sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Guiné 63/74 - P7156: Memória dos lugares (103): Gadamael: a misteriosa sigla A.S.C.O já lá estava no tempo do Luís Guerreiro (1969) e do José Gonçalves (1974), dois camaradas que vivem no Canadá


Guiné > Região de Tombali > Gadamael > CART 2410 (1968/69) > Messe e quarto de sargentos... Terá sido também, em tempos, armazém comercial... A misteriosa sigla, A.S.C.O., já lá estava nessa época...




Foto: © Luís Guerreiro (2010). Todos os direitos reservados.




1. Mensagem de Luís Guerreiro, com data de 21 do corrente:


Assunto: Memória dos lugares Gadamael

Caro Luis:

Foi com bastante agrado que vi todas as fotos que o Pepito enviou de Gadamael.


Sobre o edifício em ruínas em 1968/69, quando da permanência da CArt 2410, era a nossa
messe e quartos de sargentos, e se a memória não me atraiçoa tinha sido armazém comercial.

No P3087, já tinham sido publicadas as minhas fotos de Gadamael, aonde o referido edifício se encontra , e com a nome ASCO bem legível, só que na altura ninguém prestou atenção. Vou voltar a enviar a mesma foto.

Por hoje é tudo

Cumprimentos



Luís Guerreiro


[Ex-Fur Mil do 4.º Gr Comb da CART 2410,
Os Dráculas, 
Gadamael, Ganturé e Guileje, 1968/70, 
 e mais tarde do Pel Caç Nat 65, 
Bajocunda e Buruntuma,  1970;  
a viver em  Montreal, Canadá, desde 1971]  






2. Mensagem do José Gonçalves, também de 21 do corrente (e de quem ainda não temos nenhuma foto; vive igualmente no Canadá):


Assunto: O enigma do edifício de Gadamael

Olá, Luis. 

Aqui te mando uma foto antiga do edificio em questão onde se pode claramente ver a insígnia ASCO que também não sei o que quer dizer mas pela foto antiga parece ter havido mais letras [, vd. foto à direita].  O edificio não era messe de oficiais mas sim de sargentos e tinha sido também enfermaria, (aliás foi aqui neste edificio que me prepararam para a evacuação de sintex para Cacine, no dia em que fui ferido,  17 Fev 1974).

 Depois dos ataques de 73 a enfermaria foi implantada mesmo em frente,  do outro lado da rua,  num abrigo em betão armado que se construiu para o efeito apesar de esta continuar a ser utilizada ainda mas não tinha camas .

A Messe de oficiais era mais perto da antiga pista e está identificada numa das fotografias que o Pepito mandou como sendo Instalações do comando, centro de transmissões e residência de oficias. Isto pederá ter sido antes de mim mas quando cheguei a Gadamael o centro do comando e transmissões (COP5)  estava nesse tal abrigo de betão armado,  perto do início da pista. Este edificio era a sede da secretaria da minha companhia,  messe de oficiais da minha companhia e alojamento para o 1º sargento e capitão. 

No meu tempo os oficiais e sargentos dormiam perto dos soldados. Eu dormia na mesma casa onde estava metade do meu Poletão e os furriéis faziam o mesmo.

Estranho que estes abrigos não tenham permanecido pois existiam dois. A enfermaria no local onde indiquei e o de telecomunicações no início da pista. O PAIGC talvez os tenha destruido.

Cumprimentos para todos os bloguistas

Alferes Mil Op Esp,
CCAÇ 4152/73
 (Gadamael Porto,  Jan 74/Jul 74)

Guiné 63/74 - P7155: Em busca de... (148): Aurino Barbosa Medeiros, ex-Fur Mil Operações Especiais/RANGER da 2ª CART do BART 6523 (António Barbosa)


1. O nosso Camarada António Barbosa (ex-Alf Mil Op Esp/RANGER do 1º Pelotão da 2.ª CART do BART 6523, Cabuca, 1973/74, enviou-nos em 18 de Outubro último o seguinte apelo:

Camaradas,

A razão do meu contacto é um pedido de ajuda para reencontrar o “meu” Fur Mil OpEsp/RANGER com o NIM 15228173, por isso da incorporação de 1973, de nome Aurino Barbosa Medeiros.

Aqui deixo o meu apelo a quem souber alguma indicação do seu paradeiro, pois após a nossa chegada a Lisboa nunca mais soube nada dele, por favor me contacte para o meu e-mail: a.antonio.barbosa@gmail.com ou para o telemóvel 936 470 419.


Eu e o Aurino Medeiros
Um Grande Abraço
António Barbosa
Alf Mil Op Esp/RANGER da 2.ª CART do BART 6523

Emblema de colecção: © Carlos Coutinho (2010). Direitos reservados.
Fotografia: © António Barbosa (2010). Direitos reservados.

___________

Nota de M.R.:
Vd. último poste desta série em:
6 de Outubro de 2010 > Guiné 63/74 - P7086: Em busca de... (147): Ademar Rodrigues, ex-1.º Cabo Escriturário da CCS/BART 6521 procura camaradas

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Guiné 63/74 - P7154: (De) Caras (5): Silate Indjai, um dos primeiros guerrilheiros do PAIGC a entrar em Guileje, dirige agora os trabalhos de detecção e limpeza de UXO (Pepito)


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > Outubro de 2010 > Escavações no antigo aquartelamento das NT, abandonado em 22 de Maio de 1973  > Foto nº 1 > Silate Indjai está a dirigir os trabalho de detecção e limpeza de minas e outros objectos explosivos não explodidos (UXO, em inglês). Foi  um dos primeiros guerrilheiros do PAIGC (*) a entrar no quartel após este ter sido abandonado. [Presumimos que seja nalu, natural do Cantanhez].


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > Outubro de 2010 > Escavações no antigo aquartelamento das NT, abandonado em 22 de Maio de 1973  > Foto nº 2 > Mais um abrigo destapado...


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > Outubro de 2010 > Escavações no antigo aquartelamento das NT, abandonado em 22 de Maio de 1973  > Foto nº 3 > Granadas de artilharia (obus 14, peça 11.4...?)


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > Outubro de 2010 > Escavações no antigo aquartelamento das NT, abandonado em 22 de Maio de 1973  > Foto nº 4 > Mais granadas de artilharia...


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > Outubro de 2010 > Escavações no antigo aquartelamento das NT, abandonado em 22 de Maio de 1973  > Foto nº 5 > Granadas diversas, incluindo de morteiro e bazuca.


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > Outubro de 2010 > Escavações no antigo aquartelamento das NT, abandonado em 22 de Maio de 1973  > Foto nº 6 > Restos de cunhetes, metálicos, de munições



Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > Outubro de 2010 > Escavações no antigo aquartelamento das NT, abandonado em 22 de Maio de 1973  > Foto nº 7 > Fragmentos de bombas da FAP


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > Outubro de 2010 > Escavações no antigo aquartelamento das NT, abandonado em 22 de Maio de 1973   > Foto nº 8 >  Novo abrigo descoberto



Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > Outubro de 2010 > Escavações no antigo aquartelamento das NT, abandonado em 22 de Maio de 1973  > Foto nº 9 > Restos de redes de arame de camas... [Ou ferro do cimento armado, Pepito ?]


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > Outubro de 2010 > Escavações no antigo aquartelamento das NT, abandonado em 22 de Maio de 1973   > Foto nº 10 > Mais vestígios de camas no abrigo [ ?]...


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > Outubro de 2010 > Escavações no antigo aquartelamento das NT, abandonado em 22 de Maio de 1973  > Foto nº 11 > [ Um tijolo, possivelmente, tijolo burro, que se usava para fazer o forno do p\ao,  com a marca da fábrica, possivelmente a Ceramica do Liz, SA, cuja historia remonta aos anos 30]...


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > Outubro de 2010 > Escavações no antigo aquartelamento das NT, abandonado em 22 de Maio de 1973  > Foto nº 12 > Um artefacto  produzido por um militar da CCAÇ 3325 (À direita, a sua efígie)... Recorde/se que a CCAÇ 3325 esteve em Guileje, de Fev a Dez 1971, comandada pelo Cap Jorge Parracho, hoje coronel na reforma.


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > Outubro de 2010 > Escavações no antigo aquartelamento das NT, abandonado em 22 de Maio de 1973  > Foto nº 13 > Uma garrafa de água mineral Bussaco...


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > Outubro de 2010 > Escavações no antigo aquartelamento das NT, abandonado em 22 de Maio de 1973  > Foto nº 14 > Garrafa de refrigerante Convento, produzida (se não me engano) por uma empresa do concelho de Mafra, a Francisco Alves & Filho, com sede na Venda do Pinheiro...

Fotos:  © Pepito / AD -Acção para o Desenvolvimento (2010) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados


1. Mail do Pepito, com data de 17 do corrente:


Amigo Luís

Como te disse em email anterior, o ex-quartel de Guiledje está a ser limpo de minas e UXO [, 2ª fase, incluindo o perímetro exterior].

A primeira curiosidade advém do facto de que quem está a dirigir o trabalho, Silate Indjai (foto 1), ter sido um dos primeiros guerrilheiros do PAIGC a entrar no quartel [, em 25 de Maio de 1973,] após este ter sido abandonado [, três dias antes].

Sobre a controvérsia sobre quem destruiu o quartel após este ter sido tomado, conta ele que, passados uns dias e já sem ninguém do PAIGC no quartel, a aviação portuguesa bombardeou e destruiu o quartel, tendo agora sido recolhidos fragmentos dessas bombas (foto 7). 

Diz ele [, Silate Indjai,]  que, estando por ali perto, ouviu esses bombardeamentos, corroborando testemunhos avulsos que já nos tinham sido relatados ao longo destes anos em que estamos a "trabalhar" em Guiledje. 

Mais, segundo ele, os guerrilheiros nunca mais voltaram a este quartel até ao fim da guerra. Por outro lado, diz que os canhões do PAIGC nunca poderiam perfurar a cobertura dos paiois subterrâneos.

Sem querer tirar conclusões definitivas, apenas disponibilizo mais este relato. 
Outras fotos:


Foto 2: um dos abrigos que foi agora "destapado" para se retirarem os morteiros [ou granadas de obus ?] (muito perto do Museu)

Fotos 3-4-5: morteiros [ granadas de obus] e outros
Foto 6: caixas dos morteiros [granadas]
Foto 7: fragmentos de bombas aéreas
Foto 8: novo abrigo descoberto
Foto 9-10: camas metálicas [ ?] nos abrigos novos 
Foto 11: foi desenterrado este "tijolo", alguém saberá o que quer dizer ou a que se refere?
Foto 12: estava à entrada de um abrigo e penso ser o nº de uma companhia
Fotos 13-14: garrafas intactas

abraço
pepito

PS - Perdoa-me as designações militares do equipamento, morteiros, etc. Não percebo nada do assunto. Vais receber muitos emails, cada um com a sua foto.



2. Comentário de L.G.:


Obrigado, Pepito, pelas fotos e legendas... E sobretudo pela paixão com que pões a malta a escavar as entranhas de Guileje, que ainda têm muito que contar... e que vais preservar no núcleo museológico Memória de Guiledje. Tentei dar uma ajuda, complementado as tuas notas... 

Isto é um verdadeiro trabalho de arqueologia... Mas, atenção, diz à tua rapaziada: Safety, first! A Segurança, acima de tudo!... Esses brinquedos de morte ainda hoje podem matar!... Não quero que um dia destes nos mandes nenhuma funesta notícia, em relação com a eventual deflagração desses tais UXO (engenhos explosivos por deflagrar, do inglês Unexploded Ordnance...), podendo originar uma tragédia... Na guerra, a morte pegava-se de caras (**)... Felizmente, estamos agora em paz...Mantenhas para ti, o Domingos, o Silate e restante rapaziada... LG


PS - Já agora, não tens a história (resumida) do Silate Indjai, como guerrilheiro ? Por onde é que ele andou, com quem andou, que recordações tem, etc... Há um silêncio muito grande por parte dos homens (e mulheres) que lutaram, de armas na mão, nas fileiras do PAIGC... As suas histórias de vida podem e devem ser passadas a escrito e divulgadas... O blogue é nosso...

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Guiné 63/74 - P7153: In Memoriam (56): Joaquim Djassi, ex-combatente do PAIGC, radicado em Lisboa, faleceu no dia 19 de Outubro de 2010 (Hugo Moura Ferreira)

1. Mensagem de Hugo Moura Ferreira (ex-Alf Mil da CCAÇ 1621, Cufar e Cachil, e CCAÇ 6, Bedanda, 1966/68), com data de 20 de Outubro de 2010:

Caro Carlos Vinhal:

Nesta época e na nossa idade por vezes somos confrontados com notícias que nos entristecem.

Foi o caso de hoje, quando recebi uma chamada do telemóvel do Joaquim Djassi, mas feita pela Leontina, sua mulher, a dar a triste notícia do falecimento do marido ontem à tarde, no Hospital de Santa Maria, onde ainda se encontra.

Ao perguntar-lhe do funeral, disse-me que sairá da Mesquita de Lisboa, na 6.ª feira, às 14h00. Não sei ainda para onde. O telefone de contacto é: 969 442 125.

Achei que era meu dever comunicar-te, no sentido de, se assim o entenderes, fazer circular a notícia.

Embora o Joaquim não fizesse parte da nossa Tabanca Grande e tivesse sido nosso IN no outro tempo, actualmente era uma amigo querido de alguns de nós.

Começou essa amizade quando, em Dezembro de 2007, alguns de nós fizeram uma almoçarada no restaurante dele, o Pelicano Dourado, que motivou o PosT 2334, do Marques Lopes. Mesmo, no dia 10 de Junho de 2009, houve mais um almoço que está representado em foto no Post T4531, do Hélder de Sousa/Francisco Allen, em que numa das fotos se reconhece o Joaquim sentando ao fundo.



Na foto, da esquerda para a direita: António Pimentel, Marques Lopes, Braima Baldé (de pé) e Joaquim Djassi

Penso que era conhecido, já que foi referenciado por diversas vezes e merece ser recordado como um indivíduo que acima de tudo acreditava na amizade acima das divergências que fizeram uma época.

Entretanto, desejo que as coisas estejam bem para ti e para os teus.

Um abraço camarigo
Hugo Moura Ferreira
CCaç 1621(Cufar)
e CCaç6 (Bedanda)
1966/68

Obs. - Negritos da responsabilidade do editor
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 25 de Fevereiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2579: Álbum Fotográfico do Hugo Moura Ferreira (3): Em Sangonhá, a sul de Gadamael, com a CCAÇ 1612 (1968)

(**) Vd. poste de Sábado, 8 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2334: Encontro de ex-combatentes, em Lisboa, no Pelicano Dourado (A.Marques Lopes)

Vd. último poste da série de 30 de Setembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7062: In Memoriam (55): António Domingos Rodrigues (1947-2010), natural de Torres Novas, ex-1º Cabo Trms Inf, CCAÇ 2590 / CCAÇ 12 (Contuboel e Bambadinca, Maio de 1969 / Março de 1971)

Guiné 63/74 - P7152: Os nossos camaradas guineenses (27): Dandi, natural de Jol, no chão manjaco, capitão da companhia de milícias do Pelundo, agraciado com Cruz de Guerra pelo Gen Spínola em 1972, fuzilado pelo PAIGC em 1975 (Manuel Resende / Augusto Silva Santos)



Guiné > Região do Oio > Jolmete > CCAÇ 2585 (1969/71) > O >Alf Mil At Inf Manuel Resende e o chefe de secção de milícias, Dandi, mais tarde Capitão da Companhia de Milícias do Pelundo...





Guiné > Região do Oio > Jolmete > CCAÇ 2585 (1969/71) > "Junto vou-te enviar uma foto, especial para mim, pois fui eu que a tirei em pleno mato, da última operação que ele [, o Alf Mosca,]  fez com o Capitão Tomás da Costa antes de ir para o CAOP. Como não tem legendas, vou explicar: ao centro, com as cartucheiras e ar de mau (para a foto) é o Cap Tomás da Costa; ao lado esquerdo,  sentado com a G3 ao alto no ombro,  é o Mosca; do lado direito em pé, sempre equipado a rigor, é o nosso amigo Dandi, que nunca facilitava em serviço (mais tarde também graduado em Capitão de milícia pelo Gen Spínola, em 72 Cruz de Guerra, e em 75 fuzilado)" (Manuel Resende, 16/6/2009).




Guiné > Região do Oio > Jolmete > CCAÇ 2585 (1969/71) > O Dandi, junto ao monumento da CCAÇ 2585


Fotos:  © Manuel Resende (2009). Direitos reservados


1. Excerto do depoimento do nosso camarada Manuel Resende, ex-Alf Mil At Inf, CCaç 2585/BCaç 2884 (Jolmete, Pelundo e Teixeira Pinto, 1969/71) (, foto à esquerda) (*):

(...) Neste apontamento quero e tenho o dever de salientar o contributo altamente positivo dos soldados africanos do Pelotão de Caçadores Nativos nº 59, comandado inicialmente pelo colega Alferes Mosca, e pela secção de milícias, comandada pelo chefe da milícia, o célebre Dandi, mais tarde promovido a Capitão de Milícia pelo Sr. General Spínola, e que já vinha com boas referências da companhia anterior [, CCAÇ 2366].


Sempre que saíamos para o mato estes homens iam sempre à frente, pois como conhecedores do terreno, sabiam como chegar ao objectivo. O Dandi,  natural do Jol, conhecia como ninguém todos os recantos da mata.

Bom guerrilheiro, bom caçador, muito nos ajudou a evitar cair em emboscadas, abrindo trilhos novos na mata. Quando saíamos para o mato com ele, ninguém tinha medo, por mais difícil que fosse a missão. Mais tarde fez parte do rol dos fuzilados [, a seguir à independência]. Sinceramente não sei se a Cruz de Guerra prometida pelo Sr. General Spínola lhe foi entregue antes de 1975. Que será feito dos outros?

Apesar do primeiro contacto a sério com o inimigo, já referido atrás, com 2 mortos e alguns feridos, o dia ou o facto que mais me marcou durante toda a comissão, e o fez profundamente, foi a morte dos Oficiais do CAOP, os três Majores e o meu colega Alferes Mosca (além dos outros três nativos) no dia 20 de Abril de 1970, em prol da paz e do entendimento dos povos do Chão Manjaco.

O Alferes Joaquim João Palmeiro Mosca pertencia à minha Companhia, a 2585, pois era comandante do Pel Caç Nat  59 (já referenciada) que fazia parte da Companhia, embora a rendição fosse individual. Em Set/Out de 1969 o Alferes Mosca foi convidado pelo CAOP em Teixeira Pinto, para cuidar das plantações experimentais que se começavam a desenvolver no Chão Manjaco, pois ele era Regente Agrícola de formação.

Como as suas qualidades para a Psico eram boas, foi convidado para colaborar nessa área com o Sr  Major Joaquim Pereira da Silva, Oficial de Informações e Coordenador da Acção Psicológica com as populações. (...)

2. Comentário de Agusto Santos Silva, ex-Fur Mil da CCAÇ 3306/BCAÇ 3833 (Pelundo, Có e Jolmete, 1971/73) (, foto à esquerda)

Olá Camarada e Amigo!


Sempre com Jolmete por fundo, aqui estou eu a saudar-te por esta tua iniciativa.

Por tua influência, juntei-me a este blogue, por minha influência (julgo), decidiste publicar no Correio da Manhã a tua passagem pela Guiné, mas aqui bem mais completa e esclarecedora.

Sabes uma coisa curiosa? É que eu antes de ser chamado para o serviço militar, estive na marinha mercante dos 18 aos 21 anos, e um dos navios em que prestei serviço foi precisamente no "Niassa", embora só em 1970. Outra curiosidade. Sabes onde eu moro? Em Almada, e nessa altura residia muito perto do quartel onde te foste apresentar, mas que hoje já não existe. Com algum atraso, as nossa vidas andaram cruzadas (Almada / Niassa/ Guiné / Jolmete).

Sobre o célebre Dandi... No meu tempo ele já era o Comandante da Companhia de Milícias do Pelundo, embora estivesse sempre no Jol, e já tinha sido agraciado com a cruz de guerra pelo General Spínola. Numa das operações (a mais difícil que me lembro), ele chegou a ser ferido com um tiro numa perna.

Era de facto um excelente guerrilheiro. Numa ocasião, para escaparmos a uma emboscada do IN, lembro-me que ele nos levou por um trilho de caça muito antigo que, segundo o próprio Dandi, já não passavam por lá pessoas há alguns anos.

Também me lembro de irmos fazer segurança ao local onde morreram o Alferes Mosca e os 3 Majores, para o General Spínola ir lá depôr uma coroa de flores, acto que sempre praticou enquanto se manteve na Guiné.

Um Grade Abraço,

Augusto Silva Santos
 
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Notas de L.G.:
 
(*) Vd. poste de 21 de Outubro de 2010 > Guiné 63/74 - P7151: Recortes de imprensa (34): A guerra do Manuel Resende, ex-Alf Mil At da CCaç 2585/BCaç 2884 (Correio da Manhã)
 
(**) Último poste da série > 13 de Junho de 2010 > Guiné 63/74 - P6586: Os nossos camaradas guineenses (26): O regresso do inesquecível Mamadu Camará (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P7151: Recortes de imprensa (34): A guerra do Manuel Resende, ex-Alf Mil At da CCaç 2585/BCaç 2884 (Correio da Manhã)


1. O nosso Camarada Manuel Resende*, ex-Alf Mil At da CCaç 2585 do BCaç 2884, que esteve em Jolmete, Pelundo e Teixeira Pinto, (1969/71), enviou-nos, com data de 19 de Outubro de 2010 a seguinte mensagem:

A Minha Guerra
Manuel Cármine Resende Ferreira, 63 anos, reformado.
Casado, com uma filha.
Mobilizado para a Guiné, Jolmete, como Alferes Miliciano.
Embarque a 7 de Maio de 1969.
Regresso a 2 de Março de 1971.

Fui mobilizado para a Guiné em Fevereiro de 1969. Após a minha recruta como cadete na Escola Prática de Infantaria em Mafra, de Julho a Setembro de 1968 (3º turno), foi-me atribuída a especialidade de “Atirador de Artilharia”, por isso fui “tirar” a especialidade em Vendas Novas, na Escola Prática de Artilharia, de Outubro a Dezembro de 1968. Terminado o curso fui colocado nos Açores, no Regimento … (não me lembro o nome) nos Arrifes, em Ponta Delgada, para onde segui em meados de Janeiro de 1969, no navio “Angra do Heroísmo”.
Cerca de um mês depois de lá estar recebi ordem de marcha para me apresentar no quartel do Pragal (Almada) para fazer o IAO (Instrução de Aperfeiçoamento Operacional), a fim de ser integrado no Batalhão de Caçadores 2884, que seguiria para a Guiné. Como o transporte era escasso, esperei pelo próximo barco, o FUNCHAL, que saiu de Ponta Delgada em 28 de Fevereiro de 1969, dia do grande tremor de terra aqui no continente. Este Batalhão era constituído pela Companhia de Comando e Serviço (CCS), e pelas Companhias Operacionais 2584, 2585 e 2586. A minha seria a Companhia de Caçadores 2585. Feito o IAO embarquei para a Guiné a 7 de Maio de 1969, no paquete Niassa, onde cheguei a 12 do mesmo mês.
Após alguns dias em Bissau disfrutando daquele calor intenso e húmido, o Batalhão foi para Pelundo (zona de Teixeira Pinto), onde ficou sediada a Companhia CCS e a Companhia Operacional 2586, tendo sido atribuído o destacamento de “Jolmete” à minha Companhia 2585 e “Có” à 2584.
No dia 17 de Maio chegamos a Jolmete, onde fomos recebidos pela Companhia 2366 que nos esperava e íamos substituir. Nos dias que estivemos em Bissau fomos informados pelo Governador e Comandante-Chefe Sr. General Spínola, que a responsabilidade da nossa Companhia, a 2585, iria ser muito grande, pois íamos substituir uma das melhores Companhias Operacionais da Guiné (acção psicológica já a funcionar).
Foi-nos dito que esta Companhia, comandado pelo Sr. Capitão Barbeites, era considerada uma das melhores companhias operacionais da Guiné, quer pelo seu trabalho operacional, quer pela obra começada da construção do quartel a partir do nada, e que nós (2585) soubemos continuar.
Chegamos na altura da transição do tempo seco para a época das chuvas, que começava a 15 de Maio, e que de facto começou. Foi uma sensação muito estranha, para quem não estava habituado, chuva torrencial e calor ao mesmo tempo. Com as chuvas começava a época da bicharada. Coisas que só compreende quem lá esteve …
A nível operacional, nos dez dias de sobreposição de companhias, tudo correu bem. Saíamos em patrulhamentos com os grupos de combate da companhia cessante, mas não íamos para zonas perigosas.
O interesse da 2366 era passar o testemunho da melhor maneira possível, sem correr grandes riscos, pois a “peluda” estava próxima. No dia em que a Companhia cessante se foi embora, a 27 de Maio, começaram os nossos problemas com 2 mortos e vários feridos, não em combate, mas por acidente com arma de fogo.
Ao chegarmos ao quartel, depois da operação de segurança e protecção à coluna auto que levou a 2366 para o Pelundo, o soldado que transportava a BASUCA ao retirar a granada da arma, talvez por deficiência da mola ou por descuido, ela caiu pelo tubo, explodindo ao tocar no chão.
Este foi o primeiro contacto com a triste realidade das mortes e evacuações. A partir deste dia, entregues a nós próprios, começamos a fazer a nossa guerra. Fazendo uma retrospectiva devo concluir que não nos demos muito mal com o sistema adoptado. Saídas diárias evitaram flagelações ao quartel, que nunca tivemos, todavia emboscadas no mato eram constantes.
Nos 21 meses de mato a Companhia esteve 28 vezes debaixo de fogo, e eu com o meu grupo de combate (4º Grupo) estive 22. Lembro perfeitamente como se fosse hoje a primeira emboscado a sério em que caímos. Emboscada em “U” em que nós entramos pelo centro. Foi a 22 de Julho de 1969. Tivemos 2 mortos e vários feridos por tiro de RPG 2 e respectivos estilhaços.
“HOMENAGEM”
Neste apontamento quero e tenho o dever de salientar o contributo altamente positivo dos soldados africanos do Pelotão de Caçadores Nativos Nº 59, comandado inicialmente pelo colega Alferes Mosca, e pela secção de milícias, comandada pelo chefe da milícia, o célebre “DANDI”, mais tarde promovido a Capitão de Milícia pelo Sr. General Spínola, e que já vinha com boas referências da companhia anterior.
Sempre que saíamos para o mato estes homens iam sempre à frente, pois como conhecedores do terreno, sabiam como chegar ao objectivo. O Dandi natural do Jol, conhecia como ninguém todos os recantos da mata.
Bom guerrilheiro, bom caçador, muito nos ajudou a evitar cair em emboscadas, abrindo trilhos novos na mata. Quando saíamos para o mato com ele, ninguém tinha medo, por mais difícil que fosse a missão. Mais tarde fez parte do rol dos fuzilados. Sinceramente não sei se a Cruz de Guerra prometida pelo Sr. General Spínola lhe foi entregue antes de 1975. Que será feito dos outros?
Apesar do primeiro contacto a sério com o inimigo, já referido atrás, com 2 mortos e alguns feridos, o dia ou o facto que mais me marcou durante toda a comissão, e o fez profundamente, foi a morte dos Oficiais do CAOP, os três Majores e o meu colega Alferes Mosca (além dos outros três nativos) no dia 20 de Abril de 1970, em prol da paz e do entendimento dos povos do “Chão Manjaco”.
O Alferes Joaquim João Palmeiro Mosca pertencia à minha Companhia, 2585, pois era comandante do Pel. Caç. Nat. 59 (já referenciado) que fazia parte da Companhia, embora a rendição fosse individual. Em Set./Out. de 1969 o Alferes Mosca foi convidado pelo CAOP em Teixeira Pinto, para cuidar das plantações experimentais que se começavam a desenvolver no Chão Manjaco, pois ele era Regente Agrícola de formação.
Como as suas qualidades para a “PSICO” eram boas, foi convidado para colaborar nessa área com o Sr. Major Joaquim Pereira da Silva, Oficial de Informações e Coordenador da Acção Psicológica com as populações.
Estas acções da “psico” deram tantos frutos que praticamente de Novembro de 1969 a 20 de Abril de 1970 (fatídico dia), não tínhamos contactos com o “IN”, nem tínhamos autorização para abrir fogo em primeiro lugar, caso os víssemos, tendo até havido alguns que se entregaram voluntariamente. Sabíamos que o “IN” procedia exactamente como nós, pois as ordens que tinham eram iguais.
O Major Magalhães Osório e o Major Passos Ramos estavam mais ligados à parte operacional, como planeamento de operações conjuntas e afins e que nos visitavam diariamente do ar, com a sua DO, a perguntar se estava tudo bem, se era preciso alguma coisa, pois sabiam a nossa posição exacta no mato. Estes dois Majores e o respectivo comandante, Coronel Alcino, eram visita constante ao nosso quartel em Jolmete.
Como a Companhia estava empenhada na construção de casas para a nossa população, composta quase exclusivamente por militares do Pel. Caç. Nat. 59 e milícias, com as respectivas famílias, foi uma época propícia à descoberta e transporte de matéria prima para as obras: pedras, que eram poucas e madeiras que íamos procurar junto ao rio Cacheu, completamente avontade e sem grande segurança. Na minha modesta opinião e traduzindo os sentimentos da altura, perdemos ali, de uma só vez, um conjunto de Oficiais único e inigualável. Mas como dos fracos não reza a História, é por isso que ainda hoje eles são falados…
Escusado será comentar que as tréguas que existiam acabaram nesse dia. Nos meses que se seguiram até ao fim do ano de 1970 tivemos uma actividade operacional muito intensa. Felizmente não houve mais baixas. Passamos a pasta à Companhia que nos sucedeu a C Caç 3306 em Fevereiro de 1971, tendo regressado a Bissau para embarque. Após alguns dias de atraso do “UIGE”, embarcamos a 26 de Fevereiro, tendo chegado ao cais de Alcântara em 2 de Março de 1971.
Era costume o Sr. General Spínola convidar para um jantar de despedida com bate-papo os comandantes de Companhia (Capitães) e um dos alferes de cada companhia antes do embarque de regresso. Em relação à minha Companhia a 2585, O Sr. General fez questão de convidar todos os alferes além do Capitão, como recompensa pela actividade desenvolvida.
Ainda me lembro que o prato foi arroz de frango. Nessa altura já o Sr. General Spínola dizia que a Guiné não tinha solução pela guerra. Manifestava muitas ideias que mais tarde veio a publicar no seu livro “Portugal e o Futuro”.

Nº 1 – A bordo do Niassa, a caminho da Guiné. O sentimento dominante era de expectativa.

Nº 2 – Operação de patrulhamento comandada pelo nosso Capitão Tomaz da Costa, sentado ao centro. Do seu lado esquerdo, em pé, Dandi, sempre equipado a rigor; à sua esquerda, sentado, o Alf. Mosca.

Nº 3 – Atravessamento de uma bolanha à chegada de uma operação. O nosso quartel estava rodeado por bolanhas.

Nº 4,5 e 6 – Recolha de materiais, madeiras e pedras, para construção de abrigos e casas para a população.

Nº 7 – Eu com o Dandi, que mais tarde foi promovido a capitão de Milícia.

Um abraço,
Manuel Resende
Alf Mil At da CCAÇ 2585/BCAÇ 2884

Fotos: © Manuel Resende (2010). Direitos reservados.
__________
Nota de M.R.:

Vd. último poste desta série em:

3 de Outubro de 2010 > Guiné 63/74 - P7075: Recortes de imprensa (33): A guerra do Alberto José dos Santos Antunes, ex-Fur Mil da CCaç 5 (Correio da Manhã)

(*) Vd. também o poste da CCAÇ 2585 do BCAÇ 2884:

14 de Setembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2106: Tabanca Grande (33): Apresenta-se José Rodrigues Firmino, ex-Soldado Atirador (CCAÇ 2585 / BCAÇ 2884, Jolmete, 1969/71)

Guiné 63/74 - P7150: Tabanca Grande (249): Carlos Fernandes, ex-1º Cabo Pára (CCP 122, 1971/74) e ex-elemento do Grupo Os Vingadores, do Alf Grad Marcelino da Mata


Guiné > Bula > 1973 > O grupo Os Vingadores, comandado pelo Alf Graduado Marcelino da Mata, no dia em que receberam as Boinas Vermelhas. Na foto, dois militares do BCP 12, o Cap Pára Valente dos Santos (conhecido por Capitão Asterix) e o 1º Cabo Pára Carlos Fernandes (na ponta esquerda). O grupo terá sido fuzilado pelo PAIGC, depois da independência, com excepção de um elemento gravemente ferido, evacuado para Lisboa,  bem como do Marcelino da Mata, que saiu oportunamente da Guiné. A informação é da autoria do Carlos Fernandes.




Guiné > S/l > O 1º Cabo Pára Carlos Fernandes, da CCP 122 / BCP 12 (Bissalanca, 1971/74) > Legenda do autor: "Eu e aminha MG 42"... 



Guiné > S/l > Brasão da CCP 122 / BCP 12... O Carlos Fernandes chegou à Guiné em Novembro de 1971 e saiu em  Agosto de 1974. O Carlos diz ter pena de não ter hoje 20 anos, para poder continuar nos páras, e servir a Pátria no Kosovo ou no Afeganistão.


Fotos : © Carlos Fernandes (2010) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados.


1. Mensagem do Carlos Fernandes, ex-1º Cabo pára-quedista, CCP 122 / BCP (Bissalanca, BA 12, 1971/74) que passa a partir de hoje a integrar, de pleno direito, a nossa Tabanca Grande. 

Com este poste completa-se a sua apresentação e fica registada a sua vontade expressa de se reunir a este grupo, virtual, de antigos combatentes da Guiné (1963/74), unidos por laços de camaradagem e pelo desejo de partilhar memórias desse tempo e desse lugar. Em meu nome, dos demais editores e dos restantes camaradas, desejo-lhe as boas vindas (*):


Data: 19 de Outubro de 2010 15:47
Assunto: Sobre a Ambulância


Boa tarde, amigo Luís Graça


Eu, Fernandes, antes de mais pretendo enviar as maiores saudações, para todos os camaradas de armas neste magnífico blog.

Pretendo e desejo dizer que não é o meu intuito falar mal de quem seja, ou chamar nomes a qualquer pessoa, se bem que por vezes temos essa vontade e também um desejo enorme de dizer algo, que nos vai na alma... Mas foi com total respeito que eu fiz a minha entrada, muito ao de leve, no teu blog e em companhia de bons amigos. Por sinal e não por acaso como dizem na gíria ser por acaso porque não existe,  mas sim caso ou casualidade, que já obti notícias de ex-colegas do mesmo pelotão e da mesma companhia da Guiné. Magnífico!...

Luis Graça,  o que de momento me leva a enviar estas palavras  é para falar a respeito da notícia sobre a Ambulância, que foi capturada entre Copá e a Fronteira. Eu estive nessa operação, eu e o Capitão Asterix (que não era o Ramos, mas sim o Valente dos Santos). 

Nessa altura,  ou seja entre fins de 1973 a Agosto de 74, quem fez parte do COE, foram o Major Veiga da Fonseca,  do Exército,  já falecido,  e o Capitão Pára Valente dos Santos de quem junto uma foto de grupo, onde estou eu e o Valente dos Santos [, vd. foto acima]. Foi tirada em Bula a quando da entrega das Boinas Vermelhas. Foi o nosso grupo o primeiro a usar tal cor de boina.


Hoje a Boina, que o Marcelino usa nesta foto , que também junto [, à esquerda], fui eu que lha ofereci, antes de ter vindo viver para a Madeira. Dei-lhe o crachá bem como os emblemas do grupo,  os Vingadores.

Pois nessa operação, que teve por nome Gato-Zangado, em Fevereiro de 74, saímos de Bajocunda,  andámos toda a noite... A operação consitia em armadilhar as linhas de água, com as "Bailarinas" e as "Viúvas Negras", pelo Alferes Tarro,  do Exército. Eu fiquei encarregue de lhe fazer a segurança,  a esse Alferes. 

Já tinhamos colocado algumas armadilhas na zonas de água e estavamos no nosso descanso, quando aparecem dois sujeitos da população do PAIGC, com uns baldes, para irem buscar água, dentro do território deles. Aí começa a caça ao inimigo. Houve uma troca de tiros e,  na perseguição, encontrámos caixotes de Armamento, granadas de RPG, bem como Armas. 



Guiné > Zona Leste > Região de Gabu > Ambulância, de origem russa, capturada ao PAIGC em Copá, Fevereiro de 1974. 



Foi pedido apoio aéreo, na retirada do material, e foi numa das voltas do héli-canhão, que se deu com algo escuro, que de cima não deu para ver o que seria. Foi com base na informação do piloto do héli, que deparámos com uma viatura tipo Ambulância que se encontrava tapada, camuflada com árvores cortadas, com o sistema de ligação estragado. Foi o Marcelino que conseguiu colocá-la a trabalhar,  depois de pedir combustível a Bajocunda, que era o quartel mais perto. Depois a Ambulância foi levada até Massacunda, local onde estava uma coluna de mantimentos para Copá e Bajocunda.

No dia seguinte à captura da Ambulância, tivemos um forte contacto,  muito bem cedo. Era um forte grupo, isto dito pelo Marcelino,  para cima de 100 guerrilheiros do PAIGC e com elementos Cubanos a comandar. Neste contacto foram feitos vários feridos e creio que também houve mortos pelo nosso lado, do lado do pessoal do Exército da coluna, que era para seguir para Copá. Essa coluna  não foi levada para diante. O grupo de guerrilheiros tinha estado de noite a enviar fogo para Copá.

O Capitão Valente dos Santos pediu apoio aéreo dos Fiat e a Ambulância foi levada depois para Bajocunda e também com um grupo de Milícias a dar proteção à restante coluna.

Pois eu até levei um louvor nessa operação, bem como depois levei outro louvor, já na operação Bétula, em Março de 74 na zona de Jumbembem [ou Jemberém ?], perto de Cacine, que deu a origem a uma cruz de guerra de 4ª classe, proposta pelo Marcelino da Mata.

Nesta operação foi para dar apoio moral e também dizer ao IN que seria possível os travar nas intenções deles se bem que,  no quartel de Jumbembem, estaria não uma Companhia, mas sim um Batalhão,  perto de mil e tal homens, mas não tinha ordens de fazer fogo pela assinatura do Governador da Guiné. 



Ao Grupo do Marcelino da Mata coube dar apoio ao pessoal,  em conjunto com os Fuzileiros Negros de Cacine, creio que era o Destacamento 2 comandada por um Tenente branco Fuza. Eu aí conheci o Látas, bem como o Guiné, Fuzileiros Especiais, que foram guardas-costas de um Comandante dos Fuzas, que não me recorda agora o nome dele.


Esta operação de facto teve o nome de Bétula, feita no mês de Março e iniciou-se de noite, com a saída de Cacine antes da meia noite, em botes da Marinha. Andámos rio acima, rio abaixo, tudo por culpa do Oficial da Marinha, que não soube dar com a entrada no local, fomos colocados já de manhã cedo, era dia e ao iniciarmos a entrada no tarrafo, que era lama, levámos uma emboscada de todo o tamanho, pois que o IN teve a possibilidade de fazer valas de noite, à nossa espera.

Nesta operação foi morto um chefe de grupo do IN, que tinha uma Kalash Especial, com um tambor de 40 munições,  que só os chefes de grupo é que as usavam, como aconteceu em Moçambique com as Armlites,  a menina R10 de alça. Os números do grupo apontados pelo Marcelino eram da ordem dos 80 elementos. A minha posição era (e sempre foi) a 3ª . O 1º era um elemento do grupo com a Kalash,  em 2º o Marcelino [, foto ao lado], eu em 3º e o Capitão Valente dos Santos em 4ª posição. Eu fui guarda-costas do Valente dos Santos, era a minha função no grupo.


Tivemos metade do grupo ferido e foi nesta operação que o Marcelino foi ferido com uma bala nas costas e onde um elemento levou uma rajada nos joelhos, sendo mais tarde evacuado para Lisboa.

Quanto aos restantes elementos do grupo,  tirando o Chefe e mais este da rajada,  todos eles foram fuzilados pelo IN, depois da Independência da Guiné.






Guiné > Região de Tombali > Aldeia Formosa > CCP 122 / BCP 12 > 2 de Abril de 1972 > O 1º Cabo Pára-quedista Carlos Fernandes, apontador de MG 42, fotografado com um casal feito prisioneiro: em primeiro plano, a criança,  do sexo feminino, filha do casal, completamente nua, levada pela mão do Carlos... A foto foi tirada pelo enfermeiro  do pelotão, o Serra.



Quanto à operação da foto de início, que deu origem à minha entrada na Tabanca Grande (*) pretendo dizer que foi na zona da Aldeia Formosa, em que diziam que o Nino estaria por aqueles lado. Antes de sairmos para a dita operação ou para o mato, foi-nos comunicado pelo héli-canhão, que fazia reconhecimento das zonas. Fizemos um Héli-Assalto, que deu com as três figuras meios escondidas [, um homem, uma mulher e uma criança, do sexo feminino]. 

O Comandante Araújo e Sá estava na Aldeia [ Formosa] e foi pedido voluntários das armas pessadas, para irem buscar  o casal, mais a miúda nua (que estava com muito medo devido às munições do héli, que eram de ponta vermelha incendiárias).

Quanto ao fotógrafo,  foi o Enfermeiro do pelotão,  o Serra, camarada de quem perdi o rastro. Não sei nada dele, desde a minha saída da Guiné, já tentei saber o paradeiro dele mas até agora não o consegui encontrar.

Já agora digo que conheço o [Sargento] Mor Rebocho. Foi por ele que eu apanhei a minha 1ª porrada na tropa. Se eu fosse mulher não me perdia de amores por ele. Isto ao fim de 3 anos... E depois daí apanhei mais 3, que no total foram 4 porradas.  A 3ª tinha eu 8 dias de Guiné e foi em Teixeira Pinto.

Haveria mais coisas para contar, mas fica para uma outra altura e já agora me deixa dizer, eu não fui herói, mas sim fui um Combatente. Fui bem treinado no ano de 1968 e tenho pena,  na data presente de 2010, não ter 20 anos, para poder ir até ao Kosovo ou ao Afeganistão.


Envio um forte abraço muito amigo para ti,  Luis,  e para todos os Camaradas de armas,  sejam eles quais forem. Um bem haja a todos.

Carlos Fernandes

[ Revisão / fixação de texto: L.G.]
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Notas de L.G.:

(*) Último poste desta série > 20 de Outubro de 2010 > Guiné 63/74 - P7147: Tabanca Grande (248): Augusto José Saraiva Vilaça, ex-Fur Mil da CART 1692/BART 1914 (Sangonhá e Cacoca, 1967/69)


(**) Vd. poste de 7 de Outubro de 2010 > Guiné 63/74 - P7093: (De) Caras (4): Eu também estive lá (Carlos Fernandes, ex-1º Cabo Pára-Quedista, CCP 122/BCP 12, 1971/74)


quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Guiné 63/74 - P7149: Memórias e histórias minhas (José da Câmara) (22): Aventuras em terras manjacas

1. Mensagem de José da Câmara (ex-Fur Mil da CCAÇ 3327 e Pel Caç Nat 56, Guiné, 1971/73), com data de 26 de Setembro de 2010:

Meu caro amigo Carlos Vinhal,
Junto encontrarás mais uma história simples sobre as minhas andanças por terras manjacas. Deixo à apreciação dos nossos camaradas os choques de vivências diferentes e os preçários então praticados em terras manjacas.

Para ti, para todos os camaradas e vossos familiares um grande haja saúde.
Um abraço amigo,
José Câmara


Memórias e histórias minhas (22)

Aventuras em terras manjacas

Na Mata dos Madeiros éramos, constantemente, surpreendidos com situações muito diversas. Resolvê-las era, em muitos casos, um problema que dependia mais da capacidade humana de cada um, sem esquecer o lado militar.
A incompreensão na solução das situações que nos surgiam, poderia levar a uma situação de rotura do elo de ligação entre comandos e comandados, o elo de respeito humano.

Numa das minhas saídas para a mata, fui surpreendido com um pedido formulado pelos militares da minha Secção. Queriam, pediram eles, aproveitar a nossa próxima folga de serviço para irmos a Teixeira Pinto. Bem me apercebi das suas intenções!

Bajuda Manjaca (Edição da Confeitaria Império - Bissau)

A minha reacção imediata foi negativa. Ainda tinha bem presente a emboscada feita aos Comandos, os tiros disparados pelo Fur Mil André Fernandes sobre algo suspeito, não identificado, que pressentira quando acabara de emboscar para a noite, as duas morteiradas que caíram para os lados do Balenguerez tentando localizar as nossas forças, através de uma possível resposta destas e a prisão de dois homens na mata e que acabámos por deixar ir.

Confesso que também não sentia nenhum à-vontade em fazer a deslocação para Teixeira Pinto, sobretudo o troço até ao Bachile. O perigo entre este quartel e a Ponte Alferes Nunes era menor. Para além disso, também levei em conta o facto de nunca termos estado em Teixeira Pinto, nem termos tido qualquer contacto com as populações manjacas, para além daquele que tínhamos com alguns dos capinadores, sobretudo os jovens, que nos acompanhavam no acampamento.

Notei o desânimo estampado na cara daqueles moços, tão jovens quanto eu, ao receberem o meu não imediato. Não falámos mais no assunto, mas não deixei de pensar nele. Quanto mais pensava na minha reacção menos à-vontade me sentia.

Na manhã seguinte, de regresso ao acampamento, fui ter com o nosso Cap Mil Rogério Alves, a quem coloquei o assunto. Tal como eu, a sua recusa foi imediata e pelas mesmas dúvidas que me tinham assaltado. Acrescentou o facto de, em caso de ataque, o acampamento ficar com menos uma Secção na defesa.

Para a sua última dúvida em não podia ter resposta. Já a nossa segurança no percurso até à ponte Alferes Nunes poderia ser garantida com algum atraso na escolta da tarde ao Bachile. Na manhã seguinte, a minha Secção também não chegaria a tempo de ir para a mata, mas poderia apanhar a primeira escolta do dia ao Bachile.

O capitão lá foi acrescentando que o pessoal estava farto de ração de combate, bacalhau com grão, dobrada desidratada com feijão, entre outros, que me autorizava a ir a Teixeira Pinto, mas que eu teria que trazer carne fresca e que me responsabilizava pelo comportamento da Secção.

Há muito aprendera que, nas nossas circunstâncias, a única certeza que tínhamos era a incerteza. Por isso, guardei segredo até momentos antes de acabarmos os nossos deveres do dia. Que, diga-se, acabaram logo ali...

Havia que preparar o atavio para a saída. Camuflado a preceito, botas engraxadas, brilhantina e água de cheiro bem carregadinhas, tudo em nome das pu(r)as donzelas de Teixeira Pinto.

Já nesta vila, dei-lhes conta da promessa que fizera ao Capitão. Todos compreenderam o que estava em jogo. Nenhum perguntou, nem era necessário, o que me fizera mudar de opinião. Pediram-me que os acompanhasse... só para o jantar. Fi-lo com gosto!

Passeio açorianíssimo em Teixeira Pinto: José Câmara e o Chaves (St. Maria) da CCaç 2791


Sobre este assunto, foi assim que escrevi à minha madrinha de guerra.

Mata dos Madeiros, 11 de Maio de 1971
Ontem... Ao chegar de outra operação tinha 2 cartas para mim: uma tua e outra de meus tios. Em boa verdade, até dispensei a minha Secção por um quarto de hora para as ler. Sabes que horas eram?! Nada mais nada menos que cinco horas da manhã e as cartas foram lidas à luz dos faróis da viatura que ía sair comigo.


Isto é assim: chegámos do mato e não se pára, o trabalho continua. Só vim a descansar a partir das duas da tarde e fui a Teixeira Pinto com os meus rapazes, tendo regressado há pouco.

O passeio foi agradável. Umas voltas por lá com um bom bife à noite (tirei a barriga da miséria) e fui ao cinema. O pior seria à noite na cama. Todas as vezes que me mexia acordava. Ela era tão mole que me dava vontade de dormir no chão. Só para não perder o hábito!

De manhã, logo pelas 6 horas, fomos à procura de vacas, porcos, cabritos e galinhas. Nunca tinha ido e acredita que já tive muitos problemas e horas de boa disposição. Mas, as duas ao mesmo tempo não acontecem muitas vezes.
Fomos até a uma tabanca e os soldados que estavam comigo iam entrando nas casas. Nos quartos das casas estavam os cabritos, os porcos e tudo o mais, que nem parece deste século.

Toda aquela bicharada punha-se a fugir quando entrávamos e cheguei a pensar que estavam ensinados nesse sentido. Para apanhar duas vacas levámos quase uma hora e meia. Uma pesava 90 kgs e a outra 110 kgs. Paguei pela primeira 630$00 e pela segunda 770$00. Pagámos 7$00 por kilo. Também apanhámos um porco que custou 70$00, um cabrito pelo mesmo preço e uma galinha que custou 12$50.
Imagina a festa que é ver 11 homens a correr atrás de uma vaca, de uma galinha, ou os mergulhos às pernas dos animais.

O pior viria a seguir. Quando estávamos para vir embora começaram a tocar batuque e e a dançar, numa última despedida às suas vacas. Tive pena daquela pobre gente. É que eles guardam e estimam os animais.

A reacção daquelas gentes fez-me lembrar as famílias açorianas quando embarcavam os seus animais com destino ao mercado continental. Ficava sempre a tristeza de ver partir os bichinhos que, durante mais ou menos anos, tinham feito parte das suas vidas. Porém, compreendia-se que esses animais iriam cumprir a missão para que tinham sido criados e sustentados: ajudar, financeiramente, o agregado familiar.

Em Teixeira Pinto fomos encontrar realidades bem diferentes, sobretudo as de crença religiosa.

Os manjacos professavam o animismo, acreditavam no IRÃ e abominavam o roubo. Por isso mesmo, a sua cooperação foi, na prática, nula. Daí o termos entrado nas suas moradias à procura dos animais. Não acredito que o fizemos por sermos mais fortes, mas porque a necessidade se impunha. Tanto assim é que, quando se negaram a dar um preço pelos animais, nós levámos estes e seus donos à Administração Civil. Foi aqui que os animais foram avaliados e pagos.

Ao regressar à Mata dos Madeiros, mal sabia que voltaria a viver situações semelhantes num futuro relativamente próximo. Mas com a lição aprendida! Passei a contactar o chefe da tabanca para ajudar no processo.

José Câmara
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 30 de Setembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7059: Memórias e histórias minhas (José da Câmara) (21): Um abraço de paz na Mata dos Madeiros