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sábado, 3 de junho de 2017

Guiné 61/74 - P17427: Banco do Afecto contra a Solidão (22): Notícias do antigo 1º sargento da CCAÇ 1419 (1965/67) e da CCAÇ 2312 (1968/69), e cofundador da ONG Ajuda Amiga, António Joaquim Lageira: deixou de comparecer aos convívios anuais e estava num lar do exército, em Oeiras, em 2015 (Ana Pacheco / Carlos Fortunato)


Lisboa > 19/4/2008 > Grupo fundador da ONG Ajuda Amiga (*) :

(i) de pé da esquerda para a direita: Manuel Pais e Sousa (CCav 1650), Rogério Marques Freire (CArAntónio Joaquim Lageira (CCaç 1419 e Caç 2312) [, foto à direita],  Adrião Lourenço Mateus (CArt 1525), António Jesus Picado Magalhães (CArt 1525);
t 1525) Eurico Caeiro Lavado (CCaç 1419), Júlio da Silva Esteves (CCaç 816) Carlos Manuel Rodrigues Bernardes (CCav 1650),

(ii) em baixo da esquerda para a direita: Manuel Joaquim (CCaç 1419), Carlos Silva (CCaç 2548),  José Riço  (CCav 1650) e Carlos Fortunato (CCaç 13).

Foto (e legenda): Ajuda Amiga [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradasa da Guiné] 



1. A Ana Pacheco (Anita), filha de um camarada nosso, escreveu-nos no dia 1 a seguinte mensagem;

Boa tarde,

Desculpe estar a incomodar, mas precisava da sua ajuda. 
O meu pai, João Gonçalves Pacheco, esteve na Guiné-Bissau entre 1968  e 1970, na Companhia de Caçadores 2312, onde o sr. António Lageira era 1º Sargento.

Sempre participou nos encontros que se fizerem desde há 30 anos para cá, deixando de aparecer desde há uns 6 a 7 anos, não conseguindo nenhum dos camaradas do meu pai nem o meu pai, contactá-lo pois o telefone chama e ninguém atende.

Gostaríamos de saber se tem alguma informação sobre ele (ví que ele aparece numa fotografia numa publicação do vosso blog a 4 de março de 2010) para lhes poder dar, pois têm grande estima por ele.
Grata pela atenção,

com os melhores cumprimentos
Ana Pacheco

2. Resposta do nosso editor:

Anita:
Boa noite, e obrigado pelo seu contacto.

O camarada Lageira, 1º sargento, pertenceu originalmente à CCAÇ 1419 (Bissau, Bissorã e Mansabá, 1965/67)... Temos no blogue referências ao seu nome.


 Além disso, integrou originalmente os corpos sociais da ONG Ajuda Amiga, mas já não faz parte da lista eleita para o biénio 2016/17:
 
Talvez os nossos camaradas,  e membros da nossa Tabanca Grande, Carlos Fortunato, Carlos Silva e Manuel Joaquim, também cofundadores e atuais dirigentes dessa ONG, lhe possam dar notícias do camarada António Joaquim Lageira.

E espero que essas notícias sejam boas. Disponha sempre e dê um abraço nosso ao seu pai, João Pacheco, da CCAÇ 2312, subunidade da qual temos infelizmente poucas referências,  e que fazia parte do 
BCAÇ 2834 (Buba, Aldeia Formosa, Guileje, Cacine, Gadamael 1968/69). Tem história da unidade disponível aqui, em sítio criado e mantido pelo nosso grã-tabanqueiro Francisco Gomes.

O nosso blogue está aberto ao seu pai e a outras camaradas da CCAÇ 2312 que queiram partilhar connosco memórias e afetos...

Saudações, o editor Luís Graça
3. Mensagem do nosso camarada Carlos Fortunato, presidente da ONG Ajuda Amiga, com data de ontem:


 Bom dia,

A última vez que falei com o António Lageira foi ao telefone, em 2015, na altura ele contou-me que a sua saúde tinha piorado e que estava num lar do Exército que existe em Oeiras, onde cuidavam bem dele e que tinha muita dificuldade em andar.

O ofereci-me para o ir buscar e o levar aos almoços de camaradas da Guiné que organizamos perto de Oeiras, eram pequenas deslocações, recusou disse que os passeios dele eram do quarto para a sala, e apenas por vezes por insistência dos auxiliares dava um pequeno passeio pelo corredor. Também não quis ser visitado, que preferia estar assim sem visitas.

Apesar de achar que lhe faria bem sair e dar dois dedos de conversa com os seus camaradas, respeitei a opção dele de se isolar, se era assim que ele se sentia bem.

Saudações

J. Carlos M. Fortunato

Presidente da Direção
E-mail jcfortunato2010@gmail.com + E-mail jcfortunato@yahoo.com
Telem. +351 935247306
NIF 111853338
Ajuda Amiga – Associação de Solidariedade e de Apoio ao Desenvolvimento

ESCRITÓRIO
Rua do Alecrim, nº 8, 1º dtº
2740-007 Paço de Arcos

SEDE
Rua Mário Lobo, nº 2, 2º Dtº.
2735 - 132 Agualva - Cacém

NIPC 508617910
ONGD – Organização Não Governamental para o Desenvolvimento
Pessoa Coletiva de Utilidade Publica
Site http://www.ajudaamiga.com
E-mail ajudaamiga2008@yahoo.com

Telemóvel +351 937149143

4. Depois de termos dada à Anita, estas últimas notícias sobre o camarada Lageira (e que não eram as mais "encorajantes"), ela respondeu-nos de imediato nestes termos:

Bom dia!


Quero agradecer-vos a atenção e muito obrigado pelas informações.
Agradeço e retribuo os cumprimentos dirigidos ao meu pai.

Tenho muito orgulho nele e em todos os homens que estiveram nesta guerra. Cresci a ouvir falar dela e de há 30 anos para cá tenho conhecido os rostos e as histórias daqueles que durante 2 anos viveram com o meu pai, nas terras de Guiné - Bissau.

Foi, infelizmente, na missão com a companhia do meu pai, que o sr. Lageira se feriu ao pisar uma mina quando ia com dois camaradas apanhar lenha. Um grande homem por quem tenho um profundo respeito. (**)

Obrigado por tudo!
Cumprimentos para todos,
Anita

__________________

Notas do editor:

terça-feira, 29 de novembro de 2011

Guiné 63/74 - P9112: Porto de Abrigo (Carlos Rios) (3): A nossa estada em Bissorã e Mansoa, e as baixas em combate

1. Terceiro episódio de "Porto de Abrigo", as memórias passadas a escrito pelo nosso camarada Carlos Luís Martins Rios, ex-Fur Mil da CCAÇ 1420/BCAÇ 1857, Mansoa e Bissorã, 1965/66.


PORTO DE ABRIGO - III

A nossa estada em Bissorã e Mansoa, e as baixas em combate

Bissorã era uma vila já com bastante população em que havia alguns estabelecimentos comerciais, muito deles já abandonados, mas ainda assim com um ou outro em funcionamento (os pertencentes a libaneses), perdi a sensação de tremendo isolamento que me tinha acompanhado durante a permanência em Fulacunda, tendo em vista que a vila tinha ligações por estrada, com Mansoa, Barro, Olossato e Mansabá, para esta última através do assustadora mata do Morés, considerado um refugio do IN, daqui a que desde que fosse assegurada a necessária desminagem e segurança se fizessem colunas. Ficamos durante alguns meses em conjunto com a Companhia 1419 e aparte os patrulhamentos e observações nas tabancas limítrofes, apenas têm relevância no plano militar dois acontecimentos que vieram abalar o contingente: em primeiro lugar junto à pista de aterragem rebentou uma mina antipessoal que provocou a amputação do querido amigo Lageira – 1.º Sargento da 1419. À posteriori o 2.º Sarg Sarrico por descuido deixou rebentar no bolso do camuflado uma granada de fósforo que o queimou e estropiou bastante. Vim encontrá-lo com sofrimento tremendo já no Hospital da Estrela onde foi horrivelmente tratado, quando da minha evacuação por ter sido atingido a tiro, e já fortemente estropiado. O Sarrico veio a falecer depois com uma cirrose hepática.

As condições em Bissorã já eram mais aceitáveis, sendo que inclusive tomávamos refeições de boa qualidade num estabelecimento do exterior, e um grupo de furriéis, em que me incluía, alugou uma casa também no exterior do quartel para pernoitar e repousar. Era realizado sistematicamente pela população um tradicional mercado ao ar livre. Existiam dentro da vila, em tabancas separadas e nos arredores, diversos grupos e sub-grupos étnicos, nomeadamente fulas, mandingas, biafadas, alguns balantas e um curiosíssimo sub-grupo, os saracolés que teciam e produziam os panos azuis, que as mulheres dos diversos grupos usavam a servir de saias. Havia alguns artesãos habilidosíssímos que criavam em pau-santo belas peças das quais adquiri alguns exemplares que hoje possuo, mas o artigo para mim mais interessante é um corta papeis em feitio de punhal manufacturado a partir do bronze do invólucro das balas e do alumínio das caixas de outra munição que não me lembro já hoje e que de certeza utilizei tendo em linha de conta que andei dezenas de vezes aos tiros com todo o tipo de armamento. Junto à casa do administrador de Posto chamou-me a atenção uma viçosa horta que produzia permanentemente durante todo a ano alfaces, tomate etc. Aqui não há os períodos de inverno ou verão, basta regar todos os dias como verifiquei ser feito por elementos da população, não sei contratados como. Também aqui me chamou a atenção um enorme monte de mancarra, (amendoim) que veio depois a ser transportado para Bissau (Casa Gouveia - Sucursal local do Grupo CUF) e com o monopólio da exportação de todo o amendoim da Guiné para Portugal..

A casa do Administrador.

A tasca do senhor Maximiano. A nossa messe em Bissorã

Rua com duas bombas de gasolina à direita


Terminado este período de aparente acalmia, mais uma vez nos deslocamos em viatura pela estrada para ficarmos localizados em Mansoa, ainda nos deslocamos algumas vezes a Bissorã com colunas de abastecimentos.

A igreja católica vista de frente.

A mesquita com os seus crescentes nos minaretes

Nesta vila onde pensávamos terminar a nossa comissão de serviço com menos tensão, veio a ser a zona de maior desgaste e com momentos mais angustiantes e onde sofremos os mais dramáticos e terríveis acidentes de guerra e onde viemos a ter as mais traumáticos situações e tropelias. Por aqui passava a estrada alcatroada que vinha de 10Km, (andava em construção – atribulada é certo - o pessoal de Engenharia envolvido era frequentemente atacado – também várias vezes fizemos a segurança aos mesmos e entramos em combate com o IN desfazendo as ferozes emboscadas feitas à estrada, que estava planeada para servir de ligação entre Bissau e Bafatà. Era também já uma vila com vida própria com alguns comerciantes, principalmente libaneses e raros portugueses um posto de Correios, onde algumas vezes telefonei para casa, a sede do Os Balantas, clube de futebol onde existia uma ampla esplanada e um cinema ao ar livre. Tinha também um administrador que aqui residia com a esposa e que eram assíduos frequentadores do cinema, o único inconveniente é que todos os filmes pareciam ser de guerra, porquanto milhares e milhares de melgas que pejavam o chão no fim de cada sessão, voavam permanentemente na frente do projector parecendo no ecrã uma enfiada de balas tracejantes.

O centro com o café e esplanada.

A Estação dos Correios

Quartel de Mansoa visto do cimo do depósito da água

O quartel era já de grande dimensão porquanto era aqui o comando de um vasto sector. Aqui chegados e instalados, veio, depois de algumas incursões dolorosas no mato sob o Comando (digamos que nos acompanhou) o verdadeiro comandante era já o Rui Ferreira, o Cap. Capador, um ineficaz que só atrapalhava, convenhamos que saía mudo escondia-se por todo o buraco que aparecia e regressava calado sendo que foi neste período que tivemos os mais duros contactos com o inimigo e tivemos diversos feridos. Foi a companhia desmembrada, sendo que ao nosso pelotão/grupo foram destinadas as funções de guarnições em destacamentos avançados, (mais uma vez o isolamento e a solidão), e que eram Braia, um bunker na estrada a caminho de Bissorã, nada existia para além do bunker e o arame farpado a toda a volta e onde foi colocada a primeira a Secção comandada pelo sensato, responsável e corajoso, José Monteiro, e Cutia em que existia dentro da cerca de arame farpado algumas moranças e onde exceptuando o refeitório tudo o resto eram abrigos debaixo de terra e cibes onde dormíamos e que ficava na estrada a caminho de Mansabá. Aqui fui colocado com o Ameixa e o resto do pelotão e onde mais tarde se veio juntar um alferes em substituição do Rui, que entretanto tinha sido ferido em combate em operação durante o tempo que permanecemos como companhia de intervenção em Mansoa.

O fortim para defesa da ponte. No chão, feito com garrafas de cerveja enterradas, pode ler-se: “Piratas do Oio 1420″.

Vista parcial da tabanca, dentro do arame farpado, e do Destacamento, onde se vê a bandeira na Porta de Armas.

Perdidos na memória do tempo os nomes dos diversos locais onde sofremos cruéis emboscadas, e procuramos e atacamos acampamentos e casas de mato do IN, apenas me marcam profundamente aquelas onde viemos a sofrer mortos e feridos.

Inscrição na parede de uma caserna.

Choveu copiosamente no percurso para o assalto a uma casa de mato, só participei nela porque ali ia o meu extraordinário grupo e era comandado pelo grande Rui, fui de chinela de praia porque nesse mesmo dia o meu Camarada Carolino (o enfermeiro da companhia) me tinha extraído uma unha arreliadoramente encravada, no meio da aterradora escuridão tropecei no fio de um fornilho que felizmente, eventualmente por causa da chuva, só rebentou o detonador o que não diminui o ânimo do pessoal, não sei exprimir o que senti. Chegamos de madrugada e ao sermos alvejados irrompemos pela casa de mato provocando a sua destruição pondo o IN em fuga desesperada com feridos e capturando diversas armas; no regresso dois elementos já longe do local dedicavam-se à pesca, obrigamo-los a acompanhar-nos para o Quartel, nunca soube de mais nada. Em nova incursão para a mesma zona somos recebidos a partir da berma de uma pequena mata por imensa metralha, no afã de desalojar o IN e porque seguia como de costume no inicio da coluna, avançámos o mais abrigado possíveis naquele sentido, pedindo eu aos dois bazukeiros, o Feijões e o Antunes, que se aproximassem da minha linha de fogo para melhor alvejarem o IN, assim fizerem o que resultou no desalojar dos mesmos mas, como ainda hoje me dói e me faz amiúde sonhar com o acontecimento, na morte de Antunes com um tiro na carótida. Foi dramática a evacuação daquele camarada transportado, aos nossos ombros, em maca improvisada até um local que o helicóptero pudesse pousar.
Pouco tempo após este acontecimento, vim de férias a Portugal, tendo regressado a Mansoa no mesmo dia que era inaugurada a primeira ponte sobre o Tejo. Acho graça a esta coincidência, para um revoltado permanente sem saber porquê.

Durante o período de férias recebi em casa, carta do meu amigo Rui onde me transmitia que uma secção do 4.º Pelotão tinha sofrido uma tremenda emboscada em que uma bazookada tinha atingido a viatura que se dirigia o destacamento da ponte de Uaque para levar a alimentação tendo morrido o 2.º Sargento Monteiro e havido diversos feridos de entre eles o mais grave era o nosso amigo Raimundo (o puto) entre a malta que era a vedeta futebolística da companhia e que faz o favor de ser um meu grande amigo. Era oriundo de uma família de pescadores da Costa da Caparica onde ainda hoje reside já em local diferente. Ficou e está completamente estropiado numa das pernas e num dos braços além do estropiamento ainda ficou amputado de parte dos dedos. Poucos dias passados e ainda de férias recebo nova carta do Rui que me comunica que o nosso pelotão tinha sofrido uma emboscada vindo o nosso amigo Augusto Palhais a ser atingido e ia ser evacuado para a metrópole. Fui visitá-lo ao Hospital onde constatei que tinha sido atingido por uma bala que lhe tirou uma vista. Este jovem, o único casado e já com um filho era a responsabilidade e ponderação que muito nos fazia falta e nos ajudava, está também entre os amigos, quase a generalidade, que se reúnem periodicamente para confraternizar. Originário de Mira – Aveiro ali se radicou.

Vindo de Cutia em trânsito por Mansoa com destino ao Hospital de Bissau para ser observado pelo facto de ter dado uma violenta queda que me provocava fortes dores no peito e tive a alegria de encontrar já recuperado o meu amigo Rui que aguardava transporte para se juntar a nós, em quem notei imediatamente um sentimento de revolta e inconformismo. Então não é que, por que o Comandante do 4.º Pelotão que se encontrava ausente para Bissau e estando aquele grupo para sair com a missão de avançar para o mato para o desalojamento e eliminação de alguns focos referenciados, o Comando de Batalhão, o tinha indigitado para comandar aquele grupo ao que ele reagiu acabando no fim praticamente por ser coagido a aceitar a missão; de imediato abandonei a ideia de ir para o hospital e lhe transmiti: se vais eu também vou, assim já seremos dois a aguentar o barco! Oh diabo, voaram mosquitos por cordas; não penses nisso, nem em sonhos, se for preciso proíbo-te de ires porque sou teu superior, era um poço de humanidade e brincalhão este Rui, depois de acesa discussão com este teimoso lá verificou que não merecia a pena insistir, pelo que lá nos juntámos aos camaradas do 4º. Pelotão. Depois de diversas peripécias no atravessamento de imensas bolanhas aproximamo-nos de uma tabanca isolada na extremidade de uma pequena mata, indo como de costume na frente da coluna, avistei em fuga em elemento, pelo que impetuosa e impensadamente me lancei em sua perseguição, vindo a ser gravemente ferido quando um grupo, emboscado estrategicamente, disparou diversas rajadas de metralhadora atingindo-me duas balas que me provocaram perfuração intestinal e o esmagamento de diversos ossos da bacia que me condenaram ao estropiado que hoje sou. Felizmente não houve mais feridos, porquanto vinham ligeiramente mais atrasados e puderam abrigar-se e eliminar aquela frente de fogo.

Fui em pouco tempo evacuado de helicóptero para Bissau, vindo ao fim de 15 dias para o HMP e posteriormente para a semi-clausura do Anexo vindo a terminar no DI no largo da Graça, locais de onde guardo a mais confrangedora das recordações. E assim termina a saga africana deste anónimo labrego.

No dia 10 de Junho de 1968, ainda andava em bolandas pelas instalações hospitalares donde só saí em Março de 1972, fui condecorado com a Cruz de Guerra, assunto que não pretendia aludir mas que devido a um facto acontecido me obriga a abordar e que anexo no fim.

(Continua)
____________

Nota de CV:

Vd. último poste da série de 26 de Novembro de 2011> Guiné 63/74 - P9097: Porto de Abrigo (Carlos Rios) (2): A nossa estada em Fulacunda

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Guiné 63/74 - P7261: História de vida (32): Adilan, nha minino. Ou como se fica com um menino nos braços - 1ª Parte (Manuel Joaquim)


Sintra > Azenhas do Mar > Setembro de 1977 >  O Adilan, com as suas queridas “maninhas”, dez anos depois de vir da Guiné para Portugal... Fará 50 anos no dia 12 de Janeiro de 2011. E a nossa Tabanca Grande, nesse dia,  quer-lhe cantar os "Parabéns a Você!"...


1. O nosso Camarada Manuel Joaquim, ex-Fur Mil de Armas Pesadas da CCAÇ 1419, Bissau, Bissorã e Mansabá, 1965/67, enviou-nos, com data de 5 de Novembro de 2010, a seguinte mensagem:Camaradas,

Envio-vos um texto e fotos, sobre um menino balanta-mané, o JM, meu "familiar" desde 1967, quando o trouxe da Guiné e que hoje ronda os 50 anos de idade (estou mesmo velhote!).
Tentei que o relato não fosse tão extenso mas não consegui. Aliás, o tema tem bem por onde se pegar e se desenvolver.
Mas este relato limita-se a dar uma ideia do porquê da vinda do menino para Portugal e suas peripécias, do ambiente familiar que encontrou, do seu regresso à Guiné em 1978, do encontro com seus pais e do seu regresso a Portugal, onde reside atualmente.
As fotos são minhas. Não sei se acham interessante a formatização do texto do Apêndice com selos da Guiné-Bissau. Fi-lo porque este texto é quase todo composto por excertos de correspondência por mim recebida, vinda do meu JM. [ O texto que se publica segue o novo acordo ortográfico. EMR]
ADILAN, nha minino... Ou como se fica com um menino nos braços (1ª Parte)

Texto e fotos: © Manuel Joaquim (2010) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados
Introdução
Durante a chamada Guerra do Ultramar (1961/74) diversas crianças vieram para Portugal, trazidas por militares em fim de comissão. Eu fui um dos que o fez e sou dos que acham que algumas destas ações são parte da história da guerra. De certeza que a minha o é. Vejamos:
Guiné, Janeiro de 1966: Este meu menino foi capturado com cerca de quatro anos, passando a conviver, no ambiente militar de Bissorã, com a CCaç 1419/ Bcaç 1857. E acabou por entrar na minha casa em 1967. Ainda cá mora.
Para contar o que se passou com nha minino (o meu menino) fui, por ele, posto à vontade. Não desvendo a sua naturalidade e, do seu nome, ficam as iniciais JMSC. É óbvio que poderá ser reconhecido por quem de mais perto lidou com ele, em Portugal e na Guiné, mas não quero facilitar o acesso à sua identidade.
Irei centrar-me em períodos ou momentos da sua vida, para mim importantes. Não irei inventar e empolar mas recordar acontecimentos e emoções. Confio na minha memória que, neste caso, tem sido muitas vezes ativada, de há 43 anos para cá.


Nha minino > Maio/1967 > No dia seguinte à sua chegada a Portugal

Uma explicação: Adilan é o nome original (balanta-mané) de JMSC. Quando tratei do registo da criança nos serviços competentes de Bissau já todos tinham esquecido o seu nome, ela incluída. Só mais tarde, uns onze anos depois, se voltou a saber como se chamava em pequenino. Por fim, e vale o que vale: vou falar de alguém muito querido que me trata por padrinho e que é irmão das minhas filhas e tio dos meus netos (tratamento familiar mútuo).
1. A causa
Bissorã, 11/ 01/ 1966. Ordem operacional para a CCaç 1419: "limpeza” da tabanca de C., trazendo a sua população para Bissorã. Ao meu grupo de combate cabe-lhe ficar em casa, aguardando o dia seguinte com a missão de organizar a recolha de toda a gente na ponte (destruída) sobre o rio Blassar, limite transitável da estrada Bissorã/Barro.
Ao início da manhã estamos no local. Segurança montada, espera-se. Até que se percebe no horizonte um movimento ondulante, tipo cobra gigante de cor indefinida, que vai ganhando forma à medida que se aproxima: sobressaem mulheres e crianças, animais diversos, alguns deles trazidos à corda, esteiras, utensílios domésticos, tudo misturado com soldados e milícias. Eles aí vêm mas não se ouve qualquer ruído.
Passam-se uns minutos e já se ouve a cobra a rastejar pelo caminho de aproximação. O barulho aumenta progressivamente e, ao dar-se o encontro, o obstáculo gerado pela falta da ponte faz a cobra dissolver-se numa mancha ruidosa, alargada e desordenada, a dirigir-se para as viaturas estacionadas no outro lado do rio (seco). Na confusão da subida para as viaturas, a algazarra de soldados e milícias contrasta com a indiferença e a resignação (ou medo disfarçado?) dos deslocados. Lá se vai arrumando tudo, com alguma dificuldade, e a coluna põe-se em marcha.
Chegados a Bissorã, ala que se faz tarde! Esvaziam-se as viaturas, a tropa vai para o aquartelamento e o povo... fica no chão, embrulhado na tralha trazida e agarrado aos animais, sem controlo aparente. Nem a milícia, que por ali ronda, parece interessada naquela gente. Talvez esteja a controlar, deve estar a cumprir missão específica. Passeio mais uma vez o olhar pelo aglomerado humano e, de repente, dou comigo a pensar: “Não há homens aqui? Só vejo um!"... No meio das mulheres e crianças está um homem, já meio velhote, com ar de perdido ou de inseguro, todo encolhido, calado. “... não conseguiram trazer mais nenhum homem da tabanca? Que estranho!... que se lixe, quero lá saber! Vamos lá mas é arrumar isto!” (as viaturas).
2. A surpresa
Assunto arrumado, dirijo-me a casa. Sim, casa. Os furriéis e 2ºs sargentos da CCaç 1419 estão aboletados numa vivenda, situada fora do aquartelamento e em ótimo estado de conservação, onde também funciona a enfermaria e posto de socorros da Companhia, no que terá sido a área comercial do edifício. Ao entrar pelo pátio das traseiras vejo um grupo todo excitado, como que formado em meia-lua, virado para uma parede. – O que é isto? – Eh pá, o Sarrico trouxe este puto do mato!
Aproximo-me e vejo um pretinho franzino, três/quatro anitos, junto à parede. Reparo no 2º sarg Sarrico, veterano da guerra em Angola, à volta do menino a tentar fazê-lo falar, sem resultado. Chama um miúdo balanta que por ali anda, para servir de intérprete. Nada. Do menino nem um pio mas vê-se que está a tremer, com os olhos arregalados e inquietos. A sua cor é indefinida, talvez acinzentada, a pele está cheia de manchas esbranquiçadas.
Nisto aparece o furriel enfermeiro, repara no aspeto da criança e faz logo um diagnóstico rápido, sentenciando:
– Olhem, ponham-no debaixo da torneira! Ele precisa de uma boa barrela!
– Ponham-no “preto!” – grita alguém da meia-lua.
Há gargalhadas dispersas. Junta-se ao grupo o 1º sarg Lageira, olha, informa-se, sussurra um sincopado “coi... ta… di… nho!” e interpela o enfermeiro:
– Oh Santos, não tens nada para estas coisas da pele? Olha como o puto está!
O Santos deve ter dito que sim e o Sarrico põe a mão na torneira que está na parede da casa, a um metro do solo e por cima da cabeça do miúdo, preparando-se para o lavar. Ao abri-la, o pretinho começa a chorar, aos berros, quando vê a água a jorrar sobre si. E, sempre a chorar, é lavado da cabeça aos pés.
O miúdo está a acalmar, parece. O Sarrico tenta de novo usar o intérprete, com expressões do tipo «não tenhas medo», «ninguém te faz mal», e pergunta-lhe o nome. E não é que o garoto responde? Com uma voz encolhida, deve ter dito Adilan. Sarrico : “Dila?” Intérprete: “A.. .dí… lan!” Sarrico: “pois, Dila”. E quanto ao nome, não se passa daqui. Ficou a dúvida.
(Obs.: Hoje consigo lembrar esta cena, com o nome Adilan incluído, por razões que aparecerão adiante no texto. Mas, na altura, toda a gente esqueceu o seu nome original, inclusive ele próprio. Não admira, é o resultado de ter passado a ser reconhecido por 'Sarrico' e assim ficar a ser chamado.)

Voltemos ao banho de torneira. Está o garoto, lavado e mais calmo, a começar a responder ao intérprete quando aparece o Santos, todo pressuroso, com um grande frasco na mão, cheio do tal produto que faz bem à pele:
– Vamos lá a isto!





Bissorã > Janeiro/1966 > Eu, na varanda da habitação dos sargentos da CCaç 1419
O enfermeiro dirige-se ao miúdo e passa-lhe a tintura pelo corpo todo. A cena torna-se patética. Com o corpo a arder, o garoto grita que nem um desalmado tentando soltar-se; alguns dão gargalhadas, outros têm um sorriso amarelo, parecendo incomodados. Eis senão quando o menino solta-se mesmo e, aos saltos que nem um cabrito, investe contra a meia-lua humana, aos berros, assustado com o que está a sentir. Parece pedir socorro. Tem razão o 1º Lageira, com o "coitadinho" de há pouco. Mas o menino não consegue fugir e, qual passarinho entre as mãos do seu captor, vai acalmando a um ritmo lento parecendo estar a tomar conta, pela primeira vez, do ambiente que o rodeia.
As conversas cruzam-se. Discute-se o acontecimento. Até que se ouve o sarg Sarrico dizer que vai cuidar da criança. Não digo nada mas o caso incomoda-me: o menino foi retirado à força da sua comunidade e, ainda por cima, numa ação de reordenamento populacional. Por onde andarão seus pais ou outros familiares?
Com a decisão do Sarrico a criança fica a viver na nossa casa. Por incrível que pareça, passados poucos dias já parece outro, a sua pele brilha num castanho claro, ele e o Sarrico parecem já ser amigos, fazem lembrar o filme “O Garoto de Charlot“. Mas esta situação só durou pouco mais de um mês.
(Obs.: Hoje sei que seus pais fugiram, deixando o filho para trás porque estava afastado deles, em companhia de outro garoto mais velho, a “trabalhar”, assustando a passarada que está sempre cheia de fome ao alvorecer. Foi apanhado de surpresa por alguém que não mais o largou. O seu companheiro conseguiu fugir.)
3. O acidente
Bissorã, 20/ 02/ 1966. Meio da tarde. Uma mulher da tabanca, com problemas no parto, precisa de ser evacuada para Bissau. Vem um helicóptero. O piloto diz ter visto um grupo suspeito, na estrada Bissorã/Bula, que lhe pareceu estar em reunião. Tal informação gera uma ordem de saída para se verificar e atuar conforme. Foi dada ao grupo de combate do sarg Sarrico.
Está um calor sufocante. O Sarrico tem a mania de andar no mato com uma granada de fumos. Não sabemos porquê. Talvez tenha medo de se perder; ele adora fotografar e é frequente vê-lo de máquina fotográfica nas mãos durante as operações. Hoje, para cúmulo, tem a granada num bolso das calças, sem arejamento. Distração ou inconsciência?
Pois é. Ao aguardar a saída, ao sol direto, a granada rebenta-lhe no bolso : PÔFF!... Queimaduras muito graves nos dedos das mãos, no baixo ventre e noutros locais alcançados pelos espirros do material químico. Aparece-nos em casa, pelo seu próprio pé a caminho da enfermaria, e uma espécie de fiozinhos de vapor branco evolam-se saindo dos farrapos do camuflado, das zonas do corpo atingidas... até da G3! Socorro possível e imediato, evacuação para Bissau. Segue-se Lisboa (HMP) e... salvou-se! Mas a morte andava por perto, não esperou muito tempo para o levar.

Final da tarde. Naquela falsa calma dorida e angustiante, alguém pergunta:
– Eh pá, e o puto? Que é que se faz com ele?.

Bem, fala-se por falar, trocam-se olhares, encolhem-se ombros e ninguém assume nada. O puto está sem o seu protetor e é precisa uma solução, de e para o imediato. Que não demora muito. Alguns soldados levam-no para a caserna, batizam-no de Sarrico, e lá ficam com ele.
Os meses vão passando, a convivência corre bem mas o miúdo é livre de frequentar a rua e a tabanca. Parece que “é de todos e não é de ninguém”. Não é mascote. Vejo-o, uma vez por outra, nos pequenos bandos de crianças que, de lata na mão, esperam pelas sobras do rancho. Não precisa de comida, quer é brincar e participar nas movimentações da miudagem. Mais dia menos dia, penso, será recuperado totalmente por alguém da família. Chego a estranhar isto não ter ainda acontecido.
4. A “emboscada”
Bissorã, finais de Outubro/66. Oito meses são passados desde o acidente que vitimou o 2º sarg  Sarrico. É alterada a disposição no terreno das forças militares do BCaç 1857 e, assim, a CCaç 1419 sai de Bissorã e vai para Mansabá. Que bela prenda, para final de comissão!
Nas vésperas da mudança, a sociedade civil local organiza um convívio para agradecer o trabalho da Companhia durante os 12 meses que permaneceu em Bissorã. Foram convidados os oficiais, os sargentos e algumas praças. Bom ambiente, muitas bebidas, bons petiscos e, com coisas destas, pouco tempo é preciso para se esquecer a razão das despedidas. Às tantas, alguém me convoca:
– Meu furriel, há para ali pessoal que quer falar consigo. Pedem p´ra ir lá.
Estranhando o despropósito do momento e da hora, bem noturna , lá vou até à porta.
– Oh nosso furriel, um favor, veja se convence o nosso capitão a deixar levar o Sarrico c´a gente p´ra Mansabá! É que ele não autoriza, já fizemos tudo e... nada! Veja lá se o convence!
Tento dizer-lhes que o capitão lá terá as suas razões... assunto complicado... não deve ser possível levar o miúdo... Mas, perante tanta insistência, não resisti:
– Está bem, estejam descansados que eu vou tentar! Esperem aí!
Pego num uísque e por ali fico bebericando, conversando e aguardando a oportunidade de cumprir o prometido. Falo com alguns camaradas sobre o assunto mas ninguém está ali para pensar nisso! O ambiente está animado, barulhento e... ,para mim, há uma resposta a dar ao pessoal que espera lá fora. Vamos lá!
Qual mensageiro da plebe castrense, já envolto em vapores etílicos, um bocado leve no andar e de fala um pouco entaramelada, lá vou eu ao encontro do capitão. De chofre, sem rodeios, em voz bem alta:
– Meu capitão, por que não deixa ir o Sarrico c´os soldados p´ra Mansabá? Estão pr´ali quase a...
Nem me deixa acabar. Com a voz ainda mais alta que a minha, atira logo:
– Oh meu caro Manuel Joaquim, responsabiliza-se por ele?
Pimba!!!... que grande martelada na tola! Inesperadamente, em décimas de segundo, os meus neurónios excitados pelo álcool (anestesiados?) devem ter decidido eu dizer, de imediato:
– Responsabilizo, pois!
O capitão, talvez surpreendido com tal resposta, engasga, pigarreia e... :
– Então está bem! Se assim é, o rapaz fica ao seu encargo a partir de agora!
– Com certeza, meu capitão! Vou já avisar o pessoal!
E não houve mais conversa! Meia volta e lá vou eu para a porta da rua ter com a malta, um pouco zonzo com o que me está a acontecer:
– Podem levar o Sarrico! A partir de agora está por vossa conta... e minha!!!
– Eh!.. bestial !!! Obrigado!!!
Caem-me em cima festejando e voltam para a caserna, rua fora, festejando... eu volto à sala para festejar, digo a alguém “ já me f... ! ” e agarro mais um uísque para me ajudar a digerir o assunto.

Lembro-me bem da saída de Bissorã, bem cedo. Pouca gente na rua, uns acenos tímidos, quase indiferença. É exceção um pequeno núcleo a protestar quando passa por ele a viatura onde segue o Sarrico. Fico surpreendido pois não imaginava tal oposição. Afinal, o miúdo tem família ali em Bissorã! E, ainda por cima, a reinvindicá-lo!
Quem diria, estava sinalizado pela família e ninguém me disse nada?! ... “ merda p`ra isto!”...
Sinto um certo mal-estar. O ruído, ou melhor, a razão daquele protesto incomoda-me: “Olha no que eu me meti! ... F...-se! ”
Lá vou matutando, inseguro e aborrecido, até Mansoa. Aqui, e a caminho de Mansabá, começo a medir verdadeiramente o problema que arranjei e que tenho de resolver!...
Sem saber como, e de um momento para o outro, fico com um menino nos braços, literalmente!

Mansabá > 1967 > Contraluz
5. A decisão
Mansabá, Novembro / 1967. O Sarrico fica a viver com os soldados, a tempo inteiro. Não quero interferir, pois eles gostam dele e tratam-no muito bem. E há também um pequeno grupo responsável pelo seu bem-estar. Do meu lado sucedem-se algumas conversas com o capitão, à procura de uma possível saída para resolver o meu problema.
Passa-se o tempo e nada, nem sim nem sopas. Depois de tudo o que aconteceu, só vejo uma solução para resolver o caso, ética e moralmente aceitável para mim. É levar o garoto para Portugal.
Decisão tomada, vou informar o capitão e, para grande surpresa minha, ouvi-lhe um “não esperava outra coisa”! A seguir, dirijo-me à caserna e dou a notícia aos cuidadores:
– Está resolvido, vou levar o Sarrico comigo para a metrópole! Tratem-no bem, digam-lhe que irei tomar conta dele e que vai gostar muito de estar comigo. Quero que me veja como seu protetor, como a sua segurança quando vocês o deixarem.
Com esta minha decisão há, de novo, festa na caserna. E eu sinto-me confortado, pacificado.
Os dias passam. Não sei o que vai na cabeça do, agora, nha minino. É um menino muito bem tratado por todos. Para já quero que me veja como uma espécie de figura mágica que o pode proteger. Vê-me de longe, não me aproximo, de vez em quando calha trocarmos olhares, deve sentir o carinho do meu olhar, talvez.

Mansabá > 1967 > Vista, de dentro do quartel, de parte da tabanca (W). Em 1º plano nota- se a cobertura de um abrigo

Mansabá, Abril de 1967. Passaram-se cinco meses. É preciso regularizar a situação civil do Sarrico e preparar a sua viagem para Lisboa, prevista para o fim do mês. Vou a Bissau: (i) registá-lo com um nome cujas iniciais são JMSC (cada uma delas corresponde também à inicial de outros nomes: o meu, de meu pai, da sua tabanca natal, de quem o capturou); (ii) autenticar um Termo de Responsabilidade sobre a criança; (iii) obter autorização da PIDE para a viagem; (iiii) comprar a respetiva passagem marítima. Tudo resolvido, regresso a Mansabá. «O Sarrico vai c´a gente!», grita-se na caserna.

Mansabá > 1967 > Regresso das tarefas agrícolas, ao fim da tarde

Bissau, finais de Abril /1967. Adeus Mansabá, olá Bissau! Matam-se saudades das ostras e doutros petiscos (nos três primeiros meses de comissão a CCaç 1419 esteve colocada em Bissau). O dia do embarque aproxima-se. Vai-se à procura de roupa para o menino que fica todo boneco, uma beleza. O pessoal rejubila. E é nesta altura, nas compras, que tenho o que se pode chamar um verdadeiro primeiro contacto físico, afetivo, com o balantinha-mané mas durante pouco tempo, o tempo das compras. Só lhe volto a tocar em Abrantes.

6. Portugal
Lisboa, 9 de Maio de 1967. Cais da Rocha: o UIGE despeja a carga, a alegria anda estampada nos rostos dos militares, de seus familiares e amigos.
Menos efusivo do que antes imaginava, desço as escadas do navio e vou ao encontro da namorada. Um pouco depois nha minino passa junto de nós, todo apinocado e acompanhado por alguns soldados. A minha futura sogra exclama “Olha ali um pretinho tão giro!”.
Digo com alguma indiferença “irão vê-lo muitas vezes” e vejo que não me percebem. É que eu não disse nada a ninguém! A ninguém mesmo!
Segue-se a viagem de comboio para o RI 2, em Abrantes. Só aqui, na hora das despedidas, acontece a entrega do menino. Lágrimas e abraços a selar o momento. Assiste um amigo de Pombal que ali está de carro para nos recolher, a mim e a outro militar lá da terra. A surpresa é grande quando percebe que há mais um passageiro, e que passageiro!
A caminho de Pombal, a primeira paragem é na minha casa, numa aldeia chamada Casal Novo. Minha mãe está sozinha: meu pai está em França, meu irmão mais novo também e o outro irmão está em Moçambique, já recuperado de ferimentos em combate, a cumprir os meses finais de comissão na cidade da Beira. (Como a mãe deve ter sofrido com dois filhos na guerra, em simultâneo durante mais de um ano, e um outro fugido em França!)
Alegria a rodos, vamos todos casa adentro. Saltam um chouriço e uma garrafa de vinho, o menino é motivo de conversa mas não diz uma palavra. Está sentado numa cadeira, hirto, afastado da mesa, como que olhando para o vazio. Vêm as despedidas, sai-se para a rua mas ele ficou onde estava. Minha mãe, que ficou à porta, nota a falta da criança e exclama: “Então não levam o menino?!!!”.
Ficam como que assarapantados com a pergunta mas, de imediato, lhes digo: “Não lhe disse nada!” e para ela: “O menino fica comigo!”. Fica de boca aberta, não quer acreditar, e há mais uns minutos de conversa motivada pelas circunstâncias.
Ao reentrar, verifico que ele está sentado no mesmo sítio. Olha-me calmamente, agora sinto que me olha mesmo! Espantam-me a calma e a confiança que aparenta. Belo trabalho dos soldados, só pode ser. Tentamos conversar. O seu português é tosco mas lá nos entendemos.
Vamos comer mais alguma coisa enquanto minha mãe vai recuperando da surpresa e do espanto. Depois, o sono vem depressa ao seu encontro e já não acordou antes de ser levado para a cama. Minha mãe quer perceber o que aconteceu para ter, assim, um menino em casa. E que menino! A conversa prolonga-se.
Acordo, bem tarde, no dia seguinte. Estavam os dois, no quintal, a tratar das galinhas e doutra bicharada. “Maravilha!, sucedeu química entre eles!” – penso. E diz a minha mãe:
– Queres saber? Logo de manhãzinha fui chamar as vizinhas: “querem ver a prenda que o meu Manel me trouxe da Guiné?” Olha, vieram a correr e abri-lhes a porta do quarto, só se via uma bola preta, assim a cara, com duas coisas mais claras, assim os olhos, e elas não sabiam o que era! Abri um pouco as cortinas da janela para verem melhor e nem imaginas como ficaram! Ele estava acordado, muito quietinho de olhos arregalados, só com a cabeça fora dos lençóis!
Bela cena! Começo a sentir-me bem, verdadeiramente.

Pombal > Casal Novo > Maio/1967 > Os primeiros passos de corrida para o domínio do espaço da aldeia
7. A integração
Situada perto de Pombal, Casal Novo é aldeia pequena mas a notícia da chegada de um pretito da Guiné espalha-se facilmente para lá da aldeia. Será conveniente fazer algum tipo de apresentação social e, para o efeito, nada melhor que aproveitar a missa dominical.
Assim, a 14 de Maio e à saída da missa, lá estou no largo da igreja paroquial de Santiago de Litém com o meu pequenino JM. A apresentação é um sucesso, para mim e para ele. Muito seguro de si, pose empertigada, é alvo de grande curiosidade.
Aproveito a ocasião e vou apresentá-lo ao pároco, que fica encantado. Interessa-me motivá-lo para me ajudar na integração social da criança. Vem à baila a educação religiosa e, logo ali, fica decidido que o menino será batizado.
Resolvo comunicar ao padre a minha intenção de realizar, na igreja local, o meu casamento. Aponto para finais de Agosto. E surge a ideia, que até é do padre: por que não realizar o casamento e o batizado na mesma altura? Acho interessante, ótimo mesmo, mas preciso do acordo da noiva (que veio a concordar).
Para criar vínculos familiares combinou-se que meu pai seria o padrinho de batismo e a noiva seria a madrinha. E em 20 de Agosto de 1967, a seguir ao meu casamento, realiza-se o batizado do menino JMSC. E assim ficamos todos seus padrinhos, diretamente ou por afinidade.



Pombal > Santiago de Litém > Agosto/1967 > Um casamento e um batizado, três meses após a chegada da Guiné

Após o casamento vou morar para Rio de Mouro (Sintra) e deixo o menino com meus pais. Já está decidido, ficará com minha mãe (meu pai trabalha em França) e em Outubro irá frequentar a escola da aldeia.
É a melhor solução pois, sendo eu professor titular de um lugar de escola perto da Figueira da Foz (não consegui transferência atempada para a área de Lisboa, onde a esposa trabalha), será difícil tomar conta do miúdo.
Assim a maior parte dos nossos fins-de-semana, durante o ano letivo, irá passar-se na minha casa paterna. E, para ajudar, nota-se uma enorme empatia entre ele e a agora “madrinha”, a minha mãe.
Na escola a integração é rápida, torna-se um dos melhores alunos, desde a primeira classe. Assim, no ano seguinte, apesar de eu ficar colocado na Amadora, opta-se pela sua não mudança de escola.
Na aldeia é muito querido por toda a gente e, nos seus tempos livres, é vê-lo a participar em pequenas tarefas rurais, as mais diversas, tanto nas da sua casa como nas dos vizinhos. Esta situação dura quase quatro anos e termina pelo Natal/1970, quando meus pais resolvem viver juntos em Paris.

Agualva-Cacém, 1971. Em Janeiro, o JM vem viver comigo. O afastamento da aldeia não esfria as relações com seus habitantes pois grande parte das suas férias escolares futuras será lá que a passa, participando ativamente na vida social local.
A chegada dele coincide com o aumento da família. A uma menina com dois anos e meio está quase a juntar-se uma outra. Nasce um mês depois. Ele é o seu “irmão mais velho” , elas assim o vêem e ele assim o sente. Elas são as suas “manas”.
E temos agora um rapaz prestes a entrar na adolescência, num ambiente totalmente diferente, tanto familiar como social.
Segue o percurso escolar sem sobressaltos de qualquer espécie até ao 25 de Abril. Mais cedo do que eu pensava, e na sequência da Revolução de Abril que o apanha com 13 anos, ele começa a prestar muita atenção ao que se passa na Guiné.
É verdade que sempre tentei criar nele laços afetivos com o seu país natal, ajudando-o a criar e a manter um sentimento de pertença às suas gentes e a um espaço que é seu por nascimento, mas não lhe tinha notado nenhum interesse especial no assunto.


Agualva > Cacém > No carnaval de 1973 > Com a madrinha, passeando as “manas”

8. O regresso
A independência da Guiné-Bissau é para ele uma coisa normal, estava preparado para tal. Sente-se bem com o facto. Há muito tempo que lhe venho dizendo para não menosprezar os estudos pois poderiam ser importantes para vir a ajudar, um dia, o seu país, assim mesmo, o seu país.
Os anos vão passando e a Guiné-Bissau torna-se um chamariz irresistível. Devo ter contribuído para isso, não medindo as palavras para elogiar seu povo e suas belezas naturais, o aroma e o sabor dos frutos, o paladar de um bom chabéu; para recordar o faiscar furioso dos relâmpagos com o ribombar ensurdecedor dos trovões, os cheiros fortes, mesmo excessivos, da floresta húmida e os suaves aromas vindos da savana seca no cacimbo da madrugada; para referir a beleza de um batuque, os sorrisos das crianças e a dignidade dos velhos, a cultura da sua gente. Talvez eu tenha pecado por não o alertar para as coisas más e desagradáveis que também existiam, e que seriam muitas.
Também nunca lhe menti sobre seus pais. Podia ter dito que tinham morrido mas digo-lhe que tanto podem estar mortos como terem fugido no momento em que ele foi apanhado. A verdade é que ele acredita mais na morte deles do que eu. Tento deixar-lhe entreaberta a porta da esperança, sempre.
Ao acabar o nono ano, em 1977, o rapaz pensa em voltar à Guiné. Começo a procurar maneira de lhe fazer a vontade. E, em Setembro, consegue-se lugar num avião militar português.
Temos então o JM a despedir-se dos amigos, dos familiares e do pessoal da(s) aldeia(s) com quem conviveu nos primeiros anos portugueses e onde passava férias escolares nos últimos cinco anos. Prendas arrumadas, enxoval emalado, despedidas lacrimosas e , na data marcada, ida para o aeroporto. Na manhã seguinte, estava-me a bater à porta!
– Então? !!! - pergunto, muito admirado.
– Pifou tudo, padrinho! Ao preparar o embarque, e ao verem a minha idade, perguntaram-me quem é que estava em Bissau à minha espera. Como não sei o nome de ninguém, disse-lhes que era o PAIGC e eles responderam-me que PAIGC é muita gente, não serve.
Fico espantado. Estava tudo tratado, o cônsul da Guiné-Bissau até tinha ajudado a conseguir esta boleia e... afinal, cá temos o rapaz de novo em casa! Ele pode estar frustrado mas para a família cá de casa não há problema. As suas “maninhas” têm seis e nove anos, gostam muito dele e ficam todas contentes.


Sintra > Azenhas do Mar > Setembro/1977 > Na véspera da partida (falhada) para a Guiné, num passeio de despedida com as suas queridas “maninhas”

Retoma-se o processo, tentando não haver falhas. O Consulado guineense assume a orientação e eu apresento-lhes uma espécie de curriculum vitae do JM, com um relato das circunstâncias que me tinham levado a trazê-lo para Portugal. Não demorou a sua aprovação.
Agora só falta comprar a passagem e querem que seja eu a fazê-lo. Perante a minha recusa, o governo de Bissau paga-lhe a viagem na TAP e lá vai ele a caminho da Guiné, agora sim, recomendado a uma figura destacada do PAIGC. Estamos em Janeiro/1978, fez há pouco 17 anos e tem quase 11 de vida em Portugal.
Muito bem recebido em Bissau, a Organização do PAIGC toma conta dele, garante-lhe residência e alimentação até ter emprego. Retoma os estudos. E começa uma nova etapa da sua vida, sozinho, às vezes inseguro mas maravilhado com o novo mundo que lhe aparece, cheio de esperança e entusiasmo.
9. Os anos de Guiné
Razões várias me levam a não fazer grandes referências ao percurso do JM na Guiné-Bissau, quer por princípio quer por respeito pela sua privacidade, não só a pessoal mas também a cívica.
Continua a estudar, integra-se na vida política como militante da JAAC (Juventude Africana Amílcar Cabral), trabalha na administração pública. Sozinho, sem família nem “padrinhos”, vai marcando o seu lugar.
(Obs.: O regresso do JM à Guiné natal vai criar-lhe um natural desejo de saber da situação dos seus pais. Estariam vivos? Como irá ele reagir, que sentimentos vai ter de enfrentar? Que tipo de emoções vai sentir? É sobre tudo isto que, em Apêndice, ele vai ”falar” através da correspondência que me dirigiu.)

A certa altura é escolhido para frequentar o Instituto Superior Karl Marx, de Berlim, na então República Democrática Alemã, na área de formação administrativa e política ou coisa parecida. E assim, alguns anos depois, cá temos o rapaz outra vez na Europa mas, infelizmente, gora-se a espectativa de uma passagem por Portugal.

Alemanha ( RDA ) > 1986 > Convivendo

Acabado o curso, regressa a Bissau.
A Guiné que ele tinha deixado estava a começar a resvalar para o que, na altura, ninguém imaginaria. Mas os sinais já lá estavam. A propósito diz-nos, em Agosto de 1986:

Como é do vosso conhecimento as coisas por cá não vão lá muito “católicas”. (...) os vencimentos mal chegam para um indivíduo comer - a inflação é galopante e, quando assim é, o pessoal (...) e reclama, outros lembram-se dos bons velhos tempos do colonialismo em que havia de tudo (...), outros ainda só pensam em emigrar (...) situação não muito alarmante mas que precisa duma certa atenção por parte das entidades responsáveis (...).

A sua atividade laboral desenvolve-se na área política, tendo nos anos seguintes trabalhado em diversos gabinetes ministeriais.
Entretanto, surge-lhe a oportunidade, que não perdeu, de vir passar seis meses em Portugal. Ótimo para matar saudades, cada vez maiores, da sua família portuguesa. E ei-lo de volta a Lisboa, a Agualva-Cacém e ao seu Casal Novo. Estamos em 1990, treze anos depois do seu regresso à Guiné, e temos o nosso JM de novo em Portugal e nos ambientes da sua infância e adolescência.
10. A reviravolta
A sua visita é uma grande alegria, para ele e para todos os seus familiares portugueses. Chega radiante e anda cada vez mais radiante. Aproveita para renovar o seu Bilhete de Identidade português. Não quer regressar sem este documento pois a vida social e política na Guiné começa a dar sinais de instabilidade. Tem alguns pressentimentos desagradáveis, está bem colocado para se dar conta disso. Infelizmente virão a concretizar-se e a um nível difícil de imaginar, naquela altura. Apesar de tudo, JM faz planos para desenvolver atividade económica em Bissau. Mas o destino baralha-lhe os planos. Um problema surge na Conservatória, não lhe aceitam o processo de renovação do B.I.
É verdade, tudo tinha mudado para casos como o dele. O que tem de fazer, agora, é pedir a recuperação da nacionalidade portuguesa. Tem direito a esta se tiver residido em Portugal, em permanência, num determinado período imediatamente anterior a 25 de Abril de 1974 (cinco anos?).
Ora bem, não há problema nenhum, é fácil provar a sua residência pois tinha frequentado a escola pública durante todo aquele período, há registos oficiais disponíveis e credíveis. Pois é… é fácil, mas a entrega do B.I. só acontece passados dois anos. Dois anos!!! Por isso não voltou a Bissau na data prevista, tendo por cá ficado à espera do B.I.
Entretanto, a instabilidade política e a degradação económica da Guiné vão aumentando rapidamente e afastam, cada vez mais, a ideia de regresso. Surgem mais razões para diluir esta ideia: confirma que a sua ligação afetiva à família portuguesa é muito grande e envolve-se sentimentalmente com quem, mais tarde, contrairá casamento e será mãe dos seus filhos.
Apesar de adorar a sua Guiné, sempre interessado e preocupado com o que lá se passa, também se sente muito bem como cidadão português. Para além da família constituída há relações fortes com muita gente, com os locais portugueses onde cresceu e com a outra sua “família” que o acompanhou nesse crescimento. Sem esquecer os ex-militares da CCaç 1419 que tomaram conta dele, desde Bissorã até Abrantes, com quem se encontra anualmente, de há 18 anos para cá. Não mais regressou.
11. Epílogo
Está no fim esta narrativa, feita sem outro objetivo que não o de referenciar momentos e aspetos da vida de um homem que, desde os seus 4 anos de idade, se podem caraterizar como especiais e o de dar a conhecer um outro lado da guerra colonial que criou afetos que perduram, pelo menos enquanto forem vivos os seus intervenientes.
Há ainda um acontecimento importante a referir, o reencontro de JM com seus pais.
Este acontecimento poderia integrar um processo de análise das possibilidades de reintegração de alguém que tenha sido afastado da sua família natural, nomeadamente quando esse alguém é uma criança nos seus primeiros anos de vida. Poder-se-á pensar que o processo é simples. Tudo leva a crer que só excecionalmente o será.
Este caso de um menino de quatro anos retirado, à força, da sua família e do mato da Guiné e catapultado para uma sociedade europeia, mesmo que seja rural-portuguesa, pode dizer alguma coisa sobre o assunto. Não esquecer que este é um caso inserido numa guerra, o que também o torna especial.
A seguir, em apêndice, JMSC relata os momentos que (e como) viveu aquando (e a partir) do reencontro com seus pais, quase doze anos depois da sua separação. São relatos,  a quente,  de sentimentos e sensações que, na altura, muito mexeram com ele e connosco, seus familiares em Portugal. E, no meu caso, ainda hoje. A composição deste Apêndice mostrou-mo.
(continua)


Um abraço,
Manuel Joaquim
Fur Mil de Armas Pesadas da CCAÇ 1419

Fotos: © Manuel Joaquim (2010). Todos os direitos reservados.
__________
Nota de M.R.:

quarta-feira, 21 de agosto de 2019

Guiné 61/74 - P20081: Banco do Afecto contra a Solidão (23): o ex-soldado paraquedista nº 04341366, Álvaro Magalhães, eo seu processo kafkiano, que se arrasta desde o início dos anos 90, de reconhecimento de doença em serviço...Camaradas, quem pode ajudar ? (Jaime Silva, ex-alf mil paraquedista, BCP 21, Angola, 1970/72)

1. Mensagem do nosso amigo e camarada Jaime [Bonifácio Marques da] Silva, natural de (e residente em) Lourinhã, ex-alf mil paraquedista, BCP 21, Angola, 1970/72, membro da nossa Tabanca Grande, com 60 registos no blogue:


Data: terça, 13/08/2019 à(s) 11:54

Assuntio: Processo do paraquedista Ávaro Magalhães

Caro Luís:

Vê se consegues que algum camarada nosso tem disponibilidade para averiguar se o processo do paraquedista Álvaro Magalhães, combatente em Angola, ainda se arrastará por mais tempo:

O Álvaro, por indicação do seu médico de família, iniciou nos anos 90 o processo para lhe ser reconhecido qe sofre de "stress pós.traumático de guerra".

O processo deu entrada nos Hospital Militar da Força Aérea em Lisboa no início dos anos noventa.
O tempo passou e, quando o Álvaro tenta saber da evolução do processo, é informado que este tinha desaparecido. Por volta de 2008, desesperado, pede-me ajuda e conseguimos que desse entrada um novo processo em 2009..

Tudo volta à estaca zero e entrega novo processo que ainda se arrasta. O Álvaro vive desesperado e necessita de ajuda muito urgente.

Identificação do processo:

Processo de averiguações por doença em serviço N.º 004/ 2018 / AMI / 001 /DS

O último ofício que recebeu foi oriunda do Ministério da Defesa Nacional - Força Aérea - Comando Pessoal / Serviço de Justiça do Hospital das Forças Armadas na Avenida da Boavista,  Porto.

Álvaro Magalhães - Ex. sold. Paraquedista / 04341366

Por favor vê o que podes fazer.
abraço
Jaime
__________

Nota do editor:

Último poste da série > 3 de junho de 2017 > Guiné 61/74 - P17427: Banco do Afecto contra a Solidão (22): Notícias do antigo 1º sargento da CCAÇ 1419 (1965/67) e da CCAÇ 2312 (1968/69), e cofundador da ONG Ajuda Amiga, António Joaquim Lageira: deixou de comparecer aos convívios anuais e estava num lar do exército, em Oeiras, em 2015 (Ana Pacheco / Carlos Fortunato)

quinta-feira, 4 de março de 2010

Guiné 63/74 - P5932: (Ex)citações (60): Este blogue é um fórum mas também uma câmara de gritos (de saudade, de alegria, de tristeza, de horror, de perdão, de expiação, de amor-próprio, de vaidade, de humildade, de dádiva, de amizade, de solidariedade, de revolta, às vezes de vazio) (Manuel Joaquim, CCAÇ 1419, Bissorã e Mansabá, 1965/67)




Onde está o nosso camarada Manuel Joaquim, ex-Fur Mil de Armas Pesadas da CCAÇ 1419, Bissau, Bissorã e Mansabá, 1965/67  (*) ? Acontece que ainda não temos uma foto dele...

Ei- lo aqui entre o grupo fundador da  Ajuda Amiga... Transcreve-se a legenda:

 "Realizou-se no dia 19/4/2008, no escritório do Carlos Rodrigues em Lisboa, a primeira reunião para criação de um movimento de ajuda à Guiné, onde estiveram camaradas de armas de várias companhias que passaram pelo sector de Bissorã e de Farim.

"Na foto de pé da esquerda para a direita: Manuel 'Pais e Sousa'- CCav 1650, Rogério Marques 'Freire' - CArt 1525, Eurico Caeiro 'Lavado' - CCaç 1419, Júlio da Silva 'Esteves' - CCaç 816 , 'Carlos' Manuel Rodrigues'  Bernardes - CCav 1650, António Joaquim 'Lageira' - CCaç 1419, 'Adrião' Lourenço Mateus - CArt 1525, António Jesus Picado 'Magalhães' - CArt 1525.
"Em baixo da esquerda para a direita: Manuel Joaquim - CCaç 1419, Carlos Silva - CCaç 2548 , José Riço - CCav 1650, e Carlos Fortunato - CCaç 13)". (...)



Lisboa > 20/8/2008 >  Tomada de posse [ dos órgãos sociais da Ajuda Amiga - Associação de Solidariedade e de Apoio ao Desenvolvimento, que é presidida pelo nosso camarada Carlos Fortunato ]. Legenda: de pé, Antero Valongo (a assinar), Carlos Fortunato e Carlos Rodrigues; sentados: António Magalhães, Carlos Silva, Manuel Joaquim e António Bernardes.

Fotos: © Ajuda Amiga (2010). Direitos reservados


 1. Comentário, de hoje,  do Manuel Joaquim, ao poste P5924 (**)

 Oh pessoal, calma no barco!Tenho este livro (**) desde 1980. Li-o e na altura, confesso, achei-o mais como um exercício panfletário contra a guerra do que uma história assente em factos passados na Guiné. Aquela maluqueira passava um bocado ao lado da minha guerra onde tive muito medo, senti a sorte proteger-me, fui louvado por actos em combate, chorei e ri muitas vezes, sofri muito mas também me diverti muito!

E eu era contra aquela guerra. Digo-o agora como o dizia na Guiné aos meus camaradas (e em voz alta, posso prová-lo). Hoje, perante o que fui sabendo, olhando para o assustador número de casos clínicos graves atribuídos ao stress de guerra e, principalmente, lendo esta imensidão de páginas deste blogue onde as sequelas de foro psicológico e psiquiátrico estão tão nítidas e tão vivas!!!

Este blogue é um fórum mas também uma câmara de gritos (de saudade, de alegria, de tristeza, de horror, de perdão, de expiação, de amor-próprio, de vaidade, de humildade, de dádiva, de amizade, de solidariedade, de revolta, às vezes de vazio ).

Voltando ao princípio : A leitura, hoje, do livro faz-me compreender uma parte importante da paisagem dos veteranos de guerra, a que me orgulho de pertencer.Concordo que o livro está datado (mas só no plano ideológico já que,quanto à base do texto,está lá bem escarrapachada muita da ambiência que me envolveu). Recomendo a sua leitura,mesmo que não concordem nada com a perspectiva ideológica do livro .E os erros histórico-geográficos que se possam encontrar não têm importância nenhuma.

Um abraço a todos (da ponta esquerda à ponta direita)
Manuel Joaquim 

(CCaç 1419)

_____________


Notas de L.G.:

3 de Agosto de 2009 > Guiné 63/74 - P4774: Tabanca Grande (167): Manuel Joaquim, ex-Fur Mil Armas Pesadas da CCAÇ 1419, Bissorã e Mansabá (1965/67)


(...) Quero inscrever-me na Tabanca, mas ainda não sei bem utilizar esta coisa (mandar fotos p.ex.); estou mesmo no início.

Um info-excluído, ou quase, que está a tentar sair desta situação e dando os primeiros passos na net, encontra um blogue (Luis Graça & Camaradas da Guiné) e... que descoberta!

Já lá vão umas boas horas de emoção! Mas nunca é tarde, nem para aprender a manipular o computador nem para começar a participar nesta rede de emoções/recordações. (...)

(...) Fui professor do ensino básico (Escola Gago Coutinho/Amadora) e director da Escola Profissional de Recuperação do Património/Sintra . Estou aposentado e perto dos 68 anos (1/9). Sou sócio da 'Ajuda Amiga-Associação de Solidariedade e de Apoio ao Desenvolvimento', muito ligada à Guiné. (...)

(**) Vd. poste  de 3 de março de 2010 > Guiné 63/74 - P5924: Notas de leitura (72): Lugar de Massacre, de José Martins Garcia (Beja Santos)