segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

Guiné 63/74 - P5672: Estórias avulsas (23): Old Parr e Antiquary a 90$00 (Luís Dias)



1. O nosso Camarada Luís Dias*, ex-Alf Mil da CCAÇ 3491/BCAÇ 3872, Dulombi e Galomaro, 1971/74, enviou-nos em 14 de Janeiro de 2010, a seguinte mensagem:

Camaradas,


Trago-vos mais uma história relacionada com as garrafas de uísque que adquiríamos na Guiné a tão bom preço. Old Parr e Antiquary a 90$00, ai que saudades!!! Se entenderem ser de publicar, força!!! Vão também fotos das garrafas.

Old Parr e Antiquary a 90$00

É verdade! Ainda tenho 5 garrafas de uísque das que trouxe da Guiné!!!. Ou seja, estas já estão em minha casa desde 1974 (o BCAÇ 3872 regressou da guerra no Niassa e atracou no Cais da Rocha Conde de Óbidos, em 4 de Abril, mas elas chegaram antes desta data). São elas uma “President”, uma “Something Special”, uma “Dimple”, uma “Smugler” e uma “Logan (conforme fotos abaixo). Umas autênticas belezas.

Alguns dirão que isto é um sacrilégio; porque será que o Dias não tratou destas “meninas” em conformidade? Outros dirão que não é lá muito de beber e que, por tal facto, foi deixando andá-las lá por casa. Eu respondo: fui bebendo algumas, deixei outras ao meu pai, também ao meu tio Armando – este sim um grande apreciador – e fui ficando com outras e olhem ganhei-lhes amizade, porque olhava para elas e ía-as destinando a grandes momentos. Bebi uma, já não me lembro a marca, quando o meu filho nasceu há 30 anos.




Tinha uma “Monks”, em bilha de barro, que muitos amigos, quando me visitavam, diziam para eu abrir, porque o uísque ia-se evaporando. Provei-lhes o contrário quando a abri e a bebi ao fazer 50 anos. Abri uma “Chivas”, ao que creio, aos 55 e agora ainda tenho estas, embora com destino certo. Vou abrir a “Dimple” quando fizer 60 anos, se Deus permitir que eu lá chegue e as outras serão para outras “special ocasions”, nomeadamente se o meu Benfica, este ano, voltar a ser Campeão Nacional.

O uísque na Guiné era, como todos sabem, uma bebida altamente apreciada e usada, inclusive, como tratamento antibacteriano. Quando regressava das operações no mato e entrava no quartel, ainda antes de tomar o retemperador e refrescante banho, a primeira coisa que fazia era beber um uísque com água de castelo para matar a bicharada (parasitas) que, possivelmente, tivesse engolido quando bebia das águas da bolanha, dos riachos, das poças, mesmo com recurso às pastilhas, ao lenço a fazer de filtro, antes de ela entrar no cantil e depois de afastar a baba dos macacos ou de outros animais que tivessem lá estado a tirar a sede.

Durante a comissão fui adquirindo diversas garrafas do precioso néctar, em especial das marcas que eu entendia serem mais prestigiadas. Encaixotava-as, devidamente acondicionadas, e pumba lá iam direitinhas para casa dos meus pais, através do correio. E nunca desapareceram e chegaram sempre inteiras!

Na minha companhia (Dulombi), ao que julgo também nas outras, depois da cerveja, o uísque era das bebidas mais comercializadas (o vinho…bem, o vinho não era lá grande coisa, como sabemos), embora existissem boas aguardentes velhas (como a excepcional “Adega Velha”, em garrafa numerada). O gin com água tónica também era muito apreciado entre os graduados (mais na sede do batalhão em Galomaro do que na nossa companhia) e até a coca-cola tinha alguma saída (esta bebíamos juntamente com o uísque, normalmente em convívios, despejando uma garrafa de uísque corrente dentro de uma das terrinas de sopa, com uma grande pedra de gelo e coca cola a atestar. Depois seguia-se o ritual de passar a terrina de mão em mão, de boca em boca, bebendo o líquido fresquinho até acabar e, às vezes, como não chegava, iniciava-se novamente o processo).

A cerveja era muito popular e bebia-se em quase todas as alturas. Em Janeiro de 1973 a companhia teve de pedir um reforço de cerveja, porque a mesma esgotou-se e, segundo a Manutenção de Bissau, a nossa companhia tinha batido o recorde de cervejas bebidas!!! Raio de malta, esta nossa rapaziada!!!

A aquisição do uísque das melhores marcas era uma luta em que o nosso 1º Sargento Gama, quase sempre, me levava a melhor. De facto, a título de exemplo, nunca consegui adquirir a “Martins” de 20 anos, porque se esgotava sempre (!!!!!). Mas eu vinguei-me, conforme vos relato a seguir.

Em finais de Fevereiro, princípios de Março de 1973, eu estava a comandar a companhia, devido às férias do nosso Capitão. Então engendrei com os operadores criptos que, num determinado dia, depois de almoço, me apresentariam uma mensagem falsa, relacionada com a nossa transferência urgente para outra zona de acção. Os outros alferes e a maioria dos furriéis estavam também alertados para a notícia.

No dia aprazado, um dos criptos vem entregar-me uma mensagem urgente à messe de oficiais e sargentos, trazendo um ar preocupado e quando eu a li, mostrei um ar de estupefacção, que levou a que os outros graduados perguntassem o que tinha acontecido.

Depois de alguns segundos de silêncio eu disse-lhes, com uma voz dramatizada, que estávamos quilhados. Tinhamos recebido ordens de marcha para a zona do Cantanhez, para onde seguíriamos dentro de 3 dias. Foi como uma bomba! É claro que a maioria sabia do engano, mas alinhou na “tanga”.

Mas, onde é que entra aqui o nosso 1º Gama? O problema é que uns dias antes o 1º sargento havia comprado mais um grande lote de garrafas de uísque e assim ele deu imediatamente um grande salto, como que impelido por uma mola.

- Como é isso meu Alferes? Vamos todos para o Cantanhez? Isso é verdade? Perguntou-me o 1º Gama.

- Nosso primeiro, a coisa é bem séria! Vamos todos para o Cantanhez! Confirmei com a cabeça.

Depois da confirmação, o 1º Gama entrou em desespero…!!! Gritava o que é que iria fazer com a pôrra das garrafas de uísque que havia comprado, que nem ía ter tempo de as remeter para a metrópole, que tinha gasto tanto dinheiro com a sua aquisição, etc. Estava fulo e chamava nomes a tudo o que era comandante, recorrendo ao seu vernáculo de bom alentejano. É claro que a malta alvitrou logo que o melhor era começar já a bebê-las e que todos nós estávamos dispostos ao sacrifício, dávamos o corpo ao manifesto, ajudando-o em tão árdua e imperiosa tarefa… O 1º sargento estava desfeito… Eu sentia-me vingado!

Deixámo-lo com estas preocupações durante algum tempo, mas não me contive e disse-lhe a verdade. Ficou tão aliviado que me perdoou a maldade.

A cena poderia ficado por aqui, o problema é que uns dias depois, exactamente depois do almoço, surge um dos operadores cripto na messe a entregar-me uma mensagem e foi logo dizendo que o assunto era sério e que a mensagem era verdadeira.

Peguei na mensagem e lia-a, primeiro com os olhos e depois com a alma, e lá estava, preto no branco. O Comandante do Batalhão solicitava a informação de quantas viaturas iriam ser necessárias para transferir, em três dias, a companhia para Galomaro (sede do Batalhão). É claro que não era a mesma coisa que ir para o Cantanhez, eram apenas 20 km de distância, mas a malta ficou em polvorosa e muitos, ao princípio, pensavam que era mais uma brincadeira. O 1º Gama lá deve ter pensado para com os seus botões, que afinal não seria assim tão mau e não me resingou os ouvidos como seria de esperar.

A verdade, é que tive de preparar e organizar todo o pessoal para sair, em três dias, ficando unicamente no quartel do Dulombi, 13 bravos, comandados pelo Furriel Gonçalves do 2º GC (posteriormente rendido pelo Furriel Soares das Trms) e dois pelotões de milícias.


Assim, no dia 9 de Março de 1973, a CCAÇ 3491, entrava em Galomaro, comigo na frente da enorme coluna que foi possível organizar. O que começara por ser uma pequena brincadeira, tornou-se uns dias depois uma realidade e a vida operacional da companhia iria ser completamente diferente. Mantivémos as operações na zona do Dulombi, alargámo-las também para a área de Galomaro e passou a estar um GC de intervenção em permanência em Piche, depois em Nova Lamego e até em Pirada (poucos dias). Era a companhia que detinha a maior área geográfica de intervenção em todo o território.

Só regressaríamos ao Dulombi para realizar operações e em Janeiro de 1974, para preparar a recepção aos nossos “piras”.

Eu, no jipe que encabeçava a coluna da CCAÇ 3491, no dia 9 de Março de 1973, à chegada a Galomaro. Atrás o Fur. Baptista do 1º GC e ao lado, a sorrir, um guerrilheiro do PAIGC que se entregara um dia antes a uma patrulha nossa, na área do Dulombi. A arma é uma Shpagin PPSH 41, de calibre 7,62 mm - Tokarev, vulgarmente conhecida por “costureirinha” (aqui com a particularidade de ter um carregador curvo de 35 munições, em vez do tambor habitual com 71) .






E, já agora, também do vinho comemorativo dos 35 anos do regresso da nossa companhia.

Um abraço do tamanho do Rio Corubal,
Luís Dias
Alf Mil da CCAÇ 3491/BCAÇ 3872


Fotos: © Luís Dias (2009). Direitos reservados.
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Nota de M.R.:

Vd. último poste desta série em:

Guiné 63/74 - P5671: Núcleo Museológico Memória de Guiledje (5): Recordando o brilhante improviso de Luís Moita, na sessão de encerramento do Simpósio Internacional de Guileje, em 7 de Março de 2008



Guiné-Bissau > Bissau > Hotel Palace > Simpósio Internacional de Guiledje (1-7 de Março de 2000) > Sessão de encerramento, dia 7, de manhã > O Prof Doutor Luis Moita (*), em nome de todos os participantes portugueses e demais estrangeiros (com excepção caboverdeanos e dos cubanos Oscar Oramas e Ulisses Estrada, que fizeram  intervenções autónomas) profere,  de improviso, um caloroso e brilhante discurso de síntese sobre o balanço  daquela "semana inolvidável" que foi o Simpósio Internacional de Guiledje (**) e as perspectivas que se abrem para o futuro da Guiné-Bissau em matéria de democratização interna e de cooperação internacional  ...

O conteúdo do discurso de 10 minutos centra-se à volta de quatro ideias-chave: Organização, Rigor histórico, Densidade humana, Qualidade política. É uma intervenção de grande qualidade intelectual e humana, que nos honrou a todos, e em que Luís Moita mostra,  para além da sua faceta de talentoso orador, toda a sua grande cultura como especialista de relações internacionais, e sobretudo a sua grande inteligência emocional, como português e amigo da Guiné-Bissau.

Era uma pena este vídeo não estar disponível para os Amigos e Canaradas da Guiné, e nomeadamente na véspera da inauguração do Núcleo Museológico Memória de Guiledje que vem celebrar, não a derrota de ninguém, mas a fraternidade dos povos, trinta e seis anos depois do fim da guerra colonial, e muito em particular vem contribuir para o reforço da relação especial que une o povo guineense e o povo português.

A cerimónia terá lugar no dia 20 deste mês, em Guileje, na presença do Primeiro Ministro, membros do Governo,  embaixadores, autoridades políticas e religiosas tradicionais, e grupos culturais de todo o país, num total estimado entre 2 mil a 3 mil pessoas. O nosso blogue estará representado por Júlia Neto, a viúva do nosso saudoso camarada  José Neto (1929-2007). (LG)

Vídeo (10' 14''): Luis Graça (2009). Alojado em You Tube > Nhabijoes

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Notas de L.G.:

(*) Luís Moita - Breve Curriculum Vitae

Fonte:  Simpósio Internacional de Guiledje (Bissau, 1-7 de Março de 2008)

(i) Nascido em 11 de Agosto de 1939.

(ii) Doutorado em Ética pela Universidade Lateranense (Itália), em 1967, com a classificação “summa cum laude” (10/10) – grau académico reconhecido pela Universidade Católica Portuguesa.

(iii) Actualmente [, Março de 2008], Vice Reitor da Universidade Autónoma de Lisboa, onde é Professor Catedrático de “Teorias das Relações Internacionais” e Director do Departamento de Relações Internacionais.

(iv) Coordenou o Instituto Sócrates para a Formação Contínua na mesma UAL e dirige o Observatório de Relações Exteriores que edita a publicação JANUS – Anuário de Relações Exteriores. É ainda o Coordenador Científico do Instituto de Investigação Pluridisciplinar da UAL.

(v) Durante 15 anos, entre 1974 e 1989, dirigiu o CIDAC, organização não governamental portuguesa de cooperação para o desenvolvimento.

(vi) Entre 1989 e 1997 leccionou a Cadeira de “Filosofia e Deontologia do Serviço Social” no Instituto Superior de Serviço Social de Lisboa.

(vii) Foi Professor Associado Convidado da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra (até Outubro de 1998).

(viii) Actualmente, coordena o Mestrado em Estudos da Paz e da Guerra, na Universidade Autónoma de Lisboa (UAL); além disso, lecciona a Cadeira de “Globalização e Relações Internacionais de África” no Mestrado de Estudos Africanos do ISCTE.

(ix) Desde 1998, é conferencista regular do Curso de Defesa Nacional promovido pelo Instituto de Defesa Nacional.

(x) Desde o ano lectivo de 2004-05 lecciona ainda no Instituto de Altos Estudos da Força Aérea e presentemente no Curso de Estado Maior Conjunto do Instituto de Estudos Superiores Militares.

Em 10 de Junho de 1998 foi condecorado pelo Presidente da República com a Grande Cruz da Ordem da Liberdade.

Título da Comunicação (apresentada no dia)

Fundamentos e originalidade táctico-estratégicos da acção político-militar de Amílcar Cabral e do PAIGC no contexto dos movimentos de libertação do Terceiro Mundo

Sinopse da Comunicação

Liderado por Amílcar Cabral, o combate pela independência na Guiné-Bissau passou por uma dupla transição: por um lado, a transição da reivindicação pacífica para o uso da violência; por outro lado, a transição da luta urbana para a luta no campo. Qualquer destas transições teve influência determinante na natureza e na condução da luta. O contexto internacional dos anos 1960 explica a adopção das respectivas orientações. Será interessante fazer uma tentativa de avaliação das mesmas, passado quase meio século.

(**) Vd. postes da série Uma semana inolvidável na pátria de Cabral: 29/2 a 7/3/2008 (Luís Graça)

8 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2618: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral: 29/2 a 7/3/2008 (Luís Graça) (1): Regresso a Bissau, quatro décadas depois...

9 de Março de 2008> Guiné 63/74 - P2620: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral: 29/2 a 7/3/2008 (Luís Graça) (2): O Hino de Gandembel, recriado pelos Furkuntunda

9 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2621: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral: 29/2 a 7/3/2008 (Luís Graça) (3): Pequeno-almoço no Saltinho, a caminho do Cantanhez

11 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2625: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral: 29/2 a 7/3/2008 (Luís Graça) (4): Na Ponte Balana, com Malan Biai, da RTP África

14 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2640: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral: 29/2 a 7/3/2008 (Luís Graça) (5): Um momento de grande emoção em Gandembel

16 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2650: Uma semana involvidável na pátria de Cabral: 29/2 a 7/3/2008 (Luís Graça) (6): No coração do mítico corredor de Guiledje

17 de Março de 2008 > Guine 63/74 - P2655: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral: 29/2 a 7/3/2008 (Luís Graça) (7): No corredor de Guiledje, com o Dauda Cassamá (I)

17 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2656: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral: 29/2 a 7/3/2008 (Luís Graça) (8): No corredor de Guiledje, com Dauda Cassamá (II)

19 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2667: Uma semana memorável na pátria de Cabral (29/2 a 7/3/2008) (Luís Graça) (9): O grande ronco de Guiledje

23 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2673: Uma semana memorável na pátria de Cabral: 29/2 a 7/3/2008 (Luís Graça) (10): Guiledje: Homenagem ao Coronel Coutinho e Lima

29 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2695: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral (29/2 a 7/3/2008) (Luís Graça) (11): Iemberém, uma luz ao fundo do túnel

31 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2704: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral (29/2 a 7/3/2008) (Luís Graça) (12): Que o Nhinte-Camatchol te proteja, Guiné-Bissau

5 de Abril de 2008 > Guiné 63/74 - P2721: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral (29/2 a 7/3/2008) (Luís Graça) (13): Visita ao Acampamento Osvaldo Vieira (I)

12 de Abril de 2008 > Guiné 63/74 - P2752: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral (29/2 a 7/3/2008) (Luís Graça) (14): Acampamento Osvaldo Vieira (II)

24 de Abril de 2008 > Guiné 63/4 - P2793: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral (29/2 a 7/3/2008) (Luís Graça) (15): Salvemos o Cantanhez (I)

15 de Maio de 2008 > Guiné 63/74 - P2846: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral (29/2 a 7/3/2008) (Luís Graça) (16): Salvemos o Cantanhez (II)

29 de Junho de 2008 > Guiné 63/74 - P2994: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral (29/2 a 7/3/2008) (Luís Graça) (17): Cacine, a voz dos abandonados (I)

29 de Junho de 2008 > Guiné 63/74 - P2996: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral (29/2 a 7/3/2008) (Luís Graça) (18): Cacine, a voz dos abandonados (II)

Guiné 63/74 - P5670: O segredo de... (11): Um ataque a Bissau, uma bravata do Hoss e do Django (Sílvio Fagundes Abrantes, BCP 12, 1970/71)


1. Comentário (*), com data de ontem, do Sílvio Fagundes Abrantes,  mais conhecido por Hoss, natural de Águeda, no tempo que foi soldado pára-quedistado BCP 12, entre 1970 e 1971 (**), comentário esse que eu me permito interpretar como a revelação, tardia, de um segredo (***):

O ATAQUE A BISSAU

Vou contar a história real dum ataque a Bissau feito em 1971. Um dia, eu e o meu amigo Julião Pais dos Santos (o Django), pensámos em atacar Bissau... Dito e feito. Mas faltava a estratégia. Depois de alguns dias a pensar na estratégia, finalmente chegou a luz ao fundo do túnel.

Material utilizado:

1 saco de viagem pequeno
1 casaco do camuflado
4 granadas de mão.

Como podem verificar, material nada fácil de arranjar na altura. Metemos o material no saco de viagem e partimos em direcção a Bissau, melhor dizendo à tabanca da namorada do Django.

Eu vesti o casaco do camuflado com as granadas no bolso, e chamámos um táxi.O Django senta-se à frente,  eu atrás... Demos uma volta por Bissau, mas não muito grande porque a guita era curta.


A certa altura mandámos o taxista seguir a toda a velocidade possível pela avenida que vai de perto do porto de Bissau, e  que passa pelo Q. G. [, Quartel General], virados ao Palácio do Governador. Na passagem, pela janela de trás,  eu ía deixando caír as granadas que naturalmente explodiam.

A partir daqui cada um imagina o efeito que isto teve. Ao outro dia a notícia importante era de que Bissau tinha sido atacado, um ataque feito por duas aves que,  se fossem apanhadas,  teriam o pescoço degolado.

Não era só a partir bares que nos divertíamos, meu comandante, Sr Mira Vaz. Espero que esta mensagem seja lida por si e quero fazer-lhe uma pergunta:

Nós passámos o Natal de 1970 e o ano novo de 70 para 71 no Olossato. Aí vai a pergunta: Quem era o comandante do quartel, do exército? Não era o hoje Major Tomé? Veja se se lembra e diga alguma coisa. Se por acaso algum bravo do Olossato ler esta mensagem, que responda à minha pergunta.

[Revisão / fixação de texto / título: L.G.]

2. Comentário de L.G.:

Sílvio, respondendo ao teu pedido: no final de 1970, princípios de 1971, o comandante da unidade de quadrícula do Olossato era de facto o Cap Cav Mário Tomé... A CCAV 2721 (Olossato e Nhacra, 1970/72)   tinha um jornal de caserna chamado Tabanca (SPM 1318, 1970).  Tens, na  I Série do nosso blogue, uma série chamada Crónicas de Bissau (ou o 'bombolom' do Paulo Santiago)... O Paulo Salgado era então Alf Mil da CCAV 2721.

Sílvio, agora sou eu a fazer-te um pedido de esclarecimento e uma ou duas perguntas (que não tens de responder, se assim o entenderes):

(i) O que é feito do teu amigo e camarada Django ?;
(ii) Na história que relatas, qual era a razão dessa brincadeira que poderia ter feito vítimas inocentes, civis ou militares a passar na avenida ?;
(iii) Era só por uma questão de adrenalina ? Por vontade (e necessidade) de diversão ? Por andarem já "apanhados pelo clima" ?;
(iv) Qual era, em tua opinião, a razão da rivalidade, em Bissau, entre páras, fuzos e comandos ? E por que é que se uniam todos quando vinha a PM ?

Continuo a aguardar uma resposta,  positiva, ao meu convite para te juntares às nossas tropas. (**)
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Notas de L.G.:
 
(*) Vd. poste de 15 de Janeiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5650: Notas de leitura (54): Guiné 1968 e 1973 Soldados uma vez, sempre soldados!, de Nuno Mira Vaz (Beja Santos)
 
 (**) Vd. poste de 17 de Janeiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5568: FAP (45): Em defesa do meu amigo Oitenta (Silvio Fagundes Abrantes, Hoss, ex-Sold Pára, BCP 12, 1970)

(***) Vd. último poste da série 24 de Dezembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5529: O segredo de... (10): António Carvalho (ex-Fur Mil Enf, CART 6250, Mampatá, 1972/74): Os tabefes dados ao Bacari

domingo, 17 de janeiro de 2010

Guiné 63/74 – P5669: Estórias do Mário Pinto (Mário Gualter Rodrigues Pinto) (33): Até os babuínos eram contra nós (Mário G R Pinto)

1. O nosso Camarada Mário Gualter Rodrigues Pinto, ex-Fur Mil At Art da CART 2519 - "Os Morcegos de Mampatá" (Buba, Aldeia Formosa e Mampatá - 1969/71), enviou-nos a sua 33ª mensegem, em 14 de Janeiro de 2010:

Camaradas,

Num encontro habitual que, periodicamente faço na Costa da Caparica, com antigos camaradas meus, o Nobre lembrou-se de contar um episódio hilariante mas de uma crueza real nas matas do sul da Guiné.

ATÉ OS BABUINOS ERAM CONTRA NÓS

A nossa ZA, a sul de MAMPATÁ, entre Colibuia e Nhacubá, onde se situava o corredor de Missirã (passagem muito utilizada pelo PAIGC), com destino ao Sector de XITOLE, era a nossa zona operacional mais frequente na acção de contra-penetração, que nos obrigava a permanecer no terreno emboscados, e em patrulhamento 24 horas/dia, permanentemente.

Por questão táctica e operacional estavam sempre fora do aquartelamento 2 Grupos de Combate, em acções sobre o dito corredor, tentando impedir a infiltração do IN e dificultando as suas acções de movimentação.

Existiam vastas zonas de implantação de minas e armadilhas, por nós criadas, que eram autênticos labirintos de morte para quem por lá se atrevesse a passar, o que por diversas vezes viemos a constatar.

Nesta área era frequente verem-se bandos numerosos de babuínos (macacos kom), que por ali tinham o seu habitat e que produziam grande barulheira (ladrando), quando pressentiam a nossa presença.

Certo dia, perto de Colibuia, quando procedíamos à verificação de algumas armadilhas que montáramos na área, encontramos o terreno de implantação todo remexido e constatámos que parte delas haviam sido levantadas e se encontravam à superfície do solo. Algumas tinham rebentado, vendo-se indícios de mortandade, pedaços de macacos, por todos os lados.

Obviamente, concluímos que tinham sido os nossos “amigos” babuínos, movidos pela curiosidade, que tinham prestado tal serviço de sapadores ao IN.

Curioso, é que já não bastava o PAIGC, como também passamos a ter de contar com os bandos de macacos kom como seus aliados, contra nós.

Quem aquelas matas atravessou, certamente se lembra dos babuínos ladrando insistentemente, protestando contra a nossa violação do seu habitat natural, e, se por vezes transportavam crias, até se tornavam agressivos, com atitudes e gestos hostis, tentando intimidar-nos.

Enfim, sempre pensei que é caso para dizer que tudo era adverso às NT, e que até os babuínos não nos gramavam.

Um abraço,
Mário Pinto
Fur Mil At Art

Fotos: © Mário Pinto (2009). Direitos reservados.
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Nota de M.R.:

Vd. último poste desta série em:


Guiné 63/74 - P5668: FAP (45): Em defesa do meu amigo Oitenta (Silvio Fagundes Abrantes, Hoss, ex-Sold Pára, BCP 12, 1970)




Guiné > Bissau > Brá> 1970 > "Os meus grandes amigos da Companhia de Caçadores Páraquedistas nº. 122: O Hoss e o Rodrigues. Em cima, vê-se o Hoss a aparar um murro no estômago, como mandavam as regras.

"Na segunda foto, o primeiro a começar da esquerda é o famoso Hoss, assim conhecido por todos incluindo os familiares, e julgo também o staf dos CTT, porque bastava escrever na carta ou no aerograma no endereço HOSS Pára-quedista, sem SPM nem nada, que a correspondência lhe ia chegar às mão. Era 1º Cabo Enfermeiro (julgo eu). O segundo era o Soldado Manuel Conceição Rodrigues, que era meu amigo desde há muitos anos, quando ele esteve a trabalhar na construção dos Estaleiros da Lisnave. Daí quando ía a Bissau, em vez de ficar no Depósito Geral de Adidos, ía comer, beber e pernoitar no quartel de Brá com estes meus grandes amigos. O terceiro da fotografia sou eu" (...) (*)

Fotos (e legendas): © Tino Neves (2006). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Comentário, com data de 4, ao poste de 2 de Janeiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5580: FAP (44): A verdade sobre os incidentes, em Bissau, em 3 de Junho de 1967, entre páras e fuzos... (Nuno Vaz Mira, BCP 12)

Caro amigo Luís Graça, em primeiro vou-me apresentar: Ex-soldado paraquedista, cumpri serviço no BCP 12. Chamo-me Sílvio Fagundes Abrantes, mais conhecido pelo Hoss.

Vou falar do que sei sobre o meu amigo Jaime Manuel Duarte de Almeida, 1º Cabo Paraquedista RD 85, mais conhecido pelo Cabo 80.

Sobre a sua vida de civíl antes da tropa pouco ou nada sei. Sei que teve uma infância muito dura e a certa altura foi para Lisboa onde se alistou na vida da noite. Quando algumas vezes lhe perguntei o que tinha feito antes da tropa, a resposta era sempre a mesma, ou se calava, ou não quero falar disso.

Era um bom jogador de cartas e exímio na vermelhinha. Não tinha escrúpulos em sacar a massa ao maior amigo, daí o pessoal não simpatizar muito com ele, como diz o Sr. Coronel Mira Vaz, meu comandante de companhia na altura.

Grande guerreiro, dotado de muita força, a MG 42 para ele era um brinquedo. Tínhamos dois inimigos comuns, os pretos e os ranhosos da PM [Polícia Militar], [que] se se bamboleavam por Bissau como se fossem donos e senhores do território, ainda hoje não posso com esses ranhosos.

O Jaime pertencia à CCP 122, veio para a 121 temporariamente pela mão do então Capitão Terras Marques que veio da 122 para a 121 e o Cabo 80 veio com ele. A seguir ao Cap Terras Marques, hoje Coronel na Ref, veio o Sr Mira Vaz.

A última vez que vi o meu amigo 80 foi em Águeda, encontrei-o por casualidade à beira da estrada nacional nº 1. Passámos ao resto da tarde juntos. Disse-me que estava à espera de ir para França, até hoje nunca mais o vi nem soube nada dele de concreto, o que sei é o mesmo que os meus amigos sabem.

O 80 não era nenhum arruaceiro e era digno das tropas Paraquedistas.Não como diz aí um senhor. Ele era um lutador, lutava pela Pátria e sabia o significado da palavra Pátria, ao contrário desse senhor que lhe chama arruaceiro, que não deve saber o significado da palavra Pátria e além disso é nojento tratar de arruaceiro um militar da estirpe do 80, sabendo que ele não está cá para se defender ou esse senhor era da PM a quem o 80 fez a vida negra e agora tenta vingar-se, isso é jogo sujo. Se ele cá estivesse de certo que não dizia uma baboseira dessas. Mais não digo.

Vou esclarecer um mal entendido. Eu era soldado enfermeiro, nunca fui promovido a cabo porque num dia fui duas vezes à missa e tramei-me. Eu era apontador de MG e um colega meu trazia a bolsa de enfermagem. Prometo voltar, Hoss.


2. Comentário, colocado no mesmo poste, pelo Paulo Santiago:

Coronel Mira Vaz: 

Após ler o seu post, liguei ao meu amigo e conterrâneo Hoss (Sílvio Abrantes), visto ter a convicção que ele tinha a especialidade de enfermeiro. Confirmou-me ter essa especialidade,apesar de nas saídas para operações levar a MG 42, sendo outro camarada a levar a bolsa de enfermagem. Falou-me numa emboscada no Pelundo (?) em que morreram 6 Páras, e após o combate ter exercido em vários camaradas as funções de enfermagem, o que acontecia, segundo ele, sempre que havia combate com feridos.

Abraço
P.Santiago
Alf Mil Pel Caç Nat 53

3. Comentário de L.G.:

Já tinha feito a sugestão ao Paulo:

"(...) Por que não trazes o Hoss até nós, tal como fizeste com o Victor Tavares ? Tu tens esse condão especial de saber levar a água ao teu/nosso moínho"...

E acrescentava: "O Victor, 1º Cabo da CCP 121 / BCP 12, foi o primeiro pára a 'abrir o livro', no nosso blogue... Publicámos, dele, um conjunto notável de depoimentos sobre a actividade operacional e humana da CCP 121, nomeadamente a actuação em Guidaje e depois em Gadamael em Maio/Junho de 1973. Também era um homem da MG 42. Ficámos amigos. Dá-lhe os meus melhores cumprimentos quando o vires"...

Julgo que a alcunha Hoss tenha sido atribuída ao Sílvio por analogia com a figura do Hoss Cartwrigh, da popular série televisiva norte-americana Bonanza...(Quem,da nossa geração, não era fã da família justiceira mas bonacheirona do Faroeste, o pai Ben, e os filhos Adam, Hoss e Little Joe ?... Comecei a vê-los desde os princípio da década de 60, se não me engano, na RTP)...

Gostava que o camarada Sílvio lesse as nossas regras de bom senso e bom gosto (por exemplo, não usamos o termo "preto", pela sua conotação racista...) e aceitasse fazer parte desta comunidade de amigos e camaradas da Guiné. Na nossa Tabanca Grande não cultivamos ódio nem raiva por ninguém, incluindo os antigos militares da PM e os homens (e mulheres) que nos combatíam (os guerrilheiros do PAIGC)...

No nosso blogue, simplesmente contamos histórias, partilhamos memórias e até afectos. Vejo que o Sílvio está na disposição de nos contar também histórias do seu tempo de militar da CCP 121 / BCP 12. Peço ao Paulo Santiago, seu amigo e vizinho, que o apadrinhe na sua entrada no nosso blogue. Se ele aceitar o nosso convite, que seja desde já bem vindo, alargando assim a representação dos camaradas do BCP 12.
___________

Nota de L.G.:

(*) Vd. poste de 10 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1512: Estórias de Bissau (11): Paras, Fuzos e...Parafuzos (Tino Neves)

Guiné 63/74 - P5667: Da Suécia com saudade (19): Intervenção do Capitão Azevedo Martins, delegado do MFA de Angola à Assembleia de Tancos (José Belo)

1. Mensagem de José Belo (ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2381, Ingoré, Buba, Aldeia Formosa, Mampatá e Empada, 1968/70, actualmente Cap Inf Ref), com data de 17 de Janeiro de 2010:

Caros Camaradas e Amigos.
 
Em comentário, quanto a mim, pertinente, Carlos Vinhal salienta o facto de poucas "histórias e Histórias" haver publicadas pelos que... fecharam a porta... das guerras de África.

Em complemento ao meu poste sobre a descolonização, e a propósito do referido, aqui segue a intervenção do delegado do M.F.A de Angola (Capitão Azevedo Martins) à Assembleia dos Delegados do Exército que ficou conhecida como a Assembleia de Tancos (2 de Setembro de 1975).


"Estão presentemente sediados em Nova Lisboa um Comando de Agrupamento, um Batalhão de Cavalaria e um Batalhão de Infantaria. Não existe sequer uma arma pesada, e dos dois Batalhões, o de Cavalaria ainda poderá dispor de pouco mais de 100 homens para o combate, enquanto o de Infantaria não poderá dispor de NINGUÉM, pois é o Batalhão que veio do Luso e que os próprios soldados do Comando do Agrupamento e do Batalhão de Cavalaria apelidam do "Batalhão do pé descalço.

Este Batalhão, no seu deslocamento do Luso para Nova Lisboa, foi desarmado, e espancados alguns dos seus elementos, incluindo o próprio Comandante. Perderam-se cerca de 4000 armas, rádios, munições, material cripto, tudo em posse da Unita. Foi o próprio Chiwale, 2.º Comandante Militar da Unita, que ordenou esta acção contra o Batalhão, como represália por acções menos correctas das nossas tropas em Sá da Bandeira, das quais trataremos mais à frente. Deste Batalhão, soldados houve que chegaram a Nova Lisboa em cuecas, facto que terá traumatizado esses elementos, mas é agora trauma explorado para forçar a sua retirada imediata para Portugal, embora só tenha... 3 meses de comissão!

Ciganos, que fazem parte dos elementos do Batalhão, logo após a entrada no quartel que lhes foi distribuído, começaram com arrombamentos e roubos. Impossível é, e porque tudo já se tentou, convencer a maioria a pegar em armas, mesmo que seja para desempenhar a também nobre missão de sentinela. Os factos passados com este Batalhão, e com uma "espécie de Companhia" que apareceu em Nova Lisboa, muito contribuiram para uma quebra no entusiasmo com que os poucos mais de 100 homens do BCav vinham desempenhando árduas missões, mesmo fora da zona de acção, como foi a evacuação da população de Malange.

A "espécie rara de Companhia" que atrás referi é um bando, não digo armado, por à semelhanca do Batalhão, ter sido também desarmada pela Unita, quando do regresso de uma missão de Henrique de Carvalho para Luanda. O Comandante desta Companhia apareceu em Nova Lisboa escoltado por elementos da FNLA, brancos, armados, pedindo cerca de 2.000 mil rações de combate e alguns milhares de litros de gasolina. Refere-se que o dito Comandante da Companhia não estava sob qualquer coacção!

Peço aqui licença ao meu General para usar linguagem "vicentina"... mas estamos a averiguar casos de soldados que trocaram a sua ração de combate pela... "co.." de algumas desalojadas! É um tal Capitão França e Silva e a sua Companhia que recebe na ordem de dezenas largas de contos dos desalojados, aos quais já muito pouco resta na vida, e mesmo esta em risco de perder-se se nós não lhes valermos. São as acções deste mesmo Capitão ao entregar o quartel de Pereira de Eça em condições muito mais que cobardes como consta do auto de notícia, por mim escrito, em que fez entrar no Quartel elementos do MPLA e os dispôs em posições camufladas. Seguidamente foi comunicar à UNITA para ir receber o mesmo Quartel. O resultado não precisa de ser aqui descrito.

Mas não são só os Militares. É-o também um tal Encarregado do Governo que mesmo sabendo das carências dos refugiados se permitiu arrecadar seis ou sete toneladas de arroz, pois tinha no seu palácio albergados os Srs. Ministros da UNITA. Tive mesmo oportunidade de perguntar numa reunião, a este Encarregado do Governo, porque não estaria já hasteada no seu palácio a bandeira da Unita, tal o estado, sujo e esfarrapado, em que lá tinha hasteada a bandeira Portuguesa!

E ainda porque nos comprometemos numa intransigente isenção partidária, são acções como esta que estão na origem das represálias atrás denunciadas, e que agora põem em perigo cerca da meio milhão de vidas, preço demasiado caro, e alicerces demasiado frágeis para a construção do edifício que queremos para a liberdade do nosso povo. Ou sois capazes de nos dar resposta a estas apreenções, ou deveis, se alguma dignidade vos resta, dar-nos conta da vossa... impotência!

REFUGIADOS/NOVA LISBOA.
São já mais de 70.000, contando com a população da cidade que também quer regressar a Portugal. Para a semana serão mais de 100.000. Pouca comida há. Remédios também poucos ou nenhuns. Dos que há, ou houve, esses foram trazidos de Gabela aquando da evacuação da sua população, por arrombamento das farmácias existentes. Não há roupa e agasalhos, e é no chão que dormem. Faltam adjectivos para classificar as condições sub-humanas em que vive esta gente. Homens, mulheres e crianças. Crianças que já morrem por impotência dos próprios médicos, uma vez que não possuem os meios mínimos para exercer a sua profissão.

Mas um perigo, ainda maior que os tiros disparados por armas traiçoeiras, paira sobre Nova Lisboa. Refiro aqui que nos dias dos confrontos armados, os movimentos de libertação tiveram o cuidado de disparar para cima das instalações do recinto FINOL onde se encontrava elevado número de desalojados.

É CULPA VOSSA! Que nossa não é concerteza, embora sejamos nós que estamos a sofrer a impiedosa hostilidade dos que consideramos irmãos... e que vós considerais colonialistas. Os que lá estão não o foram, assim o demonstram as suas mãos de árduo trabalho.

DOS QUE AQUI ESTÃO... ALGUNS O TERIAM SIDO! Por duras que sejam estas palavras, ainda admitirei que alguns de vós as sintam como injustas. Mas se assim é, então provai-o por actos, dando-nos meios para cumprirmos a nossa missão, NEM QUE TENHAIS QUE SACRIFICAR EM PARTE; OU NO TODO... AS VOSSAS OPÇÕES POLÍTICAS!


No fim destas declarações o então General Otelo Saraiva de Carvalho, no calor do momento (?) disse:

- O que aqui foi dito sobre Angola deverá ser dito a todo o povo português!

Salgueiro Maia, e mais alguns Oficiais (3), ofereceram-se para, de imediato, partir para Angola.

Quantos tiveram oportunidade de ler, em comunicados oficiais, nos jornais, na televisão, ou na rádio, estas (entre outras) detalhadas, dramáticas e vergonhosas... informações?

Kíruna 17/Jan/2010
José Belo
__________

Nota de CV:

Vd. poste de 16 de Janeiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5660: Da Suécia com saudade (16): Algumas considerações sobre a descolonização (José Belo)

Guiné 63/74 - P5666: Em busca de... (110): Procuro notícias de meu pai Bubacar Tenem Balde (Mário Fitas)


1. O nosso camarada Mário Fitas, ex-Fur Mil Op Esp/RANGER da CCAÇ 763, “Os Lassas”, Cufar, 1965/66, com data de 14 de Janeiro de 2010, enviou-nos a seguinte mensagem/apelo:

Camaradas,

Foi-me entregue por um elemento da Associação Nacional dos Combatentes do Ultramar uma cópia de um manuscrito, que transcrevo, com o pedido se poderia fazer alguma coisa, visto ter sido combatente na Guiné.

Como estive sempre em Cufar, no Sul, ao ler este documento, achei de grande interesse, não só pela ajuda na resolução de um problema pessoal, que se reflecte na ansiedade deste homem, ao tentar fazer a vontade do falecido pai, bem como ter aqui uma história interessante, para conhecimento da guerra nesta região.

Haverá na nossa Tabanca alguém que tenha conhecimentos sobre o assunto? Aqui vão todos os contactos do nosso homem.

Não tendo material para poder enviar o manuscrito, julgo que a transcrição será a mais fiel possível (as palavras a bold são da minha responsabilidade).

Procuro notícias de meu pai Bubacar Tenem Balde

“ Lisboa, 20/10/2009.

Exmos Senhores Combatentes do Ultramar. É com muito prazer que vos escrevo esta carta.

Sou Seco Umaru Balde, de 42 anos de idade, Guineense, nasci na região de Gabu, sector de Pirada, secção de Bajucunda, numa aldeia chamada Copa, numa distância de 29 km a Pirada (fica junto à estrada que faz a fronteira com o Senegal).

Sou filho de Bubacar Tenem Balde, um homem muito conhecido pelas tropas portuguesas daquele quartel, um homem que se dedicou à caça e à agricultura. Foi também um homem que passou toda a sua vida entre a selva e a sua aldeia, e a sua função era controlar um espaço terrestre de 25 km, que separava as aldeias vizinhas, vigiando a movimentação das tropas do P.A.I.G.C., no mato, e transmitindo informações ao senhor Samuel, que era coronel, ou furriel, no Quartel de Copa, a fim de evitar eventuais ataques terrestres nos três quartéis da área.

Entre 1966 a 1973, o meu pai foi um braço direito da tropa do aquartelamento de Copa, e foi fundamental com as suas informações sobre a movimentação e a localização das tropas do PAIGC, neste espaço terrestre que dava acesso aos referidos quartéis.

Por esta razão, por três vezes, antes e depois de independência, ele foi duramente castigado pelo PAIGC, por ter desempenhado esta função; e eu, como filho, fui moralmente castigado logo aos (7) sete anos de idade.

Durante a minha infância sofri maus tratos, castigos morais e estive a pagar as culpas do meu pai, pelas funções narradas que ele desempenhou durante a luta da libertação nacional.

Depois da independência, o meu pai teve que fugir para o vizinho Senegal para se livrar do pior que lhe poderia acontecer. Lembro-me que ele um dia me disse: “Filho, eu vou ter que fugir com o resto da família para o Senegal, tu vais ter que ficar aqui na Guiné-Bissau, vais ter de pagar a minha culpa, vais ter que sofrer muito por minha causa, mas passe o que passar, resiste e estuda, que para amanhã possas contar esta minha e tua histórias ao mundo. Não pela voz, mas sim por escrito.”

Naquela altura, eu tinha sete anos de idade, ouvi, percebi, aceitei o desafio e aqui estou a cumpri-lo.

Em 2008, recebi da minha mãe uma carta que o meu pai lhe tinha deixado escrita um mês antes da sua morte. Ela guardou esta carta durante 22 anos, pela razão de lhe ter sido pedido para ma entregarem só quando eu fosse adulto. Foi o que a minha mãe fez, respeitando o pedido do meu pai.

Agora, quero terminar este silêncio. Quero escrever mais, mas, para o fazer melhor e com mais eficácia, preciso de testemunhos e provas. Provas estas, que só os ex-tropas portugueses que estiveram no serviço militar no quartel de Copa e Bajucunda (22 Km a Pirada), me poderão ajudar a revelar.

Para que eu possa localizar estes homens, ou trocar correspondência com eles, necessito do vosso maior apoio e quanto mais rápido melhor. Acreditem que tenho muito para vos contar, no que tem sucedido com muitas crianças como eu, depois de libertação daquele país lusófono.

Eu, atrever-me-ia a identificar-me como combatente infantil. Podia intitular este nome ao 1º. livro que escreveria se o pudesse fazer.

Por isso, agradecia muito que me ajudassem a contactar, ou a corresponder, com todo e qualquer tropa português, que tivesse estado em serviço militar em Copa, ou Bajucunda, no sector de Pirada, região de Gabu, entre 1966 a 1973.

Por favor, ajudem-me a realizar os sonhos do meu falecido pai, que ainda não contei, e faço questão de os contar a todos que me quiserem ouvir com atenção.

Termino dizendo-vos do fundo do meu coração, que estou de mãos dadas com todos os ex-Combatentes do Ultramar, do serviço militar pela força, coragem e sofrimento, que têm sofrido ao longo destes anos e continuam a sofrer nos dias de hoje.

Para terminar, agradeço a Deus que haja paz boa, longa vida e saúde, cheia de felicidades, aos que ainda nos acompanham neste mundo. Que haja paz para os espíritos das almas dos que ficaram pelo caminho.

Muito obrigado a Deus e ao vosso blogue.

Respondam-me por escrito ou pelo telefone.

É tudo do Vosso filho/neto de nome:

Seco Umaru Balde
Avenida da Liberdade, Nº 24 - 2º E
Monte Abraão
2745-290 QUELUZ
Telem = 966371381
Espanha = 0034 691 908 797

Esperando a atenção desejada para este assunto, o velho abraço do tamanho do Cumbijã, que já é de tanta gente.

Mário Fitas
Fur Mil Op Esp/RANGER da CCAÇ 763
__________

Nota de M.R.:

Vd. último poste da série em:

16 de Janeiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5656: Em busca de... (109): Manuel Quelhas, ex-1.º Cabo da CART 3567, Mansabá 1972/74, procura camaradas

Guiné 63/74 - P5665: (Ex)citações (54): Comentário ao texto de José Belo no Poste 5660 (José Brás)

1. Na impossibilidade de o nosso camarada José Brás colocar este texto como comentário no poste do outro nosso camarada José Belo, fica aqui a sua transcrição:


Comentário de José Brás* ao texto de José Belo** (Poste 5660)***:
"Algumas considerações sobre a descolonização" 


Caríssimo José Belo
Não poderia concordar mais contigo quando dizes, e passo a citar:
"Pelas dramáticas consequências, não só para Portugal nos milhares de refugiados, como para os novos países que, de imediato, se viram envolvidos em sangrentos conflitos internos, será, numa perspectiva de análise histórica futura, a descolonização, na sua forma e resultados, assunto de muito, e aprofundado, estudo. Talvez com menos "compreensão" para com alguns dos responsáveis."

E diria até mais, não deixando de colocar à frente de tudo a tragédia humana que aquilo foi, para Portugal que se viu em meia dúzia de meses com uma população muito acrescida por cidadãos sem nada para fazerem e a necessitarem de apoio, para os próprios que deixaram vidas de trabalho e esperanças e saíram escorraçados de uma terra que já consideravam sua, para os angolanos que se viram nos tais sangrentos e longos conflitos, mas também sem ninguém que soubesse construir, conduzir camiões, fazer paredes, cortar cabelos e barbas, costurar, manter as máquinas, porque eram brancos os motoristas e os pedreiros e carpinteiros e canalizadores e os barbeiros e os funcionários da estrutura administrativa e os donos de lojas e de barcos de pesca e de roças de café e, até, os cauteleiros e os donos das tascas nos musseques.

De facto, os locais que abandonámos, para além de pequenas tarefas como meter cana no engenho, nada sabiam fazer porque nada lhe ensinávamos.
A caminho de Lisboa os que sabiam produzir, Angola ficou sem ninguém para trabalhar de verdade, aceitando-se o conceito de que trabalho é a actividade que se destina a utilizar e multiplicar os recursos da natureza.
Assisti, porque transportei milhares de portugueses na ponte aérea que se estabeleceu então, vivi os seus dramas, olhei-os nos olhos. Grande é a minha dificuldade ainda hoje para, por palavras, descrever o tamanho e a profundidade da desilusão e da revolta que lhes vi.

Algumas vezes aterrámos na antiga Nova Lisboa com chamas na pista, combates na zona do aeroporto, dificuldades de peso para descolar, convivendo com portugueses analfabetos que trabalhavam em Angola como o faziam antes nas suas aldeias, olhando o pessoal de bordo como se fossemos seres de outro mundo.
Portugal, que durante séculos foi incapaz de desenvolver e aproveitar a sério das riquezas daquele território, ao contrário, portanto, da eficácia fria, desumanizada e rapaz, de verdadeiros colonialista que outros foram noutros locais de África, sacando até ao quase esgotamento da mina, Portugal que nem a metrópole era capaz de desenvolver, que poder tinha para comandar bem a descolonização em três frentes, tão importantes e longínquas?

E se não fomos verdadeiros colonizadores, como poderíamos ser verdadeiros descolonizadores?

Não serei eu a desculpar erros que dirigentes de então cometeram na pressa de "abandonar" e lavar as mãos.
Sei é que não vi por lá formas de evitar a maior parte da tragédia de que falas, perdidos e embrulhados no jogo das grandes potências por posições estratégicas globais.
E posso garantir-te que vi e vivi por dentro dessa realidade muito mais do que tu poderás imaginar.
Aliás, se tiver anos de vida e disponibilidade intelectual e da vontade, talvez que venha a escrever um dia qualquer coisa sobre isso, apesar de me parecer ainda hoje muito complicado fazê-lo.

Peguemos, por exemplo, nos militares profissionais de então, capitães, majores, tenentes coronéis.
Quantas comissões tinha já somado de mato, de tiros, de desilusões, de anos fora das famílias, vendo os filhos de dois em dois anos?
Que vontade tinha essa gente de prolongar estadias e responsabilidades após o destapar da panela de pressão?

Não falarei de milicianos, oficiais e sargentos, nem de soldados porque a esses estava ainda mais longínqua a capacidade de determinar formas e modos.

Nos hotéis onde ficavam as tripulações da TAP, convivíamos de muito perto com toda a fauna de indivíduos de língua inglesa, francesa, russa, castelhana, e com gente armada que se guerreava dentro do próprio hotel.

Tivemos culpas?
Claro que tivemos e muitas, ainda assim.
Luanda foi sempre uma cidade turbulenta, mesmo nos anos anteriores a setenta e quatro.
Não havia noite de estadia em que não ouvisse tiros e batalhas entre gang's do "feijão verde" e da noite marginal.

Muito antes do ano de Abril, já taxistas incendiavam musseques e lutavam com Pára-quedistas, Fuzileiros e Comandos.

Naquela situação de caos, com três movimentos no seu interior da cidade, cada qual com sua origem e realidades, odiando-se como só sabem odiar-se aqueles povos na ressaca de sociedades tribais vindas da subsistência recente, todos interessados em correr com brancos, o caldo estava temperado que bastasse.
De tão clara esta verdade, nem vale nem aproveita a pena negar que dos altos responsáveis militares e políticos portugueses, a simpatia ia maioritariamente para um dos movimentos, embora este se apresentasse à data profundamente dividido, fragilizado e quase desarmado.

Concordo contigo, também, com a leitura que fazes da passagem dos militares de uma cultura castrense para a pretensão de liderar a revolução "bolchevique", e concordando, acho que está aí, também, um dos factos que mais pesou na decisão política desencontrada que se ia tomando em Lisboa para aplicar numa Luanda que provavelmente não tinham entendido nunca na sua profundidade social e que agora se queriam afastar a todo o custo e rapidamente.

Nas minhas obrigações profissionais, pude conviver também com a sociedade portuguesa de Joanesburgo.
Com amizades femininas no mundo da moda e da beleza local, nos ambientes das discotecas e bares, pude observar com alguma profundidade as misturas que por lá se faziam com a "intelegentzia" do Estado sul-africano da época, os jornais portugueses e as suas ligações, etc.

Posso garantir-te sem qualquer dúvida que muitas mentiras foram aí forjadas, muitas manobras, muitos documentos e correspondência falsa, muitas acusações infundadas e tendenciosas em ralação a responsáveis portugueses.
Evidentemente, não tenho qualquer vontade de te convencer, seja do que for, nem aos camaradas que connosco convivem na Tabanca Grande e que têm um visão diferente da minha, umas vezes, outras vezes da tua, algumas outras diferentes da minha e da tua.
Aliás, nem tenho a certeza se não é a mim próprio que tento convencer de certezas que podem não ser assim tão certas.

A minha única vontade real que tenho é dizer-te que estou contigo na grande abordagem à tragédia que representou a descolonização portuguesa, quer para Portugal, quer para Angola, quer para os portugueses, quer para angolanos, e, também contigo, denunciar a rapina profunda de que Angola foi vítima por parte de insuspeitos amigos de Peniche, em terra e nos mares e o racismo e ódio aos negros que vi daqueles de quem eu esperava a solidariedade.

Não estou de acordo e penso que também tu não estás, é acerca das dúvidas sobre a madrugada de Abril. Tão bem ou melhor que eu, sabes da inevitabilidade das perdas quando acontecem mudanças sociais e políticas como as que aconteceram então, agravadas ainda pelo prolongamento da situação anterior, muito para além do que era esperável e necessário.

Um grande abraço
José Brás
__________

Notas de CV:

(*) José Brás foi Fur Mil na CCAÇ 1622, Aldeia Formosa e Mejo, 1966/68. É autor do romance "Vindimas no Capim", Prémio de Revelação de Ficção de 1986, da Associação Portuguesa de Escritores e do Instituto Português do Livro e da Leitura.

(**) José Belo foi Alf Mil Inf na CCAÇ 2381, Ingoré, Buba, Aldeia Formosa, Mampatá e Empada, 1968/70, actualmente é Cap Inf Ref e vive na Suécia.

(***) Vd. poste de 16 de Janeiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5660: Da Suécia com saudade (16): Algumas considerações sobre a descolonização (José Belo)

Vd. último poste da série de 1 de Outubro de 2009 > Guiné 63/74 - P5042: (Ex)citações (49): Réplica ao camarada José Belo (António Matos)

Guiné 63/74 - P5664: Banco do Afecto contra a Solidão (9): Humberto Duarte, ex-Fur Mil Op Esp/RANGER, BCAÇ 4514/72, 1973/74, trava o seu último combate (2) (Ana Duarte)



1. Recebi hoje, com pedido de publicação, da Ana Duarte, esposa do nosso Camarada Humberto Duarte, ex-Furriel Miliciano do BCAÇ 4514/72, 1973/74, a seguinte mensagem:



Coragem e Dignidade

Magalhães,

A ti só tenho que agradecer, conseguistes uma coisa que vários militares, ainda no activo me diziam ser impossível, honras militares feitas por Op Esp.

Agradeço também ao Pedro Neves e a outros Amigos que souberam do que se está a passar por telefone e ou vieram cá a casa ou telefonaram. O Filipe O.E., que fez o curso em Mafra com o Humberto, está nos Açores e já falaram, e choraram ao telefone, comigo a fazer de ponte. Alguns ex-combatentes que não nos conhecem, enviaram e-mails de solidariedade, houve até quem me telefonasse e alguém que enviou uma música linda!

A todos esses o nosso muito Obrigado. Mas revolta-me ver o Humberto perguntar por este ou aquele, não menciono nomes, e depois ficar magoado porque até agora nada disseram. A maioria são Op Esp e lembro-me sempre de eu dizer tenho mais consideração por qualquer ex-combatente que esteve lá fora fosse qual fosse a sua arma, até o cozinheiro do que tenho por meninos que tiraram o curso de O.E. pós-25 de Abril 74 e só por isso se acham muito importantes.

As pessoa valem pelo que fazem e não pelo que são ou dizem. Percebo que uma pessoa prefira recordar um Amigo como ele era e não quando o físico se está a degradar dia para dia, até consigo aceitar que custe falar directamente com a pessoa, mas nem enviar uma palavra amiga?!

O Humberto tem defeitos como todos, eu mesma tive problemas com ele por causa do seu stress mas tem uma Dignidade e uma Coragem que muitos nunca vão ter.

Peço que todos os que não tiveram coragem de dizer sequer uma palavra por e-mail, que na despedida não venham com palavrinhas mansas para mim e muito menos no dia 10 de Junho.

Não sou uma ex-combatente, nunca fui nem queria ser militar, sou uma entornada de Moçambique com muito mais coragem e dignidade que muitos.

Se quiseres podes publicar este desabafo no teu site e mais onde quiseres, porque o que eu digo, faço-o na cara das pessoas e não por trás.

Um abraço grande de Ana e Humberto.

P.S: Eu tinha escrito "gostava que publicasses isto no teu site" mas o Humberto pediu para pôr "se quiseres". Um pedido dele é uma ordem para mim.



2. Às 13h15, respondi assim à Ana e ao Humberto Duarte:



Coragem e Dignidade - RESPOSTA

Bom dia Amiga Aninhas e Amigo e Camarada Humberto,

Não só vou colocar nos blogues, como vou enviar este e-mail àquele pessoal de quem tenho contactos.

Também tenho um bloguesito dedicado aos RANGERS na net:


Basta clicares duas vezes sobre o endereço indicado e vais lá directamente.

Da vossa coragem conjunta não tenho palavras para definir.

Peço-vos que mandeis os nomes do pessoal com quem o Humberto gostava de falar, pois de muitos não tenho qualquer contacto, mas vou tentar arranjar.

É bem provável que muita malta ainda não saiba da situação de saúde do Duarte.

Um beijo para ti Aninhas e um abração Amigão para o RANGER Humberto.

P.S. - Amanhã ligo-vos ok!



3. Às 13h37, tive que complementar o meu anterior e-mail, para repor uma verdade inequívoca:



Coragem e Dignidade - RESPOSTA

Mais uma vez Bom dia, Amiga Aninhas e Amigo e Camarada Humberto Duarte,

Peço desculpa mas, nas pressas de ir colocar a vossa mensagem nos blogues, deixei por esclarecer um facto fundamental.

O seu a seu dono deve pertencer!

Por favor não digas que fui eu que consegui as cerimónias militares de Op Esp, mas sim pelo menos a 3 pessoas, com maior ou menor grau de responsabilidade na imediata e inequívoca decisão desta prestação.

Um foi o nosso bom amigo comum, o Sr. Coronel António Feijó, que sei, logo que soube do estado de saúde do HD, se apressou a enviar um reforço solidário do vosso pedido ao Exmo. Sr. Comandante do CTOE.

Depois a resposta imediata e afirmativa, do Exmo. Sr. 2º Comandante do CTOE, TCOR Valdemar Lima, que tenho a certeza absoluta, em pleno acordo e anuência com o Exmo. Sr. Comandante do CTOE.

Deixo aqui um grande abraço AMIGO para estes três HOMENS.

Por motivos óbvios, envio este e-mail com conhecimento a todos os meus contactos a quem havia enviado o anterior e-mail.

Para vós, mais um beijo para ti Aninhas e outro abração Amigão para o RANGER Humberto



Emblema de colecção: © Carlos Coutinho (2009). Direitos reservados.

_____________

Notas de M.R.:

Guiné 63/74 - P5663: Núcleo Museológico Memória de Guiledje (4): Os últimos preparativos (Pepito)













Fotos: ©  Pepito / AD - Acção para o Desenvolvimento (2009). Direitos reservados




1. Mensagem de hoje, do nosso amigo Pepito:

Luís


Seguem as ultimas fotos dos preparativos para a inauguração do Museu de Guiledje.

A – CAPELA:

Já está concluída a sua construção. Será inaugurada no dia 20 de Janeiro de 2010 pela esposa do Capitão José Neto, Srª Júlia Neto [ue parte hoje para Bissau]. Recordamos que foi o Capitão Neto que teve a iniciativa e promoveu a construção da Capela, aquando da sua estadia em Guiledje [, na altura a exercer funções de 1º Sargento da CART 1613, 1967/68]. O Bispo de Bafatá, D. Pedro Zili, estará presente e dirá missa nessa ocasião.

B - MUSEU:

Com a importante colaboração da Fundação Mário Soares, o Museu está ganhando forma podendo-se ver o painel que ficará no fundo do diorama, dois computadores com toda a História existente de Guiledje (Honório Correia e Domingos Fonseca trabalhando na sua configuração como apoio do Victor Santos,  da Fundação Mário Soares) e um dos vários painéis que serão fixados nas paredes.

C – SINALIZAÇÃO:

Na parte exterior do Museu, vários motivos de visita estão devidamente assinalados: a capela, a mesquita, o obus e a pista de helicópteros.(*)

abraço

pepito
 
2. Mensagem do Pepito de 12 do corrente:
 
Luis


Obrigado pelas fotos formidaveis do Luis Guerreiro.

Não te preocupes com a representação do nosso Blogue. Ou Xico [Allen] se cá estiver, ou a mulher do Capitão Neto, estarão presentes.

Quanto ao discurso já não há espaço (como te disse desta vez não é uma iniciativa só da AD mas inclui o Governo e os oradores já estão definidos por eles, porque se trata de uma cerimónia oficial. Já não podemos alterar). Competirá à Julia Neto fazer a inauguração da Capela em nome do marido e do Blogue que teve um papel determinante.

abraços

pepito
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Nota de L. G.:
 
(*) Vd. último poste da série > 17 de Janeiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5662: Núcleo Museológico Memória de Guiledje (3): Algumas fotos do João Graça

Guiné 63/74 - P5662: Núcleo Museológico Memória de Guiledje (3): Algumas fotos do João Graça












Guimé-Bissau > Região de Tombali > Guileje > 10 de Dezembro de 2009 > c. 17h30/18h00 >  Fotos do médico João Graça, no regresso a Bissau, depois de seis dias em Iemberém...Guileje, a 18 km de Faro Sadjuma e a 36 de Iemberém,  é agora  uma terra de paz, onde os miúdos jogam à bola e onde está instalado um núcleo museológico que vai ser, a 20 de Janeiro de 2010 - Dia de Amílcar Cabral - ser oficialmente inaugurado, com a presença do Governo guineense... A antiga população de Guileje, da época da retirada em 22 de Maio de 1973, vive hoje em Mejo, a noroeste. Mas há já um pequeno núcleo habitacional em Guileje. Toda a região do Cantanhez pode vir a tornar-se um polo de desenvolvimento, a partir do ecoturismo.

Devido à hora tardia (o João levou 10 horas a chegar a Bissau, devido a avaria mecânica no jipe da AD, conduzido pelo Antero), já não houve tempo para visitas à Capela e ao Núcleo Museológico.  No exterior (vd. fotos acima) há equipamento militar usado tanto pelo PAIGC (anti-aérea quádrupla) como pelas NT (o famoso burrinho, o Unimog 411). (*) (LG)

Fotos: © João Graça (2010). Direitos reservados

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Nota de L.G.:

(*) 12 de Janeiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5633: Núcleo museológico Memória de Guiledje (2): Inauguração no próximo dia 20 de Janeiro, com a Júlia Neto a representar o nosso blogue