Norte

Vir pela A1 e sair em Pombal;
Nessa saída apanhar o IC8 na direcção Louriçal/Figueira da Foz;
Ao fim de mais ou menos 10/12 Kms, apanhar a A17 na direcção para Leiria;
Sair na saída de Monte Real;
Na rotunda logo na saída, tem três direcções possíveis:
À direita: Monte Redondo/ Figueira da Foz
Em frente: Monte Real
À esquerda: Leiria
Tomar a direcção de Leiria, que é a EN109.
Mais ou menos a 2/3 Kms, sempre nessa estrada, entre uma curva e contra curva, aparece do lado esquerdo o Restaurante Salon/Quinta do Paul, com um grande parque de estacionamento.
É aí! Já chegaste!

Para quem vem do Sul

2 hipóteses

1 – Pela A1

Saída em Leiria e apanhar a EN109 na direcção Monte Real/Figueira da Foz. Está bem sinalizado com indicações de Monte Real e Figueira da Foz. Passados 12/13 Kms, no final da povoação da Ortigosa, entre uma curva e contra curva, aparece do lado direito o Restaurante Salon/Quinta do Paul, com um grande parque de estacionamento. É aí! Já chegaste!

2 – Pela A8

Depois de passar pela saída da Marinha Grande/Zona Industrial, e sempre na A8, aparece em continuidade a A17 direcção Figueira da Foz. Seguir pela A17 e sair na saída de Monte Real.
Na rotunda logo na saída, tem três direcções possíveis:

À direita: Monte Redondo/ Figueira da Foz
Em frente: Monte Real
À esquerda: Leiria
Tomar a direcção de Leiria, que é a EN109.

Mais ou menos a 2/3 Kms, sempre nessa estrada, entre uma curva e contra curva, aparece do lado esquerdo o Restaurante Salon/Quinta do Paul, com um grande parque de estacionamento.
É aí! Já chegaste!

Para quem vem do Centro e outras direcções

Com estes itinerários acima e respectivas referências ninguém se pode enganar. De qualquer modo o meu telemóvel é 962108509 e assim podem ligar e eu tratarei de vos encaminhar.

5. Não se esqueçam que continua activa a operação Todos em Força Para Monte Real.

6. Hoje mesmo começam a ser enviados os crachás aos participantes já inscritos.

A comissão organizadora: Joaquim Mexia Alves / Carlos Vinhal
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Nota dos editores:

Vd. último poste de 1 de Maio de 2008 Guiné 63/74 - P2805: III Encontro Nacional da Nossa Tertúlia (4): Novidades (J.Mexia Alves/C.Vinhal)

Guiné 63/74 - P2831: Operação Macaréu à Vista - II Parte (Beja Santos) (31): Tigre Vadio: Um banho de sangue no corredor do Oio

Porto > 1934 > 1ª Exposição Colonial Portuguesa > Álbum fotográfico > "Indígenas da Guiné" > O régulo Mamadu Sissé fotografado por Domingos Alvão.

Mamadu Sissé era um prestigiado combatente e aliou-se ao Governador Oliveira Muzanty, em 1907 e 1908, contra Infali Soncó e Bonco Sanhá. A sua neta emprestou livros a D. Violete, a professora de Bambadinca, que me foram muito úteis. Mamadu Sissé esteve no Porto, em 1934, durante a 1ª Exposição Colonial Portuguesa, foi fotografado por um dos nossos maiores fotógrafos do tempo, Domingos Alvão.Encontrei esta preciosidade no álbum fotográfico, publicado nesse ano de 1934, nas minhas leituras na Sociedade de Geografia de Lisboa.



Foto (e legenda): © Beja Santos (2008). Direitos reservados.

Texto do Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70) (1), enviado em 19 e 20 de Fevereiro de 2008:

Luís, acredita que foi um pesadelo escrever este episódio. Belel ficou juncada de cadáveres e todos nós juncados de sofrimento. Um sofrimento que eu parcialmente não vivi, tu estiveste lá até ao fim, eu limitei-me a assaltar Belel e a destruí-la com grandes soldados. Por favor, pensa em ilustrações que envolvam o Geba, Missirá, Fá, Enxalé ou o Xime, não me ocorre dar-te mais nenhuma sugestão. Espero entregar-te na próxima semana os episódios n.º 32 e 33. Um abraço do Mário.

Luís, reenvio-te o texto, estava cheio de besteiras. Bem gostava de ter a tua opinião, tu estiveste lá do princípio ao fim (*). Foi a mais sangrenta de todas as nossas operações. Ao que parece, Napoleão Bonaparte gostava de generais que soubessem fazer a guerra mas que tivessem sorte. Naquele dia tivémos muita sorte, entrámos em Belel com toda a gente a fazer a sesta. Por favor, escolhe as ilustrações possíveis. Um grande abraço do Mário.


Operação Macaréu à vista - Parte II > Episódio XXXI:UM BANHO DE SANGUE NO CORREDOR DO OIO
por Beja Santos

(i) Uma conversa com o major Sampaio e uma grave distracção minha


Na manhã de 28 de Março reuniram-se no gabinete do major Sampaio os diferentes intervenientes da operação Tigre Vadio: uma companhia de Bafatá que se fazia representar por dois grupos de combate, a CCaç 12, os Pel Caç Nat 52 e 54 e duas esquadras de morteiro do Pel Mort 2106, de Bambadinca. O major Sampaio referiu os objectivos que eram, muito concretamente, os de bater a região ocidental do Cuor e procurar destruir as acampamentos de Madina e Belel.

As informações disponíveis referiam a existência no local de um bigrupo razoavelmente equipado, repartido na protecção das populações em Madina, Quebá Jilã, Belel e até em Banir, já no Oio. Toda esta área não só tinha terrenos cultivados como havia notícia de servir de ponte de passagem de material de guerra e guerrilheiros do Norte para o Sul da província. Os diferentes RVIS asseguravam a existência de vias de comunicação já mal dissimuladas pela vegetação densa. Era um importante corredor, como recentemente confirmara uma operação de pára-quedistas que incendiara um conjunto de barracas na região de Madina, onde encontraram sinais eloquentes de vida organizada, em todas as direcções. Não era só no Oio que o PAIGC estava bem armado e detentor de território.

Depois do desaire da [Op] Anda cá, em Fevereiro de 1969, propunha o comando de Bambadinca que a operação fosse constituída por dois destacamentos, partiriam ambos de Missirá, perto de Quebá Jilã dar-se-ia a bifurcação, seguindo um destacamento para Belel e outro para Madina, respectivamente apoiados por esquadras de morteiro 81, através do apoio aéreo tentar-se-ia manter os destacamentos em sintonia de modo a que, após se terem alcançado e destruído os objectivos regressassem via Enxalé, e depois Xime, apoiando-se mutuamente. Eu a tudo assistia e ouvia, contente, vendo o morteiro 81 entrar naturalmente na organização da operação. Tendo vivido todas as decepções e desaires da Anda cá, no período de perguntas e respostas perguntei se não era possível fazer-se a cambança do Geba perto de Fá, para, a partir de Gã Gémeos ou de Gã Joaquim, se chegar a Missirá sem ter a tropa exausta, e apelando para o ensinamento de que trezentos homens não deveriam, em circunstância alguma, em território batido pelo inimigo, andar num só destacamento, com todos os riscos inerentes a ser flagelado dentro da floresta galeria.

O major Sampaio garantiu que os dois destacamentos se iriam autonomizar e que os dois objectivos eram para ser cumpridos, fosse como fosse. Discutimos equipamento de transmissões, armas, munições e carregadores. E quando falo de carregadores refiro expressamente ser humanos para nos ajudar no transporte de morteiros 81 e suas munições. Esvaiu-se-me da memória, esqueci completamente de mencionar os carregadores para jerricãs de água, naquele calor infernal dois cantis de água eram manifestamente insuficientes. Mais ninguém se lembrou deste pormenor.

A factura foi apresentada em 31 de Março, depois do inferno de Belel. Cada vez que me vem à memória este episódio sinto os lábios ressequidos e vejo um helicóptero com os vidros estilhaçados, recordo uma lala com o piloto aviador a mandar-me sair com jerricãs de água que trouxéramos entretanto de Bambadinca. E vibro com sofrimento que provocámos naqueles que não puderam beber aquela água que eu acabei por levar para o Xime. Enfim, uma distracção que agravou o sofrimento daqueles trezentos homens que já levavam o corpo moído, tensos e à espera da mais imprevisível das emboscadas.

(ii) Os preparativos, de Bambadinca para Fá, daqui para Missirá

Ao princípio da tarde do dia 30 de Março, uma coluna de GMC e Unimog recolhe em Bambadinca as forças da CCaç 12, o Pel Caç Nat 52 e as esquadras de morteiro. As tropas africanas informam as famílias e as populações locais que vão para Bafatá, irão combater algures no Leste, talvez em Geba. Uma força da CCS vai para Finete, a milícia daqui parte para Missirá, ficando esta também reforçada com gente de Fá. Na estrada para Bafatá viramos na Bantajã Assá e daqui seguimos para Fá, onde já chegaram, os grupos de combate de Bafatá. Os soldados estão desorientados com a geografia da operação, ninguém se lembra que há um sintex que pode cambar abaixo de Mero e daqui para Gã Joaquim.

A cambança processa-se sem grandes percalços. Anoitece quando o último pelotão entra em Missirá. Propositadamente, somos nós. O acolhimento é ruidoso, consigo disfarçar a emoção, entro em Missirá como se estivesse em Taibatá, Samba Juli ou Madina Bonco. Mas os Soncó e os Mané são gente inconfundível, vêm açodados partir mantenha, trazem papaia e água fresca, Malã e Lânsana disputam a minha companhia. Evito falar das obras e melhoramentos, concentro-me em perguntas acerca dos ausentes e das crianças. E peço para descansar, deito-me em cima de uma manta até às dez da noite, na morança do Príncipe Samba. Levanto-me com energia redobrada, olho para o céu estrelado e para a prata fulgente da lua e é então que pressinto que vamos viver uma operação inesquecível.

Desta vez precavi-me, desde que entrei em Missirá não paro de falar com Cibo Indjai, um verdadeiro conhecedor da região, proponho que ele e Queta Baldé sigam na frente, depois os bazuqueiros Abdulai Djaló e Mamadu Djau, eu e Cherno, logo a seguir Sadjo Seidi e Tunca Sanhá, dois exímios apontadores de dilagrama. Claro está, não vamos prescindir de Quebá Soncó, o guia de Missirá, mas confio que Cibo nos indique o mais rapidamente possível o caminho mais curto para Belel. Ficara combinado, quando bifurcássemos, seria a separação do nosso destacamento com a tropa de Bafatá para Belel e a CCaç 12 seguiria com o Pel Caç Nat 54 para Madina. Na separação dos destacamentos, Cibo viria connosco e Queta Baldé e Quebá Soncó iriam na vanguarda do outro destacamento para o Sul. Mas não aconteceu nada disso.


(iii) O que se diz na sala de operações não se escreve no terreno


À hora aprazada, muito antes da meia noite excepcionalmente quente, abandonamos Missirá, temos a vida aparentemente facilitada pelo luar, está uma noite quente, Queta Baldé na dianteira leva-nos de Cancumba para Paté Gide. Aqui surgem as primeiras dificuldades, a velha tabanca foi tomada pela natureza, mesmos os trilhos que existiam para Salá desapareceram na alta e insondável vegetação. Mas não perdemos mais tempo, guiados pelo instinto os nosso picadores levaram-nos até Sancorlá e daqui os guias orientaram-se até Salá.

É uma marcha bastante silenciosa, sob um calor atabafante, é madrugada e o suor oleoso escorre pelo corpo, cola-se à farda, a coluna progride a bom ritmo, os alvores do dia surpreendem-nos já em Salá e daqui inflectimos para Quebá Jilã. Vamos prudentes, foi aqui que em 4 de Fevereiro do ano passado capturámos Aruma Sambu. Mas não há trilhos à vista, tudo parece mato virgem. É neste impasse que Cibo, imprevistamente, me manda chamar: os seus olhos sempre ágeis, indicam-me que há ali um trilho, está bem sulcado mas a natureza é acidentada à volta, impossível formar duas colunas.

Faz-se um auto, peço aos dois capitães que me dêem instruções. São coincidentes: vamos para o Sul até se perceber se entrámos, ou não, no corredor do Oio, compete ao PCV dar-nos indicações mais precisas. O calor é imenso, inabitual àquela hora, progredimos cautelosamente quando surge uma nova contrariedade: em frente a Madina arde o capim seco, é uma extensa cortina de fumo, não há possibilidade alguma de perceber onde se acantona o inimigo ou, até, se estamos referenciados. O que fora ditado na sala de operações é contraditado por aquele fogo imenso.

Nisto, recebemos ordem do avião para contornar a queimada, os destacamentos devem continuar juntos é melhor seguir na direcção Sul-Norte, os destacamentos devem progredir em direcção a Belel, há trilhos um pouco mais adiante à nossa frente, assegura com firmeza o PCV. E, de facto, apareceu um caminho largo, uma picada cheia de marcas de presença humana, até o sulco do rodado de bicicletas era perceptível. Depois, voltámos a marchar dentro de uma floresta densa, um copado frondoso que nos protegia da fornalha do sol. As horas passam. Uma força descomunal toma conta de mim, na minha cabeça posiciono o Pel Caç Nat 52 em posição de ataque. Ponho-me ao lado de Cibo e vou fazendo perguntas.
- Sim, alfero, estamos muito perto de Belel, vim aqui muitas vezes, são mais três voltas de caminho e estamos lá, na velha tabanca.

Tomo providências: o Queirós que prepare o morteiro 81, a companhia de Bafatá logo que haja fogo que disperse para a direita, onde tem visibilidade sobre o outro lado da mata, podendo ripostar fogo e desorganizar a reacção do inimigo; se detectarmos o acampamento, nada de contemplações, há que espalhar o terror com as bazucas e com o fogo dos dilagramas, a seguir entramos em Belel e começará o ataque quando o acampamento estiver destruído. Ordeno ao Cascalheira e ao Ocante que vão atrás falar com os dois capitães e com o alferes de Missirá. A CCaç 12 e o Pel Caç Nat 54 que não se precipitem a foguear, esperem que entremos em Belel. São quase duas da tarde, é como se estivéssemos numa frigideira.

(iv) O ataque e a destruição de Belel


Os moradores de Belel estavam a dormir mas um sentinela disparou o seu RPG2 a escassos dez metros da nossa entrada na clareira, sendo imediatamente abatido. Os meus bravos soldados desencadeiam um ataque fulminante, atordoador, ribombam os estoiros das bazucas e dos dilagramas, abrimos em leque e metralhamos as casas e os seus habitantes. Ouvem-se imprecações de desespero, o morteiro 81 com o hábil Queirós vomita a morte sobre uma força em fuga, tudo me parece estranho, retiram sem armas e não são propriamente população civil.

Grito até enrouquecer, Belel está a arder, continuamos a abrir e a cercar, bate-se a mata, continuo a gritar por mais fogo, não quero que o inimigo se concentre, percorro Belel com todas as suas casas de mato a arder, os cadáveres espalhados com os olhos ainda surpresos, os gritos de dor confundem-se com a gritaria da caçada humana. Mamadu Djau puxa-me pelo braço e mostra-me armas carbonizadas, é melhor não entrar nas barracas não se sabe se não há lá granadas. Alfaias agrícolas, pilões, peças de roupa, bicicletas destruídas, juncam o chão do revolto campo de batalha.

Continuo aos gritos e chamo o sargento Cascalheira e ordeno-lhe que transmita aos capitães que vamos continuar numa pequena perseguição, despejando fogo sobre a mata, aguardo instruções para a retirada. Na fumarada de Belel que se extingue, pergunto se temos feridos. Bem à vista está Sadjo Seidi com feridas no peito e um braço estilhaçado até à mão. Não me parece grave, mas há que ponderar a sua evacuação. Os dois capitães mandam informar que propõem a retirada, é temerário continuar no corredor do Oio onde ignoramos tudo. E prontamente Cibo Indjai investe num corta-mato com passo estugado, caminhamos para Oeste, flanqueamos Quebá Jilã procuramos passar ao largo de Madina.

Momentos depois, começava o nosso calvário: afinal, há mais um ferido, trata-se de um soldado da CCaç 12, depois ouvem-se gritos de gente em debandada por causa de um enxame de abelhas, comunicam-me que os carregadores largaram as munições, faz-se um auto já em atmosfera caótica, proponho que se procure ligar o rádio e pedir a evacuação dos feridos, os capitães estão de acordo.

Enquanto isto se passa vejo como a falta de água está a fazer os seus estragos, a dizimar todas as energias. Animo o Teixeira a pôr o Racal a funcionar, vamos ter imediatamente sorte, prometem-nos uma evacuação em breve. Dá tempo para avaliar o estado de ansiedade e as ameaças de desidratação daquele enorme contingente que marcha numa desorganizada coluna. E peço licença para aproveitar a vinda do helicóptero e ir buscar garrafões de água a Bambadinca, onde ficaram os feridos. Os capitães concordam de novo e peço ao Teixeira para informar Bambadinca que ponha rapidamente na pista o maior número possível de garrafões.

Chega e desce o helicóptero numa clareira onde puséramos telas , salta o Vidal Saraiva que fica em terra enquanto eu subo com os dois feridos. A máquina ganha balanço para subir quando uma rajada despedaça alguns vidros, o piloto grita que nos seguremos bem, o zunido dos motores tomam conta dos sentidos, o helicóptero parece um animal ferido que caminha de lado e pela primeira vez na minha vida vejo a mata, a extensíssima floresta que une o Cuor ao Enxalé, a escassos metros, de cima para baixo, é nesta posição que passamos ao lado do Xime, lá dentro balouçamos com a ventania quente que se infiltra, o animal ferido só se endireita para aterrarmos em Bambadinca.

(v) Desencontros do helicóptero com o Teixeira das transmissões


Os garrafões estão a chegar à pista, como está a chegar um jeep com Jovelino Corte Real. Sai colérico com esta ideia de se interromper uma operação para vir buscar água, nem cuidou de olhar para os feridos que estão a ser transportados para a enfermaria. Cedo ao cansaço e às emoções, e pela primeira e última vez elevo a voz ao comandante de Bambadinca:
-Se quer ver os resultados, suba comigo e venha até Belel. Tem lá os caminhos cheios de sangue, ninguém nos esperava, foi uma mortandade. A tropa está cheia de sede, todos nós nos esquecemos de levar jerricans de água. Não interfira nesta operação, é um momento doloroso, temos mais de dez quilómetros até chegar à estrada e pedir auxílio ao Enxalé. Não aceito nenhuma das suas críticas, se quer ver como é que estão os seus homens, venha comigo.

Dou comigo aturdido por esta estridência verbal. Felizmente, Jovelino Corte Real responde:
- Ainda bem que está a ser uma boa operação. Não se perca no caminho, felicidades para a última etapa.

O piloto explica-me que só aquele motivo de força maior justifica que ele vá com os vidros estilhaçados deixar-me algures, na mata, com os garrafões, qualquer coisa como vinte a trinta. E lá regressámos ao Cuor, num ângulo estranhíssimo, vejo tudo inclinado, os Nhabijões, o Geba lamacento, o planalto de Mato de Cão, depois a floresta galeria do Cuor, não sei se perto de Madina, se perto de Belel o piloto desce, pousa numa lala e diz-me:
- Desça e tire os garrafões, depressa!

Com o ânimo já serenado, perguntei-lhe:
-Você quer que eu fique aqui com os garrafões à espera de quem? Até agora ninguém respondeu à sua mensagem, você escolhe um sítio ao caso e não se interroga que isto não é um filme de aventuras?

Olhando-me furibundo, respondeu-me:
- Não tenho culpa do rádio avariado, vou largá-lo no Xime, aí procurem contactar a gente da operação, eu tenho que partir para Bissau para reparar o helicóptero.

E minutos depois aterrámos no Xime, puxei por vinte a trinta garrafões para o solo, angustiado por ter bebido água e ter água para trezentos homens com quem não se podia comunicar.

Conversei com o Queta Baldé há dias, antes de escrever sobre a Tigre Vadio, pedi-lhe o relato das suas impressões, sobretudo a retirada quase apocalíptica com gente que parecia em delírio, a beber água das poças, a gritar por água. Ele rememorou a coluna interminável, a descoberta completamente imprevista da picada para Belel, a sorte que tínhamos tido em termos chegado ao acampamento pelas duas da tarde, o ataque brutal dos bazuqueiros e o fogo dos morteiros, o comportamento heróico de Mamadu Camará e de Serifo Candé metralhando e afugentando os resistentes em Belel.

Erguendo as suas mãos que falam e documentam a narrativa, Queta explica-se como se tivesse transformado num livro aberto:
- Nosso alfero, tivemos sorte demais, nem nos Comandos voltei a ter tanta sorte como naquele dia em Belel, eles estavam a fazer a sesta quando nós irrompemos e destruímos tudo, em fúria, não era possível responder-nos. Naquele dia entrámos pela primeira vez no corredor do Oio como vencedores. Foi um grande sofrimento a retirada, mas foi preferível chegarmos doentes e sem mais feridos graves a ter continuado no trilho para Madina e sermos continuamente emboscados. Cibo Indjai escolheu bem o caminho da retirada. Mas esta foi muito dura, tínhamos gente picada pelas abelhas, gente que gritava e chorava a pedir água, felizmente que o Cibo agiu sem hesitação, escolheu o corta mato que desnorteou o grupo de Madina, caminhámos sempre até ao anoitecer, íamos procurando animar-nos uns aos outros, ficámos perto do Enxalé, onde só entrámos já com a luz do dia. Depois de bebermos e comermos, a gente do Enxalé levou-nos até ao Geba e daqui atravessámos até ao Xime. Pensei muito naquela operação, a canseira e os muitos mortos. Só à minha conta contei quinze. Há heróis a combater e há heróis que ajudam os combatentes. É pena que na guerra se esqueça o trabalho dos maqueiros a consolar e a tratar os feridos.

Ao amanhecer, no Xime, assisto à chegada das tropas em esgotamento físico e psicológico. É um espectáculo patético, aguento tudo a pé firme, eu também me reprovo. A todos peço desculpa por não lhes ter levado a água prometida. Foi um final duríssimo da operação, não me consolaram os resultados da Tigre Vadio, naquela noite no Xime, rodeado de vinte a trinta garrafões de água, senti profundamente o descaso de um helicóptero desnorteado e de um rádio que não funcionava. Voltava a aprender que a falta de comunicação, mesmo por milímetros, priva os homens de terem acesso à água que nos mantém vivos. Quando nos comunicam a mensagem do comandante chefe a congratular-se com os resultados da operação, ninguém levantou a cabeça, todos teriam preferido água a tempo e horas. No meio daquela balbúrdia, descorei o comportamento dos meus bravos soldados. Foram eles que destruíram Belel.

Vamos parar um dia, a seguir partimos para a ponte de Udunduma. A 9, regressaremos ao Xime para bater novamente a foz do Corubal e a Ponta do Inglês. Será a Pavão Real. De permeio, andaremos pelo Cossé e por Badora. Eu escrevo para várias latitudes a falar do meu casamento, aprazado para 16, pelas seis e meia da tarde, na Catedral de Bissau. Com os pés em chaga, leio, devoro livros, oiço Beethoven, as suas sonatas para piano interpretadas pelo genial Willhem Kempff. É uma sensação de euforia, ir rever a mulher amada. Medito no sofrimento que foi a Tigre Vadio.

Irei aprender também que a fronteira entre a paz e a guerra, a fronteira entre a acalmia e a inquietação, é difusa e também pode fazer sofrer. Como irei procurar explicar. Em Bissau irei viver as doçuras do reencontro. Mas sabia que eu estava transformado num tigre vadio, tinha os meus homens a combater, não muito longe.
_________

Notas de L.G.:

(1) Vd. poste de 5 de Maio de 2008 > Guiné 63/74 - P2810: Operação Macaréu à Vista - II Parte (Beja Santos) (30): O Xime, sem ferro mas com fogo...


(2) Vd. postes de:

29 de Junho de 2006 >Guiné 63/74 - P924: SPM 3778 ou estórias de Missirá (4): cão vadio disfarçado de tigre (Beja Santos)

27 de Junho de 2006 > Guiné 63/74 - P918: Operação Tigre Vadio (Março de 1970): uma dramática incursão a Madina/Belel (CAÇ 12, Pel Caç Nat 52 e outras forças) (Luís Graça)

(*) Em tempos escrevi e reescrevi a minha versão, pessoalíssma, dolorosa, como a tua. Na linguagem que me é mais confortável, com aquela liberdade que é permitida aos poetas e aos aprendizes de poeta. Permite-me, Mário, pela tua parte, que, usando (e abusando) do teu tempo de antena, e à pala do tua soberba evocação da Op Tigre Vadio, venha colar, no rodadapé do teu poste, este meu tosco relim.

Vd. poste de 1 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P930: O Relim não é um Poema (a propósito da Op Tigre Vadio) (Luís Graça)

1. Extractos de : História da Unidade: BCAÇ 2852 (Bambadinca, 1968/70). Bambadinca: Batalhão de Caçadores 2852. 1970. Cap. II. 145-146.

Op Tigre Vadio

Iniciada em 30 [de Março de 1970], às 7h00, com a duração de 2 dias, para fazer um patrulhamento conjugado com emboscadas e batida na região do Cuor/Madina.

Tomaram parte na operação os seguintes destacamentos:

Dest A: CCAÇ 2636 a 2 Gr Com, reforçada pelo Pel Caç Nat 52

Dest B: CCAÇ 12 a 3 Gr Comb

Dest C: Pel Caç Nat 54 + 1 Esq Mort 81 / Pel Mort 2106

Relim:

Op Tigre Vadio terminou 1 [de Abril], 13h00. Regresso quartéis terminado 1, 16h30. Aproximação dificultada partir 31, 8h00 queimada linear feita IN. 31, 14h00, detectado acampamento região Belel (Mambonco 7I4-97) oito moranças com colmo sete adobo.

IN reagiu PPSH e RGPG-2 cerca de 2 minutos, sofrendo 15 (quinze) mortos confirmados, vestígios sangue 10 (dez) feridos graves. Verificado após incêndio acampamento 6 PPSH queimadas.

Destruídos meios vida. NT sofreram 2 feridos ligeiros. Batida Mort 81 mata (Mambonco 8H5- 17) ouvidos muitos gritos de dor. Fuga IN direcção (Mambonco 8G6 -32).

31 [de Março], 17h00 encontrada cadeira vigia e 2 granadas RPG-2 (Bambadinca 1A8-95). Gr[upo] IN estimado 6/8 elementos emboscou NT 2 LGFog, RPG-2 e PPSH cerca de 5 minutos.

IN fugiu reacção NT impossibilitadas perseguição virtude forte ataque abelhas causou diminuição física bastantes elementos. NT tiveram 1 ferido ligeiro e 1 ferido grave, 1 doente grave esgotamento.


Transcrição MSG 1404/C Com-Chefe (Oper): COMCHEFE MANIFESTA SEU AGRADO REALIZAÇÃO RESULTADOS OBTIDOS OP TIGRE VADIO.


2. Comentário de L.G.:



Relim não é poema

Participei nesta operação,
a Operação Tigre Vadio,
que era pressuposto durar dois dias.
Um passeio a Madina/Belel.
Um patrulhamento ofensivo,
a travessia de um rio,
uma excursão a um santuário da guerrilha,
uma visita de cortesia,
aos homens do mato,
ali tão perto,
para retribuição de outras visitas de cortesia
que eles nos faziam,
aos destacamentos de Missirá e de Finete,
e à navegação do Geba Estreito.
Em boa verdade,
só te faltou o autocarro autopulman,
com ar condicionado
e bar aberto.

Éramos só tropa-macaca,
como convinha,
sempre era mais barato:
pretos de primeira da CCAÇ 12
e do Pel Caç Nat 52,
mais alguns brancos de segunda,
os açorianos
da vinte e seis trinta e seis.
Levámos dois cantis de água por cada G-3 (...).

O que é que um gajo pensa,
aos vinte três anos,
de Missirá a Salá
e daqui a Sancorlá,
em bicha de pirilau,
de noite,
escuro como breu,
a alma tensa,
o corpo lasso,
o capim mais alto
que as searas de trigo da tua terra,
a fustigar-te as trombas ?
Um gajo não pensa nada,
não tem tesão
para pensar,
apenas para sobreviver
a mais um operação...

Era pressuposto haver um reabastecimento
no dia seguinte,
como manda o mais elementar bom senso
e a experiência operacional do passado
(vd. Op Lança Afiada
em que um cada seis foi evacuafdo).

Caminhámos toda noite.
Penosamente.
Era pressuposto a guerra parar
às dez horas da manhã.
Às dez em ponto.
Porque o clima é quem mais ordena,
e não o relógio do comandante.
Cortaram-nos as voltas.
Os tipos do PAIGC
(não me apetece dizer IN)
cercaram-nos pelo fogo.
E quanto a Deus
e às abelhas selvagens da Guiné,
a gente nunca sabia exactamente
de que lado estavam.

Temerariamente,
decidimos brincar ao gato e ao rato.
catorze horas, no píncaro do dia,
com uma temperatura brutal
e os cantis vazios...
Havia ali uma dúzia de casas
de colmo e de adobe,
mesmo a jeito ou por azar,
para a gente despejar
as nossas granadas de bazuca
e de morteiro oitenta e um.

Nós, quem ?
O major da Dornier, do PCV,
a quem as casas estragavam a vista
nos seus passeios matinais
pelo corredor do Oio.
Ainda não havia os Strellas,
a temível arma dos arsenais
do inimido,
que haveriam de pôr o homem
borrado de medo
e definitivamente em terra.

Alguém puxou dos galões
e decidiu fazer um golpe de mão.
Ou melhor: mandar fazer,
que eu nunca vi nenhum cão grande,
de capitão para cima,
andar cá em baixo,
com a tropa-macaca,
com a puta da canhota nas mãos.

A escassas semanas de acabar a comissão.
P'ra ficar bem na fotografia.
E para pôr no curriculum vitae
e impressionar o Caco...
Um senhor major qualquer
do BCAÇ 2852,
que gostava de andar de Dornier
e que queria chegar a tenenente-coronel.
Um herói de opereta.

Quem ?
Quem é que manda nesta merda,
quem comanda esta tropa-macaca ?
É uma imensa cobra
que se desloca nas terras do Infali Soncó,
espantando os bichos e os irãs,
destruindo tudo à sua passagem.
Não se lhe vê nem o rabo
nem a cabeça.

Entretanto, já alguém,
o Beja Santos,
o nosso Tigre de Missirá,
tinha ido buscar, de heli,
o reabasteciemnto de água
a Bambadinca.
Não voltou.
Alguém dos nossos (?!) terá,
intencional ou inadvertidamente,
disparado uma rajada que atingiu o heli
(soube isto agora,
pelo relato dramático do Beja Santos).
O heli foi para Bissau, para a oficina,
e o Beja Santos ficou retido no Xime.

A verdade é esta:
O PCV falhou, o heli falhou.
O cadeia de comando quebrou-se.
Ou porventura alguém quis matar
o Tigre de Missirá.
O ataque de abelhas fez o resto,
enquanto o cabrão do comandante do PCV
foi bater a sesta em Bambadinca.

No regresso ao Enxalé,
sofremos brutalmente.
Eu sofri,
que a dor não para dá
para partilhar.
Sofri brutalmente a desidratação,
o esgotamento físico.
A insolação.
O absurdo.
A desumanidade.
Tive miragens.
Bebi o próprio mijo,
esgotado o soro.
Mastiguei as ervas do orvalho,
esgotada a água.
Desesperei,
perdida a esperança.
Bebi sofregamente a água choca dos charcos.
Amparei os mais desgraçados do que eu.
Transportei os nossos feridos.
Consolei os mais desesperados.
Fiz as minhas obras de misericórdia,
segundo o Evangelho de São Mateus.
Não deu nenhum tiro de misericórdia
porque nunca dei nenhum tiro em combate.
Mesmo cristãmente,
odiei o PCV,
Bambadinca,
as fardas, os galões,
a tropa, a guerra,
Herr Spnínola,
a Guiné.

Um homem,
mesmo o cristão que eu não sou,
tem que odiar
para sobreviver.

Amigos e camaradas,
depois de tantos anos,
releio o relim
e há qualquer coisa que mexe em mim.
O relim não é um poema.
Um poema épico ou dramático.
É sim, tão apenas,
Um esquema telegráfico
da guerra
para os senhores que estão em terra.

O relim faz economia
dos quilos de merda
que destilaste,
que destilámos.
Das miríades de abelhas kamikazes
que arrancastes do cachaço.
Dos gritos de dor
que ecoaram pelas matas de Madina/Belel.
Dos teus gritos
e dos gritos dos desgraçados elementos pop
que morreram à hora da sua sesta.
Das paredes do estômago
coladas uma à outra pela fome, a sede.
A lassidão do corpo, a tensão da alma,
sem um colchão
para te estirares,
sem um ombro amigo
para morderes de raiva.

Não, nunca mais irei esquecer Madina/Belel.
Eu e mais 250 homens combatentes
(oito grupos de combate),
fora um número indeterminado de civis, nativos,
contratados ou arrebanhados
como carregadores
(para transporte à cabeça,
como no tempo do Teixeira Pinto,
de granadas de morteiro,
de bazuca,
de jericãs de água, etc.).
E que largaram tudo,
ao primeiro ataque
do exército das abelhas do Cuor,
quiçá treinadas na China.

Ah, esqueci-me de mencionar o médico
da CCS do BCAÇ 2852,
o Alferes Miliciano Médico
Saraiva (tinha esquecido o nome),
que o Beja Santos
deve ter conseguido aliciar
à última hora,
face aos casos graves de desidratação,
insolação,
intoxicação...
O pobre do doutor
(ninguém tratava ninguém por doutor
lá no cu do mundo,
longe do Vietname)
ficou em terra,
perdeu a boleia do heli
e conheceu o inferno do Cuor.

Meus senhores,
o Relim não é um poema,
é um exercício de economia,
um tratado
de estética,
um compêndio de gramática,
um fait-divers com que se brinca,
um escarro na cara do Zé Soldado,
entre duas partidas de King
na messe dos oficiais de Bambadinca.

Que nos valha, ao menos, o RDM,
o Regulamento de Disciplina Militar,
é mais grosso,
tem mais papel,
é coisa que se vê
e que em último caso serve
para limpar... o cu.

Fonte:

Extractos do Diário de um Tuga.
Abril de 1970 / Julho de 2006

Guiné 63/74 - P2830: Aqueles que nem no caixão regressaram (4): O Açoriano, da CCAÇ 1439, desintegrado por uma mina (Henrique Matos)


Guiné >Zona Leste> Sector L1 > Bambadinca > Estrada Enxalé-Missirá > Sítio do Mato Cão > 6 de Outubro de 1966 > Cratera povocada por uma mina A/C cuja explosão provocou a morte do Soldad Manuel Pacheco Pereira Junior, da CCaç 1439. Era natural de São Miguel, Açores. Os restos mortais (cerca de 3kg) ficaram no Cemitério de Bambadinca, Talhão Militar, Fileira 2, Campa 1, Guiné-Bissau. NO regresso de Missirá, a mesma coluna accionou outra mina A/C que decepou a perna do Fur Mil Op Esp António dos Santos Mano, acabando por morrer por fa

Foto: ©
Henrique Matos (2008). Direitos reservados.


1. Texto do Henrique Matos, o primeiro comandante do Pel Caç Nat 52 (Enxalé e Porto Gole, 1966/68), açoriano de São Jorge, que vive hoje em Olhão (1):

Caro Luís:

Respondo ao teu mail para dizer que enquanto estive com o [Pel Caç Nat] 52 não se registaram baixas e não me recordo de qualquer funeral de militares tanto no Enxalé como em Porto Gole. O mesmo não se pode dizer da CCaç 1439, companhia a que estava adstrito.

No dia 6 de Outubro de 1966 numa coluna que saiu do Enxalé para reabastecimento de Missirá (sorte minha, porque não foi a minha vez de a comandar) e no fatídico lugar de Mato Cão, o soldado Manuel Pacheco Pereira Júnior, mais conhecido pelo Açoriano pois era o único natural dos Açores naquela companhia que era de madeirenses, foi literalmenet pulverizado por uma mina A/C.

Quando digo pulverizado é o termo que melhor descreve a situação, pois sou um dos que andou à procura de restos do corpo e apenas encontraámos pequenos fragmentos de ossos com que fizemos um embrulho que pesava poucos quilos. Tem a sua campa em Bambadinca, como se pode ver na relação do Marques Lopes (2). A G3 dele nunca mais se viu, pensando-se que terá voado para o Geba que passa a não muitos metros de distância.

E como é que isto aconteceu numa estrada (se é que àquilo se podia chamar estrada) que era sempre picada. Mato Cão era uma zona problemática porque havia ao lado da estrada uma pequena colina que era propícia a emboscadas. Por isso mesmo, e sobretudo quando não avistávamos macacos nas árvores (se houvesse macacos não havia gente), mandávamos umas morteiradas para as traseiras da colina ou avançava uma secção para fazer o reconhecimento.

Nesse dia coube à secção do Açoriano fazer o reconhecimento e este escondeu-se ao lado do pneu do Unimog que ia rodando lentamente. E foi nesse mesmo pneu que rebentou a mina que não fora detectada pelos picas.

Mas a tragédia não acaba aqui. A coluna foi descarregar a Missirá e regressou a abrir, isto é, o mais depressa que podia andar e sem picar. Então muito próximo do mesmo local outra mina A/C tirou a vida ao Fur Mil Ranger António dos Santos Mano, que vinha ao lado do condutor mas com uma perna para o lado de fora do assento. E foi isso que lhe causou a morte, pois a perna foi decepada e não houve forma de o salvar. Nessa noite foi preciso acalmar muita gente no Enxalé pois a companhia, [a CCAÇ 1439,] só tinha tido uma baixa até essa ocasião e já ia a caminho de 15 meses de comissão.

Mando uma fotografia da cratera que uma das minas deixou, e que não sei se terá algum interesse. As fotografias das viaturas desapareceram mas também não tinham nada de especial pois via-se apenas que tinham ido parar longe e tinham a chapa retorcida.

Grande abraço e até Monte Real
Henrique Matos

___________

Nota dos editores:

(1) Vd.postes do Henrique Matos:

14 de Setembro de 2007 >
Guiné 63/74 - P2105: Recordações do 1º Comandante do Pel Caç Nat 52 (Henrique Matos) (1): Ataque a Missirá em 22 de Dezembro de 1966 (Parte I)

14 de Setembro de 2007 >
Guiné 63/74 - P2107: Recordações do 1º Comandante do Pel Caç Nat 52 (Henrique Matos) (2): Ataque a Missirá em 22 de Dezembro de 1966 (Parte II)

6 de Outubro de 2007 >
Guiné 63/74 - P2158: Recordações do 1º Comandante do Pel Caç Nat 52 (3): O famigerado granadero do Enxalé, da CCAÇ 1439 (1965/67)

11 de Outubro de 2007 >
Guiné 63/74 - P2173: Recordações do 1º Comandante do Pel Caç Nat 52 (Henrique Matos) (4): O capitão de 2ª linha Abna Na Onça, régulo de Porto Gole

18 de Outubro de 2007 >
Guiné 63/74 - P2191: Recordações do 1º Comandante do Pel Caç Nat 52 (Henrique Matos) (5): O baptismo de um periquito no Enxalé

23 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2376: Recordações do 1º Comandante do Pel Caç Nat 52 (Henrique Matos) (6): Insularidade e solidariedade no Natal dos açorianos

31 de Dezembro de 2007 >
Guiné 63/74 - P2392: Memórias dos Lugares (3): Porto Gole (Henrique Matos, Pel Caç Nat 52, 1966/68)

Vd. também poste de 22 de Junho de 2007 >
Guiné 63/74 - P1871: Tabanca Grande (15): Henrique Matos, ex-Comandante do Pel Caç Nat 52 (Enxalé, 1966/68)

(...) Em 10 de Agosto de 1966 (recordo-me por ter sido 4 dias após a inauguração da Ponte sobre o Tejo, então Salazar) embarquei para a Guiné no Rita Maria, na chamada rendição individual.
Depois Bolama, que foi o meu curto IAO, onde já me esperava o Pel Caç Nat 52, composto por pessoal metropolitano (Furriéis Milicianos Vaz, Altino e Monteiro e 1ºs Cabos Cunha, Castanheira e Pires) e o restante pessoal do recrutamento local englobando três 2ºs Cabos (um era caboverdiano, penso que se chamava Félix).



Passados alguns dias, saímos numa LDM para o Enxalé, ficando em reforço à CCAÇ 1439, independente, de madeirenses, adstrita ao BCAÇ 1888, sediado em Bambadinca (...).


(2) Vd. poste de 5 de Maio d 2008 >
Guiné 63/74 - P2811: Lista dos militares portugueses metropolitanos mortos e enterrados em cemitérios locais (3): De 1966 a 1967 (A. Marques Lopes)

Há pelo menos 4 militares da CCAÇ 1439, que morreram na Guiné e por lá ficaram enterrados (dois em Bambadinca e dois em Bissau, sendo três madeirenses e um açoriano):

(i) José Manuel Mendonça, Soldado, CCaç 1439, morto em 30.08.65, no Xime, por ferimentos em combate; era natural de Santa Maria Maior, Funchal; está sepultado o Cemitério de Bissau, Campa 1952, Guiné-Bissau;

(ii) Tolentino Gouveia, Soldado, CCaç1439, falecido em 30.08.65, em HM241, Bissau, na squência de ferimentos em combate, no Xime; era Santo António da Serra, Machico, Madeira; foi enterrado no Cemitério de Bissau, Campa 1926, Guiné-Bissau;

(iii) Juvenal Gonçalves, Soldado, CCaç 1439, morto em 28.02.66, em Bambadinca, por afogamento; era natural de São Vicente, Madeira; repousa no Cemitério de Bambadinca, Fila 1, Campa, 9, Guiné-Bissau;

(iv) Manuel Pacheco Pereira Junior, Soldado, da CCaç 1439, 06.10.66, morto na estrada Enxalé-Missirá, no sítio d Mato Cão, por ferimentos em combate; era natural de São Miguel, Açores; os restos mortais ficaram no Cemitério de Bambadinca, Talhão Militar, Fileira 2, Campa 1, Guiné-Bissau.