A apresentar mensagens correspondentes à consulta petromax ordenadas por relevância. Ordenar por data Mostrar todas as mensagens
A apresentar mensagens correspondentes à consulta petromax ordenadas por relevância. Ordenar por data Mostrar todas as mensagens

quarta-feira, 26 de julho de 2017

Guiné 61/74 - P17620: Fotos à procura de... uma legenda (87): o luxo de um "petromax" da Casa Hipólito nas noites escuras como breu...



Guiné > Região leste > Bambadinca > Setor L1 > Destacamento da Ponte do Rio Udunduma > Setembro de 1973 > CART 3494 (Xime e Mansambo, 1971/74) > "A mesa polivalente, onde se comia, escrevia, li, jogava e conversava. Em suma: o espaço de socialização e de partilha. Da esquerda para a direita: Gregório Santos, José Sebastião, Ricardo Teixeira e eu [, Jorge Araújo,] participando no 'matabicho' das tardes, preparando-nos para mais uma noite de muitas estrelas."

[Assinalado a amarelo está um candeeiro a petróleo de camisa ou "petromax", cuja marca se desconhece. Seria da Casa Hipólito, de Torres Vedras, do modelo 350? "Petromax" era uma marca registada, de origem alemã, que  entrou no nosso vocabulário... O vocábulo foi grafado e é usado em diversos postes publicados no nosso blogue.]

Foto (e legenda): © Jorge Araújo  (2017). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar:  Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Comentário do nosso editor LG ao poste P17616  (*):

"Candeeiro antigo a petróleo Hipólito 350'"
(Com a devida vénua, OLX)
ID do anúncio: 514081809

Jorge:

Em relação ao 'resort' da ponte do Rio Udunduma, onde também passei algumas belas noites de céu estrelado, com miríades de insetos, deixa-me dar-te conta da minha inveja e admiração: quatro anos depois, já havia, em meados de 1973,  "minibar" e, de vez em quando, "arroz de pato da bolanha"... além de jipe às ordens e petromax!...

Melhor que nada, a verdade se vocês tivessem que pagar IMI, já tinham, na avaliação do "prédio urbano" mais uns pontozinhos a melhorar o coeficiente de qualidade e conforto...

Parabéns pela vossa imaginação e vontade de dar a volta às contrariedades: não me lembro de, na minha companhia, haver um raio de um petromax, da Casa Hipólito (que se exportava para Cuba!)... Ou então alguém se abotoava com os petromaxes que, em África, eram um tesouro!...


Petromax (marca registada) era um candeeiro a petróleo de camisa. Era usado na iluminação pública, doméstica e na pesca ao candeio.

Segundo a descrição da Wikipédia, "consta de um depósito, onde está introduzida uma bomba de pressão, do qual sai um tubo tendo na extremidade um vaporizador e fixa a este uma camisa em seda em forma de lâmpada, protegida por um cilindro em vidro. No cimo tem uma chaminé por onde saem os gases."

[Imagem à esquerda: 

"Autocolante s/ data. As lanternas de incandescência começaram a ser fabricadas pela Casa Hipólito em 1949. Em 1950 iniciou-se a sua comercialização." Foto de perfil da página do Facebook Memórias da Casa Hipólito de Torres Vedras. Com a devida vénia ao autor da página Joaquim Moedas Duarte, criada no âmbito do Mestrado em Estudos do Património, da Universidade Aberta de Lisboa.]


2. Tudo indica que nos primeiros anos da guerra na Guiné o uso do "petromax" (ou lanterna de incandescência...)  fosse mais generalizado, servindo inclusive para iluminar o perímetro de defesa dos aquartelamentos, como no caso de Bedanda, por exemplo, ao tempo do nosso camarada Rui Santos, em 1963.

Em Binta, em 1964, no tempo do JERO, jogava-se o "King" à luz do "petromax"... Em muitos abrigos, deveria haver "petromaxes"... Em Beli, o Armindo Alves, 1.º cabo enf da CCAÇ 1589 (1966/68), prestava primeiros socorros, à noite, à luz do "petromax"... Depois vieram os geradores e passou a haver luz elétrica, pelo menos à noite... Mas, nos destacamentos, como o Biombo, em 1970, ou Banjara, em 1967, continuava a recorrer-se ao "petromax"...

Em sítios isolados (destacamentos, tabancas em autodefesa, etc.), o uso do "petromax" levantava questões de segurança... De qualquer modo, as companhias deviam ter, em "stock", este precioso utensílio... mas era preciso garantir a disponibilidade de petróleo e de "camisas"...

Não me lembro no meu tempo (CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71),  de alguma vez ter levado  um "petromax" para o destacamento da ponte do Rio Udunduma ou para tabancas fulas (onde íamos, por vezes, reforçar o sistema de autodefesa).

Será que alguém ainda se lembra do velho "petromax" a iluminar as noites escuras como breu da Guiné? (**)


Guiné > Zona leste > Geba > Banjara > CART 1690 (1967/69) > Excerto de uma requisição de material, com data de 9/6/67, feita pelo alf mil Afredo Reis, da CART 1690 (Geba, 1967/69), na altura a comandar o destacamento de Banjara.

Alguns dos artigos requisitados: fósforos, palha de aço, camisas para petromax de 150 velas, torcida e vidro (?) para o frigorífico,  pregos (...), aerogramas,  selos, 12 esferográficas (uma vermelha e as outras azuis),  bloco de cartas, Omo e sabão, uma garrafa de whisky, Sumol ou outros sumos [...]

Foto: © Alfredo Reis (2007). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


2. O Jorge Araújo, em férias, já respondeu nestes termos (*):

(...) No 'resort' da Ponte do Rio Udunduma não havia "jipe às ordens". Ele era utilizado, sempre que possível, apenas para o transporte dos alimentos confeccionados na CCS, entre Bambadinca e o Destacamento.

(...) O reforço de "pato da bolanha" não tinha arroz. Ele era cozido durante mais ou menos 3 horas, pois a carne era muito dura devido às suas características morfológicas, utilizando-se a chama de uma palmeira seca que se regava previamente com petróleo numa extremidade.

O tacho tinha de recuar à medida que a dita cuja (palmeira) se ia transformando em cinza. Depois de cozido e cortado em pedaços, o pato era frito adicionando-se depois um pouco de malagueta, como único condimento. (...)

(...) Quanto à pergunta sobre o "petromax", não faço a mínima ideia da sua marca ou origem. O importante para nós era, naturalmente, a sua função... a de nos dar alguma claridade em especial nas noites de lua nova. Obrigado... foi quanto nos custou o objecto, depois de termos feito um "choradinho" no comando do BART 3873, no sentido de nos cederem um exemplar. (...)
____________


terça-feira, 27 de outubro de 2009

Guiné 63/74 – P5166: Histórias do Jero (José Eduardo Oliveira) (19): Um dia calha a todos: - O parvo de serviço foi o enfermeiro!


1. O nosso Camarada José Eduardo Reis de Oliveira (JERO), foi Fur Mil da CCAÇ 675 (Binta, 1964/65), enviou-nos a sua 19ª história, com data de 25 de Outubro de 2009:

UM DIA CALHA A TODOS: - O PARVO DE SERVIÇO FOI O ENFERMEIRO!

BINTA, 13 de Setembro de 1964

«No dia 13, domingo, içar da bandeira e uma manhã calma para escrever à família. À tarde, um desafio de futebol para “desenferrujar”os músculos – a semana tinha sido de trabalho duro, mas para dar uns pontapés na bola arranjam-se sempre 22 “artistas” –.

Depois da bola mais umas horas para uma sesta merecida. À noite, quase todo o pessoal se foi deitar cedo pois havia “trabalho” para as primeiras horas da manhã.

Mas houve “alguém” que quis proporcionar um final mais “animado” a esse domingo especial – fazia 4 meses que tínhamos chegado a terras da Guiné – e organizou uma “soirée”, embora um pouco tardia, que nos fez levantar a todos da cama.

Seriam umas 23:00 horas, quando, de várias direcções, o Estacionamento começou a ser flagelado com rajadas de pistola-metralhadora e espingarda.

A reacção das sentinelas foi rápida, principalmente do terceiro e quarto postos, e momentos depois todo o dispositivo de defesa estava organizado, embora houvesse, como é natural, à mistura com a surpresa, alguns momentos de precipitação principalmente dos elementos que se encontravam ainda a pé, escrevendo ou conversando.

Minutos depois”todo o mundo” desfrutava com muito mais à vontade a “sessão extraordinária” que o inimigo nos tinha vindo “dedicar”, possivelmente como represália à nossa acção em Santancoto e ninguém se dignava responder ao fogo inimigo que, passado o rompante inicial, nos ia flagelando com tiros de pistola isolados.

O ”espectáculo” durou até cerca da 1h30, terminando com o incêndio de algumas moranças abandonadas a cerca de 1 km de Binta, que o inimigo houve por bem destruir para assinalar a sua retirada.

Algumas morteiradas bem dirigidas apressaram-lhes o passo e tiraram-lhes a vontade de fazer mais «fogueiras».Reforçam-se os postos de sentinela.

Depois de alguns minutos de conversa e de umas piadas àqueles que, no início do ataque, tinham vistos rajadas “levantar”o pó do chão e inimigos, em cima de árvores, já dentro do estacionamento, toda a gente se foi deitar e recomeçar o sono interrompido.

“Alguém” iria pagar estas horas de sono que tínhamos perdido...

Hoje, dia 14, dois grupos de combate bateram as imediações do quartel encontrando diferentes tipos de invólucros, e localizando as duas principais posições de fogo do inimigo, que se situavam de 300 a 500 metros do estacionamento .

Pelos rastos encontrados avaliou-se o grupo atacante entre 40 a 50 indivíduos, convergindo todos os vestígios de retirada em direcção da estrada de Bigene, que confirma a ideia inicial de que a flagelação de Binta foi como represália à nossa acção na região de Santancoto.

Não se esperava que os “Santancotenses»fossem tão susceptíveis nos seus brios e chega-se à conclusão que eles afinal não sabem bem com quem estão metidos...

É possível que em breve o saibam!!!
Durante o dia souberam-se mais umas histórias pitorescas que se registaram, a quando do início do ataque, salientando-se uma cena movimentada na Sala dos Sargentos.

Naquela sala, onde ainda havia luz e se conversava amenamente, houve uma certa atrapalhação a quando dos primeiros tiros de que resultaram um “petromax” partido, uma passagem apressada por baixo de uma mesa e uma porta arrombada a caminho de uma saída mais segura pela sala dos telegrafistas.

Houve ainda alguém que disse que “eles estão a atacar em massa e já estão cá dentro”, mas parece que tudo isto não chegou a passar de boato...».

Enfim... o velho problema de quem tem um buraco ao fundo das costas...!

Quarenta e tal anos depois!

À distância no tempo confesso ter tido um grande cagaço... na longínqua noite de 13 de Setembro de 1964.

Mastigando as recordações dessa noite diferente da minha vida tento encontrar explicações para a dimensão do dito (o cagaço) pois já não éramos propriamente «maçaricos» na Guiné... quando aconteceu o ataque a Binta.

A surpresa de um ataque «a nossa casa» é no entanto um pouco diferente de uma emboscada no mato onde se sabe que, de um momento para o outro, podem (podiam) acontecer tiros e confusões.

O ataque ao quartel surpreendeu-nos...

A hora era tardia e ninguém estava a pensar em «guerras».

Jogava-se o «King» na Sala dos Sargentos e eu até tinha uma «boa mão»...
De repente rajadas de pistola-metralhadora e tiros de espingarda.

Tá, tá, tá, tá, tá,boum, boum...
Pum,pum, pum...
Tá, tá, tá, tá...

É (foi) uma sensação do caraças!

Mas que porra é esta!!!

Os tiros pareciam que nos estavam a passar a centímetros da cabeça.

Lembro-me que nos levantámos que nem um tiro – passe a expressão – e ala lá pra fora mas... pela porta dos telegrafistas.

Para perceber melhor o que aconteceu há que explicar que, de facto, o medo dá asas mas não nos transforma em passarinhos...

Estávamos numa sala que tinha duas saídas.Uma para o lado donde vinham os tiros e outro pró outro lado.

O lado bom.

Está claro que foi esta saída que escolhemos.

Havia bidões de protecção (bidões cheios de terra) do lado donde vinham os tiros mas ninguém teve a «lembrança» – ia dizer a «coragem» - de sair por esse lado.

O efeito chicotada –o tiro a passar na vertical da cabeça de um indivíduo – é de facto uma sensação... do caraças.
Isto... para não usar o português «vernáculo» que nessa altura usámos e abusámos amiudadas vezes...

Parece (parecia) que dizer asneiras espantava –um pouco – o medo!

A «boa mão» do «King» não deu para apagar o petromax...

Atrasei-me um pouco na saída para «o lado bom» e só consegui apagar a luz quando parti o petromax contra o chão.

Não foi um acto heróico mas... foi o que se pôde arranjar na altura.

Os meus camaradas do «King» já tinham entretanto arrombado a porta para saída do lado bom – a sala dos telegrafistas – que, além dos tiros, gramaram com uma cavalgada pelas suas instalações de uns quatro(ou cinco) furriéis que lhes devem ter parecido – salvo as devidas proporções - uma manada de búfalos a fugir de leões.

3Leva mais tempo a contar do que o tempo que levou a saída... para o lado bom.
Depois agarra-se uma arma, dá-se uns tiros do nosso lado para o lado dos «maus» e logo tudo muda de figura...

O nó no estômago atenua-se.Lembro-me ainda de no dia seguinte – eu e os meus companheiros do «King»» – termos descoberto telhas partidas por cima da sala de «Sargentos».

Foram estragos causados pelos tais tiros que nos tinham parecido ter passado a rasar as nossas cabeças...

Afinal tinham passado dois metros acima!

Mas o tal efeito da «chicotada» é de facto... do caraças.

Tá, tá, tá, tá, tá, boum, boum...
Pum, pum, pum...
Tá, tá, tá, tá...

Ainda hoje me lembro. Dos sons e... da minha «boa mão» do «King» que... tremia comó caraças.

Oh Oliveira apaga o «petromax»!

Tá bem, pá. É já a seguir.

Toma... contra o chão.

E... apagou-se a luz!!!

Da-se!!!

Um abraço,
JERO
Fur Mil Enf da CCAÇ 675

Fotos: José Eduardo Oliveira (2009). Direitos reservados.
___________
Nota de M.R.:

Vd. último poste desta série em:

sexta-feira, 16 de setembro de 2016

Guiné 63/74 - P16495: Notas de leitura (880): Os Cus de Judas, por António Lobo Antunes (2) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 14 de Setembro de 2015:

Queridos amigos,
Aqui se põe termo a esta narrativa que foi tão galvanizante, é tão reconhecida a sua importância que até ao ano passado já tinha conhecido 33 edições, em Portugal, narrativa autobiográfica, há para ali dores que não se apagam, embaraços na alma que não encontram ancoradouro como Lobo Antunes em determinada altura escreve: "Flutuo entre dois continentes que me repelem" ou "O medo de voltar ao meu país comprime-me o esófago, porque estive longe demais, tempo demais para pertencer aqui". E por fim: "O avião que nos traz a Lisboa transporta consigo uma carga de fantasmas que lentamente se materializam, oficiais e soldados amarelos de paludismo, atarraxados nos assentos, de pupilas ocas, observando pela janela um espaço sem cor, de útero, do céu" e tudo termina assim: "E separámo-nos em cinco minutos, um aperto de mão, uma palmada nas costas, e eis que as pessoas desaparecem, vergadas ao peso da bagagem, pela porta de armas, evaporadas num redemoinho civil da cidade".
Temos aqui obra-prima no top da nossa literatura de guerra.

Um abraço do
Mário


Os Cus de Judas (2), por António Lobo Antunes

Beja Santos

Estamos num bar, as horas escorrem sossegadas, o narrador beberrica e tem por assistência uma mulher que nunca será definida. Em certos momentos, sobrelevando a exaltação pela soma de tantos silêncios, pelo absurdo de tantos corpos cozidos ou metidos em urnas, como que num relâmpago de ternura iluminam-se episódios como o do nascimento da primeira filha, Lobo Antunes nunca nos iludiu com a vertigem autobiográfica:
“Eu tinha-me casado, sabe como é, quatro meses antes de embarcar, em Agosto, numa tarde de sol a que o som do órgão, as flores nos altares e as lágrimas da família emprestavam um não sei quê de filme de Buñuel enternecido e suave, depois de breves encontros de fim de semana em que fazíamos amor numa raiva de urgência, e despedimo-nos sob a chuva, no cais, de olhos secos, presos um ao outro num abraço de órfãos. E agora, a 10 mil quilómetros de mim, a minha filha, massa do meu esperma, a cujo crescimento de toupeira sob a pele do ventre eu não assistira, irrompia de súbito no cubículo das transmissões, entre recortes de revistas e calendários de atrizes nuas”.

Mas o que pesa, o que domina toda a narrativa anda pela agonia da espera, como o autor verbera:
“A lenta, aflita, torturante agonia da espera, a espera dos meses, a espera das minas na picada, a espera do paludismo, a espera do cada vez mais improvável regresso, a espera do jipe da Pide que semanalmente passava a caminho dos informadores da fronteira, trazendo consigo três ou quatro prisioneiros que abriam a própria cova, se encolhiam lá dentro, fechavam os olhos com força, e amoleciam depois da bala como um suflé se abate, de flor vermelha de sangue a crescer as pétalas na testa”.

E há as descrições, por vezes alucinantes, como aquele louco na mata, é um horrível epitáfio do colonialismo. Ainda não chegou a manhã, o narrador e a sua ouvinte mantêm de pé todo este monólogo plangente, e o autor grita:
“Foda-se, vim para aqui porque me expulsaram do meu país a bordo de um navio cheio de tropas desde o porão à ponte e me aprisionaram em três voltas de arame cercadas de minas e de guerra, me reduziram às garrafas de oxigénio das cartas da família e das fotografias da filha, Angola era um retângulo cor-de-rosa no mapa da instrução primária, freiras pretas a sorrirem no calendário das Missões, mulheres de argolas no nariz, Mouzinho de Albuquerque e hipopótamos. Um amigo negro da Faculdade levou-me um dia ao seu quarto no Arco do Cego, e mostrou-me o retrato de uma velha esquelética, em cujo rosto se adivinhavam gerações e gerações de petrificada revolta: 
- É a nossa Guernica. Queria que a visses antes de me vir embora porque me chamaram na tropa e fujo amanhã para a Tanzânia”.

Recordações é o que não falta neste relato vivo mas atribulado, amor por empréstimo, a peste da solidão. As horas passam, a ouvinte seguiu o narrador até à sua casa, despem-se e toda aquela dor sufocante que ele traz desde Angola assoma com carga poética, é uma intocável lembrança:  
“Mangando, Marimbanguengo, Bimbe e Caputo: em Mangando e Marimbanguengo a tropa estacionada tiritava de paludismo e de aflição, soldados seminus cambaleavam no calor insuportável da caserna, que o relento do suor e dos corpos por lavar entontecia como os hálitos nauseabundos dos cadáveres, se nos inclinarmos para eles à espera das tristes palavras apodrecidas que os mortos legam as vivos num borbulhar de sílabas informes. Em Mangando e Marimbanguengo, vi a miséria e a maldade da guerra, a inutilidade da guerra nos olhos de pássaros feridos dos militares, no seu desencorajamento e no seu abandono, o alferes em calções, espojado pela mesa, cães vadios a lamberem restos na parada, a bandeira pendente do seu mastro idêntica a um pénis sem força, vi homens de 20 anos sentados à sombra, em silêncio, como os velhos nos parques, e disse ao furriel enfermeiro, que desinfetava o joelho com tintura, É impossível que um dia destes não tenhamos por aqui uma merdósia qualquer, porque, sabe como é, quando homens de 20 anos se sentam assim à sombra, num tão completo desamparo, algo de inesperado, e estranho, e trágico acontece sempre, até que me vieram informar do rádio: Um tipo deu um tiro em Mangando”.

E esta vibração poética atinge aqui o seu auge:
“Penso que quando eu morrer a África colonial voltará ao meu encontro, e procurarei em vão os negros da sanzala ao longe, a manga da pista de aviação acenando escarninhamente para ninguém. De novo será noite e apear-me-ei do Unimog a caminho do posto de socorros, onde o tipo sem rosto agoniza, aclarado pelo petromax que um cabo segura à altura da cabeça e contra o qual os insetos se desafazem num ruidozinho quitinoso de torresmos. O tipo sem rosto agoniza numa agitação incontornável, amarrado à marquesa de ferro que oscila, e vibra, e parece desfazer-se a cada um dos seus sacões. As ampolas de morfina sucessivamente injetadas no deltóide parecem esporear cada vez mais o corpo amarrado que se rebola e torce, e o petromax múltipla nas paredes em sombras que confluem, se sobrepõem e se afastam, formando uma dança frenética de manchas na geometria suja do estuque. Apetece-me abrir a porta de golpe, abandoná-lo, sair dali, tropeçar ao acaso, sentar-me nos degraus de uma velha casa de colono, de mãos no queixo, vazio de indignação. Os grilos de Mangando enchem a noite de ruídos, um dilatado e suave som contínuo sobe a terra e canta, as árvores, os arbustos, a miraculosa flora de África solta-se do chão e flutua, livre, na atmosfera espessa de vibrações e de cicios, o tipo amarrado à marquesa agoniza a um metro de mim, e queria estar a 13 mil quilómetros dali, a vigiar o sono da minha filha nos panos do seu berço.
Mangando, Marimbanguengo, Bimbe e Caputo: o sujeito imobilizou-se por fim num estremeção derradeiro, o que restava da garanta cessou o seu borbulhar ansioso, o cabo do petromax deixou pender o braço e as sombras estenderam-se no soalho, subitamente imóveis. Ficámos muito tempo a contemplar o cadáver agora em sossego, as mãos molemente cavadas sobre as coxas, as botas que se afiguravam dilatadas de um recheio de palha, quietas na placa de ferro branco, mal pintada, da marquesa. O pequeno grupo apinhado dissolveu-se devagar num murmúrio indistinto, e eu dava o cu para estar longe dali, longe do gajo morto que mudamente me acusava, longe das ampolas de morfina que se amontoavam, vazias, no balde pensos”.

A comissão caminha para o fim e começa a tripa-forra dos disparates, como em todas as guerras que vivemos:
“Trazíamos 25 meses de guerra nas tripas, de violência insensata e imbecil nas tripas, de modo que nos divertíamos mordendo-nos como os animais se mordem nos seus jogos, nos ameaçávamos com as pistolas, nos insultávamos, furibundos, numa raiva invejosa de cães, misturávamos comprimidos para dormir no uísque da Manutenção e circulávamos a cambalear pela parada, entoando em coro obscenidades de colégio”.

É raro um escritor lançar-se primigenamente junto do público com tão palpitante escrita, já se anunciavam aqui as suas obras-primas.
____________

Nota do editor

Último poste da série de 12 de setembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16476: Notas de leitura (879): Os Cus de Judas, por António Lobo Antunes (1) (Mário Beja Santos)

domingo, 20 de fevereiro de 2011

Guiné 63/74 - P7822: Memória dos lugares (140): Bedanda e o seu reabastecimento no meu tempo (Rui Santos, ex-Alf Mil, 4ª CCAÇ, 1963/65)


Guiné > Região de Tombali > Bedanda > 1971 > Reabastecimento do aquartelamento e povoação através do Nordatlas e do lançamento de géneros por pára-quedas, durante a época das chuvas.  Foto do Álbum de Amaral Bernardo, ex-Alf Mil Med, CCS / BCAÇ 2930 (Catió, 1970/72)... Esteve em 1971 em Bedanda, onde foi rendido em Dezembro de 1971 pelo Mário Bravo.





Foto: © Amaral Bernardo (2011). Todos os direitos reservado

1. Texto do nosso camarada Rui Santos [, foto à direita, ](ex-Alf Mil da 4.ª CCAÇ, Bedanda, 1963/65),  sobre as suas recordações dos reabastecimentos a Bedanda (*)




Bedanda, Setembro de 1963 a Agosto de 1964, datas entre as quais posso testemunhar o que vi e vivi, tudo o que se possa ter passado fora desse tempo foi de ouvir dizer.


Assim, vamos aos reabastecimentos, os mais desejados “bojecas” e “visques”, a seguir os morfos correntes, batatas, arroz, bacalhau, azeite em bidões, óleo alimentar em bidões, gasolina em bidões, garrafões de 10 litros de vinho tinto e branco, vinagre, munições, enfim um sem número de coisas que nos eram imprescindíveis e, sempre, todos os acessórios para os petromax de iluminação do perímetro do aquartelamento de Bedanda, o meu pelotão reforçado, com cerca de 80 nativos três sargentos, alguns cabos brancos e tintos, e um “sorna” cabo branco de pele e de alma, que era o homem dos petromax e dos dois motores dos “excelentes” (!?) barcos M1 (como o chamávamos sempre: ò sorna! Não me lembro do nome real...)


Nunca fomos reabastecidos por terra,  via Cantanhez, por razões óbvias!


Éramos sempre reabastecidos via marítima por barcos da Casa Gouveia, um era o rebocador N/M Gouveia 16 (que puxava um batelão) e ía sempre Unguariuol acima até ao caisito de Bedanda a cerca de 700 mts da povoação.


Já em tempos descrevi o ataque ao Gouveia 16 aqui no blogue, e desde aí nunca mais vi barco nenhum perto de Bedanda, senão em Cobumba, 6/7 kms da povoação, aí era sempre o N/M (navio motor) Gouveia 17 que era mais comprido que o 16 e não entrava no afluente do Cumbijã , e ficava acostado a um dos lados da rampa que ali existia, e por vezes também trazia batelão, era descarregado e os materiais levados para o armazém em frente do chefe de posto e as munições para dentro do quartel da Companhia.


Estes barcos eram sistematicamente atacados nas curvas do Cumbijã entre Cadique e Cafine, mas, antes dos fuzileiros “limparem” literalmente essas duas povoações, causando dezenas de mortos ao IN e apreendendo muito material de guerra, os barcos começaram a ser escoltados por LDM dos fuzileiros, mas não no tempo que mencionei.


O correio, alimento essencial para o “psique”, vinha sempre via aérea em Dorniers ou em Auster militares, ou Dornier e Cessna civis, que por vezes também traziam medicamentos e algo essencial que tivesse sido pedido de urgência.


No período da “menopausa” marítima, lá vinham os Nordatlas em voo razante “despejar” caixotes de legumes, bacalhau, conservas, não mandarem as “bojecas” foi uma sorte, o bacalhau era o único que não se espalhava pelo mato pois vinha forrado de chapa de alumínio, mas fomos assim “tratados” apenas duas vezes.


Comentando a foto [ vd. acima,] tirada a bordo da aeronave que se aproximava do campo de aviação e estava sobre o Cantanhez, (aliás já nas “bordas” do Cantanhez):


(i) a sombra do avião cruza o Cumbijã exactamente no ponto do cais de Cobumba;


(ii)  os 4 telhados brancos mais à direita da foto eram o antigo aquartelamento da 4ª CCAÇ;


(iii)  ao centro sobre a esquerda a povoação de Amedalai que, pelo que leio, os da CCAÇ 6 lhe chamavam Bedanda (mas para que a verdade seja reposta é só verem o que “diz” o mapa cartográfico);


(iv)  saindo de Amedalai vê-se para sul a estrada para a mata do Cantanhez, Salancaur, Cabedu, Mejo, Lisboa, Cacilhas, etc.;


(v) para norte descendo para Bedanda cruzando o “campo de aviação dos legumes espalhados”, logo à saída de Amedalai e nessa direcção vê-se um pouco indistintamente o tal aldeamento das casas com telhado de zinco do lado esquerdo da estrada Amedalai /Bedanda, que o Vasco Santos ilustrou numa foto dirigida ao blogue, da qual eu duvidei, e peço desculpa, pois no Google Earth nada consta actualmente desse bairro mandado edificar pelo snr. Cap. Ayalla Botto (!?) nem o conjunto de moranças do lado direito da estrada sentido Amedalai/Bedanda, que também se avista em parte nesta excelente foto;


(vi) Lá para baixo, os “meus aposentos”, e as casas comerciais!


Em todos os pontos da foto, e muito mais para os lados coloquei as minhas botas e por vezes a minha barriga e o corpo inteiramente vestido e armado dentro de um riozito com cerca de 2mts de profundidade, salvando dois (cabo branco e soldado acastanhado) e recuperando o armamento por eles perdido.


Lá ao fundo mesmo longe na última curva do Cumbijã que se vê na foto,  rebentei sozinho da margem (direita na foto esquerda do rio) duas “big” canoas.


Como não ter saudades ? 22/23 anos, menos 40 quilos, juventude, inconsciência, sempre pronto. Só tenho pena de não ter tido um comando à altura das circunstância, e mais não digo!


_____________


Nota de L.G.:


(*) vd. poste de 17 de Fevereiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7802: Álbum fotográfico de Amaral Bernardo (Alf Mil Med, CCS/BCAÇ 2930, Catió, Cacine, Bedanda, Guileje, Gadamel, Tite, Bolama, 1970/72) (1): O reabastecimento de Bedanda, no tempo das chuvas, através do Nordatlas, com lançamento de pára-quedas


Último poste desta série >


14 de Fevereiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7778: Memória dos lugares (139): Bedanda no meu tempo (Rui Santos, ex-Alf Mil, Op Esp, 4ª CCAÇ, 1963/65)

terça-feira, 14 de fevereiro de 2023

Guiné 61/74 - P24066: Notas de leitura (1556): Em "A Minha Guerra a Petróleo", por António José Pereira da Costa; Chiado Editora, 2019 - "Cerca das 281330AGO71", uma memória de guerra, uma apreciação de um facto (Carlos Vinhal)


Guiné > Região do Oio > Carta de Farim (1954) (Escala 1/50 mil) > Posição relativa de Mansabá ea lgumas das tabancas (Mansomine, Manhau, Mantida, etc.) desactivadas no tempo da CART 2732 dentro da sua zona de acção, que a Leste, terminava na bolanha de Manhau (Vd. poste P12150, de Ernesto Duarte)

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2013)


N
o meu primeiro comentário no Poste 24063, fiz referência ao infortúnio que atingiu o então Cap Faria Monteiro, comandante da CART 3417, quando pisou uma mina antipessoal ali para os lados de Manhau.

No seu livro "A Minha Guerra a Petróleo", o nosso camarada António José Pereira da Costa, Cor Art Ref, faz referência este incidente nas páginas 159 a 167, porque o Cap Monteiro era, e é, seu amigo. Porque a narrativa está muito pormenorizada e fiel ao acontecimento, pelo menos nas horas difíceis passadas em Mansabá e em que eu e os meus camaradas tivemos a nossa modesta intervenção, não resisti a transcrever aqui no Blogue o capítulo na íntegra. Só espero que o nosso esforço tenha minorado a extensão dos ferimentos sofridos pelo Cap Monteiro.

A propósito, o livro "A Minha Guerra a Petróleo" ainda pode ser adquirido, tendo um custo actual de 14,00€, através da WOOK, por exemplo.
São 187 páginas de leitura interessante complementada com algumas fotos.

CV
********************

Cerca das 281330AGO71[2]

Este texto não é só mais uma memória de guerra, uma apreciação de um facto que veio ter comigo. Será a maneira como observei algo que sucedeu a outra pessoa e a memória que disso guardei, influenciada por situações que vivi antes e depois. Julgo que este texto pode ser considerado uma homenagem.

Saindo de Mansabá em direcção a nascente encontrávamos três pequenas localidades abandonadas: Mansomine, Manhau e Mantida. No tempo da paz eram servidas pela estrada que seguia para Banjara - esta já a mais de 18 km de distância - e que, na altura em que por ali andei, também já fora abandonada. Não pertencia ao nosso sector. Era apenas algo de que se falava...

Nos patrulhamentos que realizávamos naquela direcção, marcou-me especialmente a visão do quartel de Manhau, abandonado e destruído. Segundo apurei, fora um destacamento da Companhia de Mansabá, ocupado quinzenalmente por um grupo de combate e um pelotão de milícia com umas condições de vida muito más e para onde era necessário levar tudo, até a água, numa viatura-tanque. Qual seria a vantagem táctica de uma posição com aquelas características? Como tantos outros "quartéis da malta", acabara abandonado e destruído "à granada de mão", por volta de 1966.

Naquela altura, ainda se reconheciam as duas fiadas de arame farpado, agora ferruegnto e quebrado aqui e além, vagamente esticado entre as últimas varas que o tinham suportado. O cavalo-de-frisa ainda se mantinha de pé, mas inútil não chegava a vedar o acesso ao interior da área quadrada, que deveria ter tido cerca de trinta a quarenta metros de lado. No interior, nenhuma construção ou mesmo restos do que pudesse ter sido uma, eram identificáveis com clareza, mas no exterior, o sistema de iluminação continuava bem representado por alguns postes: uns já caídos, outros resistindo às intempéries numa posição quase vertical. Cada poste não era mais do que um tronco de palmeira cravado no solo, ao qual havia sido adossado pela geratriz um "abat-jour" cilíndrico deveras original.

Era constituído por um bidon vazio que tinha sofrido umas pequenas, digamos, adaptações. Uma das tampas - a que ficaria para baixo - fora removida, mas a outra apenas havia sido separada da superfície lateral do cilindro em pouco mais de metade do perímetro. Depois de aberta a geratriz oposta à que fora pregada ao poste, um petromax ficava pendente da face inferior da tampa, no interior do cilindro. Julgo que assim se pretendia preservar o candeeiro dos ventos e das chuvadas, mantendo o perímetro do aquartelamento iluminado. Sempre que um dos Petromax fraquejasse, o "electricista de noite" tinha uma tarefa a cumprir. Considero este abat-jour mais uma prova do "desenrascanço nacional" e do engenho (que não arte) dos Portugueses.

Todavia, o sistema fornecia pouca iluminação para que os defensores pudessem observar a área circundante da posição. Em compensação, o In dispunha de uma visão privilegiada sobre ela, a algumas centenas de metros de distância. Agora, olhar para este "quartel" era contemplar uma espécie de peça de arqueologia militar, que entristecia se procurássemos saber o que levava a que o destacamento fosse construído, sabe-se lá com que esforço, e depois abandonado. Depois deste, era a tabanca de Mantida, onde os militares que guarneciam Manhauiriam buscar laranjas de boa qualidade e correndo os inerentes riscos. Era uma lenda, mas para que tenha surgido é necessário que, pelo menos uma vez, lá tenham ido...

Devo ter ido a Manhau e Mantida duas ou três vezes, mas para além da visão das ruínas do quartel, tenho a imagem de uns dois metros de estrada onde a erva não tinha crescido, passado mais de um ano. Tinha sido ali... segundo se dizia e eu acredito, pois - soube dpois - que, além da mina que vitimara o Monteiro, havia mais três que o furriel de minas e armadilhas tinha detonado.

Eu estava em Bissau com a Bateria Ati-aérea, quando o Joaquim Evaristo me deu a notícia. O Monteiro[4] tinha pisado uma mina anti-pessoal. Há notícias que não podem ser dadas de outra maneira: de modo brutal e com uma frase curta e, como todas do mesmo tipo, de significado imediatamente dedutível. Não sei porquê, mas não fui logo ao Hospital. O Joaquim foi e, pouco tempo depois, só medisse:
- Está sem um pé.

Logo que me foi possível fui ao Hospital e localizei-o. Estava num quarto, deitado na cama com uma perna esticada e a outra erguida e apoiada em algo que se parecia com uma almofada...

Fiquei sem saber o que dizer, mas o silêncio de poucos segundos tornou-se impossível de suportar. Nestes momentos, sabemos que é necessário dizer ou fazer qualquer coisa, mas não temos a ideia do que possa ser. Se calhar, concentramo-nos em nós e no que sentimos, quando deveríamos considerar que o ferido ou o doente grave que ali está é que deverá estar antes de tudo.

Tartamudeei qualquer coisa, nem sei o quê. Depois tentei saber como as coisas tinham sucedido. A estrada abandonada ainda conservava as rodeiras, as marcas dos pneus das viaturas que por ali tinham passado. E foi ao movimentar-se pela área entre rodeiras que encontrou a mina.

Por outras experiências que tive, sei que a surpresa inicial deu lugar ao espanto e à pergunta feita a si mesmo:

- O que sucedeu?

Depois é uma mistura de dor sentida e uma vontade de sair dali, de tudo aquilo que não seja verdade e de um turbilão de perguntas que acabam por se redizir a uma certeza: "Estou gravemente ferido. Isto também me aconteceu a mim".

- A mim? Porquê a mim?

Os outros têm muito que fazer. A nós, nada mais resta do que aguentar a dor e sentir revolta contra a falta de sorte e a irreversibilidade da situação

Dez dias depoi de ter completado 24 anos!...

À chegada dos reforços vindos de Mansabá, os enfermeiros da sua Companhia já tinham garrotado a perna e metido o soro, procedimentos habituais nestas situações. Agora eram sete quilómetros em coluna, de regresso ao quartel, num percurso em que se queria evitar solavancos, sempre excessivos para quem sofre. Porém, nesse dia chovia e, devido à pouca visibilidade, os helicópteros não voavam. Podia ser que as condições melhorassem, mas há dias em que nem os astros ajudam. Cerca das cinco da tarde confirmou-se que o héli não viria e não houve outra solução que não fosse a evacuação, em coluna auto. A espera inglória na enfermaria foi angustiante. Uma tortura que nada justificava. 

Por fim, o pessoal de enfermagem "depositou" a maca numa das viaturas e a coluna partiu em marcha moderada. Seria uma viagem até Mansoa e daí, em ambulância, até ao hospital. Todavia a viagem de Mansoa a Bissau "não estava prevista" e a coluna por ser de quase cem quilómetros, até Bissau, debaixo de chuva intensa. Já tinham passado bastantes horas e o sofrimento físico e psicológico somavam-se, numa aritmética de revolta sem fim, que só terá tido uma paragem pelas seis e meia da tarde à entrada do Hospital Militar de Bissau. Tinham decorrido cinco horas.

Ouvi a descrição do Monteiro e, não podendo ou não sabendo, dizer mais, respondi-lhe que agora "era necessário reagir". No segundo imediato apercebi-me da agressão que tinha cometido. Há coisas que, mesmo que se pensem, não se dizem e o Monteiro fez-mo sentir respondendo-me.
- Reagir? Reagir, reages tu que tens duas pernas. Agora eu só tenho uma...

Fiquei sem palavras. Uns instantes de silêncio depois, despedi-me e deixei o quarto. Além do monte de gaze que marcava agora o fim da perna fiquei impressionado com a cor das gengivas que o ferido apresentava. Brancas. Disseram-me que era do soro que lhe fora ministrado, durante muito tempo. Por mim, penso que era um indício de anemia pela perda de sangue.

Poucos dias depois, voltei com o major Gaspar, nosso amigo e meu segundo-comandante. Ainda estou para saber o que o terá levado a aparecer, naquele dia, com as fitas das condecorações e com o brasão do Regimento de Artilharia n.º 3 (de Évora) sua unidade habitual. Era à tarde e os feridos e doentes tinham sido postos na varanda do hospital, talvez numa tentativa de lhes melhorar a disposição, se tal fosse possível...

A conversa foi curta e eu8 procurei ficar calado. O nosso amigo, talvez por ser mais velho, parecia ter maior capacidade de diálogo, mas, ao fim de alguns minutos, o silêncio acabou por surgir. O Monteiro disse, de repente e num tom que parecia subtil, mas que comportava uma crítica muito amarga e contundente:

- O meu major está muito bonito, com as condecorações!

Com o sol já baixo, ficou-me a imagem do major Gaspar com os olhos marejados, a dizer, como se se justificass:

- Calhou. Isto não é nada. Já estavam postas nesta camisa quando a vesti hoje.

Não arranjo melhor expressão para descrever a nossa saída da varanda: "Fugimos"

E chegou a véspera da evacuação para Lisboa.

De novo, o major e eu fomos ao hospital. O jantar já fora distribuído há muito e os corredores estavam desertos e escuros. Eu tinha para mim que seríamos recebidos com frieza, se não mesmo com agressividade. Porém, ao entrarmos no quarto, fomos saudados com alegria e boa disposição. Era a saída da Guiné, o retorno à "Metrópole" e à família. Era o fugir dali, um lugar onde não pertencia, para um sítio onde poderia reencontrar os seus, aqueles que havia deixado pouco mais de dois meses antes.

Fiquei surpreendido por falarmos com certo à-vontade e eu, já não me lembro a propósito de quê, disse qualquer coisa como:

- Pois é, a vida está má!

O Monteiro tratou-me pela alcunha e comentou:

- Boa piada PK! Boa piada! Olha, que até o meu coto se ri!... - e, agarrado à perna, abanava-a com as mãos.

Foi então que concluí que uns produtos daqueles que tiram as dores e dão boa disposição, talvez euforia, deveriam ter andado por ali, misturados na sopa ou mesmo em todo o resto do jantar.

O Gaspar, por seu turno, aproximou a orelha do coto entrapadíssimo e, pedindo-lhe que ligasse o transmissor, comentou a qualidade da música que estaria a ouvir.

Mais uma vez fiquei sem saber o que dizer. Não me lembro se saí por minha iniciativa, por não poder suportar o surrealismo daquela cena, ou se fui levado pelo final da visita, decretado pelo meu segundo-comandante, para meu alívio, confesso.

A partir daqui e ao longo da minha vida, fui recordando duas situações que desenterrei na memória e que envolviam pernas, as pernas do Monteiro. Uma ainda na Academia e outra já quando éramos oficiais.

Nunca tive grande jeito para um qualquer desporto em especial. Contudo, um dia descobri o basquetebol. Achei-o curioso, mas cedo concluí que deve ser dos jogos de bola mais difíceis de praticar. Ou seria "o árbitro" que me perseguia? Certo é que, sempre que eu tocava na bola fazia falta, "por passos". E não havia maneira de aprender a técnica. E aquela regra é tão apertada, convenhamos!...

Apesar disto, não desisti e resolvi aprender com o Monteiro. E uma das coisas que ele me ensinou foi que, ao receber a bola com ambas as mãos, eu deveria escolher um "pé-eixo" que, a partir daí não poderia mexer. Era como se estivesse soldado ao chão. Pelo menos, foi o que entendi. Acabei por desistir da aprendizagem, mas mantive o gosto pela modalidade, graças às indicações do meu improvisado mestre.

Recordei também a cena na Sala de Oficiais da Escola Prática de Artilharia para onde o nosso curso de tenentes tinha sido enviado para o Curso de Promoção a Capitão, que, depois, não valeu. Mas isso já são questões laterais. Uma manhã, no rádio da sala passava "Les Champs-Elysées", na voz de Joe Dassin. Bela melodia e letra curiosa e bem construída Andávamos pelos nossos vinte e dois a vinte e cinco anos e fôramos musicalmente educados na música europeia. Tínhamos cinco anos de francês, no ensino secundário, e numa música como aquela era fácil encontrar encanto. Imediatamente constituimos uma libha de seis ou sete bailadores com as mãos apoiadas no ombros do que nos ficava ao lado. Depois, em sincronismo, atirávamos alternadamente a perna direita para a esquerda e a perna esquerda para a direita, ao rítmo da música, uma gajice própria dos jovens que éramos, apesar de já todos termos um ano de África, em Angola, em Moçambique ou na Guiné para onde partíramos três e só dois haviam voltado. Naquela idade, ainda tínhamos uma certa garridice que permitia enfrentar o futuro com certo ânimo e confiança, mesmo tendo já adquirido uma certa (má) experiência da vida e sabendo que os tempos que se avizinhavam tinham tudo para ser de provação. A dada altura alguém comentou:
- Olhem só para isto! Os futuros comandantes das companhias de Artilharia que irão para o Ultramar!...

O grupo desfez-se, de imediato. Caíramos em nós. No fundo, éramos oficiais respeitáveis e conscientes dos nossos deveres e não podíamos permitir-nos a brincadeiras como aquela...

Depois da evacuação para Lisboa, tive notícias dispersas do Monteiro, até nos encontrarmos na AM na celebração dos trinta anos do nosso curso. Nessa altura, disse-me que era professor. "Professor", mas com P Grande. Por mim pensei:

- Ainda bem! Nem outra coisa era de esperar de um Homem da minha geração!

Mem-Martins, 10 de Agosto de 2018

____________

Notas do autor:

[2) - Esta é a maneira de referir nas comunicações militares ou em documentos escritos, algo que sucedeu cerca das 13 horas e 30 minutos do dia 28 de Agosto de 1971. Fica assim constituído o chamado "grupo data-hora".

[3] - Naquele tempo, nas unidades tipo Regimento da Metrópole, havia um "electricista de dia" nomeado por escala.

terça-feira, 16 de junho de 2009

Guiné 63/74 - P4536: Memória dos lugares (31): Béli, CCAÇ. 1589 (1966/68) (Armandino Alves)


1. O Armandino Alves que foi 1º Cabo Enf da CCAÇ 1589 (1966/68), em Beli, Fá Mandinga e Madina do Boé, enviou-nos mais uma interessante mensagem:


Camaradas,

Hoje vou-vos falar um pouco do meu passado em Béli.

Quando chegámos a Béli, o Comandante do Pelotão que fomos substituir, informou o nosso Alferes que os ataques, que o IN fazia a Béli, eram programados, pois só aconteciam de três em três meses.

Isso de facto verificou-se o que nos levou a pensar, que o intuito deles era que estivéssemos quietinhos e não nos aventurássemos a sair para a mata.

E que podíamos nós fazer só com um pelotão, 1 Cabo Cipaio e dois ou três milícias?

É claro, mantínhamo-nos no nosso lugar ripostando apenas aos ataques com o equipamento que tínhamos: 2 morteiros de 60 mm, 2 metralhadoras pesadas e as G3.

Mais tarde, fomos reforçados com uma secção de morteiros 81 mm, constituída por 1 cabo e 4 soldados.

Tivemos de construir os abrigos para estes últimos morteiros pois, como é óbvio, para os de 60 mm não eram necessários.

Mais tarde, fomos reforçados com um Furriel dos “Comandos”, que tinha apanhado uma “porrada” e veio para o Béli de castigo.

Por pouco tempo tivemos este “reforço”, pois quando limpava a sua arma (G3), deu um tiro no pé e ficou sem dois dedos. Não sei se foi por acidente, ou se foi de propósito, pois dado ser “Comando”, creio eu, que não ia limpar tão “inocentemente” a sua arma com uma bala na câmara.

Foi evacuado para Bissau e nunca mais regressou a Béli.

Outro caso “esquisito” foi o de um cabo atirador, que foi buscar um garrafão de água e, já dentro do abrigo, bateu com ele nos ferros dos pés da cama partindo o fundo. Os vidros resultantes cortaram-lhe a barriga da perna, de cima até abaixo, tendo sido transportado para a enfermaria, a fim de ser suturado. Vi-me e desejei-me, para que ele se deixasse anestesiar localmente, poiss ele não a queria de modo nenhum.
Dizia-me ele que se fosse uma injecção “normal“ não levantava qualquer problema, mas ficar a dormir, anestesiado, não queria de modo nenhum.
Só com a ajuda de outros camaradas o consegui convencer do contrário, explicando-lhe que, quem ia ficar dormente, era o local da perna a ser cosido, e não ele por todo.

Felizmente que este acidente foi de dia e, graças a Deus, tendo corrido tudo na perfeição.

Um outro acontecimento foi na época das chuvas que como todos nós, os que passamos na Guiné, bem sabemos, são ricas em trovoadas assustadoras e espectaculares. Raios por todos os lados que, à noite no meio da escuridão, fazem arabescos no céu, dignos de serem registados em filme.

Como é lógico, nessa altura não havia “Cancorders” para realizar tais filmes, só fotos e a preto e branco. E, ali no meio do mato, não haviam sequer rolos fotográficos, só em Bissau, e ainda era preciso que alguém no-los trouxessem.

Pois, nessa altura, dizia eu, chovia a bom chover e eram dias e dias seguidos.

Então numa dessas noites, o pessoal de um dos abrigos acordou a meio de repente com os colchões a boiar, pois o dique que impedia a água de entrar no abrigo tinha ruído e a esta entrou de escantilhão.

Foi preciso ir ao abrigo do gerador buscar uma motobomba portátil, para escoar a água que se encontrava dentro do abrigo. Lá surgiu então um voluntário, que deitou a correr para a ir buscar mas, na aflição, esqueceu-se que o cavalo-de–friso estava colocado, como habitualmente, no seu sítio e quando ele reparou, e tentou travar a sua corrida já estava mesmo em cima dele.

Resultado, o arame farpado rasgou-lhe os lábios o peito e os braços. Mesmo assim ele não desistiu, pegou na motobomba e levou-a para o abrigo.

Depois foram os colegas a transportá-lo á enfermaria. Àquela hora da madrugada e sem luz eléctrica, tivemos que utilizar um “petromax”, a petróleo, que quase não dava luz, pois o vidro estava tão fumado que, mesmo posto no máximo, quase não permitia ver nada.

Assim, enquanto um colega segurava o “petromax” acima da cabeça, eu lá lhe fui cosendo os lábios, tarefa bastante difícil, pois como o local era mesmo muito escuro, com a falta de luz ainda mais difícil se tornou.

Mas enfim, com aquelas condições, lá consegui realizar mais um verdadeiro “feito”.

Os restantes ferimentos, como eram superficiais, foram devidamente desinfectados e, uma vez retomada a acalmia, lá voltamos a adormecer.

Armandino Alves
1º Cabo Enf da CCAÇ 1589
_________

Nota de M.R.:

Vd. último poste da série em:

quinta-feira, 17 de agosto de 2017

Guiné 61/74 - P17677: Fotos à procura de... uma legenda (88): "Pietá"... O fotógrafo indiano, Avinash Lodhi, captou o desespero de uma fêmea de macaco Rhesus que abraça a cria inanimada (Luís Mourato Oliveira)


"Pietá"...Um fotógrafo indiano captou o momento em uma macaca abraça com força a cria, que aparentemente estava inconsciente. "Foi um momento raro, especialmente entre animais", disse o fotógrafo Avinash Lodhi.

Segundo informação do DN - Diário de Notícias, de 11 de maio de 2017, a fotografia foi tirada em Jabalpur, no estado indiano de Madhya Pradesh e publicada nas redes sociais. "A imagem tem comovido vários utilizadores e tornou-se viral."... Um momento raro, entre animais, comentou o fotógrafo.

O animal parece-nos ser uma fêmea de  macaco Rhesus, uma das 15 quinze espécies de macacos existentes no subcontinente indiano. De acordo com a investigação dos primatólogos, os macacos Rhesus demonstram uma variedade de habilidades cognitivas complexas, como a capacidade de fazer avaliações psicológicas, entender regras elementares e avaliar os seus próprios estados mentais. Inclusive, parecem reconhecer-se ao espelho, tendo por isso algum tipo de autoconsciêncua. Já em 2014, os utentes de uma estação de comboio em Kampur, na Índia, assistiram a um cena incrível: a de macaco Rhesus, eletrocutado, a ser objeto de assistência  e reanimação  por outro macaco Rhesus.

[Imagem enviada e legendada por Luís Mourato Oliveira. Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné... Reprodução com a devida vénia...]


1. Mensagem do Luís Mourato Oliveira, com data de 22 de junho (complementada com informação sobre a foto em 15 do corrente):


[foto à esquerda, Luís Mourato Oliveira, ex-alf mil inf CCAÇ 4740, Cufar, 1972/73, e Pel Caç Nat 52, Bambadinca e Mato Cão, 1973/74; membro da nossa Tabanca Grande, com o nº 730]

Quando há algum tempo escrevi para a Tabanca Grande “Quatro Aventuras Gastronómicas na Guiné” (*) ,  fi-lo com o propósito de deixar um testemunho das limitações que existiam na obtenção de alguns géneros alimentares e também recordar o recurso à imaginação e improviso com que os militares em campanha ultrapassavam essas mesmas dificuldades.

Não contava, o que me deu muita satisfação, que um dos textos enviados, “ Macaco em Mato de Cão”, gerasse polémica e discussão tendo ainda originando um inquérito feito no Blog e no Facebook, sobre as opiniões gustativas dos camaradas que experimentaram esse prato. (**)

Um camarada criticou vivamente essa prática gastronómica que qualificou de quase canibalismo e quem a praticava de “não serem boas rolhas”,  tendo eu assumido com algum humor que me enquadrava nessa categoria.

Há alguns dias uma fotografia trouxe-me à memória a discussão travada na altura. Foi produzida por um fotógrafo indiano [, Avinash Lodhi,]. que captou o desespero de uma macaca que abraçava a cria inanimada e a imagem trouxe-me imediatamente à memória a Pietà que Miguel Ângelo esculpiu quando tinha apenas vinte e três anos e que é das obras de arte que mais emoções me produziram. 

Na Pietà a mãe de Jesus sustenta o corpo do filho morto com resignação pela morte e talvez a serenidade da sua expressão na escultura já represente a esperança da ressurreição. Na macaca o que mais impressiona é o enorme desespero e revolta de uma perda para ela irrecuperável.

Hoje seria para mim impossível repetir o exercício relatado em “Macaco em Mato de Cão”, não pelo efeito da fotografia, mas por toda a vivência de mais de quarenta anos que modificaram mais de forma invisível o meu comportamento, bem como os camaradas da minha geração com experiência similares que as transformações físicas que vamos sofrendo, o que me leva a ponderar sobre que tipo de pessoas éramos quando jovens num cenário de guerra e qual o limite que a educação e a ética impunham para os nossos comportamentos de então?

Questiono-me se,  sem as experiências vividas, como teríamos evoluído como seres humanos e se a nossa visão de humanidade seria hoje critica aos comportamentos dos nossos vinte anos?

Todos nós “crescemos” no mesmo sentido ético e dentro dos mesmos valores após as experiências vividas?

Sem rejeitar nada do passado, em transportar quaisquer sentimentos de culpa ou complexos pelos momentos vividos naquele período, quero acreditar que a vida e as experiências adquiridas nos encaminharam para ciclos distintos de comportamento difíceis de explicar porque muitas vezes antagónicos.

Quero acreditar que o processo de evolução das nossas vidas nos conduz à aprendizagem e aperfeiçoamento permanente a padrões de humanidade e compaixão por todos os seres que connosco coabitam neste Mundo e à rejeição dos caminhos fáceis de trilhar do egocentrismo, da violência e da escuridão. (***)

Luís Mourato Oliveira


Nota: A cria que na fotografia parece ter morrido estava apenas inconsciente e após ter recuperado a macaca mostrou de novo alegria e “macaquices”.

______________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 10 de novembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16706: De Cufar a Mato Cão, histórias de Luís Mourato Oliveira, o último cmdt do Pel Caç Nat 52 (2) - Experiências gastronómicas (Parte II): Restaurante do Mato Cão: sugestões de canibalismo, bom pão e melhor... macaco cão no forno com batatas!

(**) Vd. 17 de novembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16730: Inquérito 'on line': Num total de 110 respondentes, apenas 16% disse que provou (e gostou de) carne de macaco-cão... Pelo lado dos "tugas", o "sancu" está safo... Agora é preciso que os nossos amigos guineenses façam o seu trabalho de casa...

(ªªª) Último poste da série > 26 de julho de 2017 > Guiné 61/74 - P17620: Fotos à procura de...uma legenda (87): o luxo de um "petromax" da Casa Hipólito nas noites escuras como breu...